COOPERATIVAS TRABALHO COMO MEDIAÇÃO DOS PROCESSOS DE TERCEIRIZAÇÃO

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Transcrição:

1 COOPERATIVAS TRABALHO COMO MEDIAÇÃO DOS PROCESSOS DE TERCEIRIZAÇÃO Marlene Corrêa Torreão * RESUMO O presente texto apresenta algumas considerações acerca da revitalização das cooperativas de trabalho na sua relação com os processos de terceirização no Maranhão. Parte da análise de que essa estratégia, utilizada historicamente pelos trabalhadores tanto no enfrentamento às suas necessidades materiais, como na organização de suas lutas contra os fundamentos da exploração capitalista identificada na sua vertende com os processos emancipatórios, está sendo reatualizada como mecanismo de flexibilização e desregulamentação dos direitos trabalhistas na atual fase de saídas à crise-reestruturação das forças produtivas, em que o cooperativismo se coloca contraditoriamente como estratégia implementada tanto pelos trabalhadores, como pelo capital. Palavras-chaves: Terceirização, cooperativas de trabalho, precarização do trabalho. ABSTRACT The present text presents some considerations concerning the revitalisation of the cooperatives work its relationship with the processes terceirização in Maranhão. It leaves of the analysis that strategy, used historically so much by the workers in the conflit to its material needs, as in the organization of its fights against the foundations of the capitalist exploration identified in its vertende with the processes emancipatórios, it is being restituation as flex mechanism and deregulation of the right tworks in the current phase of exits to the crisis-restructuring of the productive forces, in that the cooperativismo is placed diferent as strategy implemented so much by the workers, as for the capital. Key-words: Terceirização, work cooperatives, needs work. 1 INTRODUÇÃO O movimento cooperativista aparece no cenário mundial no século XIX na Inglaterra, pela iniciativa de vinte e oito tecelões, como uma estratégia dos trabalhadores não somente à crise de emprego da época, advinda dentre outras causas, à introdução das máquinas a vapor na produção, mas como uma alternativa na luta contra a exploração do homem pelo homem, nos marcos da sociedade capitalista. No entanto, nas últimas décadas do século XX, vem se apresentando sob outras bases, reversa à sua constituição histórica, respondendo aos interesses da acumulação capitalista, expressadamente na implementação dos processos de terceirização através das cooperativas de trabalho, que tem se apresentado dentre outras formas como mobilizadoras de mão-de-obra. * Estudante de Graduação em Serviço Social. Orientadora Profª-Drª Marina Maciel Abreu.

2 Além disso, as cooperativas de trabalho têm sido forjadas por indivíduos com o objetivo de fugir das contribuições fiscais, pois, estas possuem por lei tratamento diferenciado, na comparação com uma empresa mercantil. No entanto, cooperativas também se apresentam como uma alternativa ao desemprego e como estratégia dos trabalhadores no atendimento de suas necessidades reais, podendo se colocar na condição de uma alternativa contestatória do atual regime, vinculada ao projeto de emancipação da humanidade. 2 TERCEIRIZAÇÃO E REATUALIZAÇÃO DAS COOPERATIVAS DE TRABALHO NO BRASIL NOS ANOS NOVENTA (SÉCULO XX) A terceirização, processo que vem sendo amplamente adotado no Brasil e no mundo, notadamente por grandes e médias empresas privadas, mas que também se estende aos serviços públicos, é um tipo de organização do trabalho que surgiu desde o aparecimento das grandes fábricas nas sociedades pré-capitalistas de organização da produção sob diferentes formas: trabalho a domicílio, redes de subcontratação, trabalho autônomo, etc. Esse tipo de gestão do trabalho nunca deixou de existir, ao contrário, desde a década de setenta do século (XX) com as transformações em torno da organização da produção que há sua intensificação e generalização, tornando-se uma prática justificada pelas empresas como parte do processo de descentralização produtiva na busca de maior eficiência, qualidade e competitividade. Esse trinômio, no plano mais geral, retrata uma modalidade de terceirização, presente mais especificamente nos países centrais, onde os ganhos de produtividade se estabeleceram rapidamente a partir dos determinantes organizacionais e tecnológicos, diferentemente do perfil assumido pelas empresas brasileiras, que além de priorizar pela manutenção da heterogeneidade tecnológica mesclando padrões produtivos das segundas e terceira revoluções, tendeu a se adaptar de modo passivo às particularidades da exploração da força de trabalho. Como explicita Abreu (2003, p. 8): A terceirização engendrada a partir dos parâmetros da acumulação produtiva flexível no Brasil será centrada menos em inovações tecnológicas e mais na redução de custos através da exploração da força de trabalho e na quebra material de sua constituição como força antagônica à ordem do capital.

3 É chamada terceirização a brasileira, do posicionamento do ganha-perde, em que se objetiva lucro em curto prazo a redução de custos se faz com a redução e a exploração da mão-de-obra. (FARIAS, 1994, p. 43). Ou ainda, como definiu o Dieesse (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos): É a terceirização do tipo predatória, padrão predominante no país, caracterizada pela redução de custos através da exploração de relações precárias de trabalho. Essa terceirização recorre a todas as principais formas de trabalho precário: a) subcontratação de mão-de-obra; b) contrato temporário; c) contratação de mão-deobra por empreiteiras; d) trabalho a domicílio; e) trabalho por tempo parcial; f) trabalho sem registro em carteira. (DIEESSE, 2003). Essas diversas formas de relações de trabalho têm proporcionado inúmeras implicações aos trabalhadores principalmente no que se refere ao aumento da jornada e de acidentes no trabalho. No ambiente das terceiras é possível verificar um alto grau de exploração através da intensidade do ritmo de trabalho e maior concentração de tarefas e responsabilidades. Há casos em que os funcionários das subcontratadas acabam assumindo funções dentro da empresa contratante, para as quais não foram contratados, sem qualquer correspondência em termos salariais ou de direitos. (DRUCK, 1999, p. 137). Os trabalhadores, na maioria das vezes, são levados a recorrem a horas extras e trabalho em fins de semana para cumprirem com a produção encomendada, exigidas geralmente em prazos muito curtos de entrega. O aumento da jornada de trabalho verificado nas empresas subcontratadas tem causado danos aos trabalhadores. De acordo com Blanco (1994, p. 76) exemplo disso: Está o exagero de toques por hora dos digitadores terceirizados da categoria bancária que chegam até 20.000 toques, quando a norma (NR-17) sobre saúde e condições de trabalho regulamenta o limite de 8.000 toques. Isso tem provocado um número fantástico de casos de tenossinovite, tendinite, e outras doenças ligadas ao grupo LER lesões por esforços repetitivos. Nesse caso, além da saúde do trabalhador está sendo afetada, há um outro agravante que deve ser observado em grande parte das subcontratadas: à ausência de convênio médico ou amparo (seguro de vida/ auxílio doença). Isso acontece, pois, elas geralmente são de menor porte e possuem menos recursos. Através de uma pesquisa realizada pelo sindicato dos metalúrgicos do ABC é possível observar numericamente algumas dessas modificações no ambiente das terceiras:

4 maiores jornadas (33%), menor segurança (42%), salários reduzidos em (92%) e perda de benefícios em (58%). (DRUCK, 1999, p. 148). Consoante a esse quadro, somam-se às perdas relacionadas a modificações dos níveis salariais e de postos de trabalho principalmente dos trabalhadores de altacategoria. Segundo Martins (1994, p. 20) Quem está perdendo mais emprego, quem está mais desempregado hoje é o pessoal de colarinho branco : engenheiros, chefes, gerentes. A terceirização propiciou ainda, o surgimento de um grande número de empresas em regime de autogestão, dentre elas estão as cooperativas, em especial as de trabalho, que apresentaram um grande salto quantitativo nos últimos anos segundo dados da OCB (Organização das Cooperativas do Brasil), passando de 529 cooperativas registradas em 1990, para 2.715 no ano de 2000. A cooperativa de trabalho é definida como uma empresa que organiza e presta serviços a seus associados no sentido de dar-lhes uma ocupação ou oportunidade de trabalho. (SCHNEIDER, 1999, p. 136) Ou ainda, é entendida conforme Araújo (2001, p. 5): Como uma entidade cujo quadro social é formado por trabalhadores de qualquer categoria profissional ou ofício, ou de diversas categorias, que, no intuito de auferir renda e obter melhores condições de trabalho, associam-se para colocar suas habilidades profissionais ou os produtos que coletivamente produzem à disposição do mercado. As cooperativas de trabalho surgiram no Brasil na década de trinta (século XX) com o propósito de reduzir os intermediários, mas não tiveram grande êxito e somente vão se proliferar no país em 1990. Um dos fatores dessa proliferação deve-se a expansão do desemprego no país no período citado, onde o cooperativismo se coloca dentre outras iniciativas como estratégia dos trabalhadores na superação de suas necessidades materiais. O desemprego esta intimamente ligado ao enxugamento e horizontalização das plantas fabris, bem como pela privatização de empresas estatais expulsaram um grande contingente de trabalhadores em todo Brasil. A exemplo, está o Maranhão, responsável pelas demissões de 1.700 bancários, 1.238 urbanitários, 2.508 servidores públicos e cerca de 600 trabalhadores das industrias e laticínios (BARBOSA, 2002, p. 87). Neste período, foram eliminados milhões de postos de trabalho industriais, mediante o fechamento de muitas empresas e compras de outras por multinacionais. Singer (2003, p. 13) explica em seus estudos, que parte desses trabalhadores são mantidos em ociosidade, sustentados pelo seguro-desemprego e o restante, é introduzido ou forçado a procurar a vida vendendo em algum mercado o fruto de seu

5 trabalho. Como individualmente é mais difícil enfrentar nesse mercado, os trabalhadores passam então a se unirem em empreendimentos coletivos no enfrentamento desse quadro. Outro aspecto, relevante no crescimento das cooperativas de trabalho deve-se a edição em 1994 da Lei n 8.949, de nove de dezembro, que definiu que o associado da cooperativa não tem vínculo empregatício nem com a cooperativa, nem com tomadora dos serviços. Acrescenta o parágrafo do art. 442 da Consolidação das Leis do trabalho (CLT): Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela. (Lei, 8949, art. 442) Segundo Singer (2004, p. 3) essa ementa tornou fácil e aparentemente seguro substituir os empregados duma empresa por sócios de um cooperativa contratada para exercutar os serviços antes prestados pelos primeiros. A criação dessa Lei acabou se tornando para o movimento cooperativista, de um lado, uma oportunidade de participação das cooperativas aos processos de licitação dos serviços públicos aos níveis: federal, estadual e municipal, como também na participação em oportunidades iguais ou até mais vantajosas na contratação dos seus serviços nos processos de terceirização por empresas privadas; e de outro, colocou o movimento em fogo cruzado, na medida em que propiciou o surgimento de cooperativas intermediadoras de mão-de-obra e também na expansão de empresas que se forjam sob a condição de cooperativas com um único objetivo: o de fugir das contribuições fiscais e trabalhistas, já que as cooperativas têm, por lei tratamento diferenciado, ou benefícios, na comparação com uma empresa mercantil. Pode-se visualizar ainda, que o processo de terceirização via cooperativas, está ocorrendo demasiadamente nos serviços públicos, o que segundo Faria (2001, p. 9) se configura como fraude à disciplina constitucional para o provimento de cargos na administração pública, assentada na livre acessibilidade e na seleção mediante concurso. A contratação de cooperativas por órgãos públicos deve obedecer algumas limitações, restritas as atividades meio, e deve possui caráter exemplificativo dos serviços que a administração pública deve transferir a terceiros. Poderíamos pensar que, o trabalhador que está na condição de cooperado possui vantagens, já que o cooperado tem o direito ao rateamento das sobras da cooperativa, ao princípio da singularidade do voto, a regra da soberania assemblear e a participação das quotas partes, que consubstanciam o papel de dono da cooperativa. No entanto, o que verificamos é que, este não é consciente da sua condição, tornando-se assim um trabalhador altamente explorado se comparado a trabalhadores de empresas mercantis, pois, estes possuem direitos que acabam por compensar a baixa remuneração.

6 Isso pelos seguintes motivos: o cooperado possui diferenças em relação ao trabalhador assalariado registrado, não sendo assegurado a ele: descanso semanal remunerado, férias, INSS pago pelo empregador, FGTS, 13 salário, licença-maternidade (120 dias) e licença-paternidade (5 dias). No entanto, mesmo que a cooperativa não garanta todos os direitos trabalhistas contidas na CLT, ela deve oferecer condições, serviços e benefícios para que o cooperado tenha um ganho individual que compense todos os direitos trabalhistas (incluídos nos encargos sociais que seriam devidos se ele ostentasse a condição de empregado). (SINGER, 2004, p. 3) 3 CONCLUSÃO As experiências cooperativistas do ramo de trabalho que estão sendo reatualizadas como parte das estratégias de flexibilização das relações de trabalho via terceirização, não só precariza as condições de trabalho dos associados que nela se inserem, como inflexiona o cooperativismo em seu sentido histórico enquanto um movimento contestador ao capitalismo que surge no seio da luta e resistência dos trabalhadores na Inglaterra. A formação das cooperativas de trabalho que estão em conformidade com os interesses do capital, devem ser questionadas e banidas, pois elas são utilizadas como subterfúgio de assalariar trabalhadores sem assina-lhes a carteira de trabalho e como fuga do pagamento dos direitos trabalhistas conquistados historicamente na Constituição Federal de 1988. De outro modo, as cooperativas de trabalho se colocam também como um valioso instrumento de organização e produção dos trabalhadores marginalizados sem chance de obter emprego ou dos que estão em via de demissão que utilizam o cooperativismo para recuperação econômico-financeira de empresas capitalistas falidas, ou que estão em processo falimentar. Dessa forma, as cooperativas de trabalho reaparecem no quadro brasileiro tanto como uma estratégia útil ao livre mercado, como também por trabalhadores que se unem em laços de solidariedade mobilizados não somente na construção de respostas emergenciais, mas pela busca de uma alternativa mais duradoura e consistente de garantia condições de vida satisfatórios ao pleno desenvolvimento de vastos seguimentos da classe trabalhadora.

7 REFERÊNCIAS ARAUJO, Adilson Tadeu de. Cooperativismo de Trabalho: módulo 9. Brasília: CONFEBRAS, 2001. ABREU, Marina Maciel. A constituição da solidariedade e o significado histórico da reatualização da filantropia e do cooperativismo. (Projeto de pesquisa), São Luís: UFMA, 2003. BARBOSA, Z. M. Maranhão, Brasil: lutas de classe e reestruturação produtiva, em uma nova rodada de transnacionalização do capitalismo, Tese de doutorado apresentada a Pontifica Universidade Católica, São Paulo, 2002. BLANCO, M. O processo de terceirização nos bancos. In: MARTINS, H. de S., RAMALHO, J.S (orgs). Terceirização: diversidade e negociação no mundo do trabalho. São Paulo: Hucitec, Cedi/Nets, 1994. p. 76-84. DAL RI, Neusa Maria. Economia solidária: o desafio da democratização das relações de trabalho. São Paulo: Arte & Ciência, [s.d]. DRUCK, Maria da Graça. Terceirização: (des)fordizando a fábrica. São Paulo: Boitempo, 1999. DIEESE. Os trabalhadores frente à terceirização, Pesquisa Dieese, n 7, São Paulo, 1993. FARIA, Flávio Freitas. Terceirização no serviço público e cooperativas de trabalho. Apostila da Administração pública. Brasília 2001. FARIAS, A. Terceirização: um desafio para o movimento sindical. In: MARTINS, H. de S., RAMALHO, J.S (orgs). Terceirização: diversidade e negociação no mundo do trabalho. São Paulo: Hucitec, Cedi/Nets, 1994. p. 41-61. LEGISLAÇÃO COOPERATIVISTA. Resoluções do Conselho Nacional de Cooperativismo. 5 ed., 1996. MARTINS, H. de S., RAMALHO, J.S (orgs). Terceirização: diversidade e negociação no mundo do trabalho. São Paulo: Hucitec, Cedi/Nets, 1994. SINGER, Paul. Globalização e desemprego: diagnósticos e alternativas. 6 ed. São Paulo: Contexto, 2003.. Em defesa dos direitos dos trabalhadores. Brasília: Ministério do Trabalho e Emprego. Secretária de Economia Solidária., 2004. SCHNEIDER, J, O. Desafios e perspectivas das cooperativas de trabalho. In: DAL RI, Neusa Maria(org). Economia Solidária: o desafio da democratização das relações de trabalho _ São Paulo: Arte & Ciência, 1999. p. 133-149.