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Transcrição:

PUBVET, Publicações em Medicina Veterinária e Zootecnia. Disponível em: <http://www.pubvet.com.br/texto.php?id=256>. Resistência de microrganismos patógenos (Clostridium, Salmonela, e Listeria) em embutidos crus e cozidos e carnes armazenadas em embalagem com atmosfera modificada. Thiago Moreira dos Santos Médico Veterinário, M.Sc. em Medicina Veterinária. Escola Agrotécnica Federal de Salinas, Fazenda Varginha km2, rodovia Salinas/Taiobeiras. cep 39560-000. Salinas-MG RESUMO A conservação de alimentos é baseada em métodos combinados, que podem ser usados para melhorar a qualidade de produtos convencionais ou desenvolver novos produtos. Essa conservação depende muito de fatores extrínsecos e intrínsecos relacionados à carne, determinando sua qualidade. Sabe-se que a que a contaminação microbiológica em carnes é determinada por vários fatores antes, durante e pós abate e sua composição química, com pouca quantidade de carboidratos. Nos embutidos a qualidade da matéria prima, a presença de microrganismos desejáveis (bactérias lácticas), valor do ph e concentrações ideais de sal e nitrito controlam o desenvolvimento microbiano. Aliado a essas características as embalagens possuem especial importância, como a de atmosfera modificada que apresenta efeito bacteriostático benéfico aos produtos acondicionados. Dentre os patógenos o

Clostridium botulinum possui capacidade de produção de toxinas, a Listeria monocytogenes depende de outros fatores (temperatura, o ph e tecido magro ou gordo) e a Salmonela tem crescimento limitado em atmosfera modificada. Pode-se concluir que a conservação das carnes e embutidos requer a combinação de vários fatores para que em conjunto garantam sua estabilidade microbiológica. Resistance of pathogens microorganisms (Clostridium, Salmonella, and Listeria) in raw and cooked sausage and meat stored in modified atmosphere package ABSTRACTS The conservation of foods is based on combined methods, which can be used to improve the quality of conventional or develop new products. This conservation depends of intrinsic and extrinsic factors related to meat, determining their quality. It is known that the microbiological contamination in meat is determined by several factors before, during and after slaughter and its chemical composition, with little amount of carbohydrates. In embedded the quality of raw material, the presence of desirable microorganism s (lactic acid bacteria), the ph ideal values and concentrations of salt and nitrite control microbial development. Allied to these features the packages have special importance, such as modified atmosphere that gives bacteriostatic effect benefit to the packaged products. Among the pathogens have the Clostridium botulinum toxin production capacity, the Listeria monocytogenes depends on other factors (temperature, ph and lean or fatty tissue) and Salmonella has limited growth in modified atmosphere. It was concluded that conservation of meat and sausage requires the combination of several factors that together will ensure its microbiological stability.

INTRODUÇÃO A boa conservação de um alimento é o resultado da otimização entre diferentes conceitos contraditórios difíceis de conciliar: duração, fatores científicos e tecnológicos, custos, qualidade do alimento, etc. A conservação consiste em manter durante o maior tempo possível o maior grau de qualidade de um alimento, através da diminuição ou supressão dos efeitos dos mais diversos mecanismos de alteração. Essa qualidade do alimento pode ser traduzida em qualidade higiênica, qualidade nutritiva e qualidade sensorial. A qualidade higiênica consiste em ser o alimento um produto inócuo para a saúde humana, sem riscos de qualquer origem. A qualidade nutritiva é a aptidão do alimento em nutrir a pessoa que o consome e, finalmente, a qualidade sensorial é aquela que satisfaz o consumidor em suas sensações gustativas, olfativas, táteis, visuais e auditivas. A conservação de alimentos é baseada em métodos combinados, que podem ser usados para melhorar a qualidade de produtos convencionais ou desenvolver novos produtos. Eles asseguram estabilidade e segurança, resultando em produtos que apresentam adequadas características sensoriais e nutritivas (Leistner, 1992). Sabe-se que essa conservação depende muito de fatores extrínsecos e intrínsecos relacionados à carne, determinando sua qualidade. Como fatores extrínsecos podemos citar o controle da carga microbiana, a umidade, a temperatura e a atmosfera onde se encontra essa carne. Dentre os intrínsecos estão o ph, carboidratos (nutriente), atividade de água (aw) e o potencial de óxi-redução. Para auxiliar nessa conservação, vários métodos foram desenvolvidos nos últimos anos, inclusive produtos diferenciados para melhor duração. Dentre

esses métodos e produtos a atmosfera modificada e os embutidos são amplamente conhecidos e utilizados atualmente. CARNE FRESCA A carga microbiológica das carnes frescas é determinada por vários fatores, tais como espécie e saúde do animal vivo, condições antes e durante o abate, resfriamento da carcaça, condições sanitárias de manuseio, tipo de embalagem e condições de distribuição e estocagem. A deterioração aeróbica na carne fresca é governada pela disponibilidade de glicose à flora deteriorante. As pseudomonas e a maioria dos microrganismos irão utilizar de preferência a glicose em vez de outros substratos disponíveis na carne. Enquanto a glicose servir como principal fonte de energia nenhum odor de deterioração ou aroma desagradável será detectado. A concentração de glicose na carne é relativamente baixa (menos de 1 mg/g peso úmido) e à medida que a densidade de células bacterianas aumenta na superfície, a velocidade de difusão da glicose do interior da carne se torna muito baixa para suprir as exigências de desenvolvimento da flora. As bactérias começam, então, a degradar aminoácidos e, logo em seguida, ocorre a produção de amônia e odores de deterioração. Visto que a deterioração é função da atividade microbiana, o efeito das condições de estocagem no tempo de desenvolvimento da deterioração e na forma pelo qual ela se manifesta, deve ser entendido em termos da fisiologia das espécies que compõem a flora deteriorante. Embora uma vasta gama de microrganismos mesófilos e tolerantes ao frio seja contaminante da carne, aqueles de maior importância na deterioração da carne resfriada são os seguintes psicotróficos: Pseudomonas, Acinetobacter, Moraxella, Alteromonas

putregaciens, Brochothrix thermosphacta, Lactobacillus e certos gêneros da família Enterobacteriaceae. EMBUTIDOS CÁRNEOS Os embutidos cárneos podem ser classificados em dois tipos: os crus e os cozidos. Os crus são aqueles embutidos que não sofrem tratamento térmico como método de conservação mas, geralmente, sofrem um tratamento por agentes de cura (sal, nitrato e nitrito) ou fermentativo (por bactérias ácido lácticas). Exemplos de embutidos crus estão a lingüiça e o salaminho. Já os cozidos sofrem um tratamento térmico como processo de conservação, sendo o caso das salsichas e mortadelas por exemplo. Para o controle microbiológico dos embutidos vários fatores atuam junto para se combinarem e prevenirem o crescimento microbiano, incluindo: a concentração da salmoura; o ph do produto; o nitrito adicionado ou residual; a severidade do tratamento pelo calor; o número de esporos no inóculo; a temperatura de estocagem; a natureza da flora competitiva; a disponibilidade de ferro (algumas vezes refletido pelo tipo de carne no produto) e outros aditivos (ascorbato/isoascorbato, fosfato, nitrato) (Pardi, 1993). O controle do crescimento do Clostridium botulinum pode ser obtido por muitas combinações diferentes de ph, sal e nitrito, combinados em diferentes processos e condições de estocagem. O efeito do nitrito é conhecidamente bacteriostático, age muito bem sobre o Clostridium botulinum e é eficaz contra Staphylococcus aureus em concentrações elevadas e ph baixo. Ele é eficaz contra outros clostrídios, incluindo o Clostridium sporogenes e Clostridium perfringens. Contra as Enterobactérias é geralmente ineficaz, incluindo aí a Salmonella (Pardi, 1993).

Outro processo de controle microbiano observado em embutidos é realizado pela ação das bactérias ácido lácticas, através da produção de ácido acético, ácido láctico e outros. Seus efeitos antimicrobianos devem-se à diminuição do ph. A redução do ph, devido aos ácidos produzidos durante a fermentação realizada pelas bactérias lácticas, pode alcançar níveis em que bactérias putrefativas (Clostridium spp.e Pseudomonas spp.) e as patogênicas (Staphylococcus aureus, Listeria spp., Bacillus spp., etc.), além de alguns fungos e leveduras são inibidas ou destruídas (Holzapfel, 1995). As bactérias lácticas também produzem substâncias chamadas de bacteriocinas, que possuem ação antimicrobiana de natureza protéica. Seu espectro de ação pode ser variado, afetando grande número de microrganismos GRAM positivo, incluindo bactérias deteriorantes e/ou patogênicas (Giraffa, 1995). Já se conhece um grande número de cepas de bactérias lácticas, isoladas de alimentos, que se mostraram capazes de produzir bacteriocinas de amplo espectro de atividade antimicrobiana, incluindo Listeria monocytogenes e Clostridium spp. (Piard e Desmazeaud, 1992; Nettles e Barefoot, 1993). Confirmando essa capacidade antimicrobiana das bactérias lácticas, Prado (1996) demonstrou pela primeira vez a ocorrência de bactérias lácticas nas lingüiças artezanais produzidas em Santa Luzia-MG. Além disso, o autor comprovou uma atividade antagonista direta frente às cepas de Listeria monocytogenes, apresentando um espectro de ação variado e dependente da cepa de bactéria láctica utilizada. Da Silva (1996) fez um trabalho da ocorrência de Listeria spp. em embutidos cárneos artesanais comercializados em Contagem/MG e relatou a baixa incidência de Listeria monocytogenes nos embutidos analisados (lingüiça de carne de frango e de porco, e chouriço). No mesmo sentido, Carvalho (1996) comprovou uma atividade antagonista direta das bactérias lácticas, variável e quantificável, frente às cepas de

Staphylococcus aureus, embora não tenham mostrado atividade inibitória indireta frente a este mesmo microrganismo. Com relação aos embutidos cozidos (salsichas e mortadelas, p.ex.), vale ressaltar que estes além de possuírem em sua composição agentes de cura (como sal e nitrito) irão ainda passar por um processo de cozimento, que fará com que no interior do produto a temperatura atinja 72 a 75 O C. Esse procedimento possui uma vantagem por passar rapidamente pela temperatura crítica (30-45 O C), diminuindo-se a possibilidade de desenvolvimento bacteriano. O seu resfriamento é rápido (de 72 a 10 O C em 95min) não ocorrendo nenhum crescimento elevado de microrganismos (Pardi, 1996). Outro ponto a ser ressaltado é o controle da qualidade da matéria prima utilizada na elaboração desses produtos, evitando o emprego de produtos de baixa qualidade e comprometendo o seu produto final. No caso da Escherichia coli, por ela não ser controlada pelo uso dos sais de cura, torna-se importante o consumo desses produtos devidamente cozidos e/ou fritos na hora do consumo (no caso dos embutidos crus), pois esse microrganismo possui alta termosensibilidade (Jay, 2002). O mesmo autor descreve trabalhos citando a sensibilidade da Escherichia col O157:H7 à ação do ácido acético 10% a 30 O C, não observando crescimento sob tais condições. Lembrando que o mesmo ácido acético é produzido pelas bactérias ácido lácticas, além do acético, propiônico, etc. Os principais fatores apontados por Jay (2002) para a intoxicação alimentar por Escherichia col são os seguintes: 1. Refrigeração insuficiente; 2. Preparação de alimentos com excessiva antecipação ao serviço a ser realizado; 3. Costumes deficientes de higiene pessoal das pessoas afetadas; 4. Cozimento ou tratamento térmico insuficientes e

5. Manutenção do alimento em locais de aquecimento a temperaturas apropriadas para o crescimento das bactérias. EMBALAGENS E ACONDICIONAMENTOS PARA CARNE E DERIVADOS Nos últimos anos mudanças muito importantes tem sido feitas nos circuitos de distribuição da carne e produtos cárneos. Esses produtos sofreram uma evolução devido a fatores socioeconômicos, como a sua compra em grandes redes de supermercados em detrimento ao açougue da esquina, e também devido aos avanços conseguidos na conservação dos alimentos. O emprego combinado de um envase adequado, que proteja os alimentos das contaminações externas, e do frio, inibindo o desenvolvimento dos microrganismos, permite obter um aumento pronunciado da sua vida de prateleira (Bureau e Multon, 1995). As embalagens asseguram múltiplas funções, dentre as quais: A de proteção frente às contaminações microbianas e químicas; A de resistência mecânica frente aos impactos e pressões externas; Na fragmentação dos alimentos, a embalagem permite apresentar ao consumidor quantidades do produto correspondentes a suas diferentes necessidades; A de informação, pelas indicações expressas no rótulo das mesmas. O acondicionamento da carne se faz de três maneiras: 1. Carnes acondicionadas em carcaças e quartos Com película permeável ao oxigênio do ar, o que permite uma boa conservação da cor e a redução das perdas de massa por evaporação, mesmo que não garanta mais que um tempo de conservação limitado ao desenvolvimento de microrganismos.

2. Carnes em porções industriais, embaladas a vácuo Através de películas impermeáveis aos gases. 3. Carnes acondicionadas em porções para os consumidores Películas permeáveis ao oxigênio do ar (mantém a cor vermelho vivo mas com tempo de conservação limitado) e também em atmosfera modificada (CO 2 e O 2 para uma conservação mais prolongada). ATMOSFERA MODIFICADA Conceito Fala-se de atmosfera controlada quando a pressão parcial de cada gás me mantém em um dado valor durante todo o armazenamento, e de atmosfera modificada quando somente se fixa a composição inicial da atmosfera gasosa (Wolfe, 1980). Na prática, tanto a atmosfera controlada (AC) como a atmosfera modificada (AM) podem ser aplicadas a vários volumes de produtos, desde um saco plástico até uma câmara de estocagem. Entretanto, os verdadeiros sistemas de AC são geralmente limitados a grandes volumes, como veículos refrigerados, contentores e câmaras frigoríficas (Portal, 2008). Esses grandes volumes permitem o emprego de diferentes métodos para o controle ambiental. Para a grande maioria dos produtos frescos, a AC é tecnicamente superior à AM do ponto de vista do aumento da vida útil, porém, o custo elevado da AC tem propiciado o desenvolvimento do processo de AM. Princípios Os três gases comercialmente utilizados para embalagem em atmosfera modificada são: dióxido de carbono (CO 2 ), Nitrogênio (N 2 ) e Oxigênio (O 2 ). O CO 2 é solúvel, não só em água, mas também na gordura, sendo o principal

responsável pelo efeito bacteriostático da atmosfera modificada. Esse efeito bacteriostático é influenciado pela concentração de CO 2, a contagem microbiana inicial, a temperatura de estocagem e o produto a ser embalado (Reddy et al, 1992). De acordo com Daniels et al. (1985), várias teorias podem explicar as maneiras pelas quais o dióxido de carbono influencia nas células bacterianas, sendo os mais importantes: Alterações nas funções da membrana celular, incluindo efeitos em nutrientes; Inibição direta de enzimas ou diminuição das reações enzimáticas; Penetração nas membranas bacterianas, levando a mudanças no ph intracelular, e Alterações diretas nas propriedades físico-químicas das proteínas. O N 2 é usado para deslocar o oxigênio da embalagem, diminuindo o ranço oxidativo e inibindo o crescimento de microrganismos aeróbicos. O O 2 geralmente estimula o crescimento de bactérias aeróbias e pode inibir o crescimento das estritamente anaeróbias, apesar de apresentarem diferentes níveis de sensibilidade ao oxigênio (Farber, 1991). Resistência Clostridium botulinum Os alimentos que serão submetidos à ação da atmosfera modificada devem possuir uma ou mais barreiras antibotulínicas, segundo Jay (2002). Essas barreiras são: ter uma atividade de água <0,93; ter um ph < 4,6; conservados com NaCl ou NO 2 ; conter níveis elevados de não patogênicos (na carne crua, aves, etc.); mantidos em estado congelado e ter uma vida comercial definitiva (por ex. que não ultrapasse os 10 dias).

Vários experimentos demonstraram a capacidade de produção de toxinas do Clostridium botulinum em alimentos sob atmosfera modificada, com diferentes níveis de CO 2 e temperaturas de estocagem. O que diferia nos estudos era o tempo de detecção de toxinas nas diferentes temperaturas, aumentando à medida que a temperatura diminuía (Cai et. al., 1997 e García et. al., 1987; citados por Jay, 2002). Como pode-se ver somente a embalagem com atmosfera modificada não impede a formação de esporos pelo Clostridium botulinum, pois o CO 2 não terá qualquer efeito sobre o mesmo, já que é um microrganismo reconhecidamente anaeróbio. Resistência Listeria monocytogenes Pelo fato desta bactéria crescer em temperaturas muito baixas suscita preocupações sobre sua presença e possibilidade para crescer em alimentos com atmosfera modificada. No que diz respeito ao comportamento deste organismo na carne picada de vaca embalada a vácuo, demonstrou-se que os fatores decisivos são a temperatura de conservação, o ph e o tipo de tecido (magro ou gordo). Na carne gorda o microrganismo cresceu mais abundantemente que na magra; em ph mais elevado (6-6,1) cresceu mais rápido que em ph mais baixo (5,5-5,7) (Grau e Vanderline, 1990). Outros Microrganismos Em outro estudo mais recente, analisou-se o crescimento de Listeria monocytogenes e Yersinia enterocolitica em carne de aves cozida e sob atmosfera modificada com uma mistura de CO 2: N 2 de 44:56 e conservou-se a 3,5 O C, 6,5 e 10 O C durante um tempo de até 5 semanas. Ambos microrganismos cresceram em todas as condições da prova e a microbiota normal não influenciou no crescimento de ambos (Barakat e Harris, 1999; citado por Jay, 2002).

Já quando o embutido tipo Bolonia cozido foi embalado a vácuo, o crescimento de Yersinia enterocolitica e das salmonelas foi limitado, mas não o de Staphylococcus aureus. Clostridium perfringens também foi inibido, e a inibição do crescimento foi atribuida à microbiota normal (Nielsen e Zeuthen, 1985). CONSIDERAÇÕES FINAIS Como foi visto no trabalho vários fatores podem influenciar na qualidade microbiológica das carnes e seus produtos, como no caso dos embutidos aqui analisados. Qualidade da matéria prima, dos condimentos, da produção, dos equipamentos e utensílios, todos esses processos fazem parte de um controle sistematizado que garantem a qualidade final do seu produto. Além desses controles a indústria lança mão de alguns artifícios para a melhor conservação dos produtos cárneos e alimentícios em geral. As diferentes embalagens disponíveis hoje em dia proporcionam maior segurança ao produto e menor perecibilidade, garantindo uma maior vida de prateleira aos mesmos. Torna-se necessário também não esquecermos dos cuidados que antecedem o consumo desse alimento, como a correta manutenção e estocagem dos mesmos, temperatura adequada, higiene na manipulação, tratamento térmico adequado para os produtos crus e o adequado acondicionamento pósconsumo, evitando assim a proliferação de microrganismos indesejáveis nos alimentos, protegendo a saúde do consumidor. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARAKAT, R.K. and HARRIS, L.J. Growth of Listeria monocytogenes and Yersínia enterocolitica on cooked modified-atmosphere-packaged poultry in teh presence and absence of a naturally ocurring microbiota. Applied Environmental Microbiology. 65:342-345. 1999.

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