GARANTIA DO DIREITO A EDUCAÇÃO: REPRODUÇÃO E/OU EMANCIPAÇÃO SOCIAL?

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Transcrição:

GARANTIA DO DIREITO A EDUCAÇÃO: REPRODUÇÃO E/OU EMANCIPAÇÃO SOCIAL? Resumo PACIEVITCH, Thais 1 - PUCPR Grupo de Trabalho - Diversidade e Inclusão Agência Financiadora: Cnpq O artigo tem como tema a garantia do direito à educação com ênfase nas potencialidades e fragilidades da garantia desse direito como meio para a emancipação e/ou inclusão social. A teoria da reprodução, segundo a qual a educação reproduz as desigualdades sociais, tem potencial para contribuir para a reflexão sobre a garantia do direito à educação, na medida em que evidencia que a educação não é um agente neutro de emancipação por meio da qual é possível garantir a inclusão social. Nesse contexto, pretende-se responder a seguinte questão: Em que aspectos a garantia do direito à educação se constitui como um meio para a emancipação e/ou a inclusão social? Para responder a essa questão, tem-se como objetivos: analisar as possibilidades e limites da educação como meio de emancipação e/ou inclusão social na contemporaneidade. A revisão da literatura e a análise crítica da teoria fundamentam a análise de dados empíricos coletados por meio de entrevistas estruturadas realizadas com 51 professores, em pesquisa desenvolvida pelo Observatório de Violências nas Escolas da PUCPR. Como aporte teórico, serão utilizadas as reflexões de Bourdieu e Passeron (2010); Nogueira e Nogueira (2006); Boneti (2011) e Santos (1997, 2007). No discurso dos professores sobre a finalidade da educação escolar, predomina a visão emancipatória Moderna, que vincula a educação escolar à ideia de formação do cidadão para o trabalho ou para a continuidade dos estudos (progresso), a partir de uma visão eurocêntrica, portanto, colonialista. Assim, a reflexão permite inferir que a garantia do direito à educação não promove a emancipação social se estas (a educação e a emancipação) forem entendidas com base no referencial da Modernidade. A partir das contribuições do pensamento de Boaventura de Sousa Santos, conclui-se que por meio de outro tipo de racionalidade é possível a construção de educação que possibilite a emancipação social. Palavras-chave: Direito à educação. Teoria da reprodução. Emancipação social. Introdução A instituição escolar foi concebida no período medieval a aprimorada na Modernidade, quando se tornou determinante para as condições de inserção social, do mundo 1 Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Educação da PUCPR. E-mail: thais.pacievitch@gmail.com

19564 do trabalho e da garantia da cidadania. No contexto Moderno, a escola se configurou com uma instituição neutra, responsável por colocar ordem, enquadrar em regras, disciplinar e instruir, contribuindo para a construção de uma sociedade na qual a ordem e o progresso seriam a finalidade. Segundo os estudos de Lampert (2007) e Bauman (1998) a modernidade tem como pressupostos a solidez dos princípios, a racionalização, a universalização das ideias (de onde derivam as metanarrativas), a ordem e o progresso como objetivos, em suma, a crença em uma ordem imutável do mundo, e que as leis que regem a natureza humana seriam eternas. No entanto, os desafios na/da sociedade atual dão indícios que tais pressupostos não são suficientes para as demandas no/do contexto contemporâneo. Nesse contexto, emergem e ganham espaço as discussões de cunho pós-estruturalista (principalmente no campo da linguística), pós-moderna (na filosofia e artes), pós-colonialista (na sociologia) e pós-crítica (na educação, sobretudo no campo do currículo). Assim, nessa reflexão, pretende-se relacionar a teoria da reprodução (teoria que pode ser classificada como crítica) e o discurso sobre a garantia de direito à educação (discurso alinhado a teoria pós-crítica), buscando identificar e analisar as potencialidades e fragilidades da educação como meio de emancipação e/ou inclusão social. Para tanto, serão apresentados os principais pressupostos da teoria da reprodução, relacionando-os ao discurso sobre a garantia do direito à educação, e as diferentes concepções de emancipação e inclusão social, tanto as fundamentadas nos pressupostos da Modernidade (alinhadas a teoria crítica), quanto as fundamentadas em pressupostos da Pós-Modernidade (alinhadas as discussões pós-colonialistas e pós-críticas). A partir desse aporte teórico, serão analisados os discursos de professores sobre a finalidade da educação escolar. Tais dados foram obtidos por meio de entrevista estruturada realizada com 51 professores em 14 escolas públicas de Curitiba e região metropolitana, em pesquisa realizada pelos pesquisadores do Observatório de Violências nas Escolas da PUCPR. Considerações sobre a teoria da reprodução A teoria da reprodução foi publicada em 1970, no livro A reprodução: Elementos para uma teoria de ensino. O livro é resultado de pesquisas teóricas e empíricas desenvolvidas por Bourdieu e Passeron na década de 1960, na França. Segundo Silva (2007, p. 29):

19565 [...] a década de 60 foi uma década de grandes agitações e transformações. Os movimentos de independência das antigas colônias europeias; os protestos estudantis na França e em vários outros países; a continuação do movimento dos direitos civis nos Estados Unidos; os protestos contra a guerra do Vietnã; os movimentos de contracultura; o movimento feminista; a liberação sexual; as lutas contra a ditadura militar no Brasil: são apenas alguns dos importantes movimentos sociais e culturais que caracterizaram os anos 60. Foi nesse contexto - no ápice da luta de classes de origem crítica/marxista, e no nascimento de discussões atualmente consideradas pós-críticas - que Bourdieu e Passeron, por meio de suas pesquisas e reflexões, concluíram que a escola é um espaço de legitimação e reprodução de uma cultura arbitrária que contribui para manter e reforçar as desigualdades sociais. Considerando essa premissa, os autores discutiram alguns conceitos que fundamentam a teoria, tais como: campo, habitus, violência simbólica e os capitais (cultural, social, econômico e simbólico). O campo é entendido como um espaço social de relações objetivas ou ainda universo relativamente autônomo de relações específicas (BOURDIEU, 2010, p.64, 66). Segundo Nogueira (2006, p. 36), o conceito de campo é utilizado por Bourdieu, precisamente, para se referir a certos espaços de posições sociais nos quais determinado tipo de bem é produzido, consumido e classificado (NOGUEIRA, 2006, p.36). A instituição escolar, a partir desse conceito, é o campo no qual é produzido (ou reproduzido) o conhecimento (homogêneo). O conceito de habitus diz respeito a um conhecimento adquirido e também um haver, um capital, indica a disposição incorporada (BOURDIEU, 2010, p.61). Nas palavras de Silva (2007, p. 34), o conceito de habitus se refere as estruturas sociais e culturais que se tornam internalizadas. O habitus incorporado explica o fato de que os próprios agentes dominados contribuírem para a reprodução da ordem social. A violência simbólica é outro conceito fundamental para a compreensão da teoria da reprodução. Segundo Bourdieu e Passeron (2010, p. 25) violência simbólica faz referência a todo poder que chega a impor significações e a impô-las como legítimas, dissimulando as relações de força que estão na base de sua força, acrescentando sua própria força a essas relações (p.25). Nesse sentido, o currículo escolar, por exemplo, ao valorizar um tipo de conhecimento e cultura em detrimento de outros, e a ação pedagógica que dele decorre é, objetivamente, uma violência simbólica, posto que impõe, por meio de um poder arbitrário (da autoridade pedagógica), um determinado arbitrário cultural.

19566 Silva (2007, p. 34) comentando a obra de Bourdieu e Passeron, explica que são dois os processos que tornam possível que a classe dominante possa definir sua cultura como a cultura. Segundo ele: de um lado, a imposição e, de outro, a ocultação de que se trata de uma imposição, que aparece, então, como natural. È a esse duplo mecanismo que Bourdieu e Passeron chamam de dupla violência do processo de dominação cultural. Esse trabalho pedagógico, entendido como processo de dominação cultural, quando efetivo, produz uma formação durável, ou seja, um habitus como produto da interiorização dos princípios de um arbitrário cultural capaz de perpetuar-se após a cessação da ação pedagógica e por isso perpetuar nas práticas os princípios do arbitrário interiorizado (BOURDIEU E PASSERON, 2010, p.53). Segundo os autores: Numa formação social determinada, o trabalho pedagógico pelo qual se realiza a ação pedagógica dominante tem sempre uma função de manter a ordem, isto é, de reprodução da estrutura das relações de força entre os grupos ou as classes, na medida em que tende, seja pela inculcação, seja pela exclusão, a impor aos membros dos grupos ou classes dominados o reconhecimento da legitimidade da cultura dominante, e a lhes fazer interiorizar, numa medida variável, disciplinas e censuras que servem tanto melhor aos interesses, materiais ou simbólicos, dos grupos ou das classes dominantes, quanto mais tomam a forma da autodisciplina e da autocensura. (BOURDIEU E PASSERON, 2010, p.63) As diferenças entre dominados e os dominantes se evidenciam a partir do conceito de capital, que nada mais são do que recursos que rendem lucros, ou seja, recursos que dão retorno a quem os possui. Segundo Bourdieu e Passeron (2010), existem quatro tipos de capital: cultural, social, econômico e simbólico. O capital cultural diz respeito ao nível de conhecimento geral, as boas maneiras, aos diplomas, entre outros. A cultura valorizada como capital é a cultura erudita. O capital cultural pode ser objetivado (por meio da posse de objetos culturais valorizados, como livros e obras de arte); incorporado (postura, habilidades linguísticas, conhecimentos e preferências alinhados à cultura dominante, e adquiridos em forma de habitus); e institucionalizados (os títulos e certificações escolares). A origem social/familiar é determinante quando se trata de capital cultural (NOGUEIRA, 2006, p.41). Já o acesso à bens, produtos e serviços diz respeito ao capital econômico. Capital social é entendido como a rede de relações sociais influentes que um indivíduo mantém. São as amizades, os laços de parentesco e os contatos profissionais. Quanto maior a posição social das pessoas com as quais um indivíduo se relaciona, maior seu acesso aos capitais econômico, social, cultural e simbólico (NOGUEIRA, 2006, p.51).

19567 Boa reputação e prestigio em determinado campo ou mesmo na sociedade em geral significam que o indivíduo possui capital simbólico. Trata-se da percepção dos outros em relação ao indivíduo (NOGUEIRA, 2006, p.51). A partir da compreensão de tais conceitos que constituem a teoria da reprodução, Bourdieu e Passeron (2010) entendem o sistema escolar como um conjunto de mecanismos institucionais ou habituais pelos quais se assegura a transmissão entre as gerações da cultura herdada do passado. Cultura transmitida que: Corresponde aos interesses materiais e simbólicos de grupos ou classes diferentemente situadas nas relações de força sendo que as ações pedagógicas tendem sempre a reproduzir a estrutura da distribuição do capital cultural entre esses grupos ou classes, contribuindo para a reprodução da estrutura social (BOURDIEU, PASSERON, 2010, p. 219). Assim, segundo Bourdieu e Passeron (2010, p. 206), a função mais específica do sistema de educação (o ensino) esconde a sua função objetivo, isto é, oculta a verdade de sua relação com a estrutura das relações de classe. Concluem os autores que: [...] numa sociedade em que a obtenção dos privilégios sociais depende cada vez mais estreitamente da posse de títulos escolares, a escola tem apenas por função assegurar a sucessão discreta a direitos de burguesia que não poderiam mais se transmitir de uma maneira direta e declarada. Instrumento privilegiado da sociodiceia burguesa que confere aos privilegiados o privilégio supremo de não aparecer como privilegiados, ela consegue tanto mais facilmente convencer os deserdados que eles devem seu destino escolar e social à sua ausência de dons ou de méritos quanto em matéria de cultura a absoluta privação de posse exclui a consciência da privação de posse (BOURDIEU E PASSERON, 2010, p. 206). A partir da compreensão da teoria da reprodução, e da concordância com a conclusão dos autores de que a educação escolar legitima, reforça e aprofunda as desigualdades sociais, questina-se: Em que aspectos a garantia do direito à educação se constitui como um meio para a emancipação e/ou a inclusão social? Inclusão e emancipação social Os conceitos de inclusão e de emancipação social são essencialmente Modernos. O conceito de inclusão deriva do seu conceito antagônico, o de exclusão. O conceito de exclusão tem origem no positivismo, cujo método para a compreensão da realidade social privilegia o olhar dual e estático das relações sociais (BONETI, 2011, p. 91). Assim, conforme explica Boneti (2011, p. 91):

19568 Excluídas seriam as pessoas que estivessem fora do social, os leprosos, os marginais, os doentes mentais, etc. (como se estivessem realmente). Trata-se de uma visão funcionalista de caracterizar um contingente populacional que estaria fora, à margem da sociedade [...]. Como explica o autor, não se pode afirmar que a palavra inclusão se constitua de uma noção ou de um conceito. Trata-se de uma positivação em relação a uma problemática social, a da exclusão [...] (BONETI, 2011, P. 91). A ideia de inclusão considerada por Boneti apenas um discurso se fundamenta, portanto, no positivismo clássico, e destoa das discussões contemporâneas. Segundo Boneti (2011, p. 92): A utilização da expressão inclusão referindo-se a ações de promoção da igualdade social não se mostra afinada com a discussão atual em relação ao resgate das diferenças e do multiculturalismo. Ao se falar em inclusão pressupõe-se haver um projeto social acabado, um modo de ser e de agir determinado, cabendo às políticas públicas de inclusão social inserir neste modo de ser correto e acabado as pessoas que permanecem fora. A discussão em relação a inclusão no que diz respeito à escola é extensa. Não se trata somente da recente inclusão das pessoas com necessidades educativas especiais, mas dos milhões de alunos e alunas das classes populares que somente a partir da segunda metade da década de 1990 tiveram acesso à escola. As especificidades e características sócioeconomico-culturais dessa população até então excluída, não foram, e continuam não sendo consideradas. A essa população incluída Bourdieu denominou como os excluídos de dentro", em seu livro A miséria do Mundo. Nesse sentido, a garantia do direito à educação não possibilita a inclusão social, ao contrário, pode tornar-se mais uma forma de exclusão. O conceito de emancipação social possui uma raiz filosófica ampla, sendo a mais difundida a de origem Marxista, que relaciona a emancipação à ideia de liberdade (e essa, à ideia de autodeterminação) (BOTTOMORE, 1988, p. 123). Marx distingue emancipação política de emancipação humana, sendo a primeira a redução do homem, de um lado, a membro da sociedade burguesa, a indivíduo egoísta independente e, de outro, a cidadão do estado, à pessoa moral (2002, p. 42). Em relação à emancipação humana, Marx explica que: Somente quando o homem individual real recupera em si o cidadão abstrato e se converte, como homem individual, em ser genérico, em seu trabalho individual em suas relações individuais somente reconhecido e organizado suas forces propes como forças sociais e quando, portanto já não separa de si a força social sob forma de força política, somente então se processa a emancipação humana (MARX, 2002, p. 42).

19569 A definição de Marx aponta a um caráter individual e coletivo na emancipação humana, e requer a superação do sistema do capital. No entanto, no contexto atual, não há indicações de que o sistema capitalista será substituído. Segundo Santos: O problema é que a emancipação social é um conceito absolutamente central na modernidade ocidental, sobretudo porque esta tem sido organizada por meio de uma tensão entre regulação e emancipação social, entre ordem e progresso, entre uma sociedade com muitos problemas e a possibilidade de resolvê-los em outra melhor, que são as expectativas (SANTOS, 2007, p. 17). Essa tensão entre regulação e emancipação, ou experiências e expectativas, que mantinham certo equilíbrio na Modernidade, estão atualmente desfiguradas, invertidas, conforme explica Santos (2007, p. 18): vivemos em sociedades com uma dupla crise: crise de regulação e crise de emancipação. [...] as expectativas para a grande maioria da população mundial não são mais positivas que as experiências correntes; ao contrário, tornam-se mais negativas. Nesse contexto alguns autores não encontram mais sentido da ideia de emancipação social. A própria teoria da reprodução, embora se fundamente na teoria crítica, traz em seu bojo a ideia do determinismo, de imobilismo, posto que não indica um caminho alternativo. Assim, essa reflexão se coloca em um espaço entre teorias, no qual é possível considerar a teoria da reprodução como uma explicação coerente com a prática observada nas instituições de ensino, e, ao mesmo tempo, buscar nos autores mais contemporâneos (póscríticos, pós-colonialistas e mesmo pós-estruturalistas) elementos para caminhos alternativos ao status quo. Como explica Santos (2007, p. 19): Nossa situação é um tanto complexa: podemos afirmar que temos problemas modernos para os quais não temos soluções modernas. E isso dá ao nosso tempo o caráter de transição: temos de fazer um esforço muito insistente pela reinvenção da emancipação social. Complementa o autor: É preciso continuar com a ideia de emancipação social; no entanto, o problema é que não podemos continuar pensando-a em termos modernos, pois os instrumentos que regularam a discrepância entre reforma e revolução, entre experiências e expectativas, entre regulação e emancipação, essas formas modernas, estão hoje em crise. Entretanto, não está em crise a ideia de que necessitamos de uma sociedade melhor, de que necessitamos de uma sociedade mais justa. As promessas da modernidade - a liberdade, a igualdade e a solidariedade - continuam sendo uma aspiração para a população mundial (SANTOS, 2007, p. 18). É exatamente a partir do rompimento com a lógica da Modernidade - sem romper com algumas aspirações Modernas - que se pretende discutir as potencialidades e fragilidades da

19570 garantia do direito à educação como uma forma de contribuir para a reinvenção da emancipação social, como nos convida Boaventura de Sousa Santos. Efetividade da garantia do direito a educação na contemporaneidade Se a educação institucionalizada é um instrumento de reprodução das desigualdades sociais, é evidente que a garantia do direito à educação como ação isolada não contribui para a emancipação social. Radicalizando, garantir o direito à educação, considerando a teoria da reprodução como único parâmetro, pode até favorecer a violação de outros direitos fundamentais (dignidade, respeito, etc.). No entanto, essa reflexão em relação à garantia do direito à educação situa-se a partir de referenciais contemporâneos, fundamentados nas teorias pós-critica (do currículo); pós-colonialista (da sociedade), pós-moderna (da filosofia) e pósestruturalista (do discurso). Parte-se do pressuposto que a garantia do direito à educação se dá por meio do acesso, da permanência, e da qualidade social da educação pública e gratuita oferecida. Não de apenas um desses três itens, mas dos três em convergência, em uma instituição escolar na qual todos os sujeitos (professores, funcionários, alunos e pais) sejam igualmente considerados e tratados como sujeitos de direitos, e na qual as palavras de Santos (1997) sejam consideradas como um princípio: Temos o direito a sermos iguais quando a diferença nos inferioriza, temos o direito a sermos diferentes quando a igualdade nos descaracteriza. No entanto, para a efetivação da garantia do direito à educação nesses termos, é necessária a superação da lógica eurocêntrica instalada no período da Modernidade: As ciências sociais estão passando por uma crise, porque a meu ver estão constituídas pela modernidade ocidental, por esse contexto de tensão entre regulação e emancipação que deixou de fora as sociedades coloniais, nas quais essa tensão foi substituída pela "alternativa" entre a violência da coerção e a violência da assimilação. Algumas correntes das ciências sociais visaram, sobretudo, a regulação - os estrutural funcionalistas. Os outros, os marxistas, os críticos, centraram-se mais na emancipação, mas a ideia foi sempre uma visão eurocêntrica dessa tensão; uma visão, portanto, colonialista. (SANTOS, 2007, p. 19). Como complementa Santos (2007, p. 20), a compreensão do mundo é muito mais ampla que a compreensão ocidental do mundo. Nesse sentido, não é simplesmente de um conhecimento novo que necessitamos; o que necessitamos é de um novo modo de produção

19571 de conhecimento. Não necessitamos de alternativas, necessitamos é de um pensamento alternativo às alternativas (SANTOS, 2007, p. 20). A valorização da diversidade cultural é uma característica positiva da pósmodernidade e um exemplo da necessidade da superação do pensamento hegemônico, pois a diversidade do mundo é inesgotável, não há teoria geral que possa organizar toda essa realidade. A partir desse pensamento pouco ortodoxo, porém democrático, a opção por uma teoria geral é a negação de outras realidades. Nesse sentido, Santos (2007, p. 39) propõe que: Estamos em um processo de transição, e provavelmente o possível seja o que chamo um universalismo negativo: neste momento, neste trajeto, não necessitamos de uma teoria geral. Não é possível, e tampouco desejável, mas necessitamos de uma teoria sobre a impossibilidade de uma teoria geral. Estamos de acordo que ninguém tem a receita, ninguém tem a teoria. De concreto, urge a necessidade da reflexão em relação aos conceitos de igualdade e diferença, lembrando que o contrário à igualdade não é a diferença, e sim a desigualdade. Superar essa lógica pressupõe a luta contra a desigualdade, ou seja, a luta a favor da igualdade, sem promover homogeneização, ou seja, lutar concomitantemente pelo reconhecimento da diferença, como nos explica Santos (2007, p. 62): Necessitamos construir a emancipação a partir de uma nova relação entre o respeito da igualdade e o princípio do reconhecimento da diferença. Na modernidade ocidental, seja nas teorias funcionalistas conservadoras seja nas teorias críticas, até agora não tratamos isso de maneira adequada, porque - sobretudo na teoria crítica - toda a energia emancipatória teórica foi orientada pelo princípio da igualdade, não pelo princípio do reconhecimento das diferenças. Agora temos de tentar uma construção teórica em que as duas estejam presentes, e saber que uma luta pela igualdade tem de ser também uma luta pelo reconhecimento da diferença, porque o importante não é a homogeneização mas as diferenças iguais. No entanto, a ausência de uma teoria geral, de uma epistemologia que norteie a prática, já é, por si só, uma opção teórica. Ou seria esse um pensamento pautado em uma lógica linear? Segundo Santos (2007, p. 52), necessitamos de outro tipo de racionalidade, [...] um tipo de racionalidade mais ampla, precisamente para reinventar a teoria crítica de acordo com nossas necessidades hoje. A crise da instituição escolar e dos sistemas de ensino parece demonstrar o esgotamento do modelo social e educacional que foi instituído na Modernidade. Segundo Libâneo (1997, p. 131):

19572 A Pedagogia e toda a base do seu discurso teórico são fruto da modernidade, achando-se ligada a acontecimentos cruciais como a Reforma, o Iluminismo, a Revolução Francesa, a Industrialização e as ideias como a natureza humana universal, a autonomia do sujeito, a educabilidade humana, a emancipação humana pela razão. Assim, questiona-se: Que escola, fundamentada em qual pedagogia, enfim, qual educação contribuiria para a reinvenção da emancipação social? Em pesquisa realizada pelos pesquisadores do Observatório de Violências nas Escolas da PUCPR, 51 professores de 14 escolas de Educação Básica responderam a seguinte questão, por meio de entrevistas estruturadas: Na sua opinião, qual a finalidade da educação escolar? As respostas dos participantes foram analisadas considerando as seguintes categorias: Visão reprodutivista, Visão emancipatória Moderna, Visão emancipatória contemporânea. Das respostas dos participantes alinhadas a visão reprodutivista, destacam-se aquelas que melhor ilustram a categoria: 25). Transmitir o conhecimento formal e técnico (P 10). Dar formação que torne o aluno apto a dar sequência aos seus estudos (P 17). Transmitir conhecimento (P 22). Educação escolar é ter o conteúdo para preparar para a vida (P23). A educação escolar é para que os conhecimentos sintetizados sejam repassados (P A visão reprodutivista vincula a educação escolar à transmissão de conteúdos, considerando que dessa forma seriam criadas condições para a emancipação dos sujeitos. O papel da escola na manutenção do status quo, como indicado por Bourdieu e Passeron (2010) é legitimada nesses discursos. A Visão Emancipatória Moderna é predominante nos discursos dos professores. É recorrente o uso do termo cidadão entre esses discursos, conforme ilustram as falas dos sujeitos: Formar cidadãos críticos (P 04, 09). Formar bons cidadãos, que contribuam para o crescimento do país (P 18). Formar cidadãos, para ter um trabalho (P 32). Estudo, que é tudo, é necessário para ter um bom emprego (P 33). Preparar o aluno para o mercado de trabalho e para a vida social (P 47). A visão emancipatória Moderna vincula a educação escolar à ideia de formação do cidadão para o trabalho ou para a continuidade dos estudos (progresso). O termo cidadão é

19573 recorrente no discurso, mas a formação para a cidadania indicada se pauta em princípios modernos, da igualdade, não no reconhecimento das diferenças. Mesmo a ideia de formação do cidadão crítico se dá a partir da transmissão do conhecimento historicamente construído mais valorizado, portanto, de um conhecimento hegemônico, que não considera ou reconhece a diversidade. Nas palavras de Santos (2007, p. 19), trata-se de uma visão eurocêntrica [...], portanto, colonialista (SANTOS, 2007, p. 19). Nenhum dos discursos dos sujeitos da pesquisa se alinhou a visão emancipatória contemporânea. A partir dessa visão, a finalidade da educação escolar se vincula a promoção do diálogo e das trocas interculturais, que se pautem, como explica Santos (2007, p. 62), na relação entre o respeito da igualdade e o princípio do reconhecimento da diferença. Considerações finais A retomada dos principais conceitos elaborados por Bourdieu e Passeron na teoria da reprodução e a tentativa de relacionar as afirmações dessa teoria ao discurso em relação à garantia dos direito à educação e aos conceitos de inclusão e emancipação social dá subsídios para algumas inferências. A consciência de que a instituição escolar, no formato no qual ela foi instituída e no qual permanece pode ser um instrumento por meio do qual as desigualdades sociais podem ser reproduzidas e até mesmo reforçadas e legitimadas, é fundamental para que os educadores atuem de forma a promover uma educação que efetivamente garanta os direitos de crianças e adolescentes. A reflexão em relação ao termo inclusão - e sua inconsistência teórica e ao conceito Moderno de emancipação social, remetem à busca pela superação desses termos e de seus significados. O referencial pós-colonialista pode contribuir para essa superação. No entanto, a falta de consciência e a ausência dessas reflexões são percebidas nos discursos dos professores em relação a finalidade da educação escolar, a medida em que demonstram o alinhamento as visões reprodutivista e de uma emancipação pautada nos princípios da Modernidade. A reflexão permite inferir que a garantia do direito à educação não garante a emancipação social se estas (a educação e a emancipação) forem entendidas com base no referencial da Modernidade. A partir das contribuições do pensamento de Boaventura de

19574 Sousa Santos, conclui-se que por meio de outro tipo de racionalidade é possível a construção de uma educação que se constitua como um meio para a emancipação social (reinventada). REFERÊNCIAS BAUMAN, Zigmund. O mal estar da pós-modernidade. Tradução: Mauro Gama e Cláudia Martinelli Gama. Rio de Janeiro: Zorge Zahar ed. 1998. BONETI, Lindomar Wessler. Políticas públicas por dentro. 3. ed., rev. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 2011. BOTTOMORE, T. B. (Ed.). Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1988. BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução: Elementos para uma teoria do sistema de ensino. 4ª ed. Petrópolis: Vozes, 2011. LIBANEO, José Carlos. Pedagogia e modernidade: presente e futuro da escola. In: GHIRALDELLI JÚNIOR, Paulo. Infância, escola e modernidade. São Paulo: Cortez, 1997. LAMPERT, Ernani. Pós-Modernidade e a Educação. Linhas, Florianópolis, v. 8, n. 2, p. 04, 32, jul. / dez. 2007. MARX, Karl. A questão judaica. 4. ed. São Paulo: Centauro, 2002. NOGUEIRA, Maria Alice; NOGUEIRA, Claudio M. Martins. Bourdieu e a Educação. Belo Horizonte: Autentica, 2006. SANTOS, Boventura de Souza. Por uma concepção multicultural de direitos humanos. Lua Nova Revista de Cultura e Política. nº 39, p. 105 124, 1997. SANTOS, Boventura de Souza. Renovar a teoria crítica e reinventar a emancipação social. São Paulo: Boitempo, 2007. SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos de Identidade: uma introdução as teorias de currículo. 2 ed. Belo Horizonte: Autentica, 2007.