APROPRIAÇÃO DAS TEORIAS DE VYGOTSKY POR PROFESSORES DA REDE PÚBLICA DE ENSINO DE CURITIBA



Documentos relacionados
LEV VIGOTSKY 1. VIDA E OBRA

Lev Semenovich Vygotsky, nasce em 17 de novembro de 1896, na cidade de Orsha, em Bielarus. Morre em 11 de junho de 1934.

TEORIA DA MEDIAÇÃO DE LEV VYGOTSKY

Katia Luciana Sales Ribeiro Keila de Souza Almeida José Nailton Silveira de Pinho. Resenha: Marx (Um Toque de Clássicos)

OS CONHECIMENTOS DE ACADÊMICOS DE EDUCAÇÃO FÍSICA E SUA IMPLICAÇÃO PARA A PRÁTICA DOCENTE

PROJETO DE LEITURA E ESCRITA LEITURA NA PONTA DA LÍNGUA E ESCRITA NA PONTA DO LÁPIS

PRÓ-MATATEMÁTICA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

12 Teoria de Vigotsky - Conteúdo

Profa. Ma. Adriana Rosa

PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: ELABORAÇÃO E UTILIZAÇÃO DE PROJETOS PEDAGÓGICOS NO PROCESSO DE ENSINO APRENDIZAGEM

O olhar do professor das séries iniciais sobre o trabalho com situações problemas em sala de aula

A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO FISICA NAS SÉRIES INICIAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA LEILA REGINA VALOIS MOREIRA

QUE ESCOLA QUEREMOS PARA AS NOSSAS CRIANÇAS?

Instituto Educacional Santa Catarina. Faculdade Jangada. Atenas Cursos

USANDO A REDE SOCIAL (FACEBOOK) COMO FERRAMENTA DE APRENDIZAGEM

TEORIAS DA APRENDIZAGEM: DA TEORIA À PRÁTICA

OS DIREITOS HUMANOS NA FORMAÇÃO DOS PROFESSORES

Pesquisa com Professores de Escolas e com Alunos da Graduação em Matemática

24 O uso dos manuais de Matemática pelos alunos de 9.º ano

A DANÇA E O DEFICIENTE INTELECTUAL (D.I): UMA PRÁTICA PEDAGÓGICA À INCLUSÃO

tido, articula a Cartografia, entendida como linguagem, com outra linguagem, a literatura infantil, que, sem dúvida, auxiliará as crianças a lerem e

O professor que ensina matemática no 5º ano do Ensino Fundamental e a organização do ensino

A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR DE PEDAGOGIA DA FESURV - UNIVERSIDADE DE RIO VERDE

A CRIANÇA BILÍNGUE: INFLUÊNCIAS DO BILINGUISMO SOBRE O DESENVOLVIMENTO INFANTIL ESCOLA PAN AMERICANA DA BAHIA. Profa. Conchita Kennedy Dantas

Colégio La Salle São João. Professora Kelen Costa Educação Infantil. Educação Infantil- Brincar também é Educar

Estado da Arte: Diálogos entre a Educação Física e a Psicologia

A PRÁTICA DE MONITORIA PARA PROFESSORES EM FORMAÇÃO INICIAL DE LÍNGUA INGLESA DO PIBID

DICA PEDAGÓGICA EDUCAÇÃO INFANTIL

EDUCAÇÃO E PROGRESSO: A EVOLUÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO DA ESCOLA ESTADUAL ELOY PEREIRA NAS COMEMORAÇÕES DO SEU JUBILEU

Elaboração de Projetos

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE CIÊNCIAS SÓCIO-ECONÔMICAS E HUMANAS DE ANÁPOLIS

A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO COMO PRINCÍPIO EDUCATIVO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE - UNICENTRO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÍDIAS NA EDUCAÇÃO MARIA MAZUR

A IMPORTÂNCIA DAS DISCIPLINAS DE MATEMÁTICA E FÍSICA NO ENEM: PERCEPÇÃO DOS ALUNOS DO CURSO PRÉ- UNIVERSITÁRIO DA UFPB LITORAL NORTE

A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA NA EDUCAÇÃO BIOLÓGICA: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

5 Considerações finais

MARINHA DO BRASIL CAPITANIA DOS PORTOS DO RN O NOSSO LIXO, O QUE FAZER?

A Interdisciplinaridade como Metodologia de Ensino INTRODUÇÃO

O DESENVOLVIMENTO E O APRENDIZADO EM VIGOTSKY

Projeto Pedagógico Institucional PPI FESPSP FUNDAÇÃO ESCOLA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA DE SÃO PAULO PROJETO PEDAGÓGICO INSTITUCIONAL PPI

CURSOS PRECISAM PREPARAR PARA A DOCÊNCIA

GESTÃO DO CONHECIMENTO NA INDÚSTRIA QUÍMICA

CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS DE LEV VYGOTSKY ( ) 1

ATUAÇÃO DO PIBID NA ESCOLA: (RE) DESCOBRINDO AS PRÁTICAS LÚDICAS E INTERDISCIPLINARES NO ENSINO FUNDAMENTAL

APRENDER A LER PROBLEMAS EM MATEMÁTICA

V Seminário de Metodologia de Ensino de Educação Física da FEUSP Relato de Experiência INSERINDO A EDUCAÇÃO INFANTIL NO CONTEXTO COPA DO MUNDO.

A EXPLORAÇÃO DE SITUAÇÕES -PROBLEMA NA INTRODUÇÃO DO ESTUDO DE FRAÇÕES. GT 01 - Educação Matemática nos Anos Iniciais e Ensino Fundamental

Como mediador o educador da primeira infância tem nas suas ações o motivador de sua conduta, para tanto ele deve:

CONSIDERAÇÕES SOBRE USO DO SOFTWARE EDUCACIONAL FALANDO SOBRE... HISTÓRIA DO BRASIL EM AULA MINISTRADA EM LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA

Roteiro VcPodMais#005

PERCEPÇÃO AMBIENTAL DE PROFESSORES DE GEOGRAFIA DO ENSINO FUNDAMENTAL

METODOLOGIA DO ENSINO DA ARTE. Número de aulas semanais 4ª 2. Apresentação da Disciplina

Áudio GUIA DO PROFESSOR. Idéias evolucionistas e evolução biológica

O BRINCAR E SUA FUNÇÃO NA INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA EM INSTITUIÇÕES ESCOLARES: O QUE DIZEM OS PSICOPEDAGOGOS? DIOGO SÁ DAS NEVES

Educação a distância: desafios e descobertas

SAÚDE E EDUCAÇÃO INFANTIL Uma análise sobre as práticas pedagógicas nas escolas.

AS NOVAS DIRETRIZES PARA O ENSINO MÉDIO E SUA RELAÇÃO COM O CURRÍCULO E COM O ENEM

AS CONTRIBUIÇÕES DAS VÍDEO AULAS NA FORMAÇÃO DO EDUCANDO.

O trabalho voluntário é uma atitude, e esta, numa visão transdisciplinar é:

FORMAÇÃO DOCENTE: ASPECTOS PESSOAIS, PROFISSIONAIS E INSTITUCIONAIS

ALFABETIZAÇÃO DE ESTUDANTES SURDOS: UMA ANÁLISE DE ATIVIDADES DO ENSINO REGULAR

A formação do licenciado em matemática

O PROCESSO DE INCLUSÃO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA VISUAL: UM ESTUDO DE METODOLOGIAS FACILITADORAS PARA O PROCESSO DE ENSINO DE QUÍMICA

Rousseau e educação: fundamentos educacionais infantil.

O CIBERESPAÇO NO ENSINO E GEOGRAFIA: A PROBLEMÁTICA DO USO/DESUSO DO GOOGLE EARTH EM ESCOLAS PÚBLICAS DE DIAMANTINA

A PRÁTICA DA CRIAÇÃO E A APRECIAÇÃO MUSICAL COM ADULTOS: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA. Bernadete Zagonel

QUADRO DE EQUIVALENTES, CONTIDAS E SUBSTITUTAS DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO

Mudança gera transformação? Mudar equivale a transformar?

EDUCAÇÃO E CIDADANIA: OFICINAS DE DIREITOS HUMANOS COM CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA ESCOLA

A IMPORTÂNCIA DO LÚDICO NA APRENDIZAGEM DOS ALUNOS NOS ANOS INICIAIS RESUMO

Principais Teorias da Aprendizagem

SIGNIFICADOS ATRIBUÍDOS ÀS AÇÕES DE FORMAÇÃO CONTINUADA DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DO RECIFE/PE

CURSO: LICENCIATURA DA MATEMÁTICA DISCIPLINA: PRÁTICA DE ENSINO 4

AS CONTRIBUIÇÕES DOS ENCARTES DE PREÇOS NA FORMAÇÃO DO ALUNO.

Ana Paula de Souza João Paulo Gonzaga Kelly Cristina Miquelino Jugeick Educação Matemática

Principais discussões sobre o ensino-aprendizagem de matemática na educação infantil

SEDUC SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DE MATO GROSSO ESCOLA ESTADUAL DOMINGOS BRIANTE ANA GREICY GIL ALFEN A LUDICIDADE EM SALA DE AULA

Metodologia e Prática de Ensino de Ciências Sociais

UM PRODUTO EDUCATIVO PARA FAZER EDUCAÇÃO AMBIENTAL

O USO DO TANGRAM EM SALA DE AULA: DA EDUCAÇÃO INFANTIL AO ENSINO MÉDIO

PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO

PRÊMIO AMAVI DE EDUCAÇÃO 2011: QUALIDADE EM GESTÃO E QUALIDADE NA PRÁTICA DA DOCÊNCIA. PROFESSORA: GILMARA NUSS

Jardim Helena São Miguel Paulista PROJETO DE REGÊNCIA EM TURMAS DO ENSINO MÉDIO RECUPERAÇÃO PARALELA.

UMA EXPERIÊNCIA EM ALFABETIZAÇÃO POR MEIO DO PIBID

Por uma pedagogia da juventude

GUIA DE IMPLEMENTAÇÃO DO CURRICULO ANO 2 - APROFUNDAMENTO

José Fernandes de Lima Membro da Câmara de Educação Básica do CNE

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DOS PROFESSORES DE MATEMÁTICA DO ENSINO MÉDIO DA ESCOLA ORLANDO VENÂNCIO DOS SANTOS DO MUNICÍPIO DE CUITÉ-PB

UMA PROPOSTA DE LETRAMENTO COM FOCO NA MODALIDADE ORAL DE LINGUAGEM EM SUJEITOS COM SÍNDROME DE DOWN

OBJETIVO Reestruturação de dois laboratórios interdisciplinares de formação de educadores

A PRODUÇÃO DE VÍDEOS COMO RECURSO METODOLÓGICO INTERDISCIPLINAR

Prof. Dr. Guanis de Barros Vilela Junior

Elvira Cristina de Azevedo Souza Lima' A Utilização do Jogo na Pré-Escola

determinam o comportamento e as consequências do comportamento no contexto de interação, ou seja, na relação funcional dos comportamentos.

ESPAÇO INCLUSIVO Coordenação Geral Profa. Dra. Roberta Puccetti Coordenação Do Projeto Profa. Espa. Susy Mary Vieira Ferraz RESUMO

O ENSINO DAS FUNÇÕES ATRAVÉS DO JOGO BINGO DE FUNÇÕES

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA

As Tecnologias de Informação e Comunicação para Ensinar na Era do Conhecimento

MODELAGEM MATEMÁTICA: PRINCIPAIS DIFICULDADES DOS PROFESSORES DO ENSINO MÉDIO 1

Transcrição:

APROPRIAÇÃO DAS TEORIAS DE VYGOTSKY POR PROFESSORES DA REDE PÚBLICA DE ENSINO DE CURITIBA Roberta Ferreira Cavalcanti Solange Regina Silva Almeida Rosangela Alves de Godoy Nilson Fernandes Dinis (Universidade Federal do Paraná) RESUMO: Lev Semenovich Vygotsky, psicólogo russo, formulou várias teorias importantes para a educação, entre elas o socioconstrutivismo. Para verificar se os educadores da rede pública de ensino de Curitiba conhecem estas teorias e se utilizam o socioconstrutivismo, foi feita uma coleta de dados, por meio de um questionário investigativo. A amostra foi composta por 40 questionários respondidos por professores da rede pública de ensino de Curitiba, dos quais 2,5% ainda não concluíram o magistério, 7,5% possuem magistério completo, 22,5% ensino superior incompleto e 67,5% ensino superior completo. A respeito da linha pedagógica que fundamenta o trabalho destes professores foram apontadas três linha principais; o construtivismo, o socioconstrutivismo e a histórico crítica. Em relação à divulgação das teorias de Vygotsky, 75% afirmaram conhecê-la e 25% afirmaram não conhecer nada a respeito. Contudo, ainda houve casos em que os respondentes afirmaram desconhecer o autor mas também afirmaram seguir a teoria socioconstrutivista. O que demonstra que existe um discurso que não necessariamente representa o que ocorre realmente em sala de aula. Por isso, sugere-se que haja uma formação continuada de qualidade por parte dos professores. Ainda, 100% dos professores afirmaram considerar o conhecimento que seus alunos já detêm como ponte para desenvolver os conteúdos escolares, portanto, afirmaram considerar o contexto histórico de seus alunos para desenvolver a aula. O que demonstra que apesar de alguns educadores terem afirmado não conhecerem as teorias de Vygotsky, nem seguirem o socioconstrutivismo utilizam algumas características do autor em sala de aula. O que comprova que as teorias de Vygotsky apresentam um caráter prático que se adapta na escola atual. Palavras- chaves: Vygotsky, socioconstrutivismo, professores da rede pública de ensino Vygotsky, psicólogo russo, começou sua carreira após a Revolução Russa, período em que a Psicologia encontrava-se em crise, dividida em duas correntes filosóficas opostas, a idealista e a empirista. Isso impulsionou os seus estudos sobre a

357 crise da Psicologia e o seu envolvimento na construção de uma nova abordagem desta ciência (REGO, 1999). O seu principal interesse foi construir um sistema científico para a Psicologia, a partir da perspectiva do materialismo histórico dialético de Karl Marx (PINO, 2002). Ele destacou a importância do meio social para o processo de ensinoaprendizagem, discordando da abordagem inatista e da concepção ambientalista, por acreditar que estas duas concepções interagem entre si. Também se interessava pelos problemas da Rússia, sendo que o principal deles era o analfabetismo, cerca de 70% da população era analfabeta. Principalmente por este motivo, dedicou-se aos estudos do processo de desenvolvimento e aprendizagem. Tornou-se membro ativo do Conselho Científico do Estado- Centro metodológico do Comissário de Educação do Povo, instituição que buscava criar um novo sistema educativo para a Rússia. Entre as suas contribuições para a educação encontram-se alguns conceitos importantes, como as zonas de desenvolvimento. Para Vygostky (2002) o desenvolvimento e a aprendizagem ocorrem num processo dinâmico e simultâneo. O desenvolvimento é composto por três etapas ou zonas, o potencial, o proximal e o real. O desenvolvimento potencial representa aquilo que o sujeito é capaz de aprender com o auxílio do outro, independente de sua etnia, religião ou cultura. Vygotsky denominou zona de desenvolvimento potencial ao conjunto de atividades que o sujeito é capaz de realizar com a colaboração de outra pessoa. A aprendizagem nesta etapa desperta vários processos internos capazes de operar somente quando o sujeito interage com outras pessoas em um ambiente e com a cooperação de outros. É justamente nesta fase que surge o papel do educador (ou de outra pessoa) que faz a mediação entre o que a criança tem de potencial para o que ela já é capaz de realizar sozinha, ou seja, ele estimula a criança a desenvolver essa potencialidade, transformando-a em capacidade (desenvolvimento real). Essa fase em que o educador faz o papel de mediador, denomina-se de desenvolvimento proximal. Por fim, a última etapa de desenvolvimento é a real, que representa tudo aquilo que o sujeito é capaz de realizar sozinho. São conceitos que já estão internalizados, em que não é necessário o auxílio do outro. È importante destacar que estas três zonas do desenvolvimento acontecem no decorrer do processo de ensino-aprendizagem.

358 Ainda, para Vygotsky (2002), não existe um período da vida em que estes processos deixem de ocorrer. A evolução intelectual é caracterizada por saltos qualitativos de uma etapa do conhecimento para outra. Portanto, o desenvolvimento e a aprendizagem só podem ocorrer com o auxílio do outro, neste processo deve haver a figura do mediador, como sendo aquele que estimula o desenvolvimento real. Aí, encontra-se uma das principais contribuições de Vygotsky para a educação. Pois, a função do professor é justamente mediar o conhecimento de seus alunos, para transformar o que é desenvolvimento potencial em desenvolvimento real. Outra importante função do educador é reconhecer a capacidade potencial que o aluno apresenta em relação a determinadas práticas, para a partir de então criar situações estimuladoras que possibilita a sua aprendizagem. Conforme Vygotsky (2003) o pensamento e a linguagem possuem origens e trajetórias diferentes e independentes, e que somente mais tarde haverá uma ligação entre os dois. Ele considerou, através de estudos com primatas superiores, a existência de uma fase pré-verbal do desenvolvimento do pensamento, em que os animais procuram instrumentos mediadores e se utilizam deles para solucionar alguns problemas, como por exemplo, se utilizar de varas para alcançar um alimento. Essa fase não depende da linguagem. A linguagem utilizada por eles seriam os sons, gestos e caretas faciais, que demonstram suas emoções, na busca de um contato com outros de sua espécie. Esta é considerada uma linguagem pré-intelectual. Num determinado momento do desenvolvimento filogenético, essas duas trajetórias se unem e o pensamento se torna verbal e a linguagem racional. A associação entre pensamento e linguagem é atribuída à necessidade de intercâmbio dos indivíduos durante o trabalho, atividade especificamente humana (OLIVEIRA,1993,p45). Segundo Vygotsky (2002) esse momento é crucial no desenvolvimento humano, pois o biológico se transforma em sócio-histórico. O desenvolvimento cultural do homem só é possível a partir do momento que ele interage com o outro e com o meio, em uma troca de informações específicas. Como afirma Vygotsky: Na ausência do outro o homem não se constrói. (VYGOTSKY, 2002, p. 235)

359 Segundo Santos (2002) o papel da escola é estimular o processo de desenvolvimento do indivíduo em interação com seu cotidiano na elaboração de conceitos que são construídos a partir da observação, da manipulação, da vivência direta da criança, na sua interação com o meio social e dos conceitos científicos que são os conhecimentos adquiridos em sala de aula, por meio do educador. Embora distintos, esses processos possuem uma relação de dependência entre si, pois fazem parte do desenvolvimento do sujeito. Caso o indivíduo não receba nenhuma espécie de desafio ou estímulo do meio em que vive não poderá desenvolver o seu intelecto, sofrendo conseqüentemente um atraso. O que também pode fazer com que a criança não atinja estágios elevados de raciocínio, ficando a critério do educador saber relacionar a sua prática na formação de conceitos científicos, considerando os conhecimentos espontâneos que a criança já possui. Outra importante contribuição para a educação foi o socioconstrutivismo, construído a partir da aplicação das teorias de Vygotsky na área da Educação. Conforme Rego (1999), para Vygotsky o desenvolvimento humano é compreendido não como a decorrência de fatores isolados que amadurecem, nem tampouco de fatores ambientais que agem sobre o organismo controlando seu comportamento. Mas sim por meio de trocas recíprocas, que se estabelecem durante toda sua vida, entre o indivíduo e o meio, cada aspecto influenciando outro. Portanto, a natureza humana só pode ser entendida quando se leva em conta o desenvolvimento sócio-cultural dos indivíduos. Não existe um indivíduo crescendo fora de um ambiente cultural. Desde o nascimento, o indivíduo passa a integrar uma comunidade marcada por hábitos, gestos, linguagens e tradições específicas, que orientam os rumos de seu desenvolvimento. Dessa forma, Vygotsky entende a origem e a evolução do psiquismo humano, as relações entre indivíduo e sociedade sob uma concepção interacionista, a qual alguns estudiosos chamam de socioconstrutivismo e outros de sociointeracionismo. A apropriação do ensino escolar pode ocorrer também em outros locais de socialização, e não somente nas escolas. Partindo dessas interações em locais não escolares, pode-se extrair princípios que as escolas poderiam adotar, a fim de desenvolver um ensino efetivo. Por exemplo, quando várias pessoas vão ao zoológico,

360 a interação que ocorre entre elas está carregada de valores e informações. As pessoas conversam e ensinam o que sabem para as outras sobre os animais. Situações como esta devem ser utilizadas pelos professores, porque a integração dos alunos facilitará o processo de aprendizagem. O professor socioconstrutivista deve considerar as informações que seus alunos já detêm a respeito do tema a ser estudado, tendo a função de mediar o processo de ensino-aprendizagem. Por meio deste processo pode reconhecer a capacidade que a criança tem de realizar diferentes atividades, compreendendo o seu processo de desenvolvimento real e proximal. Por exemplo, uma criança de três anos de idade, é capaz, com o auxílio do professor, de montar uma torre de peças de plástico. Uma criança de cinco anos, no entanto, é capaz de montar a mesma torre sozinha. Ainda, a criança de um ano, mesmo com o auxílio do professor, poderá não ser capaz de montar a torre. Conforme Rischbieter (2005) a teoria socioconstrutivista sugere que é possível explorar mais profundamente o papel das interações sociais, na construção de ambientes de aprendizagem. Nos quais os indivíduos não aprendem apenas explorando o ambiente, mas também dialogando, recebendo instruções, vendo o que os outros fazem e ouvindo o que dizem. Pois, para os socioconstrutivistas, o papel da linguagem é fundamental. Mais do que uma simples auxiliar do pensamento, ela é uma poderosa "ferramenta cultural", capaz de modificar os rumos do desenvolvimento. Abordando o aspecto da relação entre os indivíduos através da linguagem, os socioconstrutivistas também buscam sua inspiração em Piaget (construtivismo), que falava sobre a importância dos alunos trabalharem e discutirem juntos, com a finalidade de que os participantes explicitem suas idéias e opiniões, ajudando cada um a entender outros pontos de vista e a refletir mais conscientemente sobre as atividades. O objetivo deste trabalho é detectar o conhecimento e a utilização da teoria socioconstrutivista por parte dos educadores da rede pública de ensino da Curitiba. Pois, segundo Rischbieter (2005) a pedagogia socioconstrutivista ainda não está bem definida para os educadores, ainda que o movimento seja cada vez maior na área da educação Para coletar os dados foi elaborado um questionário investigativo, aplicado entre os meses de março a maio de 2005. Foram levantadas as seguintes questões: nos

361 primeiros itens buscou-se uma identificação dos professores pesquisados: o nome; a idade; a instituição em que trabalha; a formação profissional e a série que atua, para aferir dados gerais. A partir da terceira questão até a sexta, foram feitas perguntas para investigar se os professores conheciam algo sobre Vygotsky. Perguntou-se: qual linha pedagógica fundamenta o seu trabalho; seu conhecimento das teorias e do trabalho de Vygotsky ; se considera em suas aulas o contexto histórico de seus alunos e se, para desenvolver os conteúdos, considera as informações que os alunos já detêm sobre o assunto. A última questão visava investigar qual a perspectiva dos professores em relação à educação brasileira. Foram coletados 40 questionários. Com relação à escolaridade dos respondentes, 7,5% concluíram o magistério (nível médio); 2,5% possuem o magistério incompleto; 22,5% possuem o ensino superior incompleto, sendo que alguns destes mencionaram que estão cursando, e 67,5% concluíram o ensino superior. No que diz respeito ao conhecimento sobre o autor, foram obtidos os seguintes resultados: 75% afirmam conhecer o Vygostky e 25% afirmaram não conhecer nada sobre as teorias do autor. Na questão que se referia à linha pedagógica a qual seguem, foram mencionadas: a histórico crítica, a construtivista, e, principalmente, a sóciointeracionista. Ainda, 100% dos educadores afirmaram considerar o contexto histórico de seus alunos e as informações que eles já detêm para trabalhar os conteúdos. Alguns resultados encontrados nesta pesquisa vão de encontro à afirmação de Rischbieter: o socioconstrutivismo ainda não está claro para alguns educadores. Pois, apesar da maioria dos professores terem afirmado que conhecem as teorias Vygotsky, grande parte não escreveu nada elas. Ainda, houve três casos em que os educadores afirmaram seguir o socioconstrutivismo, mas desconhecem Vygotsky. Todavia, também houve casos em que os professores descreveram alguns conceitos principais de suas teorias. Por exemplo:...vygotsky prega que a natureza humana só pode ser entendida quando se leva em conta o desenvolvimento sociocultutal dos indivíduos. ; Vygotsky acreditava que o individuo só aprende a partir do seu meio socio-cultural e suas relações. ; Para Vygotsky o sujeito se constrói a partir da relação com o outro, aprende com o outro e com a mediação....

362 Ainda em relação à última questão que perguntava quais as expectativas para o futuro da educação brasileira, a maioria dos entrevistados mencionou a questão da valorização do professor e de melhorias salariais. Também houve afirmações como: Muita dificuldade futuramente, pois os alunos têm consciência de seus direitos. ;... acredito que para haver melhoria na qualidade da educação são necessárias muitas mudanças, mas que podem e devem começar dentro da própria escola, com a colaboração e boa vontade de todos (trabalho em equipe).... Este trabalho possibilita verificar a formação dos educadores na atualidade e diagnosticar falhas no que diz respeito ao aspecto qualitativo na formação acadêmica. É fundamental ressaltar a importância da qualidade da formação do educador e que seu direito ao aperfeiçoamento profissional continuado é garantido pela lei (LDB9394/96, Art. 67, ítem 2). É possível perceber que a maioria busca um desenvolvimento pessoal, ou por iniciativa própria ou para se enquadrar às exigências da lei (LDB9394/96, Art. 62), tendo em vista que 67,5% dos respondentes da pesquisa possuem o ensino superior completo e que, entre os 22,5% que não possuem o ensino superior completo, alguns estão cursando. Embora tenha-se constatado que as contribuições de Vygotsky para a educação realmente ainda não são bem claras para a maioria dos educadores, o estudo foi válido para questionar a qualidade da formação do professor. Pois, a teoria socioconstrutivista tem importância fundamental para a educação. Ainda, segundo Pino,: Se ignorar a história do meio pode levar a ver a criança como uma abstração genérica ou a implantar nela a ilusão de um futuro impossível ; levar em conta a história do meio pode conduzir a implantar nela a consciência do próprio fracasso e à desistência de toda a educação. O desafio, enquanto essas condições não forem transformadas, é levar em conta a história do meio e conseguir implantar na criança a consciência da sua realidade e da sua possibilidade real de superação das limitações que ela lhe impõem. (PINO, 2002, p.60 ). REFERÊNCIAS: LDB 9394/96 Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Disponível em: www.mec.gov.br/legis/pdf/l9394.pdf. Acesso em 07/06/2005.

363 OLIVEIRA, M. K. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento um processo sóciohistórico. São Paulo: Scipione, 1993. PINO, A. A Psicologia concreta de Vigotski: implicações para a educação. In: PLACCO, V. M. N. S. (org.). Psicologia e educação: revendo contribuições. São Paulo: FAPESP, 2002. p. 33-61. REGO, T. C. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes, 1999. RISCHBIETER, L. Socioconstrutivismo: a importância fundamental da cultura e do social no desenvolvimento. Disponível em: http: //www.educacional.com.br. Acesso em: 08/04/2005. SANTOS, B. S. Vygotsky e a teoria histórico-cultural. In: ROSA, L. J. (org.). Psicologia e educação: o significado do aprender. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2002. p. 121-141. VYGOTSKY, L. S. Formação social da mente. Trad.: J. C. Neto, L. S. M. Barreto, S. C. Afeche. 6 ed. São paulo: Martins Fontes, 2002.. Aprendizagem e desenvolvimento intelectual na idade escolar. In.: VYGOTSKY, L.S., LURIA, A. R.; LEONTIEV, A.N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. Trad.: M. P. Villalobos. 4 ed. São Paulo: Ícone, Edusp, 1992. p. 103-117.