Diferenças assistenciais no pré-natal, parto e puerpério entre as mulheres que utilizaram Plano de Saúde x SUS Dados da PNDS 2006

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Transcrição:

Diferenças assistenciais no pré-natal, parto e puerpério entre as mulheres que utilizaram Plano de Saúde x SUS Dados da PNDS 2006 José Cechin Superintendente Executivo Francine Leite Carina Martins Esse texto compara as assistências de pré-natal, parto e puerpério entre os sistemas de saúde publico e por plano de saúde. Foram avaliadas características de cada fase do ciclo de gravidez como indicadores de qualidade da assistência prestada. Para esta nota foram utilizadas as informações da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS 2006) 1, feita por inquérito domiciliar com uma amostra de mulheres em idade fértil, incluindo seus filhos de até 5 anos de idade (n=5.056). 1. Cobertura de Pré-Natal Das 5.056 crianças, 146 (1,3%) não realizaram consulta pré-natal em nenhum momento e 15 não souberam responder ou ignoraram a informação. Das 4.896 que realizaram pré-natal, 16,5% o fizeram por meio de algum plano de saúde. Figura 1: Taxa de cobertura pré-natal das crianças de até 5 anos por região, PNDS 2006. População (%) BR 50 40 SE 30 NE 20 10 N S CO 0 95 96 97 98 99 100 Cobertura pré-natal (%) A Tabela mostra a distribuição da cobertura de pré-natal por região. No Brasil, a taxa de cobertura foi de 98,7%, sendo que as maiores taxas cd cobertura estão nas regiões Sudeste e Sul e a menor na região Norte. 1 Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/pnds/index.php - 1/8 -

O motivo mais alegado pelas 146 mães que não realizaram pré-natal foi a distância do serviço de saúde, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, enquanto no Sul e Sudeste o motivo mais freqüente foi a falta de tempo. Por limitações do próprio inquérito, não foi possível diferenciar entre essas mães as que possuíam ou não plano de saúde com cobertura pré-natal. O maior percentual de mulheres que fizeram pré-natal pelo plano de saúde foi observado na região Sudeste (25%) e o mais baixo Norte (4,9%), conforme se mostra na Figura 2. Figura 2: Percentual de pré-natal realizado por pelo plano de saúde, por região. Brasil, PNDS 2006. pré-natal com plano (%) 30 25 20 15 10 5 0 4,9 6,8 25,0 20,9 13,8 Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste No total, 16,5% das mulheres realizaram prénatal pelo plano de saúde, número menor do que indica a cobertura de plano de saúde (27%) entre mulheres em idade fértil. Isso pode ser justificado pelo fato dessas mulheres não terem plano com cobertura obstétrica ou terem aderido ao plano após o nascimento do filho. A Tabela 1 descreve as características socioeconômicas e de assistência pré-natal entre as beneficiárias de plano de saúde ou não, segundo cada região geográfica. Em relação à idade, podemos notar que as mulheres que engravidaram muito jovens (entre 15 e 19 anos) são mais freqüentes entre as não beneficiárias, sendo que a faixa etária mais predominante entre as beneficiárias é entre os 25 e 34 anos. - 2/8 -

Tabela 1: Características sócio-demográficas e de assistência pré-natal segundo cobertura de plano de saúde por região geográfica. Brasil, PNDS 2006. Norte Nordeste Sudeste Sul Centro- Oeste Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Sim Não Idade (parto) 15-19 5,2 27,1 0,6 27,1 8,6 21,2 6,6 24,6 2,7 23,8 20-24 24,0 36,2 38,8 34,5 25,5 29,9 23,2 29,3 21,7 38,2 25-29 27,0 22,9 40,4 21,6 35,3 20,9 25,8 20,5 36,6 19,1 30-34 27,0 9,8 16,1 10,9 15,6 17,2 20,8 15,2 18,8 12,2 35 16,8 4,0 4,1 5,8 15,0 10,8 23,6 10,4 20,2 6,8 93 informações ignoradas Escolaridade Nunca freqüentou 0,0 1,5 0,0 3,3 0,3 0,9 0,0 1,4 0,0 2,6 1 a 4 2,5 28,7 1,0 25,2 4,4 16,5 1,2 19,7 0,3 13,6 5 a 8 8,8 35,0 15,4 34,6 18,9 43,8 26,0 43,0 22,8 39,6 9 88,8 34,9 83,6 36,9 76,4 38,8 72,8 35,9 76,9 44,2 36 informações ignoradas Renda per capita (SM) familiar <0,25 14,6 50,1 5,8 50,0 4,2 21,2 0,8 17,2 5,4 22,4 0,25-0,49 14,8 24,6 12,1 33,8 10,0 32,6 9,5 32,9 9,8 36,4 0,50-0,74 7,6 12,6 20,2 7,3 19,0 20,0 17,9 21,5 16,8 17,8 0,75-1,00 6,8 4,0 21,8 2,7 17,4 8,5 13,1 10,5 3,0 10,3 >1,00 56,2 8,7 40,1 6,2 49,4 17,7 58,7 17,9 65,0 13,1 875 informações ignoradas 2. Assistência Pré-Natal Recomenda-se como boa assistência pré-natal a realização de, no mínimo, 6 consultas pré-natal, sendo a última na quinzena antecedente ao parto. Além disso, devem-se realizar exames de sangue e urina (além do realizado para confirmação da gravidez) e exame físico, com aferição da pressão arterial, peso e altura. Nos dois grupos, foi baixa a freqüência (89,4% com plano e 86,1% sem plano) de realização de exame de urina, principalmente pela sua simplicidade de realização e - 3/8 -

importância para detecção de Diabetes Mellitus e infecção urinária, que pode vir a causar parto prematuro. Exame de sangue e aferição de peso e pressão arterial foram amplamente (>90%) realizados nos dois serviços. Na Tabela 2 observa-se a distribuição dessas características de assistência pré-natal segundo as mulheres que fizeram esse procedimento. Observamos que a assistência no plano de saúde foi melhor, exceto pela mensuração de peso e altura em que as distribuições foram semelhantes. Tabela 2: Distribuição das características da assistência pré-natal entre as mulheres com e sem plano de saúde. Brasil, PNDS 2006. Com Plano (%) Sem plano (%) Primeira consulta pré-natal Antes dos 3 meses 80,9 57,6 Entre 3 e 5 meses 17,2 37,5 A partir dos 6 meses 1,7 3,4 Não sabe/não respondeu 0,2 1,5 0 ignoradas Última consulta pré-natal Antes dos 7 meses 0,7 2,3 Entre 7 e 8 meses 24,3 30,2 Entre 9 e 10 meses 74,1 66,3 Não sabe/não respondeu 0,9 1,2 Quantas consultas pré-natal 3 1,3 5,0 4 a 5 2,0 9,8 6 96,7 85,2 283 ignoradas 3. Assistência ao parto Em 1985, a Organização Mundial de Saúde (OMS) 2 iniciou um trabalho para a humanização do parto, que entre outros, incluía incentivo ao parto normal e presença 2 WORLD HEALTH ORGANIZATION. "Appropriate Technology for Birth.". Lancet, v. 2, n. 8452, Aug. 1985. p. 436-437. - 4/8 -

de acompanhante no processo do parto. Além disso, recomendava a modificação de rotinas hospitalares consideradas desnecessárias, como episiotomia (corte realizado no períneo da mulher, para facilitar a saída do bebê), lavagem intestinal e tricotomia (raspagem dos pêlos pubianos) e partos cesarianos. Algumas das características de assistência ao parto podem ser observadas na Tabela 4. A taxa recomendada pela OMS de partos cesarianos é de 15%. Entretanto, a taxa revelada por essa pesquisa foi de 43,7%. Entre as que realizaram partos em hospital do plano de saúde a taxa foi muito superior (78,8%), comparada com 33,6% no SUS. Em 2003 3, a proporção de partos cesarianos na Holanda foi 14%, bem próxima do limite recomendado pela OMS. Em outros países da Europa e América o percentual de partos cesarianos foi bem maior: Alemanha (25%), Estados Unidos (28%), México (36%) e Itália (37%). Na tentativa de reduzir essas taxas, a ANS (com foco nas operadoras) e o Ministério da Saúde têm intensificado o trabalho de humanização do parto e modificação de práticas desnecessárias. Em relação à grande diferença da freqüência de cesáreas realizadas, deve-se ressaltar que o perfil das mulheres e da atenção prestada a elas é diferente. Enquanto as mulheres com plano de saúde podem decidir sobre o tipo de parto (Merighi et al., 2007) 4, entre as mulheres usuárias do SUS predomina a concepção de que a decisão compete aos profissionais de saúde, independente do desejo da mulher (Dias & Deslandes, 2006) 5. A tricotomia e a episiotomia são consideradas práticas desnecessárias no parto, mas ainda em processo de adequação pelos médicos e discussão sobre riscos e benefícios, por isso sua alta freqüência nos dois serviços de saúde. Também se observou maior freqüência de presença de médico no momento do parto (98,7% x 87,3%) e de atendimento no primeiro local procurado (96,6% x 88,1%) entre as usuárias de plano de saúde quando comparada com as não cobertas. A presença de 3 Burton, R.; Peterson, CL. U.S. Health Care Spending: Comparison with Other OECD Countries. Key Workplace Documents Federal Publications. Cornell University ILR. School Year 2007. 4 MERIGHI, Miriam Aparecida Barbosa; CARVALHO, Geraldo Mota de; SULETRONI, Vivian Pontes. O processo de parto e nascimento: visão das mulheres que possuem convênio saúde na perspectiva da fenomenologia social. Acta paul. enferm., São Paulo, v.20, n.4, 2007. 5 DIAS, Marcos Augusto Bastos; DESLANDES, Suely Ferreira. Expectativas sobre a assistência ao parto de mulheres usuárias de uma maternidade pública do Rio de Janeiro, Brasil: os desafios de uma política pública de humanização da assistência. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.22, n.12, 2006. - 5/8 -

um acompanhante durante o parto também foi mais de três vezes maior entre as mulheres com plano. Tabela 3: Distribuição das características de assistência ao parto entre as mulheres com e sem plano de saúde. Brasil, PNDS 2006. Com plano Sem plano Tipo de parto Cesárea 78,8 33,6 Normal 21,2 66,4 Acompanhante durante o parto Sim 37,6 10,1 Não 62,4 89,8 Não sabe/não respondeu/não se aplica 0,0 0,1 Realização de episiotomia (parto normal) Sim 81,6 71,4 Não 18,4 26,9 Não sabe/não respondeu/não se aplica 0,0 1,7 Realização de tricotomia Sim 51,6 35,1 Não 48,0 64,4 Não sabe/não respondeu/não se aplica 0,4 0,5 Lavagem Intestinal Sim 23,6 22,4 Não 74,0 76,1 Não sabe/não respondeu/não se aplica 2,4 1,5 3.1 Alívio da dor no parto normal A OMS e Ministério da Saúde em seu guia de humanização do parto também recomendam o alívio da dor no parto. As medidas para alívio da dor são amplas, desde não-farmacológicas até agentes anestésicos, e são receitadas de acordo com a intensidade da dor da parturiente. Para essas informações foram considerados partos realizados somente em hospitais do SUS ou conveniados pelos planos de saúde (n= 2.379 partos). - 6/8 -

A proporção de mulheres que tiveram alívio da dor no parto foi baixa (28,5%). Entretanto, quem realizou o parto pelo plano de saúde teve sua dor aliviada em uma proporção maior (48,3%), comparado com 27,2% das que realizaram o parto no SUS. Apesar da freqüência dos procedimentos não-invasivos terem sido baixos nos dois serviços, o alívio foi alcançado pelo procedimento da anestesia peridural com maior freqüência para as usuárias de plano de saúde (36,7% x 11,9%). 4. Assistência no puerpério A assistência no puerpério (consulta ginecológica até dois meses após o parto) teve uma freqüência considerada muito baixa (38,5%) na população em geral, com marcante diferença entre as que tinham (70,3%) e as que não tinham plano de saúde. (32,2%). As mulheres que realizaram esse acompanhamento são mais escolarizadas e têm maior renda per capita. Conclusões A taxa de cobertura de pré-natal foi alta (98,7%) em todo o país, com pequenas variações entre as regiões. As mulheres com plano de saúde tendem a ter filhos em idades mais altas do que as sem plano. As freqüências de assistência pré-natal antes do primeiro trimestre gestacional, acompanhamento até os meses finais, e realização de mais de 6 consultas durante a gestação foi maior entre as usuárias de plano de saúde. Quanto ao parto, o alívio da dor é realizado com maior freqüência entre as mulheres cobertas por plano de saúde, assim como para elas são mais elevadas as freqüências de tricotomia e episiotomia. As taxas de cesarianas são altas nos dois sistemas, porém, entre as usuárias de plano de saúde são muito maiores. Sabe-se que as mulheres podem mudar de opinião durante a gestação até o momento do parto 6, embora as mulheres com planos tenham maior liberdade de escolha do tipo de parto que ela quer realizar. 6 Dias et al. Avaliação da demanda por cesariana e a adequação de sua indicação em unidades hospitalares do sistema de saúde suplementar do Rio de Janeiro. In: O modelo de atenção obstétrica no setor de Saúde Suplementar no Brasil: cenários e perspectivas. ANS, 2008. - 7/8 -

As operadoras de plano de saúde, em conjunto com a ANS, têm realizado um trabalho de conscientização tanto entre as usuárias como entre os médicos para incentivar o parto normal. O custo maior do parto cesariano (considerados todos os custos) também pode justificar a política pública de redução dessas taxas para o SUS, que é muito carente de recursos. Mas o maior custo justificaria por si só também uma política de redução dos partos cesarianos para os planos de saúde? Parece que não, pois são os próprios beneficiários que arcam com os maiores custos e não a coletividade. Caberia como política comercial das operadoras as que quisessem planos mais acessíveis adotariam uma política de estímulos ao parto normal. Além disso, há a questão do maior conforto, tanto para as mães quanto para os médicos, do parto cesariano. Assim, a maior taxa de cesariana entre as mulheres com plano de saúde pode ser justificada pela opção das mesmas induzidas ou não pelo profissional. Em não sendo superiores os riscos para a saúde da parturiente e da criança não parece razoável uma política pública voltada para a redução dos partos cesarianos realizados pelos planos de saúde. A indução indevida pelo profissional deve ser combatida. Mas assume-se que as mulheres que têm plano de saúde são menos suscetíveis dessa indução por terem maior grau de instrução e informação. A assistência ao puerpério, em geral, foi baixa. Porém, entre as mulheres com plano de saúde foi mais de duas vezes mais freqüente do que entre as sem plano. A qualidade de assistência à mulher desde o pré-natal até o puerpério é, em geral, superior entre as beneficiárias de plano de saúde em relação a das não usuárias. Essa melhor assistência decorre da maior facilidade de acesso aos serviços, do atendimento com hora marcada e pelo mesmo médico durante todo o período. Esses fatores podem ser vantajosos para a adesão ao pré-natal e segurança no momento do parto, fatores que são diferenciais do sistema por plano de saúde. - 8/8 -