Desenhos Tokio. Design e Impressão Rui Carvalho Design



Documentos relacionados
ANDAM GOLFINHOS NA COSTA

Newsletter. Ano I - Janeiro de O Projecto SafeSea. Arrojamentos

Trabalho realizado por: João Rabaça. 11º Ano do Curso Técnico de gestão de Equipamentos Informáticos

RELATÓRIO DE ATIVIDADES DO ANO 2011

Estudando a Ecologia dos Golfinhos nos Açores

É esta imensidão de oceano, que mais tarde ou mais cedo teremos de aproveitar de um modo sustentável.

Contribuição do CCR Sul relativamente à consulta da CE sobre a revisão do regime de acesso à pesca de alto mar

BOTO-CINZA: SOTALIAGUIANENSIS (VAN BÉNÉDEN, 1864)

CLASSIFICAÇÃO DOS AMBIENTES MARINHOS

Posição da SPEA sobre a Energia Eólica em Portugal. Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves

ESTRUTURA EMPRESARIAL NACIONAL 1995/98

BLOCO 11. ASSUNTOS: Controlo Análise dos Registos Contabilísticos Análise de estrutura e de eficiência Análise de actividade PROBLEMAS:

CAPA DO RELATÓRIO DE VIAGEM

REDE TEMÁTICA DE ACTIVIDADE FÍSICA ADAPTADA

Espécies de cetáceos registrados entre a praia de Guaibim e costa leste da ilha de Itaparica e áreas circunvizinhas, incluindo a BTS

EDP. PREPARAR A ECONOMIA DO CARBONO Eficiência energética em alerta vermelho EMPRESA

ISO 9000:2000 Sistemas de Gestão da Qualidade Fundamentos e Vocabulário. As Normas da família ISO As Normas da família ISO 9000

Jornal Oficial da União Europeia

ESTUDO STERN: Aspectos Económicos das Alterações Climáticas

A Vida do Cagarro. durante 1 ano

Mais clima para todos

Figura 1: Bosque de Casal do Rei, alguns meses após o incêndio que ocorreu no Verão de 2005.

A Ponte entre a Escola e a Ciência Azul

Pescas e Aquicultura na Região Centro BREVE CARACTERIZAÇÃO

O Ser Humano como potencial destruidor do ecossistema marinho. Carlos Bastos

ARTIGO TÉCNICO. Os objectivos do Projecto passam por:

Pequenas e Médias Empresas no Canadá. Pequenos Negócios Conceito e Principais instituições de Apoio aos Pequenos Negócios

XI Mestrado em Gestão do Desporto

CURSO SOBRE PARTICIPAÇÃO DE GRUPOS DE INTERESSE

IUCN Red List Categories - Version 3.1

Índices Teleconectivos

MUNICÍPIOS E O MAR Associação Fórum Empresarial da Economia do Mar. Município da Nazaré

Geografia - Clima e formações vegetais

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 28/IX SOBRE A REVISÃO DA POLÍTICA COMUM DAS PESCAS

Escola Secundária de Valongo PROFESSORAS: DINORA MOURA ISABEL MACHADO PIMENTA

QUALIDADE E INOVAÇÃO. Docente: Dr. José Carlos Marques

VARIAÇÃO DA RADIAÇÃO SOLAR AO LONGO DO ANO EM PORTUGAL

Plano de Actividades do CEA para 2006

Restituição de cauções aos consumidores de electricidade e de gás natural Outubro de 2007

Observatório da Criação de Empresas. Observatório da Criação de Empresas

Projeto de Voluntariado para a Cooperação: MUITO MAIS MUNDO. Plano de acção para o Município de Santa Cruz, Santiago, Cabo Verde.

Projecto REDE CICLÁVEL DO BARREIRO Síntese Descritiva

1- Foca-da-Gronelândia (Pagophilus groenlandicus) 2 - Cavalo-marinho Pigmeu (Hippocampus bargibanti) 3 - Lontra-marinha (Enhydra lutris)

Em 2007, por cada indivíduo nascido em Portugal, foram criadas 1,6 empresas

8 DE MAIO ONDE NASCE O NOVO EMPREGO EM PORTUGAL Teresa Cardoso de Menezes

PRESSUPOSTOS BASE PARA UMA ESTRATÉGIA DE INOVAÇÃO NO ALENTEJO

Métodos de treino da resistência

Seminário de discussão, Buenos Aires, 3 e 4 de Dezembro de 2009

Projeto de Resolução n.º 238/XIII/1.ª. Recomenda ao Governo que implemente medidas de prevenção e combate à Diabetes e à Hiperglicemia Intermédia.

Área de Intervenção IV: Qualidade de vida do idoso

AVALIAÇÃO DA SATISFAÇÃO DO CLIENTE NOS SERVIÇOS SAGRA ONLINE

CONSERVAÇÃO DOS RECURSOS HALIÊUTICOS

PLANO DE PROMOÇÃO DA EFICIÊNCIA NO CONSUMO (PPEC) REVISÃO DAS REGRAS

Conclusões CAPÍTULO 7 CONCLUSÕES. O Ambiente Interior e a Saúde dos Ocupantes de Edifícios de Habitação. 217

Bioma é um conceito estabelecido para classificar ambientes com base na

O TURISMO NO ESPAÇO RURAL 2005

IAGC. Associação Internacional dos Contratistas de Geofísica. Possui um Comitê Ambiental cuja missão é:

8 anos de Planos de Promoção do Desempenho Ambiental (PPDA)

COLÉGIO SÃO JOSÉ PROF. JOÃO PAULO PACHECO GEOGRAFIA 1 EM 2011

Rota de Aprendizagem 2015/16 5.º Ano

DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS COMBINADAS

Estratégia Europeia para o Emprego Promover a melhoria do emprego na Europa

Turismo no Espaço Rural. A oferta e a procura no TER

Política da Nestlé sobre Sustentabilidade Ambiental

Domínio Prioritário Natureza e Biodiversidade

97% dos indivíduos com idade entre os 10 e os 15 anos utilizam computador, 93% acedem à Internet e 85% utilizam telemóvel

Construção e Energias Renováveis. Volume IV Energia das Ondas. um Guia de O Portal da Construção.

Estudos de Imagem e Notoriedade

Começo por apresentar uma breve definição para projecto e para gestão de projectos respectivamente.

ESTATÍSTICAS DEMOGRÁFICAS DISTRITO DE VIANA DO CASTELO E SEUS CONCELHOS. F e v e r e i r o d e

Disciplina: Geografia. Trabalho realizado por: Mónica Algares nº 17. Turma: B

BIOLOGIA - 2 o ANO MÓDULO 20 ECOLOGIA

DESENVOLVER E GERIR COMPETÊNCIAS EM CONTEXTO DE MUDANÇA (Publicado na Revista Hotéis de Portugal Julho/Agosto 2004)

CEF/0910/26436 Relatório final da CAE (Univ) - Ciclo de estudos em funcionamento

ANEXO 3. A floresta portuguesa FACTOS E NÚMEROS

Desigualdade Económica em Portugal

TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO. SISTEMAS DE GESTÃO DE BASE DE DADOS Microsoft Access TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

Os diferentes climas do mundo

PLANIFICAÇÃO CIÊNCIAS NATURAIS (8.º ANO) 2015/2016 Docentes: João Mendes, Madalena Serra e Vanda Messenário

ANÁLISE DO MERCADO DE REMESSAS PORTUGAL/BRASIL

A taxa de desemprego do 3º trimestre de 2007 foi de 7,9%

Projeto 1 do Plano de Ação Lixo Marinho Açores

Como elaborar um Plano de Negócios de Sucesso

ANEXO A. Carta Educativa do Concelho de Mafra Anexo A, Pág. 305

CARACTERIZAÇÃO SOCIAL DOS AGREGADOS FAMILIARES PORTUGUESES COM MENORES EM IDADE ESCOLAR Alguns resultados

Estratégia Nacional de Educação para o Desenvolvimento. ( ) ENED Plano de Acção

Uma reflexão sobre Desenvolvimento Económico Sustentado em Moçambique

Desigualdade Económica em Portugal

Governança de TI. ITIL v.2&3. parte 1

Universidade de Aveiro Departamento de Física. Dinâmica do Clima. Precipitação

Fotografias PauloHSilva//siaram. Saber Mais... Ambiente Açores

contexto estratégico, económico e empresarial

Ecologia Geral (ECG33AM) Estrutura populacional (crescimento e dinâmica populacional)

A certificação de Qualidade para a Reparação Automóvel.

A taxa de desemprego foi de 11,1% no 4º trimestre de 2010

PERFIL DO JOVEM EMPREENDEDOR

Protocolo de Colaboração Rede Embaixadores para a Responsabilidade Social das Empresas dos Açores

Transcrição:

Manual de Apoio 1

Manual de Apoio para a Promoção de uma Pesca Mais Sustentável e de um mar seguro para cetáceos Textos José Vingada, Marisa Ferreira, Jorge Santos, Hélder Araújo, Isabel Oliveira, Sílvia Monteiro, Ana Marçalo, Lídia Nicolau, Célia Tavares e Catarina Eira. Desenhos Tokio Fotografia José Vingada, Marisa Ferreira, João Petronilho, João Quaresma, Joana Miodonski, Ana Henriques, Jorge Santos, Filipe Leigo, Isabel Oliveira. Design e Impressão Rui Carvalho Design Citação recomendada Vingada, J., Ferreira, M., Marçalo, A., Santos, J., Araújo, H., Oliveira, I., Monteiro, S., Nicolau, L., Gomes, P., Tavares, C. & Eira, C. (2011), SafeSea - Manual de Apoio para a Promoção de uma Pesca Mais Sustentável e de um mar seguro para cetáceos; Programa EEAGrants - EEA Financial Mechanism 2004-2009 (Projecto 0039). 114 pp. Braga. Coordenação José Vingada e Pedro Gomes Gestão do projecto Célia Tavares Página de Internet Filipe Rocha Técnicos de campo Marisa Ferreira, Isabel Oliveira, Jorge Santos, Hélder Araújo, Sílvia Monteiro, Rute Costa, Catarina Eira, Jorge Vaqueiro, Ana Marçalo, Lídia Nicolau, Carolina Bento, Paula Mendez Fernandez, Angela Llavona Vallina, Josep Alonso Farré, Maria Llarena Reino, Sabine Goetz, Fiona Read, Ana Henriques, Joana Miodonski, Paulo Landeck. Técnicos de Laboratório Magda Graça, Amaro Rodrigues, Pedro Santos e Joana Ferreira Consultores Arne Bjorg (IMR), Alfredo Lopéz (CEMMA) e Graham Pierce (Univ. Aberdeen)

Entidade Financiadora Financiado por Islândia, Liechtenstein e Noruega através do Mecanismo Financeiro do Espaço Económico Europeu Entidades participantes Universidade do Minho - Dep Biologia/CBMA Sociedade Portuguesa de Vida Selvagem Coordinadora para o Estudo dos Mamíferos Mariños Institute of Marine Reseach Centro Litoral O.P. VianaPesca O.P. Entidades colaboradoras Centro de Estudos sobre Ambiente e Mar - Universidade de Aveiro (CESAM) Instituto de Investigação das Pescas e do Mar (IPIMAR) Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB) Associação Nacional das Organizações dos Produtores da Pesca do Cerco (ANOPCERCO) Instituto de Investigaciones Marinas de Vigo (IIM/CSIC) Centro Oceanografico de Vigo (COV/IEO) University of Aberdeen, OceanLab Université de La Rochelle, Littoral Environnement et Sociétés (LIENSS) Universitat de Barcelona, Facultat de Farmácia (UB) Fumunda Marine BetterGear, LLC

Projecto premiado pelos Green Project Awards com a Menção Honrosa na categoria Investigação e Desenvolvimento. 4 Este prémio não é só para a equipa do SafeSea, é também um reconhecimento do apoio e ajuda que armadores, mestres e pescadores têm dado ao projecto. Sem o seu apoio este projecto não seria possível.

Índice 09 CAPÍTULO 1 Introdução 79 CAPÍTULO 5 Medidas de mitigação para reduzir a captura acidental de cetáceos em artes de Pesca 15 CAPÍTULO 2 Espécies de Cetáceos em Portugal Continental 97 CAPÍTULO 6 Análise de custo-benefício para a aplicação de medidas de mitigação 49 CAPÍTULO 3 As pescas em Portugal Continental 113 REFERÊNCIAS 65 CAPÍTULO 4 Interacções entre cetáceos e artes de pesca 5

Capítulo 1

8 Alagem da rede de cerco

Introdução A pesca em Portugal foi sempre uma fonte de rendimento importante, principalmente para as comunidades costeiras. Com uma tradição marítima bastante forte, Portugal possui artes de pesca bastante diversificadas que variam regionalmente em termos de tecnologia e métodos de pesca utilizados. As interacções existentes entre as artes de pesca e os cetáceos envolvem quase todos os tipos de artes e têm consequências negativas quer para a economia pesqueira quer para o estado de conservação de várias espécies de cetáceos. Estas interacções normalmente tomam duas formas: a captura acidental de cetáceos e a predação efectuada pelos mesmos, levando à perda de pescado e danificação dos aparelhos de pesca. O Projecto SAFESEA, através de um envolvimento estratégico com duas associações de pesca local, manteve entre 2008 e 2011 um programa de monitorização com o objectivo de recolher dados científicos de base, de modo a: - Avaliar o estado das populações de cetáceos, - Avaliar as capturas acidentais de cetáceos nas artes de pescas, e - Implementar ensaios piloto de dispositivos de alerta, que visam diminuir a captura acidental de cetáceos. A área inicial de implementação do projecto SAFESEA foi a zona centro e norte de Portugal, entre Peniche e Caminha, cobrindo uma faixa costeira de cerca 300 km. A área marinha monitorizada estendeu-se desde a linha de costa até às 50 milhas náuticas, cobrindo a totalidade da plataforma continental e do seu talude. Nesta área é possível encontrar alguns dos principais portos de pesca de Portugal e também importantes comunidades piscatórias locais que dependem da pesca tradicional. Em 2010, o projecto SafeSea teve a oportunidade de aplicar na região Algarvia as metodologias já em uso nas regiões Norte e Centro, tendo por isso ampliado a sua área de intervenção em mais 200 km. 9

10 Golfinho-comun

Assim, o Projecto SAFESEA foi o primeiro projecto estratégico direccionado para a promoção de uma maior compatibilização da actividade pesqueira com a conservação de cetáceos, visando contribuir para o desenvolvimento sustentável da pesca local. Para atingir tais objectivos, o projecto encontra-se dividido em 5 acções estruturantes e interligadas: Acção 1: Avaliação das interacções entre a actividade pesqueira e os cetáceos; Acção 2: Estimativas de abundância e distribuição das populações de cetáceos; Acção 3: Ensaio de medidas de mitigação para reduzir as interacções de cetáceos e pescas; Acção 4: Divulgação do projecto ao público e comunidade científica; Acção 5: Educação ambiental direccionada para a promoção do uso sustentável dos recursos e uso de medidas mitigadoras de capturas acidentais. O presente Manual, pretende ser um documento de divulgação e de apoio direccionado à comunidade de pescadores das artes polivalente, cerco e de xávega. Este documento pretende apoiar a continuação das acções já iniciadas pelo SafeSea e mostrar que a promoção de acções de conservação só é possível com o envolvimento directo das comunidades de pescadores. Este manual pretende também contribuir para a implementação de boas práticas e servir como um guia de aconselhamento sobre como tornar a pesca uma prática mais sustentável. Baleia-anã na proximidade de barco de pesca polivalente 11

Capítulo 2

Espécies de Cetáceos em Portugal Continental Actualmente estão descritas cerca de 90 espécies de cetáceos a nível mundial, das quais 25 ocorrem no Atlântico Nordeste (Reid et al., 2003) e 21 ocorrem no Mediterrâneo e Mar Negro (IUCN, 2006). Na costa continental portuguesa e durante o Projecto SafeSea foi possível registar a ocorrência de 23 espécies de cetáceos, sendo 16 pertencentes à sub-ordem dos odontocetes (cetáceos com dentes) e 7 à sub-ordem dos misticetes (cetáceos com barbas). Algumas destas espécies são consideradas residentes - como os golfinhos-comum e riscado, o roaz-corvineiro, o bôto, o grampo, a baleia-anã e a baleia-piloto - enquanto outras são apenas ocasionais (ver tabela 2.1). No entanto, a informação disponível sobre as populações de cetáceos na costa continental portuguesa é escassa. Por esta razão, muitas das espécies estão incluídas na categoria de Informação Insuficiente, no livro vermelho dos vertebrados de Portugal (Cabral et al. 2005). Para algumas espécies potencialmente mais raras ou de mais difícil observação, ainda não foi possível efectuar uma avaliação do seu estatuto nas águas continentais Portuguesas. 15

Tabela 2.1. Nomes comuns e científicos de espécies encontradas em Portugal Continental durante o Projecto SafeSea, bem como o grau de ocorrência e estatuto de conservação segundo o livro vermelho dos vertebrados de Portugal (Cabral et al. 2005). Nome comum Nome científico Ocorrência Estatuto (Livro Vermelhos dos Vertebrados de Portugal) 16 Golfinho-comum Delphinus delphis Residente Pouco preocupante Golfinho-riscado Stenella coeruleoalba? Pouco preocupante Golfinho-malhado-do-Atlântico Stenella frontalis? Não avaliado Roaz-corvineiro Tursiops truncatus Residente Pouco preocupante Bôto Phocoena phocoena Residente Vulnerável Baleia-piloto Globicephala melas? Informação Insuficiente Baleia-piloto-tropical Globicephala macrorhynchus? Informação Insuficiente Grampo Grampus griseus Residente Informação Insuficiente Orca Orcinus orca? Informação Insuficiente Falsa-orca Pseudorca crassidens Ocasional Não avaliado Cachalote Physeter macrocephalus Ocasional Não avaliado Cachalote-pigmeu Kogia breviceps? Informação Insuficiente Zífio Ziphius cavirostris? Informação Insuficiente Baleia-de-bico de Gervais Mesoplodon europaeus? Não avaliado Baleia-de-bico de Sowerby Mesoplodon bidens? Não avaliado Botinhoso Hyperoodon ampullatus? Não avaliado Baleia-anã Balaenoptera acutorostrata Residente Vulnerável Baleia-sardinheira Balaenoptera borealis Ocasional Não avaliado Baleia-comum Balaenoptera physalus Ocasional Não avaliado Baleia de Bryde Balaenoptera edeni? Não avaliado Baleia-azul Balaenoptera musculus Ocasional Não avaliado Baleia-de-bossa Megaptera novaeangliae Ocasional Não avaliado Baleia-basca Eubalaena glacialis Ocasional Não avaliado

A principal fonte de informação disponível sobre a ocorrência de mamíferos marinhos é representada pelos arrojamentos (situações em que um ou mais cetáceos dão à costa). Apesar de estes arrojamentos permitirem a recolha de dados relativos à biologia destes animais (através da recolha e análise de amostras), estas situações não fornecem informações detalhadas sobre a origem dos animais arrojados. Para conhecer o estado das populações em termos ecológicos é muito importante a obtenção de informação relativa à ocorrência e distribuição das espécies através de uma constante monitorização. Esta informação permite inferir sobre os movimentos destas populações (residentes ou migratórias) e detectar áreas de alimentação ou reprodução. Simultaneamente, permite perceber de que modo estas espécies poderão estar a ser influenciadas pelo Homem, já que se poderá saber se ocorrem por exemplo em zonas especialmente poluídas ou se ocupam áreas específicas em que ocorra uma maior competição pelos mesmos recursos (dieta vs. pesca). Toda esta informação poderá orientar uma futura implementação de estratégias de gestão e conservação. Tornam-se assim essenciais a actualização e a monitorização contínua da ocorrência das várias espécies de cetáceos na costa portuguesa. Deste modo, é possível conhecer as várias populações, detectar e prevenir possíveis problemáticas associadas à influência do homem, e entender as variáveis que conduzem à presença/ausência das diferentes espécies em águas portuguesas, nomeadamente aquelas que normalmente prefeririam outros habitats mas que já foram observadas em águas de Portugal Continental. 17

18 Golfinhos-comuns junto a embarcação de pesca

Golfinho-comum Delphinus delphis O golfinho-comum é a espécie de cetáceo mais abundante na nossa costa. São animais esguios e com um bico proeminente, que possuem uma coloração escura no dorso e branca no ventre. No entanto, é lateralmente e abaixo da barbatana dorsal que se distinguem um V e um padrão cromático, típicos desta espécie. Na parte anterior deste V observa-se uma mancha amarelada enquanto que na parte posterior até à cauda distingue- -se outra mancha de um cinzento mais claro. Uma faixa escura liga a mandíbula inferior à barbatana peitoral. Quando adultos, os machos são ligeiramente maiores do que as fêmeas podendo medir entre os 1,7 e os 2,6 m e pesar entre os 70 e 135 kg. Não existe um dimorfismo sexual evidente, sendo que a identificação do sexo é possível através da observação da zona genital onde as fêmeas exibem 3 fendas paralelas (glândulas mamárias e a fenda genital) anteriormente ao ânus e os machos exibem apenas 2 fendas longitudinais (fenda genital e o ânus). As barbatanas peitorais são longas e pontiagudas enquanto que a barbatana dorsal é alta e ligeiramente falciforme. Actualmente estão descritas duas formas distintas de acordo com o tamanho do bico: os golfinhos-comuns de bico curto (Delphinus delphis) e de bico comprido (Delphinus capensis) (Rosel et al., 1994). Estes cetáceos apresentam um comportamento bastante gregário. É possível encontrar grupos de centenas de animais, bem como grupos mais pequenos de 30 ou ainda menos indivíduos. Os grupos são constituídos por animais de diferentes idades, embora possa existir alguma segregação sexual. Está descrito que estes animais possuem fortes vínculos sociais e pensa-se que poderão comunicar através de vocalizações que incluem vários estalidos e assobios. Observam-se com relativa facilidade na nossa costa e aproximam-se frequentemente à proa de embarcações. Os golfinhos-comuns são animais bastante ágeis e rápidos, sendo capazes de grandes saltos. Associações com outras espécies de cetáceos não são invulgares (Jefferson et al. 1993), nomeadamente com roaz- -corvineiro e o golfinho-riscado. Na costa Portuguesa, a presa preferencial do golfinho comum é a sardinha. No entanto estes cetáceos podem alimentar-se de outros peixes como cavalas e fanecas e também cefalópodes. O golfinho-comum tende a caçar em grupo e adapta a sua actividade ao movimento das suas presas (Silva, 1999). Quando as encontram, é habitual empurrar os cardumes para a superfície onde estes são mais vulneráveis (Gallo, 1991). Aparentemente, os grupos de golfinho-comum podem percorrer grandes distâncias em busca de alimento, geralmente durante a noite até às primeiras horas da manhã. Durante o dia restabelecem energias e relacionam-se com os elementos do grupo. Em latitudes mais elevadas, a actividade reprodutora do golfinho-comum é sazonal embora em águas tropicais possa prolongar-se durante todo o ano. Na Península Ibérica, a actividade reprodutora ocorre geralmente em 19

Golfinho-comum 20 Ilustração Tokio

Maio e Junho e as fêmeas tendem a permanecer em latitudes mais baixas ou mais longe da costa na época de reprodução e lactação (Reeves et al., 2003). Ainda pouco se sabe sobre a maturidade sexual nesta espécie, sendo que estudos mais recentes sugerem que pode ocorrer entre os 3 e os 7 anos de idade. O período de gestação pode ser de 10 a 11 meses e o período de lactação pode atingir os 16,5 meses. Actualmente, e apesar de, na maior parte dos países já ser proíbida por lei, a captura directa de golfinhos-comuns para fins alimentares ainda ocorre. Para o golfinho-comum, as principais ameaças são as capturas acidentais em diversos tipos de artes de pesca. Os núcleos populacionais mais costeiros estão também mais vulneráveis a outros tipos de pressões antropogénicas como poluição, tráfego marítimo e perda de habitat decorrente da implementação de estruturas de produção de energia. O golfinho-comum é uma espécie amplamente distribuída nas regiões temperadas, tropicais e subtropicais do mundo inteiro, onde a temperatura superficial da água varia entre os 10º e os 28º, limitando a sua distribuição à faixa situada entre os 40 Sul e 50º Norte. No entanto, alguns indivíduos poderão viajar para fora desta área quando encontram correntes quentes. Esta espécie pode ocorrer em águas costeiras e águas oceânicas, sendo mais frequente nas zonas da plataforma continental (Carwardine, 1995). Pode ser igualmente encontrada em corpos de água fechados como o Mar Vermelho ou o Mar Mediterrâneo. Algumas populações são estáveis ao longo do ano enquanto outras parecem migrar seguindo um padrão sazonal. As variações na aparência de certas populações sugerem pouca interacção entre diferentes grupos. Em Portugal Continental, esta espécie encontra-se amplamente distribuída sendo frequente tanto nas zonas próximas da costa, como nas zonas mais oceânicas. Na região centro/norte de Portugal, a avaliação da distribuição e abundâncias de golfinho-comum permitiu verificar que esta espécie é comum em toda a área de estudo monitorizada (Mapa 1). A análise integrada de todos os dados recolhidos permitiu verificar que esta espécie ocorre em toda a zona de estudo, apresentando dois núcleos de maior concentração de detecções. O núcleo mais a sul caracteriza-se por ocorrer numa zona entre Aveiro e S. Pedro de Moel, desde as 1,5 milhas náuticas e as 25 milhas. Este núcleo ocorre em águas menos profundas parecendo haver uma preferência por batimétricas próximas dos 100 metros. A segunda zona de maior concentração de animais desta espécie surge no norte da área de estudo, junto à fronteira da Galiza. Este núcleo apresenta uma distribuição com uma influência mais oceânica e menos costeira, ocorrendo a norte da Póvoa de Varzim, numa zona mais próxima do limite da plataforma, entre as batimétricas dos 100 e 200 metros. 21

Mapa 1. Distribuição das observações totais de golfinho-comum, mediante a representação de Kernels, obtidas durante censos aéreos, costeiros e em plataformas de oportunidade no centro e norte de Portugal. Contudo, com base numa análise mais pontual resultante, dos censos aéreos efectuados na Primavera-Verão de 2010, é possível verificar que existe uma maior fragmentação da distribuição de golfinho-comum que resulta em 4 zonas de maior concentração das observações (Mapa 2). Duas destas zonas coincidem com as zonas já anteriormente referidas. A terceira zona de maior concentração ocorre sensivelmente em frente ao Furadouro, enquanto que a quarta zona de forte ocorrência de golfinhos-comuns ocorre a sudoeste das Berlengas. Ambas as zonas são mais oceânicas do que costeiras, estando próximas da batimétrica dos 200 metros. Esta avaliação permitiu também verificar que a zona costeira desde Mira até sensivelmente Viana do Castelo, correspondeu a uma extensa área com fraca ocorrência de golfinhos-comuns durante a Primavera-Verão de 2010. 22

-10 Mapa 2. Distribuição das observações de golfinho-comum, mediante a representação de Kernels, obtidas durante censos aéreos no centro e norte de Portugal. Porto Com base nos censos de avião efectuados durante o SafeSea (Mapa 3), foi possível estimar a abundância de golfinho-comum na área de estudo. Os valores obtidos variaram entre 0,0135 e 0,0389 avistamentos por km 2, com um valor médio de 0,0229 avistamentos por km 2. Estes valores foram relativamente similares aos obtidos no SCANS-II (Hammond, 2006). Contudo, o número médio de indivíduos em cada avistamento foi ligeiramente inferior, tendo no presente caso sido de 11,5 indivíduos, resultando numa densidade de 0,263 animais por km 2. 40 Para estes valores estima-se que em Portugal Continental, entre a costa e as 50 milhas naúticas, poderão ocorrer em média ± 20 500 indivíduos de golfinho-comum. -10 23

24 Mapa 3. Distribuição e número de golfinhos- -comuns observados em cada um dos grupos durante censos aéreos no centro e norte de Portugal.

Bôto Phocoena phocoena Bôto - Pormenor da cabeça arredondada e quase sem bico. Unlisted Images/Fotosearch.com O bôto possui um corpo pequeno mas robusto. Os adultos não costumam exceder 1,70 m de comprimento e os 70 Kg, sendo que as fêmeas são ligeiramente maiores que os machos. Na Peninsula Ibérica, têm sido registados animais de maiores dimensões, quando comparados com as populações do Mar do Norte, sendo que o animal de maior tamanho correspondeu a uma fêmea de 2,05 metros. A sua coloração pode ser variável mas normalmente é cinzenta escura no dorso clareando até à zona ventral que é branca. Em alguns animais pode-se notar uma mancha escura no queixo, algumas linhas escuras entre a boca e as barbatanas peitorais e por vezes umas manchas cinzentas esbatidas ao longo do corpo. Possui uma barbatana dorsal triangular situada a meio do corpo. O focinho é curto e não tem bico perceptível. Os indivíduos desta espécie costumam ser avistados sozinhos ou em pequenos grupos de 2 a 5 animais. O tamanho do grupo tende a aumentar ligeiramente no fim do Verão mas pouco se sabe sobre as suas interacções sociais. Quando emergem para respirar, na maior parte das vezes, só é possível reconhecer a sua pequena barbatana dorsal e um pouco do corpo arqueado, uma vez que não costumam sair muito fora de água nem executar grandes saltos. Nesta espécie está descrita a ocorrência de migrações sazonais, geralmente associadas ao movimento das suas presas ou à severidade das condições meteorológicas. A ocorrência de movimentos perpendiculares à costa para águas mais oceânicas, sugere que os bôtos podem utilizar zonas oceânicas durante parte do seu ciclo de vida. Em algumas áreas é possível que interacções negativas entre bôto e roaz-corvineiro determinem os limites de ocorrência desta espécie. O bôto alimenta-se de peixes demersais e bentónicos, mas também de espécies pelágicas principalmente espécies com comportamento agregativo em cardume. Nas costas Ibéricas parece haver uma clara preferência para espécies como: o verdinho, carapau e fa- 25

Fêmea de Bôto com uma cria 26 Ilustração Tokio

neca (López, 2003). Também podem alimentar-se de cefalópodes e pequenos crustáceos. Nesta espécie, a maturidade sexual ocorre bastante cedo, por volta dos 3 ou 4 anos de idade. A gestação é de 10 a 11 meses e as fêmeas permanecem com os lactantes entre 8 a 12 meses. As fêmeas podem ter crias durante vários anos consecutivos e por vezes podem engravidar enquanto amamentam as crias. Esta estratégia reprodutiva é muito exigente e daí talvez possa resultar uma longevidade um pouco menor do que a de outros cetáceos. Na Península Ibérica, a maior parte dos nascimentos ocorre entre Maio e Agosto. Durante muitos anos, esta espécie foi usada não só para a produção de óleo mas também na alimentação humana, principalmente nos países nórdicos. Em Portugal, esta espécie chegou a ser alvo de pesca direccionada, prática que deixou de ser efectuada nos finais dos anos 70. Embora já tenha sido proibida em quase todo o Mundo, ainda há regiões que continuam a caçar, como por exemplo a Gronelândia. Na nossa costa, as maiores ameaças à sobrevivência desta espécie são as capturas acidentais em artes de pesca. A sua preferência por habitats mais costeiros e menos profundos, fazem com que esta espécie seja mais vulnerável à interacção com a arte Xávega e redes de emalhar mais próximas da costa. Esta espécie é mais frequente em águas frias, temperadas e subárticas do hemisfério Norte, onde a temperatura ronda os 15. Contudo, nos últimos anos, tem sido possível registar a ocorrência de uma população ao longo da costa atlântica de África, especialmente nas costas de Marrocos e Mauritânia (Boisseau et al. 2007). É uma espécie costeira e pode ser facilmente observada em zonas de profundidade inferior a 200 metros, estuários e baías. Também está descrita a existência de populações de bôtos, ainda que residuais, no Mar Báltico e no Mar Negro. No Mar Mediterrâneo esta espécie está dada como extinta. Em Portugal, distribui-se ao longo de toda a orla costeira, embora seja mais frequente na zona Norte, nomeadamente na zona entre Aveiro e Figueira da Foz e na zona da Arrábida e Costa da Galé (Sequeira, 1996). Recentemente, através de dados de observações oportunistas em barcos de turismo de observação de cetáceos foi possível confirmar a ocorrência de Bôtos no Algarve, com especial incidência na zona entre Sagres e Lagos (Castro, 2010). A área de estudo do projecto SafeSea é uma das zonas onde a plataforma continental é mais extensa, pelo que estamos perante uma das áreas potencialmente mais favoráveis para a ocorrência de bôtos. A recolha de dados efectuada ao longo do projecto permitiu detectar um importante núcleo de ocorrência entre o norte de Mira e a Nazaré, com uma clara preferência pelas zonas mais costeiras (Mapa 4). No entanto, em frente à Figueira da Foz e a Aveiro, foi possível registar algumas observações em zonas mais oceânicas, na proximidade do talude e inclusivamente na proximidade da batimétrica dos 1000 metros. 27

28 Mapa 4. Distribuição das observações totais de Bôto, mediante a representação de Kernels, obtidas durante censos aéreos, costeiros e em plataformas de oportunidade no centro e norte de Portugal.

Golfinho-riscado Stenella coeruleoalba O golfinho-riscado é muito semelhante ao golfinho-comum tanto em forma como em tamanho. A sua coloração é escura no dorso e bastante clara no ventre, que pode variar desde branco a rosa claro. As suas riscas laterais são características e conferem o nome à espécie: a maior risca escura vai desde o olho até à região anal, possui uma outra mais pequena que começa no olho e termina na base da barbatana peitoral e por vezes pode ser vista uma terceira risca que se prolonga até um pouco depois do olho. A área acima das riscas laterais é de um cinzento claro que se estende do bico até à barbatana dorsal, curvando para cima. A barbatana dorsal é proeminente e falciforme e as barbatanas peitorais são curtas e pontiagudas. O bico é escuro na parte superior e na ponta, podendo ser um pouco mais claro na parte inferior. Os adultos medem cerca de 2,5 m podendo pesar 150 kg. Os machos e fêmeas são muito semelhantes, diferindo apenas no tamanho (as fêmeas são ligeiramente mais pequenas) e na zona genital, tal como os golfinhos-comuns. Esta espécie possui um comportamento gregário, podendo formar grupos numerosos e fortemente coesos, variando entre 30 a 500 animais. É frequente os animais segregarem- -se de acordo com o sexo ou a maturidade sexual: grupos de juvenis, adultos ou sub- -adultos ainda sem capacidade reprodutora (Archer and Perrin, 1999). Estes cetáceos são extremamente activos, podendo atingir grandes velocidades (até 28 nós) e realizar um grande número de acrobacias enquanto saltam. Esta característica, em conjunto com o seu padrão de riscas laterais, torna-os facilmente reconhecíveis no mar. Há registos de avistamentos desta espécie associada ao golfinho-comum, ainda que, ao contrário deste último, não costumem interagir com as embarcações (Cawardine, 1995). Devido à sua ampla distribuição, esta espécie apresenta uma dieta muito diversificada que inclui uma grande diversidade de peixes, crustáceos e cefalópodes, que pode variar de acordo com a área geográfica. Os golfinhos- -riscados caçam em grupo e quando estão à procura de alimento, são capazes de mergulhar a profundidades que vão de 200 a 700 metros, tipicamente durante 5 a 10 minutos. Apesar desta capacidade de mergulho, a maior parte das capturas ocorre no início da noite, quando as presas se encontram mais próximas da superfície. A maturidade sexual varia bastante entre os dois sexos: nos machos dá-se entre os 7 e os 15 anos, enquanto as fêmeas maturam um pouco mais cedo, entre os 5 e os 13 anos de idade. Estão descritas diferentes épocas de acasalamento consoante a zona geográfica onde se encontram: no Outono na zona do Mediterrâneo e no fim do Verão/Outono no Atlântico (Archer and Perrin, 1999). Nesta espécie, o intervalo entre o nascimento de duas crias é usualmente de 4 anos sendo que o período de repouso entre a lactação e o próximo acasalamento é de 2 a 6 meses e o período de gestação é de 12 a 13 meses (Calzada et al., 1996). 29

Golfinho-riscado 30 Ilustração Tokio

As populações do golfinho-riscado têm vindo a registar um decréscimo em algumas zonas do mundo, especialmente no Japão onde esta espécie é alvo de captura. Aparentemente, os caçadores tiram proveito da forte coesão dos seus grupos para direccioná-los para águas menos profundas onde são mais facilmente aprisionados (Reeves et al., 2003). No ocidente, os principais problemas são a degradação de habitat, a poluição e a ocorrência de capturas acidentais em artes de pesca. O golfinho-riscado é uma espécie cosmopolita de hábitos oceânicos, com uma preferência por zonas de grande profundidade. Ocorre em mares quentes e temperados do mundo inteiro. Ocasionalmente, em áreas como a costa do Mediterrâneo e especialmente no Verão, podem aparecer bastante próximo de costa, muito provavelmente devido ao movimento das suas presas. A área de estudo do projecto SafeSea é dominada por uma extensa plataforma continental com profundidades inferiores a 200 metros, o que corresponde a zonas não preferenciais para o golfinho-riscado. Assim, devido à sua especialização oceânica, as poucas observações desta espécie ocorreram na proximidade do talude da plataforma continental ou então já em zonas próximas dos 1000 metros de profundidade (Mapa 5). A maior concentração de observações ocorreu a norte da Figueira da Foz, com um núcleo de maior actividade na zonas próximas do talude continental em frente a Aveiro. 31

Mapa 5. Distribuição das observações totais de golfinho-riscado, mediante a representação de Kernels, obtidas durante censos aéreos, costeiros e em plataformas de oportunidade no centro e norte de Portugal. -10 Porto 40 40 32-10

Roaz-corvineiro Tursiops truncatus O roaz-corvineiro possui uma cabeça robusta, com um bico relativamente curto. Esta espécie apresenta uma coloração predominantemente cinzenta. Apesar de o dorso ser ligeiramente mais escuro não é visível uma delimitação evidente em nenhuma zona, sendo que normalmente o cinzento mais escuro estende-se desde o bico até à ponta posterior da barbatana dorsal, sendo cada vez mais claro desde os flancos até à zona ventral, não sendo visível qualquer tipo de marca nos flancos. A barbatana dorsal, situada no centro do corpo, é falciforme e relativamente alta, enquanto as barbatanas peitorais são largas. Os adultos apresentam um corpo robusto que pode alcançar 2,5 a 3,8 metros, ocorrendo dimorfismo sexual relativamente ao tamanho e ao peso (machos podem atingir 500 kg enquanto que as fêmeas apenas cerca de 260 Kg). São conhecidas duas variantes morfológicas desta espécie, associadas a habitats distintos: uma variante oceânica, com animais maiores, mais escuros e com barbatanas peitorais mais pequenas e uma variante costeira, com animais de menores dimensões. Esta espécie apresenta um comportamento gregário. O tamanho dos grupos e o tipo de associações, varia ao longo do tempo consoante o habitat, o tipo de actividade em que os animais estão envolvidos, a idade, estado reprodutivo e as ligações familiares dos indivíduos. Como exemplo, verifica-se que a variante costeira tende a formar grupos mais pequenos (2-15 indivíduos), enquanto a variante oceânica pode formar grupos de centenas de indivíduos. De igual modo, verifica-se que fêmeas com crias parecem ocorrer em grupos maiores do que os dos machos. Esta espécie apresenta associações complexas e diversas, sendo a maioria delas bastante estáveis. Podem formar grupos de fêmeas aparentadas, aos quais se juntam ocasionalmente machos adultos, grupos de machos sub-adultos ou adultos aparentados entre si, e grupos de fêmeas adultas com crias. Pode também associar-se a tartarugas marinhas ou cetáceos, como baleia piloto, golfinho comum ou grampo e por vezes baleias. É possível a ocorrência de animais solitários, normalmente machos, que se aproximam de barcos ou banhistas. Esta espécie pode ser agressiva tanto com co- -específicos como com outras espécies, como por exemplo o bôto. O roaz-corvineiro é um nadador activo, rápido e vigoroso, podendo ser visto a dar saltos e a efectuar batimentos caudais. Esta espécie é considerada oportunista, uma vez que a dieta varia com a disponibilidade de presas. Alimenta-se de várias espécies de peixes bentónicos e invertebrados, na zona costeira, e peixes pelágicos e cefalópodes, nas zonas oceânicas. Animais solitários podem caçar sozinhos, no entanto é mais frequente caçarem em grupo. Utilizam diversas estratégias para capturar as presas, como por exemplo, golpear a presa com a barbatana caudal para a atirar para fora de água ou, em grupo, aprisionar os cardumes de presas junto à superfície da água, junto à 33

Roaz-corvineiro 34 Ilustração Tokio

costa ou em águas pouco profundas, para conseguir capturá-los mais facilmente. A maturidade sexual, nesta espécie, varia com o sexo (entre os 8 e 14 anos nos machos e os 5 e 12 anos nas fêmeas). Parece haver um pico na época de reprodução nos meses mais quentes, no entanto há registo de nascimentos durante todo o ano. O período de gestação dura cerca de um ano e as crias nascem com cerca de 0,9 a 1,3 metros e 90 Kg de peso. A amamentação dura entre 12 a 20 meses, fazendo com que o ciclo reprodutor possa durar entre 2 a 3 anos. Existem ainda alguns lugares no mundo onde ocorre a captura directa desta espécie para obtenção de comida ou para utilização da gordura como isco (Sri Lanka, Peru, Taiwan, Japão). O roaz-corvineiro é a espécie mais encontrada em cativeiro, sendo por vezes capturada com esse fim. Adicionalmente são também ameaçados por capturas acidentais em artes de pesca, especialmente as populações costeiras que estão também mais vulneráveis a outros tipos de pressões antropogénicas como poluição do meio marinho e tráfego marítimo. Esta espécie é por vezes responsável por predação de pescado em artes de pesca (principalmente em palangres e redes de emalhar) facto que gera conflitos com as comunidades de pescadores. O roaz-corvineiro é uma espécie amplamente distribuída, podendo ser encontrada em águas temperadas e tropicais dos dois hemisférios, evitando apenas as latitudes mais elevadas. Ocupa diversos tipos de habitats, tanto costeiros como oceânicos. As populações costeiras habitam desde zonas de costa exposta, a lagunas, estuários e recifes, em águas de pouca profundidade mas com elevada disponibilidade de recursos alimentares. Por sua vez, as populações oceânicas habitam águas com elevada produtividade, em profundidades superiores a 1000 metros. Em Portugal, existe uma população residente de roaz-corvineiro, no estuário do Sado, desde a década de 70. Nos finais dos anos 80, estimava-se que esta população rondava os 40 indivíduos, sendo que as estimativas mais recentes referem a ocorrência de apenas 25 indivíduos dos quais 14 são adultos já com uma idade avançada (Roazes do Estuário do Sado - http://roazesdosado.icnb.pt). Durante as campanhas do SafeSea foi possível registar a ocorrência de roazes um pouco por toda a área de estudo (Mapa 6), havendo uma clara preferência por águas mais costeiras. A zona de maior ocorrência registou-se na proximidade das Berlengas e do Canhão da Nazaré. Associada a este núcleo aparece uma outra zona com algumas observações na proximidade da Figueira da Foz. Mais para norte, aparecem 3 pequenos núcleos de ocorrência de roazes na proximidade do Porto e em águas mais oceânicas em frente a Viana do Castelo. Estas observações poderão estar associadas a movimentações dos indivíduos que ocorrem de forma mais constante na zona das Rias Baixas na Galiza. 35

Mapa 6. Distribuição das observações totais de roaz-corvineiro, mediante a representação de Kernels, obtidas durante censos aéreos, costeiros e em plataformas de oportunidade no centro e norte de Portugal. -10 Porto 40 40 36-10

Baleia-piloto Globicephala melas Esta espécie possui uma cabeça proeminente e bulbosa, com um bico muito curto, quase imperceptível. Apresenta coloração cinzento- -escura, com uma zona ligeiramente mais clara atrás da barbatana dorsal, bem como uma marca acinzentada em forma de âncora na zona ventral. A barbatana dorsal, situada na dianteira do corpo, tem uma base larga e inclinada para trás. As barbatanas peitorais são grandes, estreitas e pontiagudas. A baleia-piloto é o maior delfinídeo, apresentando dimorfismo sexual principalmente em relação ao tamanho (cerca de 6 m nos machos e 5 m nas fêmeas), ao peso (2 t nos machos e cerca de 1,3 t nas fêmeas) e à forma da barbatana dorsal (côncava nos machos e mais triangular nas fêmeas, mais similar à dos golfinhos). Esta espécie apresenta um comportamento gregário, sendo possível encontrar-se grupos constituídos por centenas de animais, apesar de normalmente serem vistos grupos menores (10-20 animais). Ainda que a estrutura social desta espécie seja complexa e pouco co- nhecida, crê-se que os grupos são compostos por animais aparentados entre si, de todos os sexos e idades, com fortes laços matriarcais, sendo frequente a formação de grupos de fêmeas adultas com crias. Podem ser vistos associados a outras espécies de cetáceos, como o roaz-corvineiro ou grandes baleias. O comportamento desta espécie à superfície é muito variável, podendo encontrar-se frequentemente grupos de indivíduos com uma natação lenta ou a descansar à superfície da água, bem como a emergir a cabeça fora de água ou a fazer batimentos caudais. Esta espécie apresenta uma dieta diversificada e variável consoante a localização geográfica. Apesar de maioritariamente composta por cefalópodes, especialmente lulas, consome também espécies gregárias de peixe, quando disponíveis. Alimentam-se principalmente à noite. Em termos reprodutivos, a maturidade sexual varia com o género (13 anos nos machos e 8 anos nas fêmeas). No Atlântico norte, a época de reprodução ocorre entre Abril e Setembro, seguida de um período de gestação de cerca de 15 meses. As crias nascem com cerca de 1,5-2 m e 70-80 Kg de peso. A amamentação ocorre durante cerca de 23 a 27 meses e como as fêmeas tendem a não sobrepor a amamentação com a gravidez, o ciclo reprodutor pode alcançar entre 3 a 5 anos. 37

Baleia-piloto 38 Ilustração Tokio

A baleia-piloto é das poucas espécies de cetáceos que são ainda exploradas comercialmente. A captura legal desta espécie ocorre ainda nas Ilhas Faroé. A captura legal desta espécie ocorre nas Ilhas Faroé, com uma remoção média anual de 850 indivíduos. No entanto, no Noroeste Atlântico, mais precisamente em Newfoundland, a pesca desta espécie foi proibida nos anos 70, por se considerar que contribuiu fortemente para a redução do número de baleias-piloto nesta área. Para além da captura legal desta espécie, também ocorre captura acidental de indivíduos em artes de pesca como arrastões, palangre e redes de emalhar, o que juntamente com a poluição por organoclorados e metais pesados, constituem factores de ameaça para esta espécie. Esta espécie apresenta uma ampla distribuição por águas subpolares e temperadas do Atlântico Norte e do Hemisfério Sul. As populações dos dois hemisférios estão separadas geograficamente, constituindo grupos distintos que, por vezes, são identificados como subespécies (G. melas edwardii no hemisfério Sul e G. melas melas no hemisfério Norte). É uma espécie predominantemente oceânica, ainda que possa aproximar-se de zonas costeiras, principalmente devido ao movimento de presas no Verão e Outono. Os resultados obtidos durante as campanhas do SafeSea colocam em evidência a preferência desta espécie por zonas mais oceânicas, tendo sido possível registar uma zona de maior ocorrência no norte de Portugal, junto à fronteira com a Galiza (mapa 7). Aparentemente este núcleo dispersa-se ao longo do talude oceânico até à zona da Figueira da Foz. Algumas das observações efectuadas ocorreram relativamente próximo da costa com a detecção de animais em zonas com profundidades entre os 50 e os 100 metros. 39

Mapa 7. Distribuição das observações totais de baleia-piloto, mediante a representação de Kernels, obtidas durante censos aéreos, costeiros e em plataformas de oportunidade no centro e norte de Portugal. -10 Porto 40 40 40-10

Baleia-anã Balaenoptera acutorostrata A baleia-anã apresenta um corpo alongado com cabeça pontiaguda, onde é possível observar apenas uma crista rostral desde o espiráculo até a boca. Possui uma coloração cinzento-escura na zona dorsal e branca na zona ventral e parte dos flancos, com uma característica marca branca nas barbatanas peitorais. Exibe um conjunto de pregas na zona ventral (característica dos rorquais), que expandem durante a ingestão do alimento, que será posteriormente filtrado pelas barbas pequenas e brancas ou amareladas. A barbatana dorsal é alta, pontiaguda e curva quando comparada com a dos restantes rorquais e encontra-se a cerca de um terço da barbatana caudal. O sopro desta espécie é baixo e quase imperceptível. Quando emerge, é possível observar o espiráculo e a barbatana dorsal ao mesmo tempo. A baleia-anã representa o mais pequeno e mais comum dos rorquais, com um adulto a atingir aproximadamente 10 m de comprimento e 8 t de peso. As baleias-anãs são normalmente animais solitários, embora seja possível observar grupos de 2 ou 3 indivíduos. No entanto, durante a alimentação podem agregar-se em grupos maiores (10-15 animais) e ainda ser vistos associados a outras espécies de cetáceos como roazes e, por vezes baleias-corcundas. O comportamento desta espécie à superfície pode variar de uma natação rápida por curtos períodos de tempo (13 a 16 nós), a uma natação normalmente mais lenta (2 a 4 nós). Podem ser vistas a dar saltos (entre 1 e 3) e são curiosas ao ponto de se aproximarem de barcos. Ao contrário de outros rorquais que se alimentam quase exclusivamente de Krill, esta espécie é mais generalista, podendo consumir arenque, sardinha, cavala, não rejeitando de igual modo o Krill. A baleia-anã pode utilizar diversos métodos de captura de presas, como nadar para a superfície com a boca expansível aberta para capturar os cardumes de peixe à superfície da água, ou fazer investidas a cardumes. Esta espécie ingere as presas juntamente com água e filtra o alimento através das barbas. Os locais preferidos para alimentação, no Verão, incluem zonas de afloreamento em torno de pequenas ilhas e promontórios, onde normalmente ocorre um fluxo de correntes forte. Durante a alimentação, estão frequentemente associados a aves marinhas. A maturidade sexual é alcançada entre os 7 e 8 anos. A época de reprodução ocorre no Inverno, seguida de um período de gestação de 10 meses. As crias nascem com cerca de 3 m e 300 Kg. A amamentação decorre apenas durante cerca de 4 a 6 meses, fazendo com que o ciclo reprodutor dure cerca de 2 anos. Esta espécie é ainda legalmente capturada na Noruega (aproximadamente 600 por ano), Gronelândia (aproximadamente 150 animais por ano) e Japão (aproximadamente 100 por ano). Apesar de se crer que a captura de indivíduos desta espécie não irá afectar as populações a médio-longo prazo, por ser abundante e por existirem quotas anuais para 41

Baleia-anã 42 Ilustração Tokio

a sua captura, esta actividade era já responsável pela diminuição em cerca de 45-70% da abundância desta espécie antes de ser autorizada a sua captura legalmente. A competição entre as baleias-anãs e os pescadores pelos mesmos recursos naturais (dieta vs. interesse comercial), bem como a sobre-exploração das presas desta espécie poderão ter um impacto negativo, já que esta espécie é fortemente afectada por capturas acidentais em artes de pesca, podendo ocorrer interacções com redes de emalhar ou de arrasto. A baleia-anã apresenta ampla distribuição em ambos os hemisférios, desde as regiões polares até às regiões subtropicais, sem atingir os trópicos. Acredita-se que a nível mundial existam três populações isoladas: a do Pacífico, a do Atlântico Norte e a do Hemisfério Sul (Evans, 1987). Ainda pouco é conhecido em termos de migrações, no entanto, esta espécie parece efectuar migrações sazonais, dirigidas a Norte no Inverno, para alimentação em águas mais frias, e a Sul no Verão para se reproduzirem em águas mais quentes. No entanto, também é possível observar a ocorrência em alguns locais de populações residentes. A baleia-anã percorre uma grande diversidade de habitats, desde zonas oceânicas a áreas costeiras. Pode ser observada na zona de plataforma continental, com profundidades iguais ou inferiores a 200 m, uma vez que pode aproximar-se de terra e entrar em estuários ou baías. Na região centro/norte de Portugal, as observações de baleia-anã ocorreram um pouco por toda a área de estudo, sendo que na maior parte das observações foram registados 1 ou 2 indivíduos. Estas observações ocorreram maioritariamente na proximidade do talude, mas algumas observações ocorreram relativamente próximo de costa (± 20 milhas náuticas) e em profundidades inferiores a 100 metros (Mapa 8). A zona de maior concentração de observações ocorreu entre o Porto e a Figueira da Foz. 43

Mapa 8. Distribuição das observações totais de baleia-anã, mediante a representação de Kernels, obtidos durante censos aéreos, costeiros e em plataformas de oportunidade no centro e norte de Portugal. -10 Porto 40 40 44-10

Tabela resumo de hot-spots para as diferentes espécies no norte e centro de Portugal Espécie Nome comum Hot-Spots de ocorrência Delphinus delphis Golfinho-comum Zona Costeira entre Aveiro e S. Pedro de Moel (Mapa 1) Zona Oceânica a norte da Póvoa do Varzim (Mapa 1) Phocoena phocoena Bôto Mira a Nazaré (Mapa 4) Stenella coeruleoalba Golfinho-riscado Zona oceânica a nordeste de Aveiro (Mapa 5) Tursiops truncatus Roaz-corvineiro Norte de Peniche (Mapa 6) Globicephala melas Baleia-piloto Zona oceânica a nordeste da Póvoa do Varzim (Mapa 7) Zona oceânica entre Porto e Figueira da Foz (Mapa 7) Balaenoptera acutorostrata Baleia-anã Zona oceânica entre Porto e Figueira da Foz (Mapa 8) 45

46

Capítulo 3 47

48 A diversidade da frota de pesca Portuguesa é uma das suas mais valias.

As pescas em Portugal Continental Portugal é um país onde a pesca é uma actividade de grande tradição e importância cultural. Esta importância está relacionada com o facto de Portugal possuir uma Zona Económica Exclusiva (ZEE) de cerca de 1 656 000 km 2, uma extensa zona costeira e uma plataforma continental de elevada produtividade. Desde a entrada na União Europeia, em 1986, a politica de gestão do sector das pescas está em conformidade com a política comunitária, que visa a implementação progressiva de uma abordagem à gestão das pescas na perspectiva do ecossistema, de forma a viabilizar a actividade pesqueira do ponto de vista económico e minimizar os impactes da pesca nos ecossistemas marinhos (PO Pesca 2007/2013). Para tal, foram estabelecidas quotas para algumas espécies, foram criadas áreas de interdição à pesca, existe restrição das artes de pesca, foi definido um tamanho mínimo de captura para as espécies exploradas, existe uma padronização do tamanho da malhagem da rede e uma definição da percentagem máxima de capturas acidentais. Houve também um decréscimo significativo da frota, embora a potência por embarcação tenha aumentado, o número de pescadores e desembarques diminuiu, e de uma maneira geral o sector perdeu alguma importância a nível económico, representando actualmente um peso relativamente baixo na economia nacional (Baeta & Cabral, 2005). A frota de pesca portuguesa apresenta uma grande diversidade nas suas características de zona para zona e em relação à actividade e tecnologias de pesca utilizadas (Baeta & Cabral, 2005). De acordo com o tamanho das embarcações (comprimento ou tonelagem), potência do motor e área em que as embarcações operam, a frota de pesca portuguesa pode ser classificada em três categorias: local, costeira e de largo (Tabela 3.1). Embarcação de pescal local Tabela 3.1. Requerimentos legais para a classificação da frota como local, costeira e de largo. Frota Área de pesca Tamanho (comprimento ou GT) Potência do motor Local Cabinados 1-30 milhas < 9m < 100HP Não-Cabinados ¼ - 6 milhas < 9m < 60HP Costeira Fora da 1 milha Fora das 6 milhas se GT>100 > 9m e mais de 180GT > 35HP Largo Fora das 12 milhas > 100GT 49

Embarcações de cerco 50 As embarcações de pesca local caracterizam- -se por uma grande heterogeneidade e baixo grau de autonomia. São embarcações que operam normalmente em águas interiores ou na orla marítima perto da costa, com artes de pesca diversas, existindo em número elevado. Esta frota é de extrema importância para o sector devido ao seu peso sócio-económico nas comunidades piscatórias, dela dependendo um grande número de postos de trabalho. A frota de pesca costeira apresenta uma maior autonomia, maior tonelagem e potência e melhores meios de conservação do pescado a bordo que as embarcações da frota local, pelo que têm condições para operar em zonas mais afastadas da costa, podendo mesmo actuar fora da ZEE nacional. A frota de pesca de largo é formada por navios de maiores dimensões, com condições de autonomia e meios de transformação e conservação do pescado a bordo, o que lhes permite actuar em zonas distantes como por exemplo, o Atlântico Norte, o Atlântico Central e o Atlântico Sul. Por definição, considera-se que o sector da pesca artesanal engloba todas as embarcações com menos de 12 metros de comprimento fora-a-fora, quaisquer que sejam as suas artes. No entanto, as embarcações acima

Embarcação polivalente de 12 metros tais como as da pescaria de cerco, pela sua componente operacional, podem ser incluídas no sector artesanal. As principais espécies capturadas ao longo da costa portuguesa são, no sistema pelágico a sardinha, a cavala, o biqueirão, o carapau, o carapau-negrão e o verdinho. Os peixes mais importantes da comunidade demersal são a pescada, o tamboril, o linguado e outros peixes chatos. Existem também muitas espécies de elasmobrânquios na região, incluindo raias e tintureiras, sendo que também os cefalópodes, tais como o polvo e o choco, apresentam alguma importância em termos de descargas. 51

52 Embarcação de Xávega

Características sócio-económicas da pesca artesanal O sector das pescas apresenta um peso relativamente baixo na economia nacional. A população relacionada com a pesca representa cerca de 0,3% da população activa com mais de 12 anos de idade e cerca de 6,9% da população empregada no sector primário (INE, 2010). No entanto, se analisarmos o impacto do sector das pescas a nível local ou regional, verifica-se que este sector tem um forte impacto social na medida que a pesca funciona como um factor de fixação das populações, existindo muitas comunidades ao longo da costa que têm a pesca como a sua actividade principal (PO Pesca 2007-2013). Os profissionais da pesca distribuem-se maioritariamente entre os grupos etários dos 35 a 44 anos e dos 45 a 54 anos, correspondendo no seu conjunto a cerca de 60% do total. A maioria dos pescadores matriculados encontram-se registados na região Norte (27%), na região Centro (21%) e no Algarve (19%). Quanto ao nível de ensino da população da pesca, este é na sua generalidade baixo. Cerca de 75% da população possui habilitações abaixo do 3.º ciclo do ensino básico, sendo que destes, 55% apenas tem o 1.º ciclo do ensino básico (INE, 2010). A maioria dos profissionais do sector das pescas é trabalhador por conta de outrem (73% do total) e cerca de 27% são patrões ou trabalhadores por conta própria. Ao longo das últimas décadas tem-se observado um aumento do número de patrões ou trabalhadores por conta própria, enquanto que o número de trabalhadores por conta de outrem tem vindo Pescadores a preparar as redes de cerco a diminuir (INE, 2010). Na realidade, tal acontece porque normalmente o patrão/dono da embarcação é também o mestre e faz parte da tripulação. Para além disso, a maioria das embarcações de pesca artesanal é composta por uma ou duas pessoas. O número de tripulantes aumenta com a complexidade das artes que se utilizam, pelo que embarcações de cerco ou arrasto têm mais tripulantes que a frota polivente. 53