Márcia Vieira da Costa Marques

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Transcrição:

Márcia Vieira da Costa Marques Importância da alimentação na flora microbiana do Homem Universidade Fernando Pessoa Faculdade de Ciências da Saúde Porto, 2015

Márcia Vieira da Costa Marques Importância da alimentação na flora microbiana do Homem Universidade Fernando Pessoa Faculdade de Ciências da Saúde Porto, 2015

Márcia Vieira da Costa Marques Importância da alimentação na flora microbiana do Homem (Márcia Vieira da Costa Marques) Trabalho Complementar apresentado à Universidade Fernando Pessoa como parte dos requisitos para obtenção do grau de licenciado em Ciências da Nutrição Orientador: Professora Doutora Maria Pia Ferraz

Importância da alimentação na flora microbiana do Homem Márcia Vieira da Costa Marques 1 ; Maria Pia Ferraz 2 1 Estudante finalista do 1º ciclo de Ciências da Nutrição da Universidade Fernando Pessoa. 2 Orientadora do trabalho complementar. Docente da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Fernando Pessoa. Autor para correspondência: Márcia Vieira da Costa Marques Universidade Fernando Pessoa Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Fernando Pessoa (Ciências da Nutrição) Rua Carlos da Maia, 296 4200 150 Porto Tel. +351 225074630; Correio eletrónico: 25633@ufp.edu.pt Título resumido: Alimentação, Flora microbiana do homem Contagem palavras: 9881 Número de figuras: 1 Conflito de interesses: Nada a declarar.

Resumo Introdução: A composição da flora microbiana do homem é influenciada por diversos fatores, entre os quais se destaca a alimentação praticada. Desde o início da vida verificase que a escolha dos produtos alimentares benéficos para a flora intestinal, como os probióticos e os prebióticos, é fundamental para garantir a saúde intestinal e consequentemente a saúde e bem-estar em geral, assim como têm um papel primordial na prevenção de doenças. Objetivo: Realizar uma breve revisão bibliográfica sobre a importância da alimentação na flora intestinal do homem. Métodos: Foi realizada uma pesquisa bibliográfica sistemática nas bases de dados Pubmed e Scielo, entre Abril e Setembro de 2015, utilizando como palavras-chave os termos: human microbiote and nutrition, probiotic and prebiotic, human microbiote and obesity, fibra alimentar, alimentação e flora microbiana intestinal, flora microbiana intestinal composição, e flora microbiana intestinal e obesidade. A pesquisa originou cerca de 2000 artigos, tendo sido selecionados 27 artigos. Conclusão: A alimentação é um fator fundamental a ter em conta na manutenção de uma flora microbiana saudável, e na saúde e bem-estar em geral. Palavras-chave: flora microbiana do homem, alimentação, prebióticos, probióticos.

Abstract Introduction: The composition of the human microbial flora is influenced by several factors, among which the practiced alimentation stands out. Since the beginning of life, it is known that the choice of beneficial food for the intestinal flora, such as probiotics and prebiotics, is essential to ensure intestinal health and consequently the health and wellbeing of the human body in general, and it has a key role in the prevention of diseases. Objective: To conduct a brief bibliographical review on the importance of food in the human intestinal flora. Methods: A systematic bibliographical search was carried out in the Pubmed and the Scielo databases, between April and September 2015, using as keywords the terms "human microbiote and nutrition", "probiotic and prebiotic", "human microbiote and obesity", "dietary fiber", "alimentation and intestinal microbial flora", "intestinal microbial flora composition" and "intestinal microbial flora and obesity. " The search resulted in about 2000 articles and 27 of them were selected. Conclusion: The alimentation is a key factor to consider to when maintaining a healthy microbial flora, maintaining health and well-being in general. Keywords: microbial flora of the human body, food, prebiotics, probiotics.

Lista de abreviaturas FAO Food and Agriculture Organization (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura) OMS Organização Mundial de Saúde Ig Imunoglobulina FOS Frutooligossacarídeos GOS Galacto-Oligossacarídeos AGCCs Ácidos Gordos de Cadeia Curta HMG-CoA 3-hidroxi-3-methyl-glutaril-CoA NK Natural Killer UHT Ultrapasteurização DAA Diarreia Associada à Diarreia ECN Enterocolite Necrosante ISAPP Inernational Scientific Association for Probiotics and Prebiotics (Associação Científica Internacional de Probióticos e Prebióticos) SIC Síndrome do Intestino Curto ACC acetil-coa Carboxilase FAS ácido gordo síntase ChREBP carbohydrate responsive elements binding protein SREPP Sterol responsive elemento binding protein LPS lipopolissacarídeos

CD14 receptor utilizado na deteção de LPS TLR4 Toll like receptor FIAF fasting-induced Adipose Factor LPL lípase lipoproteica

Índice 1. Introdução 1 2. Métodos 2 3. A flora intestinal microbiana 3 3.1. Composição 3 3.2. Desenvolvimento 3 3.3. Quais os fatores que influenciam a composição da flora? 4 3.4. Qual a importância de uma microflora saudável? 6 3.5. Fermentação e Metabolismo Bacteriano 7 4. Probióticos e Prebióticos 8 4.1. Probióticos 8 4.1.1. Conceito e história 8 4.1.2. Classificação de probióticos 10 4.1.3. Função dos probióticos 10 4.1.4. Aplicação de probióticos nos alimentos 13 4.1.5. Impacto dos probióticos na saúde 16 4.1.6. Impacto específico no trato gastrointestinal 16 4.2. Prebióticos 19 4.2.1. Conceito e história 19 4.2.2. Fibra alimentar e prebióticos 20 4.2.3. Impacto dos prebióticos na saúde 21 4.2.4. Impacto específico no trato gastrointestinal 21 4.2.5. Relação entre prebióticos e nutrição do recém-nascido 21 5. Simbióticos 22 5.1. Aplicação em alimentos 23 6. A relação da flora microbiana intestinal com a obesidade 24 7. Conclusão 26 8. Bibliografia 27

1. Introdução A alimentação é um dos fatores comportamentais mais influentes na saúde e qualidade de vida de um indivíduo. Este fato tem vindo a ser constantemente provado pelos estudos efetuados na área da saúde e da nutrição, sendo que esta última é uma área em ascensão, alvo de grande interesse por parte dos mais diversos profissionais de saúde e por parte da população em geral, que procura cada vez mais compreender este elemento tão fundamental e básico da vida. Um corpo e uma composição corporal adequados e saudáveis, num indivíduo, envolvem diversos fatores e no que concerne à alimentação, valoriza-se desde a quantidade de alimentos ingerida à sua composição nutricional, não esquecendo todo o processo digestivo envolvente. É preciso nutrir o organismo, fornecendo-lhe o necessário e essencial ao seu bom funcionamento e ainda garantir que os alimentos são bem digeridos, absorvidos e utilizados. Este processo é fundamental para obter o melhor estado físico, mental e emocional. O trato gastrointestinal alberga a flora microbiana (também denominada de flora intestinal, microbiota ou microbioma), um ecossistema bacteriano colonizado no intestino do Homem. Neste órgão existe um maior número de microorganismos do que o total de células eucarióticas presentes no corpo humano, sendo que por grama de conteúdo luminal encontram-se cerca de 10 10 a 10 12 miicroorganismos (cit in Brandt K., Sampaio M. e Miuki C., 2015) 1,2. As suas funções são variadas e de grande importância, e as pesquisas que envolvem este sistema têm vindo a aumentar, não sendo ainda a sua composição totalmente conhecida. A sua formação inicia-se no momento do parto, atingindo a maturidade entre os dois e os três anos de idade, denominando-se nesta fase de flora tipo adulto. Em 1977 redefiniu-se flora intestinal, dividindo esta em duas categorias, a flora autóctone e a alóctone, sendo a primeira a flora microbiana residente, que coloniza o intestino, e a segunda a microbiota transitória que passa pelo intestino, mas não o coloniza. A composição da flora microbiana intestinal é influenciada por vários fatores, neste artigo destaca-se a importância da alimentação, num ângulo que abrange desde a fase da lactação, passando pela introdução dos primeiros alimentos, até à alimentação do indivíduo ao longo da vida. Probióticos e prebióticos têm um lugar de destaque nesta 1

análise, uma vez que o seu papel na saúde humana, em especial na manutenção de uma flora intestinal saudável, é de grande importância. Probióticos são definidos como micro-organismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, proporcionam benefícios à saúde do hospedeiro (FAO/OMS, 2001) 3. A sua aplicação nos alimentos passa sobretudo pelos produtos lácteos, pela soja e ainda pelo chucrute, embora, as ofertas no mercado tenham vindo a sofrer um acréscimo incremental, observando-se uma enorme aposta na inovação e na diferenciação. Pode também ser efetuada a suplementação destes microorganismos, em cápsula, comprimido ou em pó. Prebióticos, por sua vez, são oligossacarídeos fermentáveis (como os fruto-oligossacarídeos e a inulina), também classificados como alimentos funcionais, uma vez que o seu consumo resulta na melhoria da saúde e redução do risco de aparecimento de diversas doenças. São ainda referidos, por último, os simbióticos, produtos alimentares que combinam prebióticos e probióticos na sua composição, com o objetivo de aumentar e potenciar os efeitos benéficos de ambos. Estudos recentes têm ainda associado o estado da flora microbiana intestinal ao estado inflamatório verificado na obesidade. De entre as várias funções da flora microbiana, encontra-se o seu papel nas características metabólicas do organismo e, naturalmente, a relação incontornável com a alimentação. Neste sentido, são mais uma vez referidos os prebióticos e probióticos e os benefícios que estes podem ter na prevenção deste tipo de patologia. Hipócrates referia que todas as doenças têm início no intestino. Tal afirmação não teve comprovação científica até hoje, mas de facto, reside verdade no papel absolutamente fundamental deste órgão no equilíbrio e pleno bem-estar do Homem. 2. Métodos Realizou-se uma revisão de literatura no âmbito do tema Importância da alimentação na flora microbiana do homem, tendo sido utilizadas como bases de dados a PubMed e o Scielo, para uma pesquisa efetuada entre Abril e Setembro de 2015. As palavras-chave utilizadas na PubMed foram human microbiote and nutrition, probiotic and prebiotic e human microbiote and obesity e no Scielo utilizou-se fibra alimentar, alimentação e flora microbiana intestinal, flora microbiana intestinal composição, e flora microbiana intestinal e obesidade. A pesquisa originou cerca de 2000 artigos sendo que 1400 foram encontrados na base de dados PubMed e 80 no Scielo. Destes 2

artigos, selecionaram-se para revisão de literatura 27. Foram utilizados artigos nas línguas portuguesa e inglesa, apenas. Por outro lado, excluíram-se os não diretamente relacionados com alimentação e nutrição, bem como os artigos repetidos. 3. A flora intestinal microbiana 3.1. Composição O trato gastrointestinal alberga o maior número e a maior diversidade de espécies de bactérias que colonizam o corpo humano 1. As bactérias distribuem-se de forma heterogénea, sendo que o estômago e o intestino delgado são os órgãos com condições menos favoráveis à sua proliferação, devido a diversos fatores, como a ação do suco gástrico, do suco biliar, da secreção pancreática e o intenso peristaltismo do intestino delgado. No cólon (intestino grosso), por sua vez, esta é abundante 1. O cólon possui as condições ideais para a proliferação bacteriana: o peristaltismo lento, a ausência de secreções intestinais e o abundante suporte nutricional. Desta forma, neste órgão, comparativamente, há um maior número de microorganismos do que as células eucarióticas presentes em todo o corpo humano, sendo que por grama de conteúdo luminal existem cerca de 10 10 a 10 12 miicroorganismos (cit in Brandt K., Sampaio M. e Miuki C., 2015) 1,2. Estima-se que a flora microbiana do cólon seja composta por cerca de 300 a 500 diferentes espécies de bactérias, estando maioritariamente representados os géneros bacterióides, Bifidobacterium, Eubacterium, Clostridium, Peptococcus, Peptostreptococcus e Ruminococcus 1. 3.2. Desenvolvimento O intestino do feto, banhado pelo líquido amniótico, é absolutamente estéril, sendo que a sua colonização inicia-se no nascimento do recém-nascido, quando este é exposto a diversas espécies de microorganismos transmitidos pela mãe (canal vaginal e região perineal) e no meio ambiente externo. A partir desta altura, a colonização intestinal ocorre progressivamente, estabilizando apenas entre os dois e os três anos de idade, quando é formada a flora tipo adulto. A partir desta altura a flora intestinal mantém-se estável, 3

embora o contacto com microorganismos do meio ambiente seja constante ao longo da vida 3. O desenvolvimento da microflora do recém-nascido é um processo progressivo e que ocorre lentamente, sendo influenciado por uma série de fatores que ocorrem simultaneamente e interagem entre si. Fatores estes, que influenciam o tipo de microorganismos que se estabelecem, podendo ser do tipo intrínseco (saúde do recémnascido; o seu estado imunológico; o trânsito intestinal; o estado das células intestinais descamação; proteínas e outros compostos presentes no sangue e ainda os níveis de ureia) ou do tipo extrínseco (alimentação da mãe desde a gestação inclusão ou não de probióticos na dieta é relevante; o tipo de parto e aleitamento; prematuridade; condições de higiene/contaminação ambiental; introdução precoce de alimentos sólidos; utilização de antibióticos e ainda a herança genética) 2. Uma flora microbiana saudável é definida como aquela que conserva e promove o bem-estar e a ausência de doenças, especialmente do trato gastrointestinal, embora existam especialistas nesta área, que defendem a inexistência deste conceito, uma vez que a flora microbiana está constantemente sujeita a inúmeras variações interindividuais, refutando a ideia de uma composição microbiana ideal 4. Como foi referido, a microflora intestinal é facilmente influenciada por vários fatores, no entanto, existem bactérias capazes de colonizar o local de forma permanente, a chamada flora autóctone. Estas bactérias têm locais de adesão específicos, determinados geneticamente, aos quais permanecem ligadas durante toda a vida de forma estável. Já as espécies alóctones são o oposto das anteriores, são exteriores ao ecossistema intestinal e não têm determinado geneticamente qualquer recetor, estas são assim, transitórias 2,5. 3.3. Quais os fatores que influenciam a composição da flora microbiana? A idade do individuo é um fator com grande influencia na adesão das bactérias à mucosa intestinal, verificando-se características muito próprias no início da vida e na velhice. Nomeadamente, no período neonatal estas aderem facilmente e de forma firme à mucosa, enquanto que na velhice ocorre o oposto, esta propriedade enfraquece e o número de bactérias diminui drasticamente (cit in Andrade A., 2009/2010) 2. 4

O tipo de parto influencia a formação e estabelecimento da microflora no recémnascido. Um parto vaginal implica que o canal de parto esteja contaminado pela flora materna que, por sua vez, irá interferir na flora microbiana da criança. Já o parto por cesariana, não é influenciado por este tipo de contaminação, pois não há qualquer participação da flora materna. Nesta última situação, o meio ambiente é a fonte inicial de contaminação. Nas crianças que nascem por parto de cesariana, o estabelecimento da flora estável ocorre de forma mais tardia do que nas crianças nascidas por parto vaginal. Estas diferenças podem ser detetadas até aos seis meses de vida (cit in Andrade A., 2009/2010; Wells CL., Barton RG., Wavatne CS., Dunn DL. e Cerra FB., 1992; Vanderhoof JA. e Young RJ., 2004) 2,5,6. Depois do nascimento e do tipo de parto, o fator mais importante no estabelecimento e manutenção de uma flora intestinal saudável reside na alimentação. No primeiro dia de vida do recém-nascido, as primeiras bactérias colonizam o intestino, sendo estas as enterobactérias aeróbias e anaeróbias facultativas (E.coli), que aproveitam a escassez de oxigénio, derivada do processo de sucção (inerente à amamentação). Posteriormente, o crescimento bacteriano será distinto entre crianças alimentadas com o leite materno ou com leite de fórmula. O leite materno cria um ambiente favorável para o crescimento das bifidobactérias, típicas dos latentes, já as crianças alimentadas por leite de fórmula artificial possuem uma flora microbiana mais diversa, no entanto, as bifidobactérias e algumas bactérias aeróbias e anaeróbias não predominam. Justifica-se esta diferença com diversos fatores e caraterísticas relacionados com o leite materno: a sua ação imunológica (IgA secretória, lisozima, lactoferrina e nucleotídeos), inibe a flora patogénica; este é ainda responsável pelo meio (ácido) intestinal, que potencia o crescimento das bifidobactérias; a quantidade pouco abundante de ferro, associada à grande biodisponibilidade e fácil absorção deste composto (promovida pela lactoferrina), fazem com que o ferro residual disponível no lúmen intestinal não suprima as necessidades das bactérias em geral (sendo prescindível para as bifidobactérias e enterobactérias, estas são as que mais proliferam no intestino) 2,6,7. Durante o desmame, quando são introduzidos alimentos sólidos pela primeira vez, a flora intestinal readapta-se a esta nova situação, predominando nesta fase as bactérias anaeróbias. No final do primeiro ano de vida o número de bifidobactérias assemelha-se em ambos os tipos de aleitamento, e entre os dois e os três anos a criança adquire uma 5

microflora intestinal semelhante à do adulto, em número e em composição (cit in Susuki K., Meek B., Dói Y., Muramatsu M., Chiba F., Honjo T. et al, 2004) 7. Existem ainda estudos, com recurso a gémeos adultos monozigóticos, que apontam para a influência genética na seleção bacteriana inicial no trato gastrointestinal (cit in Bourlioux P., Koletzko B., Guarner F. e Braesco, V., 2003) 8. O uso de antibióticos é ainda um fator a ser considerado nesta temática, uma vez que pode alterar a composição bacteriana, quando utilizados por um tempo prolongado ou em doses elevadas 8. 3.4. Qual a importância de uma flora microbiana saudável? Estudos recentes comprovam que a microflora do cólon apresenta um papel absolutamente vital na saúde humana 1. As suas funções são variadas, desde metabólicas/nutricionais, antibacterianas, imunomodeladoras e protetoras da mucosa. No entanto, esta contém também associados fatores de virulência que podem causar danos à célula intestinal ou terem um comportamento comensal (relação entre organismos, na qual uma das espécies é beneficiada e a outra não é prejudicada), como é o caso de alguns organismos que em condições propícias podem produzir toxinas, tornando-se patogénicos (cit in Andrade A.,2009/2010; Bourlioux P., Koletzko B., Guarner F. e Braesco, V., 2003; Liévan V., Peiffer I., Hudault S., Rochat F., Brassat D., Neeser JR et al, 2000) 2,8,9. A absorção dos nutrientes no intestino é influenciada pelas bactérias intestinais, sendo que estas permitem um melhor aproveitamento dos mesmos. Esta situação acontece frequentemente com os hidratos de carbono que são mal digeridos antes de chegarem ao lúmen intestinal. Neste local, são fermentados formando ácidos absorvíveis pela mucosa. Este processo origina ácidos gordos de cadeia curta, a principal fonte de energia das células colonócitas. Estas bactérias têm ainda participação na síntese de vitamina K e outras funções nutricionais/metabólicas 4. As bactérias autóctones têm um papel antibacteriano, protegendo o intestino de agentes patogénicos. Os principais mecanismos utilizados consistem na ocupação dos locais de adesão da mucosa pela flora autóctone, a competição por nutrientes disponíveis no meio e ainda a produção de substâncias restritivas pela flora autóctone, que previnem o crescimento de metabolitos tóxicos 4,10,11. 6

A flora microbiana apresenta ainda funções imunomodeladoras, sendo crucial no desenvolvimento do tecido linfoide intestinal 11,12. Este tecido reconhece as espécies de bactérias e substâncias que são desejáveis, adquirindo respostas de tolerância imunológica 11. 3.5. Fermentação e Metabolismo Bacteriano Todos os microorganismos, como qualquer organismo vivo, precisam de uma fonte de energia para alimentar-se, crescer e reproduzir. Alguns destes microorganismos fermentam hidratos de carbono como forma de obtenção de energia, um processo que o homem também utiliza na obtenção de produtos alimentícios. São exemplos deste processo: a produção de vinho, na qual as leveduras fermentam os açúcares contidos na uva para produzir álcool; na produção de iogurtes, as bactérias lactobacilos e streptococos fermentam o açúcar do leite (lactose), transformando-o em ácido láctico; para a conservação do chucrute, as bactérias naturalmente presentes no repolho fermentam os açúcares transformando-os em ácido láctico, na ausência de oxigénio e na presença de sal. Semelhantemente, os microorganismos presentes na primeira parte do cólon suprem as suas necessidades de energia através da fermentação de resíduos alimentares e endógenos que resultam da digestão e absorção no trato gastrointestinal superior. São metabolizados hidratos de carbono e fibras alimentares, incluindo polissacarídeos (pectinas, hemiceluloses, gomas, inulina e amidos resistentes), oligossacarídeos (rafinose, estaquiose, FOS, GOS e dextrinas resistentes), açucares (lactulose, lactose não absorvida e frutose não absorvida) e polióis (manitol, lactitol, maltitol e isomalte) 3. As principais espécies bacterianas que fermentam hidratos de carbono pertencem aos géneros Bacteroides, Bifidobacterium, Ruminococcus, Eubacterium e Lactobacillus. Esta ação microbiana resulta na produção de ácidos gordos de cadeia curta (AGCCs), ácido acético, ácido propiónico, ácido butírico e ácido láctico. Os AGCCs são absorvidos, melhorando a captação de água e sais, e usados como fonte de energia pelo hospedeiro. O ácido butírico é também a principal fonte de energia das células epiteliais que revestem o cólon e podem influenciar o crescimento e diferenciação celular 3. A produção de gases (hidrogénio, metano e dióxido de carbono) podem contribuir para o equilíbrio microbiano, no entanto são também os responsáveis pela flatulência e distensão, quando existe um consumo elevado de substratos fermentáveis. 7

À medida que aumentam em número, as bactérias contribuem para a formação do bolo fecal no reto. Uma boa formação do bolo fecal relaciona-se com um trânsito intestinal mais rápido e um menor risco de constipação e cancro do intestino. Embora as fontes de fibra alimentares não fermentáveis, como o farelo de trigo, sejam as que mais contribuem para a formação do bolo fecal, a massa bacteriana que resulta da fermentação de fibras alimentares mais solúveis e resíduos de hidratos de carbono também contribuem para a formação das fezes 1. 4. Probióticos e Prebióticos Saúde intestinal, prebióticos e probióticos são conceitos intimamente ligados, e várias publicações científicas se dedicam a explicar a importância e a função destes microorganismos no ser humano. 4.1. Probióticos 4.1.1. Conceito e história Por definição, probióticos (origem no latim pro que significa a favor e do grego bios que significa vida ) são microorganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, proporcionam benefícios à saúde do hospedeiro (FAO/OMS, 2001) 3. Esta palavra foi usada pela primeira vez em 1954, por Ilya Metchnikoff, um cientista russo, prêmio Nobel, e professor do Instituto Pasteur em Paris, tentando descrever substâncias necessárias para uma vida saudável. As suas opiniões tornaram-se relevantes até hoje: ( )A dependência dos microorganismos intestinais em relação aos alimentos possibilita que sejam adotadas medidas para modificar a microbiota no nosso corpo e trocar microorganismos nocivos por micro-organismos úteis( ) (...)pesquisas sistemáticas devem ser conduzidas para esclarecer a relação entre microorganismos intestinais e o envelhecimento precoce, e a influência de dietas que previnem 8

a putrefação intestinal na longevidade e na manutenção das forças que atuam no nosso corpo( ) 3,4. Também o pediatra francês Henry Tissier, pertencente ao instituto Pasteur, formulou uma hipótese ao realizar um estudo que incluía crianças com diarreia. O médico isolou pela primeira vez uma bifidobactéria de um latente alimentado pela mãe, à qual denominou Bacillus bifidus communis. Tissier verificou, durante este estudo, que as fezes das crianças com diarreia continham menos bifidobactérias relativamente a crianças com ausência da mesma. O pediatra postulava que estas bactérias seriam as responsáveis pelo tratamento e restauração de uma flora intestinal normal, recomendando a sua administração a lactentes que sofriam deste problema intestinal. A sua teoria defendia que as bifidobactérias conseguiam combater as bactérias proteolíticas responsáveis pela diarreia, eliminando-as 3,4. Os trabalhos de Metchnikoff e Tissier foram os primeiros a apresentarem propostas ao uso de bactérias probióticas na ciência. Em 1965, Lilly & Stillwel utilizaram o termo probiótico para denominar substâncias secretadas por protozoários (organismos eucarióticos) que estimulavam o crescimento de outros, e em 1974, Parker descrevia probióticos como suplementos alimentares destinados a animais, incluindo microorganismos e substâncias que afetam o equilíbrio da microbiota intestinal. Também Fuller (1989) considerou probióticos como suplementos alimentares para animais, que continham bactérias vivas produtoras de efeitos benéficos no organismo, assim como Havenaar & Huis In t Veld (1992) consideraram que estas eram culturas únicas ou mistas de microorganismos que, administrados a animais ou humanos, produziam efeitos benéficos no hospedeiro por incremento das propriedades da microbiota nativa. Os autores acima citados restringiram o uso do termo probióticos a produtos que contém microorganismos viáveis que promovem a saúde de humanos e animais, exercendo efeitos positivos no sistema gastrointestinal, trato respiratório superior e trato urogenital (cit in Fioromanti J., Theodorou V e Bueno L., 2003) 13. Em 2001, Schrezenmeir & De Vrese propuseram que probiótico deveria ser usado para designar produtos que contém microorganismos viáveis definidos e em quantidade adequada, que alteram a flora microbiana própria das mucosas por implantação ou 9

colonização de um sistema de hospedeiro, e que produzem efeitos benéficos na sua saúde (cit in Santos, AC., 2010) 14. Atualmente, a definição de probiótico adotada é a da FAO/OMS, afirmando ainda que estes microorganismos correspondem entre a 1% a 13% da flora microbiana do homem. 4.1.2. Classificação dos probióticos Os probióticos mais utilizados são estirpes de bactérias produtoras de ácido láctico, como Lactobacillus (bactérias anaeróbias facultativas e gram positivas, que normalmente são predominantes no intestino delgado) e Bifidobacterium (bactérias aeróbias estritas ou anaeróbias, gram positivas e presentes no cólon) (ci in Barbosa F., Henrique F., Martins S., Barbosa J., Paula L. and Nicoli JR., 2010) 15. O género Bifidobacterium divide-se em vários tipos de bactérias, das quais se destacam Lb. Acidophilus, Lb helveticus, Lb. casei, Lb. paracasei, Lb. fermentum, Lb. reuteri, Lb. johnsonii, Lb. plantarum, Lb. rhamnosus e Lb. salivarius (cit in Saad, S., 2006) 16. Também a levedura Saccharomyces cerevisiae e algumas espécies de E. coli e Bacillus são utilizadas como probióticos. 4.1.3. Função dos probióticos Ao serem ingeridos através dos alimentos, os probióticos migram até ao intestino, local onde se somam à flora microbiana existente, contribuindo para o equilíbrio da mesma. A relação entre o probiótico e o hospedeiro é de simbiose, ou seja, vantajosa para ambos os elementos. As suas principais funções passam pela vertente nutricional, digestiva, cardiovascular, metabólica e, de grande importância, a imunomoduladora. No âmbito nutricional, salienta-se a síntese de vitaminas do complexo B (B1, B2, B3, B5, B6, ácido fólico e B12) e de vitamina K. A nível digestivo, os probióticos interferem na síntese das enzimas digestivas como a lactase (responsável por metabolizar a lactose) e proteases/peptidases (responsável pela quebra de ligações peptídicas entre 10

aminoácidos). Têm ainda grande impacto na regulação do trânsito intestinal e na absorção de nutrientes 16,17. A contribuição dos probióticos para a saúde cardiovascular, passa essencialmente pelo papel que estes têm no controlo dos níveis de colesterol e triglicerídeos no sangue. O controlo destes valores é absolutamente necessário, uma vez que o seu desequilíbrio é associado a problemas cardiovasculares 16. As bactérias probióticas produzem ácidos gordos de cadeia curta (AGCCs), substratos metabólicos dos colonócitos que promovem, em condições ideais, 40 a 50% da energia requerida pelos mesmos. Participam também na síntese da enzima citocromo P450, responsável pela expressão génica do citocromo P450 no fígado, e ainda, evitam a ressíntese de hormonas já degradadas convertendo flavonoides às suas formas ativas. Estima-se que estas substâncias tenham um efeito inibitório sobre a HMG-CoA (3- hidroxi-3-metyl-glutaril-coa redutase, enzima participante no metabolismo do colesterol), reduzindo a produção deste composto. Há ainda participação dos probióticos na metabolização de alguns medicamentos e xenobióticos 16,17. No seu papel imunomodelador, as bactérias probióticas estimulam a clonagem de linfócitos e previnem a sua apoptose, sendo portanto fundamentais no desenvolvimento do sistema imunitário. Produzem ainda substâncias antimicrobianas que atuam sobre uma vasta gama de microorganismos patogénicos, dificultando a instalação dos mesmos e previnem a adesão de substâncias patogénicas, competindo pelos locais de adesão. Estas bactérias contribuem para a manutenção da barreira da mucosa intestinal, assim como atuam na produção de anticorpos (IgA intestinal e sérica), na atividade de fagócitos e na dos linfócitos NK. Reduzem também a produção intestinal de citocinas pró-inflamatórias e aumentam a produção de citocinas anti-inflamatórias 3,16,17. Na figura 1 está resumido o papel dos probióticos no organismo e os benefícios que o seu consumo representa para o ser humano. 11

Figura 1 Benefícios do consumo de probióticos na saúde humana (cit in Santos, AC., 2010) 15 Os fatores que influenciam a composição da flora microbiana intestinal, assim como as funções dos microorganismos presentes, são vários, como referido anteriormente. A idade, o trânsito intestinal, o ph intestinal, a disponibilidade de material fermentável, a interação entre componentes da microbiota, a suscetibilidade a infeções, o estado imunológico, as necessidades nutricionais, o uso de antibióticos e substâncias imunossupressoras. Destaca-se o fato de seis destes dez fatores se relacionarem diretamente com a nutrição realizada pelo indivíduo 15. 12

4.1.4. Aplicação de probióticos nos alimentos Os organismos probióticos são utilizados numa vasta gama de alimentos, principalmente, no grupo dos laticínios, assim como também se encontram disponíveis em suplementos alimentares (cápsulas, comprimidos,...). A regra básica da adição de probióticos a qualquer conteúdo alimentar passa, sem dúvida, pela quantidade. Relembrase que, segundo a OMS, um probiótico tem efeitos benéficos no organismo quando administrado na quantidade correta. - Aspetos gerais sobre a elaboração de produtos lácteos probióticos: O método de processamento dos produtos alimentícios é delineado de forma a garantir a melhor qualidade alimentar e maior eficiência do produto possíveis. Inicia-se o procedimento pela seleção da estirpe que mais se adequa às condições inerentes ao mesmo (cit in Carvalho E., Soares A. e Soares, L., 2012) 18,, uma vez que se pretende a sobrevivência das bactérias probióticas no alimento. Os laticínios contribuem para esta sobrevivência, essencialmente devido ao seu efeito tamponante e protetor, que protege as bactérias da ação do suco gástrico 18,19,20. Além da seleção adequada de estirpes de bactérias, são consideradas as tecnologias de fermentação, de secagem e de microencapsulação, altamente influentes na funcionalidade dos probióticos 18. A ação destes microorganismos durante o processo de fermentação dos produtos lácteos pode resultar nas seguintes características: 1) conservação do leite, resultante da produção de ácido lático e, possivelmente, de outros compostos antimicrobianos; 2) produção de compostos aromáticos (como o acetaldeído no iogurte e no queijo) e outros metabolitos (como os polissacarídeos extracelulares), que irão enriquecer o produto com as propriedades sensoriais desejadas pelo consumidor; 3) melhoria do valor nutricional do produto alimentício através, por exemplo, da libertação de aminoácidos livres ou da síntese de vitaminas e 4) fornecimento de propriedades terapêuticas ou profiláticas. Entretanto, é importante considerar que as culturas probióticas podem ou não desenvolver tais características, dependendo de vários fatores, como o tipo de cultura utilizada. O objetivo, na produção industrial de produtos probióticos, é garantir a viabilidade do alimento durante o armazenamento, requisito este que é desafiado pela sensibilidade 13

das bactérias à exposição ao oxigénio, calor e ácidos. Desta forma, existem produtos com menor vida de prateleira, como o iogurte e leites fermentados, contrariamente ao queijo tipo Cheddar, que apresenta uma maior resistência e durabilidade 18,21. - Alimentos enquanto probióticos: As bebidas lácteas são a primeira e mais tradicional fonte de probióticos utilizadas, embora ultimamente mais e diferentes fontes destes microorganismos sejam exploradas pela industrial alimentar. Entende-se por bebida láctea (segundo a o Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de Produto Lácteo) o produto lácteo resultante da mistura do leite (in natura, pasteurizado, esterilizado, UHT, reconstituído, concentrado, em pó, integral, semidesnatado ou parcialmente desnatado e desnatado) e soro de leite (líquido, concentrado e em pó) adicionado ou não de produto(s) ou substância(s) alimentícia(s), gordura vegetal, leite(s) fermentado(s), fermentos lácteos selecionados e outros produtos lácteos. A base Láctea representa pelo menos 51% (cinquenta e um por cento) massa/massa (m/m) do total de ingredientes do produto. Seguidamente, enunciam-se os principais produtos inseridos nesta categoria 18,20,21. O leite fermentado é um produto, adicionado ou não de outras substâncias alimentícias, obtido por coagulação e diminuição do ph do leite, adicionado ou não de outros produtos lácteos, por fermentação láctica mediante ação de microrganismos específicos cultivados. Estes microrganismos específicos devem ser viáveis, ativos e abundantes no produto final, durante todo o seu prazo de validade. São considerados leites fermentados o iogurte, o kefir, kumys, a coalhada, entre outros 18,20,21. O iogurte é um leite fermentado obtido através da ação da Lactobacillus bulgaricus e Streptococcus thermophilus, que realizam este processo numa relação de simbiose. Durante a sua produção, a lactose é degradada em ácido láctico, o que permite o consumo deste produto pelas pessoas intolerantes à lactose. O iogurte líquido possui uma quantidade mais concentrada destas bactérias (L. bulgariu e S. thermophilus), tendo por isso um papel preponderante na recomposição da flora intestinal. Esta bebida contém 51% de soro de leite, o que justifica a sua consistência mais líquida relativamente ao iogurte sólido, uma vez que este último contém 100% de soro. 14

O queijo apresenta um ph superior ao do leite fermentado, o que o torna um veículo mais adequado para determinadas espécies probióticas. Para além do ph, o queijo possui um matriz sólida, eficiente na proteção destas bactérias, aumentando assim o seu tempo de prateleira e resistência no organismo humano (cit in Cani PD. e Delzenne NM, 2007) 22. Queijos Cheddar, Gouda, Cottage, Crescenza e cremoso foram testados como veículos para as bactérias Lactobacillus e de Bifidobacterium, revelando-se apropriados (cit in Cani PD. e Delzenne NM, 2007) 22. O kefir, também conhecido como quefir, tibicos, cogumelos tibetanos, plantas de iogurte ou cogumelos do iogurte, é um leite fermentado produzido a partir dos grãos de kefir. Os grãos de Kefir são constituídos por leveduras fermentadoras de lactose (Kluyveromyces marxianus) e leveduras não fermentadoras de lactose (Saccharomyces omnisporus, Saccharomyces cerevisae e Saccharomyces exiguus), Lactobacillus casei, Bifidobaterium sp e Streptococcus salivarius subsp thermophilus. Os grãos de kefir são capazes de fermentar diversos alimentos, como leite de vaca, cabra, ovelha, búfala, açúcar mascavado, sumos de frutas, extrato de soja, entre outros. A produção da bebida ocorre diretamente pela adição dos grãos no substrato, e de forma geral, o sabor e o aroma do kefir são resultados da atividade metabólica simbiótica das bactérias e das leveduras que se encontram naturalmente nos grãos. Atualmente, são conhecidos dois tipos de kefir: de água e de leite. A ausência de lactose neste produto torna-o ainda uma opção viável nas situações de intolerância 22. A associação entre probióticos e produtos lácteos é partilhada de forma geral e até mais comum, mas existem outras fontes destes microorganismos. É o caso do chucrute, um repolho fermentado. Durante o processo de fermentação do chucrute ocorre a libertação de ácido láctico, o que o torna um alimento probiótico, uma vez que contem microorganismos como o Lactobacillus plantarum. A soja é também uma alternativa a utilizar como fonte de probióticos. A fermentação neste produto é viável, uma vez que aumenta o seu valor nutricional e ao mesmo tempo melhora a sua apetibilidade por parte do consumidor, pois tem como característica mascarar sabores e odores menos atrativos inerentes à soja. São frequentemente utilizados fungos para este processo mas existe ainda a possibilidade da adição de bactérias probióticas 18. Deste produto podem derivar ainda subprodutos como 15

natto, tempeh e miso, também eles fornecedores de probióticos (cit in Carvalho E., Soares A. e Soares, L., 2012) 18. 4.1.5. Impacto dos probióticos na saúde Os benefícios na saúde do hospedeiro, derivados da ingestão de culturas probióticas são vários e podem resumir-se da seguinte forma: o controlo da microbiota intestinal; a estabilização da mesma após o uso de antibióticos; a promoção da resistência gastrointestinal à colonização por substâncias patogénicas; a diminuição da população de patogénios através da produção de ácido acético e lático, de bacteriocinas e de outros compostos antimicrobianos; a promoção da digestão da lactose em indivíduos intolerantes à lactose; a estimulação do sistema imune; o alívio da obstipação; o aumento da absorção de minerais e produção de vitaminas. São ainda atribuídos efeitos mais específicos e alvo de vários estudos, a estas culturas, como a diminuição do risco de cancro do cólon (verificou-se através de alguns estudos que os produtos simbióticos são ainda mais eficazes nesta prevenção do que a administração dos probióticos ou prebióticos isoladamente), de complicações cardiovasculares e a prevenção da Síndrome do Intestino Irritável (verificaram-se melhorias de sintomas quando administradas culturas probióticas, já os benefícios associados às culturas prebióticas ainda não foram comprovados). Aponta-se também, para a diminuição das concentrações plasmáticas de colesterol (relacionando-se com a prevenção de doenças cardiovasculares), efeitos antihipertensivos, redução da atividade ulcerativa de Helicobacter pylori, controle da colite induzida por rotavírus e por Clostridium difficile, a prevenção de infeções urogenitais e ainda capacidade de efeito inibitório sobre a mutagenicidade 4,18. 4.1.6. Impacto específico no trato gastrointestinal A má absorção da lactose é um dos problemas mais verificados a nível gastrointestinal. A lactose, ou açúcar do leite, é aproveitada pelos bebés como fonte de energia (cerca de 10%), no entanto, nos adultos é muito frequente a intolerância a este açúcar, devido à quantidade insuficiente da enzima lactase (responsável dela degradação da lactose) no organismo. Esta lactose não digerida é fermentada no cólon, resultando em efeitos gastrointestinais como dor abdominal, inchaço, diarreia, entre outros. Há evidências de que as bactérias vivas presentes no iogurte são capazes de digerir a lactose, podendo compensar a ausência de lactase. Em casos de intolerância ligeiros a moderados, 16

esta ingestão de iogurtes pode facilitar a digestão da lactose e efetivamente melhorar e o hidrogénio libertado na respiração diminuir (uma vez que quando ocorre a digestão de hidratos de carbono não digeríveis, a concentração de hidrogénio respiratório aumenta). Esta melhoria na digestibilidade reduz os sintomas relacionado à intolerância à lactose em alguns indivíduos com má absorção 4. No entanto, é importante salientar que as intolerâncias a determinados compostos têm níveis de gravidade distintos, e numa intolerância total à lactose os produtos que contém este açúcar devem ser retirados da alimentação. Existe um impacto significativo dos probióticos nas respostas imunológicas, segundo vários estudos realizados em animais e humanos, os organismos comensais são vitais para a maturação do sistema imunológico (animais criados em ambientes isentos de germes apresentam um sistema imune subdesenvolvido). A influência de probióticos e prebióticos nas respostas imunológicas e na redução dos riscos de infeções são objeto de estudo, estimando-se que estes tragam benefícios mensuráveis para a saude 2,4. Estudos em animais demonstraram ainda que determinadas estirpes de probióticos podem melhorar a resposta imunológica às vacinas e reduzir o risco de infeções subsequentes 2,4 Quanto às infeções a nível gastrointestinal, sabe-se que o intestino delgado é o principal alvo de muitas destas situações, com tendência a contaminação por rotavírus como a S. typhirium e alguns tipos de E. coli. Os probióticos são já há muito tempo associados à capacidade de neutralizar bactérias patogénicas, e recentemente, várias estirpes potencialmente benéficas foram testadas em adultos. A diarreia é um estado gastrointestinal indissociável da flora microbiana intestinal, uma vez que afeta a sua composição e equilíbrio, essencialmente se ocorrer durante um período de tempo prolongado. Perante este estado, a primeira linha de tratamento é a reidratação oral (este processo é incontornável, principalmente em bebés), porém, em alguns quadros clínicos, a administração de probióticos pode ser feita como tratamento complementar, com a devida supervisão médica. Alguns probióticos demonstram ser mais eficazes na melhoria de sintomas quando a diarreia é provocada por infeção viral, e não bacteriana, e caso sejam utilizados na fase inicial da infeção e em quantidades apropriadas. Estudos demonstram ainda que existe um menor risco de 17

quadros de diarreia associado ao consumo de probióticos, principalmente nos países desenvolvidos, e com mais eficácia em bebés e idosos institucionalizados ou hospitalizados. A eficácia está naturalmente dependente da estirpe utilizada, sendo que determinadas estirpes utilizadas em probióticos (e alguns prebióticos) podem reduzir a diarreia dos viajantes 14. Alguns antibióticos podem perturbar significativamente as bactérias comensais intestinais, resultando em efeitos colaterais como a diarreia associada a antibióticos (DAA). Esta incidência chega por vezes a 25%, em alguns antibióticos, resultando isto no abandono do tratamento por parte do doente. Há evidências de que os probióticos podem reduzir o risco de DAA, sendo que alguns estudos demonstraram uma diminuição de 50% deste risco em adultos e idosos, apresentando as crianças resultados mais irregulares. Os estudos efetuados baseiam-se na administração de quantidades específicas de probióticos à população-amostra 2,4. Infeções pelas bactérias Clostridium difficile e Helicobacter pylori estão frequentemente associadas ao consumo de antibióticos (entre outros fatores), sendo que a utilização de probióticos como método de tratamento nestas situações está a ser alvo de estudo, com expectativas de resultados promissores. Ainda relacionado com o uso e abuso de antibióticos, também os recém-nascidos são alvo de diarreias e problemas intestinais, quando expostos a estes fármacos, devido à flora imatura que possuem. Diversos estudos apontam para o benefício dos probióticos na prevenção de algumas destas complicações, como a enterocolite necrosante (ECN), embora ainda não se verifique este método na prática clínica hospitalar 2,4,15. Existe também uma relação entre probiótico e trato respiratório. Uma série de estudos sugeriu o potencial dos probióticos na prevenção de infeções do trato respiratório superior (ITRS), bem como no alívio de sintomas e duração do quadro. Estes estudos envolveram diversas estirpes e algumas delas diminuíram a incidência da doença, outras reduziram a duração da mesma e a maioria exerceu efeitos sobre os sintomas 2,4. Há também relação entre o uso de probióticos e o trato urogenital. Demonstrouse que a administração de algumas estirpes de probióticos aumentam a eficácia do tratamento de vaginose bacteriana, tratamento este que envolve a utilização de antibióticos. Atrás deste efeito está um mecanismo que envolve o antagonismo microbiano, restauração da flora microbiana balanceada e melhoria da resposta imune 2,4. 18

Quanto aos quadros alérgicos, de uma forma breve, a alergia corresponde a uma reação de hipersensibilidade mediada por anticorpos específicos (IgE) ou mecanismos celulares. A prevalência de alergias tem aumentado nas sociedades ocidentais. Como já foi referido, há cada vez mais evidências de que a natureza da flora microbiana adquirida pelos bebés no período pós-parto tem um papel fundamental na maturação do sistema imunológico. Foram conduzidos diversos estudos sobre o impacto dos probióticos no desenvolvimento de quadros alérgicos em bebés com alto risco de doença atópica. Na maioria deles, as mães consumiram probióticos antes do parto e os bebés receberam probióticos após o nascimento, quer por aleitamento materno quer por fórmulas lácteas com adição de probióticos. Os resultados mostraram que estas crianças tiveram uma redução no risco de eczema a partir dos dois anos de idade 2,4. 4.2. Prebióticos 4.2.1. Conceito e história Reconhecidos pela primeira vez pelos japoneses, os oligassacarídeos fermentáveis foram primeiramente identificados nas rações para suínos, e mais tarde (1980) no leite humano. No entanto, só em 1995 os prebióticos foram reconhecidos como moduladores da flora intestinal microbiana. De entre as várias definições de prebiótico a mais recente e aceite é a da Associação Científica Internacional de Probióticos e Prebióticos (ISAPP), em 2010, seguidamente citado (cit in Binns N., 2013) 4. Prebióticos alimentares são ingredientes seletivamente fermentados, que resultam em alterações específicas na composição e/ou atividade de microbiota gastrointestinal, proporcionando assim benefícios à saúde do hospedeiro. Adicionalmente, o prebiótico pode inibir a multiplicação de organismos patogénicos, garantindo assim benefícios adicionais à saúde do hospedeiro. Os prebióticos atuam mais frequentemente no intestino grosso, embora possam ter também algum impacto sobre os microrganismos do intestino delgado (cit in Binns N., 2013) 4. 19

4.2.2. Fibra alimentar e prebióticos As fibras da dieta estão incluídas na ampla categoria dos hidratos de carbono, podendo ser classificadas como solúveis, insolúveis ou mistas, e ainda fermentáveis ou não-fermentáveis. Dentro destas categorias, os prebióticos correspondem aos hidratos de carbono não-digeríveis. Frutano é um termo genérico empregue para descrever todos os oligo ou polissacarídeos de origem vegetal, referindo-se a qualquer hidrato de carbono em que uma ou mais ligações frutosil-frutose predominem entre as ligações glicosídicas. A inulina e a oligofrutose, inserem-se no grupo de frutanos, correspondendo portanto a fibras solúveis e fermentáveis, não digeríveis pela α-amilase e por enzimas hidrolíticas, como a sacarase, a maltase e a isomaltase, na parte superior do trato gastrintestinal 9. Como os componentes da fibra não são absorvidos, estes penetram no intestino grosso e fornecem substrato para as bactérias intestinais. As fibras solúveis são normalmente fermentadas rapidamente, enquanto as insolúveis são lentamente ou apenas parcialmente fermentadas. A extensão da fermentação das fibras depende de sua estrutura física e química. Este processo é realizado por bactérias anaeróbias do cólon, levando à produção de ácido lático, ácidos gordos de cadeia curta e gases. Consequentemente, ocorre a redução do ph do lúmen intestinal e a estimulação da proliferação de células epiteliais do cólon 9. Dentro dos frutanos inserem-se os fruto-oligossacarídeos (FOS) e a inulina, sendo que a a maioria dos estudos efetuados sobre efeitos prebióticos relaciona-se a estes compostos e a sua oferta no mercado é vasta. As principais fontes de inulina e oligofrutose são a chicória (Cichorium intybus), alho-porro, alho, bananas, cebola, tomate, beterraba, espargos, alcachofra, centeio, aveia, trigo, mel, cerveja, açúcar mascavado, entre outros. Podem ainda estar presentes em fungos e bactérias. As bifidobactérias fermentam seletivamente os frutanos, preferencialmente a outras fontes de hidratos de carbono, como o amido, a pectina ou a polidextrose 4. A inulina, a oligofrutose e os FOS são entidades quimicamente similares, com as mesmas propriedades nutricionais. A única diferença entre estes é o grau de polimerização, ou seja, o número de unidades individuais de monossacarídeos que compõem a molécula 4. A inulina é um hidrato de carbono polidisperso, ou seja, 20