Refletindo sobre acessibilidade em ambientes virtuais de aprendizagem



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Transcrição:

Refletindo sobre acessibilidade em ambientes virtuais de aprendizagem Patrícia Scherer Bassani 1 Regina de Oliveira Heidrich 2 Resumo Diversas pesquisas vêm sendo realizadas na área da Informática na Educação, enfocando as potencialidades da Internet no processo de ensino-aprendizagem, especialmente como espaço de pesquisa, estudo, comunicação e, também, diversão. Dessa forma, considerando que a Internet possibilita oportunidades de acesso a informações diversificadas e amplia as possibilidades de trocas interpessoais, destaca-se a importância de torná-la acessível, permitindo o envolvimento de pessoas com necessidades especiais nos diferentes ambientes que nela se constituem. Nesta perspectiva, este artigo se propõe a discutir e delinear pontos referenciais de acessibilidade no desenvolvimento de ambientes virtuais de aprendizagem, enfatizando os aspectos relacionados à deficiência visual. Palavras-chave: acessibilidade, deficiência visual, ambiente virtual de aprendizagem. Abstract Researches have been done focusing on the potentialities of teaching and learning using Internet, especially for studies, communication and entertainment. Internet is increasingly being used to access diversified information and extends the possibilities of interindividual interaction. This technology makes possible new methods and aproaches to contemplate users with different necessities. The following paper presents a reflection about accessibility in virtual learnig environments, involving aspects related to visual impairment. Keywords: accessibility, visual impairment, virtual learning environment. 1 Introdução Atualmente, com a inserção das redes de computadores, especialmente da Internet, nos espaços de sala de aula, surgem novas propostas de ambientes computadorizados, que potencializam o trabalho colaborativo/ cooperativo. Muitas nomenclaturas são utilizadas para referenciar tais ambientes, como ambiente virtual de aprendizagem (AVA), VLE (virtual learning environment), ambiente digital de aprendizagem, sala de aula virtual, ambiente de ensino à distância, entre outras. Estes ambientes possibilitam a comunicação e a construção coletiva à distância, caracterizando-se como um espaço social, que se constitui a partir das interações entre os diferentes sujeitos participantes, cujos fluxos de comunicação entre os interagentes são possibilitados pela interface gráfica (VALENTINI e SOARES, 2005, p.19). Johnson (2001) aponta que, em seu sentido mais simples, a palavra interface se refere a softwares que dão forma à interação entre o usuário e o computador. Sendo assim, a interface atua como uma espécie de tradutor, mediando as duas partes, tornando uma sensível à outra (p. 17). Nesta perspectiva, o design de interface eficiente permite a um usuário isolado navegar intuitivamente através de seus documentos e aplicações, comunicando-se ocasionalmente com o mundo externo (...) (JOHNSON, 2001, p. 19). Entretanto, entende-se que o projeto de interface deve abordar utilização e navegação no ambiente a partir de diferentes perspectivas, de forma a contemplar sujeitos com necessidades especiais, sejam elas de caráter visual, auditivo, motor, mental ou físico. Diversas pesquisas vêm sendo realizadas na área de acessibilidade a ambientes de Internet, buscando oportunizar o acesso de pessoas com necessidades especiais, permitindo que estas possam perceber, entender, navegar e interagir de uma maneira efetiva na Web. Sendo assim, este artigo propõe uma reflexão sobre as questões de acessibilidade na Web e busca delinear pontos referenciais para a modelagem de softwares/ambientes virtuais que possibilitem colaboração e cooperação à distância entre sujeitos com necessidades especiais, enfatizando os aspectos relacionados à deficiência visual. 1 Professora Doutora do Centro Universitário FEEVALE. E-mail: patriciab@feevale.br. 2 Professora Doutora do Centro Universitário FEEVALE. E-mail: rheidrich@feevale.br.

LIBERATO Esta pesquisa se insere nos estudos que vêm sendo desenvolvidos (BASSANI et al., 2006) no Projeto PALCO (Portal Acessível de Linguagem Colaborativa), que visa estudar como promover o desenvolvimento da linguagem de forma que pessoas com diferentes níveis cognitivos, auditivos e visuais possam participar de um contexto de construção de narrativas. 2 Reflexões sobre acessibilidade A lei brasileira que declara a inclusão de alunos com necessidades especiais no ensino regular completou 11 (onze) anos em 2007, mas ainda tem sido negligenciada por várias escolas e segmentos da sociedade. Atualmente, há uma legislação específica que ampara as pessoas com necessidades especiais e procura concretizar o ideal de uma escola para todos. Assim, alunos com deficiência 3 podem estudar em escolas regulares, nas quais os professores buscam explorar propostas/ projetos que favoreçam o desenvolvimento social desses indivíduos, evitando seu isolamento psicológico. De acordo com o Censo de 2000 (PORTAL DA SAÚDE, 2007), estima-se que 24,5 milhões de pessoas, em torno de 14,5% da população brasileira, possuem algum tipo de deficiência. Foram incluídas na pesquisa todas as pessoas que apresentam dificuldades de visão, audição, locomoção, ou que possuem algum déficit intelectual. O conceito utilizado no censo de limitação de atividades seguiu recomendações recentes da Organização Mundial da Saúde e da Organização das Nações Unidas ONU. A tabela a seguir expõe os números. 4,1% 8,3% Censo 2000 IBGE 16,7% 22,9% Visual Motora Auditiva Mental Física Número de deficiências detectadas Visual 16.573.937 Motora 7.879.601 Auditiva 5.750.809 Mental 2.848.684 Física 1.422.224 Fonte: www.portal.saude.gov.br Tabela 1 Quadro Censo 2000 48,1% Os dados apontam que 48,1% da população brasileira possui deficiência visual, envolvendo pessoas cegas ou com baixa visão, ou seja, o indivíduo que enxerga pouco mesmo após tratamento e utilização de óculos comuns. Nesta perspectiva, levando-se em conta o número significativo de sujeitos com diferentes tipos de deficiência visual, entende-se a importância de propor interfaces que possibilitem o envolvimento destes sujeitos nos ambientes virtuais de aprendizagem. Os softwares do tipo leitor de tela, como DosVox, WinVox, entre outros, são amplamente utilizados por sujeitos cegos para uso do computador e acesso a páginas da Internet. É muito comum ver as pessoas cegas utilizarem a tecla tab para navegar somente em links ao invés de ler todas as palavras que estão na página. Deste modo eles têm uma rápida noção do conteúdo da página ou podem acessar o link desejado mais rapidamente. Para as pessoas com deficiência visual parcial, faz-se necessária a utilização de monitores grandes, que aumentam o tamanho das fontes e imagens, ou ainda os ampliadores de tela. Sendo assim, as adequações para acessibilidade de diferentes usuários precisarão ser adotadas como norma, permitindo o acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação. Destacam-se, nesta área, propostas como os princípios do Design Universal, definidos pelo Centro de Design Universal da North Carolina State University, e normas da WorldWideWeb Consortium W3C (W3C WEB, 2007). O Design Universal (Universal Design), também conhecido como Design para Todos, orienta o design de produtos e de ambientes, de forma que possam ser utilizados pela maioria das pessoas, sem a necessidade de adaptação ou design especializado. Dos 7 (sete) princípios básicos do Design Universal, destacam-se 4 (quatro) deles que deveriam ser contemplados no desenvolvimento de softwares/ambientes educacionais, que são: a) uso eqüitativo: refere-se ao fato de o software ser útil e poder ser utilizado por pessoas com diversas capacidades. Deve-se verificar se o software proporciona a mesma forma de utilização a todos os usuários (idêntica sempre que possível; equivalente se necessário) e se ele evita segregar ou estigmatizar quaisquer usuários; b) flexibilidade no uso: envolve a possibilidade de escolher a forma da utilização, como, por exemplo, acesso e uso ao destro ou canhoto e adaptabilidade ao ritmo do usuário; c) uso simples e intuitivo: o software deve apresentar facilidade de uso e fácil compreensão, independentemente da experiência, do conhecimento, das capacidades lingüísticas ou do atual nível de concentração do usuário. Sendo assim, torna-se importante eliminar a complexidade desnecessária, sendo coerente com as expectativas e a intuição do usuário, acomodando um amplo leque de capacidades lingüísticas e níveis de instrução, além de 3 A palavra está escrita desta forma, conforme Heidrich (2004) para ressaltar a Eficiência do ser (ente). 52

educação, ciência e tecnologia a informação estar organizada de forma coerente com a sua importância; d) informação perceptível: aborda a questão da comunicação eficaz ao usuário, apresentando a informação necessária, independentemente das suas capacidades sensoriais ou das condições ambientais. Para tanto, pode envolver diferentes modos para apresentar informação essencial (pictográfico, verbal, táctil); maximiza a legibilidade de informação essencial, diferencia os elementos em formas que possam ser descritas (fazer com que seja fácil dar instruções ou orientações) e é compatível com a diversidade de técnicas ou equipamentos utilizados por pessoas com limitações sensoriais. Os estudos e normatizações da W3C apontam que a avaliação da acessibilidade deve perpassar todo o projeto de desenvolvimento de um site. Implementar recursos de acessibilidade em sites e ambientes colaborativos na Web amplia as possibilidades de acesso à informação e a interação de pessoas com necessidades especiais de forma inédita. Os estudos do W3C sugerem que, ao desenvolver ou redesenhar um site, a avaliação da acessibilidade logo no início e ao longo do trabalho detectará itens de acessibilidade que se tornarão mais fáceis de corrigir do que se deixarmos o trabalho de avaliação para o final do projeto. 2.1 Delineando pontos referenciais para modelagem da acessibilidade numa perspectiva visual Conforme Bassani et al. (2006), o projeto de um software educativo deve contemplar aspectos computacionais e educacionais, de interface e colaboração. Os autores apontam, ainda, que incorporar características colaborativas a um software educativo vai além de integrar recursos de comunicação que permitam a interação entre dois ou mais usuários, mas perpassa pela proposição de um modelo de interação social como elemento central para a criação de comunidades de aprendizagem. Behar (1999), nos seus estudos sobre modelagem de ambientes computacionais, a partir da perspectiva piagetiana, destaca duas formas de interação: a) interação individual: caracteriza-se pela interação sujeito objeto de conhecimento, entendido aqui como ambiente computacional. Existe interação individual quando o sujeito interage com um software, por exemplo, um sujeito digitando um texto ou elaborando cálculos em uma planilha eletrônica; sujeito b) interação interindividual: caracteriza-se pela interação entre n sujeitos com o meio (ambiente computacional), em que existe cooperação/colaboração entre os sujeitos (dois ou mais) para interagir com o ambiente computacional; verifica-se que existe este tipo de interação nos ambientes virtuais de aprendizagem, caracterizados como sistemas computacionais que possibilitam múltiplos acessos simultâneos. sujeito 1 Figura 1 Interação individual Objeto (meio) Figura 2 Interação interindividual objeto sujeito n Também buscando uma aproximação com o referencial piagetiano, Almeida (2003) identifica diferentes níveis de interação a partir da utilização das tecnologias da informação: a) interação elementar: caracterizada pela exploração de hipertextos 4 ou ambientes virtuais. Este tipo de interação constitui, conforme a autora, a forma mais simples de equilibração 5. A exploração pode ser aleatória ou direcionada na busca de informações significativas de acordo com objetivo pré-determinado; b) coordenações inferenciais relativas à ação do usuário: as interações constituem uma seqüência de equilibrações majorantes, identificadas a partir de (três) situações: a partir de navegação no hipertexto, o sujeito seleciona informações relevantes, transforma-as em novas representações; além das representações, o sujeito cria novas conexões, rearticulando as transformações; o sujeito aplica transformações às suas próprias transformações, podendo reconfigurar o espaço e os objetos, sendo capaz de criar seu próprio hipertexto, que irá conduzi-lo a novas interações, caracterizando um processo recursivo. 4 Tecnicamente, um hipertexto é um conjunto de nós ligados por conexões. Os nós podem ser palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes de gráficos, seqüências sonoras, documentos complexos que podem eles mesmos ser hipertextos. (...) Funcionalmente, um hipertexto é um tipo de programa para a organização de conhecimentos ou dados, a aquisição de informações e a comunicação (LÉVY, 1993, p. 33). Lévy (1993) aponta seis características/ princípios do hipertexto: (a) metamorfose: a rede textual está em constante construção e renegociação; (b) heterogeneidade: permite utilização de diferentes mídias; (c) multiplicidade: qualquer ponto da rede pode revelar-se sendo composto por toda a rede; (d) exterioridade: a composição/decomposição permanente da rede depende de interferência exterior; (e) topologia: o deslocamento é possível de acordo com o mapa da rede; (f) mobilidade de centros: não há apenas um centro, múltiplos centros emergem nas conexões. 5 A equilibração é, conforme Piaget (1983), o fator fundamental do desenvolvimento, caracterizando um equilíbrio entre a hereditariedade, a experiência física e a transmissão social. 53

LIBERATO A modelagem da acessibilidade numa perspectiva individual já tem sido contemplada, a partir do desenvolvimento e utilização de softwares chamados leitores de tela. Estes programas permitem a navegação por textos e imagens, sintetizando a fala humana. Basicamente, o programa lê para a pessoa o que está na tela. Sendo assim, portadores de deficiência visual têm a possibilidade de navegação e acesso às informações disponíveis no ambiente. Uma proposta que vem sendo amplamente utilizada e que contempla sujeitos com baixa visão, refere-se à utilização de controles de acessibilidade, onde o usuário tem a possibilidade de ampliar/diminuir a fonte do texto, conforme figura 3. A A A A- A+ Onde: A A A A- A+ Figura 3 Controles de acessibilidade Auto contraste 2 fundo preto com letras bancas Auto contraste (padrão) fundo branco com letras pretas Texto normal Diminui o tamanho da fonte Aumenta o tamanho da fonte Tabela 2 Critérios de acessibilidade Por outro lado, percebe-se a necessidade de ampliar as pesquisas na área da modelagem da acessibilidade numa perspectiva interindividual, permitindo aos sujeitos com deficiência visual a participação e envolvimento em ambientes virtuais de aprendizagem. Conforme Preece et al. (2005), diversos procedimentos e regras, também entendidos como mecanismos sociais, foram estabelecidos de forma a permitir que as pessoas saibam como se comportar nos grupos sociais. As autoras apresentam três categorias principais de mecanismos sociais, que são mecanismos conversacionais, mecanismos de coordenação e mecanismos de percepção, apresentando uma relação de como os sistemas tecnológicos podem ser projetados para facilitá-los. Os mecanismos conversacionais servem para facilitar o fluxo da conversa. Mecanismos de coordenação permitem que as pessoas trabalhem juntas e interajam. Os mecanismos de percepção (awareness) são utilizados para que se descubra o que está ocorrendo, o que os outros estão fazendo e, também, para permitir que os outros saibam o que está acontecendo. Considerando que a conversa e a maneira como ela é realizada constituem uma parte fundamental da coordenação de atividades sociais (PREECE et al., 2005, p. 130), o desafio tem sido o desenvolvimento de sistemas que permitam a comunicação entre pessoas geograficamente distantes, como se estivessem no mesmo lugar. Diversas tecnologias colaborativas vêm sendo desenvolvidas de forma a possibilitar a conversação, como e-mail, videoconferência, mensagens instantâneas, salas de bate-papo ou ainda mundos virtuais, em 3D ou não, onde as pessoas se encontram e conversam. Os mecanismos de coordenação são necessários quando um grupo de pessoas atua/interage/trabalha junto. Podem-se listar como exemplos de tecnologias colaborativas as ferramentas para gerenciamento de projetos, editores de texto coletivo, entre outras. Estes mecanismos devem prever estratégias para a coordenação das ações dos usuários e prever uma política social para controlar a tomada da palavra (PREECE et al., 2005, p. 143), de forma a evitar atualizações/ alterações simultâneas que possam originar erros. Os mecanismos de percepção ou awareness são utilizados para saber quem está por perto, o que está acontecendo e quem está falando com quem. Nessa perspectiva, alguns sistemas foram/vêm sendo desenvolvidos de forma a possibilitar que os sujeitos tenham acesso a informações de percepção mesmo à distância, ou seja, possam ver o que seus colegas remotos estão fazendo em tempos determinados e ter a possibilidade de conversar com eles (PREECE et al., 2005). Nesta perspectiva, entende-se que a modelagem e implementação de mecanismos conversacionais, mecanismos de coordenação e mecanismos de percepção em ambientes virtuais de aprendizagem podem ampliar as possibilidades de acesso de pessoas com necessidades especiais. Entretanto, o desafio consiste em possibilitar que deficientes visuais compartilhem destes recursos. 3 Considerações finais Conforme dito anteriormente, esta pesquisa se insere nos estudos que vêm sendo desenvolvidos no Projeto PALCO (Portal Acessível de Linguagem Colaborativa), que visa estudar como promover o desenvolvimento da linguagem de forma que pessoas com diferentes níveis cognitivos, auditivos e visuais possam participar de um contexto de construção de narrativas. O projeto contempla a modelagem e o desenvolvimento de uma ferramenta de escrita colaborativa na Web. Sendo assim, busca-se estudar e avaliar as questões relativas à acessibilidade com ênfase na Web, analisando os padrões internacionais aceitos W3C, entre outros, de forma a elaborar/propor critérios de acessibilidade que norteiem o projeto e desenvolvimento de interfaces. Segundo Heidrich (2004), se realmente há o desejo de uma sociedade justa e igualitária, em que todas as pessoas tenham valor igual e direitos iguais, é preciso proporcionar aos alunos com deficiência as oportunidades e as habilidades para participar da nova sociedade que está surgindo. Nesta perspectiva, percebe-se a importância de pesquisas que busquem o desenvolvimento de ambientes colaborativos na Web, possibilitando a 54

educação, ciência e tecnologia comunicação e colaboração, de forma a contemplar o acesso de pessoas com diferentes necessidades. Se quisermos, realmente, que alguém faça parte de nossas vidas, é necessário fazer o possível para recebê-lo em nossas vidas e promover suas necessidades; assim, experiências educacionais adequadas e serviços afins podem e devem ser providenciados. Durante o século XX, as instituições de segregação voltadas à educação especial consolidaram-se em número e seu principal resultado foi o controle e a nãoassistência. A visão de que as pessoas com deficiência tinham pouco potencial econômico para atender às exigências da sociedade contribuiu para que se chegasse a esse resultado (KARAGIANNIS e CARTWRIGHT, 1994). Entretanto, as sociedades estão sofrendo mudanças fundamentais. As expressões via eletrônica, via de informação e escritório doméstico não são apenas expressões pomposas, mas indicações de um novo mundo de trabalho emergente. Um número cada vez maior de pessoas está se sustentando, processando informações e prestando serviços aos clientes, quer pessoal ou eletronicamente, e não mais trabalhando nas fábricas, como acontecia na sociedade industrial. Ao mesmo tempo, as sociedades estão tornando-se multiculturais, e a inclusão é um dos princípios fundamentais em que a transformação da sociedade deve basear-se (KARAGIANNIS e CARTWRIGHT, 1994). O valor social da igualdade é consistente com o motivo de ajudar os outros e com a prática do ensino inclusivo. É preciso garantir que os alunos com deficiência sejam apoiados para se tornarem participantes e colaboradores na planificação e no bem-estar deste novo tipo de sociedade. Entende-se que a abordagem deste tema é de extrema relevância num momento em que a comunidade acadêmica mundial estuda soluções para auxiliar pessoas com necessidades especiais. Referências ALMEIDA, Maria Elisabeth B. de. Educação, ambientes virtuais e interatividade. In: SILVA, Marco (Org.). Educação on line. São Paulo: Edições Loyola, 2003. p. 201-215. BASSANI, Patrícia B. Scherer et al. Em busca de uma proposta metodológica para o desenvolvimento de software educativo colaborativo. RENOTE. Disponível em: < http://www.cinted.ufrgs.br/renote/jul2006/ artigosrenote/a30_21191.pdf>. BEHAR, Patricia Alejandra. A lógica operatória e os ambientes computacionais. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO SBIE, 1999, Curitiba. Anais... Curitiba. Disponível em: <http://penta. ufrgs.br/pgie/sbie99/behar.htm>. HEIDRICH, Regina de Oliveira. Análise de processo de inclusão escolar de alunos com paralisia cerebral: utilizando as tecnologias de informação e comunicação. Tese (Doutorado em Informática na Educação) Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação do Centro Interdisciplinar de Novas Tecnologias. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004. JOHNSON, Steven. Cultura da interface como o computador transforma nossa maneira de criar e comunicar. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001. KARAGIANNIS, A.; CARTWRIGHT, G. F. Attitudinal research issues in integration of children with mental handicaps. McGill journal of education, 25(3), 369-382, 1994. LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência. São Paulo: Ed. 34, 1993. PIAGET, Jean. A epistemologia genética/sabedoria e ilusões da filosofia/problemas de psicologia genética. 2 a ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983. (Os Pensadores). PORTAL DA SAÚDE. Dados estatísticos Censo IBGE 2000. Disponível em: <http://portal.saude.gov.br/ portal/saude/cidadao/visualizar_texto.cfm?idtxt= 24202&janela=1>. Acesso em: jul. 2007. PREECE, Jennifer; ROGERS, Yvonne; SHARP, Helen. Design da interação: além da interação homem-computador. Porto Alegre: Bookman, 2005. VALENTINI, Carla; SOARES, Eliana Maria (orgs). Aprendizagem em ambientes virtuais: compartilhando idéias e construindo cenários. Caxias do Sul, RS: EDUCS, 2005. W3C WEB ACCESSIBILITY INICIATIVE. Introdução à acessibilidade na Web. Disponível em: <http:// www.maujor.com/w3c/introwac.html>. 55