COMPLICAÇÕES DA RECONSTRUÇÃO DO LIGAMENTO CRUZADO ANTERIOR. Complications of the anterior cruciate ligament reconstruction

Documentos relacionados
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BRASÍLIA UniCEUB PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA LUCAS ROOS VALE

Médico Cirurgia de Joelho

Tratamento Cirúrgico da Instabilidade Patelo-femoral Indicações do Tratamento Cirúrgico

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DEPARTAMENTO DE CIRURGIA PÓS-GRADUAÇÃO EM TRAUMATOLOGIA ESPORTIVA E ARTROSCOPIA

PULS. Placa Radio Distal. Sistema de Placas para o Rádio Distal com ângulo fixo

Lesões Traumáticas dos Membros Inferiores

Lesões do ligamento cruzado anterior (LCA)

Prof André Montillo

Exame do Joelho. -A maior das junturas sinoviais do corpo humano, bem como uma das mais complexas e discutidas.

Reconstrução do tendão patelar com enxerto dos tendões flexores

ORTOBIO - INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE PRODUTOS ORTOPÉDICOS LTDA.

Parecer do Grupo Técnico de Auditoria em Saúde 023/05 Tema: Parafuso de interferência bioabsorvível GTAS

PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO E EDUCAÇÃO CONTINUADA ORTOCURSO JOELHO CURSO PREPARATÓRIO PARA O TEOT 30 de Abril de 2016

PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO E EDUCAÇÃO CONTINUADA ORTOCURSO JOELHO CURSO PREPARATÓRIO PARA O TEOT 30 de Abril de 2016

Tendinopatia Patelar

Reconstrução artroscópica do ligamento cruzado anterior com uso dos tendões semitendíneo e grácil.

Reconstrução all inside do ligamento cruzado anterior do joelho com enxerto da parte central do tendão quadricipital

Técnicas em Ortopedia Fixação das fraturas do planalto tibial com parafusos canulados

Codificação Joelho/Ombro. Manuel Gutierres

Ligamento Cruzado Posterior

Reconstrução do Ligamento Cruzado Anterior Fatores Técnicos que Dificultam a Reabilitação

[ESTUDO REFERENTE À ENCF - JOELHO]

SCORE. SCORE total knee prosthesis cemented or cementless. Técnica Cirúrgica Mecânica

Prefeitura do Município de Londrina

Lesões Traumáticas do Punho e Mão. Prof. Reinaldo Hashimoto

Lesões Traumáticas do Membro Superior. Lesões do Ombro e Braço Lesões do Cotovelo e Antebraço Lesões do Punho e Mão

Reconstrução do ligamento cruzado anterior utilizando tendão do semitendinoso dobrado: relato de técnica artroscópica

Eficácia do protocolo de recuperação acelerada na reconstrução do ligamento cruzado anterior em atletas recreativos de futebol

O Fixador Verona Fix Dinâmico Axial é um sistema monolateral e um método de correção onde é realizada uma osteotomia de abertura gradual da tíbia OAG.

AVALIAÇÃO DO JOELHO. Clique para adicionar texto

Traumatologia. Distúrbios do Aparelho Locomotor tendo como Etiologia Sempre o TRAUMA, não importando a sua Magnitude.

Reconstrução do ligamento cruzado anterior com técnica all-inside utilizando sistema Tape Locking Screw - TLS

Rupturas do menisco. A articulação do joelho é formada pelos ossos: o osso da coxa (fêmur), o osso da perna (tíbia) e a patela.

Sistema extrator minimamente invasivo para o tendão do quadríceps ART /2015-PT

PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO E EDUCAÇÃO CONTINUADA DA SBOT-RJ ORTOCURSO SBOT-RJ/JOELHO CURSO PREPARATÓRIO PARA O TEOT 25 de Abril de 2015 NOME: HOSPITAL:

02 - AMARELA PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO E EDUCAÇÃO CONTINUADA DA SBOT-RJ ORTOCURSO SBOT-RJ/JOELHO CURSO PREPARATÓRIO PARA O TEOT 25 de Abril de 2015 NOME:

ABSTRACT. Keywords Knee; Anterior Cruciate Ligament; Arthroscopy

using hamstring tendon grafts - fixation with two interference screws

Esta patologia ocorre quando existe um stress na epífise de crescimento próximo a área da tuberosidade tibial.

Fracturas do Joelho no Desporto

Lesões ortopédicas do posterior em pequenos animais

Prof André Montillo

Instrumental para perfuração Arthrex Instruções de Uso

AVALIAÇÃO DO JOELHO. Articulação Tibiofibular Superior: É uma articulação sinovial plana entre a tíbia e a cabeça da fíbula.

FlipCutter II Instruções de Uso

- fibras de colágeno

Ele é indicado em fraturas de quadril intertrocanterianas.

Lesão do Ligamento Cruzado Posterior (LCP)

TÉCNICA CIRÚRGICA. Contours PHP Placa para terço proximal do úmero

Pós Graduação em. Exercício e lesões do Joelho. Prof. Dr. Rafael Cusatis Neto

Dr. Ricardo Anatomia dos membros inferiores junho site recomendado para estudar anatomia KENHUB

LESÕES ÓSSEAS POR ESTRESSE NO ATLETA. Daniel Zimmermann Stefani

TÉCNICA CIRÚRGICA FIXADORES EXTERNOS GRANDE E MÉDIO.

Indicações. Pré-operatório. Estudo Radiológico. Fraturas da tíbia:

INSTRUÇÃO DE USO. Descrição Geral

LESÕES TRAUMÁTICAS DO JOELHO LESÕES DOS MENISCOS. Prof. Dr. Gabriel Paulo Skroch

Biomecânica do. Complexo Articular do Joelho 08/08/2016. COMPLEXO ARTICULAR do JOELHO. Isabel Sacco

REABILITAÇÃO DOS PACIENTES SUBMETIDOS À RECONSTRUÇÃO DO LCA COM ENXERTOS DO TENDÃO PATELAR E DOS MÚSCULOS FLEXORES DO JOELHO: ESTUDO COMPARATIVO

AVALIAR A ANATOMIA DE SUPERFÍCIE DO MEMBRO PÉLVICO DO CÃO.

RECONSTRUÇÃO DO LIGAMENTO PATELOFEMORAL MEDIAL ESTUDO COMPARATIVO DAS ATUAIS ABORDAGENS CIRÚRGICAS

ENFERMAGEM CUIDADOS DE ENFERMAGEM. Aula 11. Profª. Tatiane da Silva Campos

JOELHO INTRODUÇÃO ESTRUTURA ÓSSEA ESTRUTURA ÓSSEA ESTRUTURA ÓSSEA ESTRUTURA ÓSSEA 28/08/2015. Mais complexa articulação do corpo

Fixação híbrida com MEGASHIM

Lesões Meniscais. Anatomia. Tipos de Lesões

O PRESENTE ESTUDO É DIRECIONADO AO ALUNO DO SEXTO ANO PARA DAR NOÇÕES MÍNIMAS DE ORTOPEDIA- TRAUMATOLOGIA

ANATOMIA DO JOELHO. ESTRUTURAS IMPORTANTES - Ossos e articulações - Ligamentos e tendões

Traumatologia Infantil. O Esqueleto da Criança Não É O Esqueleto do Adulto em Miniatura

Anatomia do joelho. Introdução

SINTEGRA SURGICAL SCIENCIES INSTRUÇÃO DE USO PARAFUSO INTERFERÊNCIA SINFIX PEEK REGISTRO ANVISA N

Seu médico vai decidir qual será o melhor tipo para seu caso, conforme o tipo de osso, idade e tipo de desgaste ou da doença.

Utilização do parafuso Bone Mulch na reconstrução do ligamento cruzado anterior com tendões dos músculos semitendinoso e grácil *

RECONSTRUÇÃO DO LIGAMENTO CRUZADO ANTERIOR COM TENDÕES FLEXORES QUÁDRUPLOS E PARAFUSOS DE INTERFERÊNCIA METÁLICOS

Complicações após artroplastia total de joelho: fratura periprotética após transplante do mecanismo extensor

RECONSTRUÇÃO DO L.C.P.. DO JOELHO:

Reparo de Lesão do Manguito Rotador

Artrotomia versus artroscopia: avaliação pós-operatória da reconstrução do ligamento cruzado anterior *

Lesões Traumáticas dos Membros Inferiores

TÉCNICA CIRÚRGICA FIXADOR

ANEXO A: TÉCNICA CIRÚRGICA

HASTE PROXIMAL FEMORAL TÉCNICA CIRÚRGICA

18/03/2018. Avaliação Ortopédica MEMBROS INFERIORES. Hugo Leonardo Miranda Coelho Ortopedista Médico do Trabalho Perito Médico

Nota preliminar * ABSTRACT


Músculos do Quadril e Coxa. Profa. Dra. Cecília H A Gouveia Departamento de Anatomia, ICB, USP

Traumatologia. Lesões Fundamentais do Trauma:

TÉCNICAS RADIOLÓGICAS APLICADAS NOS ESTUDOS DAS INSTABILIDADES

Reconstrução do Ligamento Cruzado Anterior: Escolha do Enxerto

Parafusos de Compressão Canulados MM e PG Razek - Com Cabeça

Fraturas do Anel Pélvico: Bacia Generalidades: Representam 3% das fraturas nas emergências Mais freqüentes nos jovens Politraumatizado: Traumas de

Reconstrução do LCA. Parafuso de interferência absovíveis osteocondutores. Material único. Design otimizado. Adaptado a diferentes técnicas cirurgicas

Acta Ortopédica Brasileira ISSN: Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia.

Expansão do Couro Cabeludo

AKS - ANATOMIC KNEE SYSTEM. Técnica Cirúrgica Prótese de Joelho Anatômica Cimentada

RESISTÊNCIA MECÂNICA DO LIGAMENTO PATELAR APÓS A RETIRADA DO TERÇO MÉDIO COM INCISÃO LONGITUDINAL OU DUAS MINI-INCISÕES TRANSVERSAS

Radiografia, cintilografia

10/17/2011. Conhecimento Técnico. Construir Argumentos

Aplicadores de osso esponjoso

ANÁLISE DA EFICACIA DO USO DA CINESIOTERAPIA NO TRATAMENTO PÓS OPERATÓRIO DE LESÃO DO LIGAMENTO CRUZADO ANTERIOR ESTUDO DE CASO

Transcrição:

COMPLICAÇÕES DA RECONSTRUÇÃO DO LIGAMENTO CRUZADO ANTERIOR Complications of the anterior cruciate ligament reconstruction Paulo Cesar Ferreira Penteado Guilherme Husemann Albamonte Amaral Wilson Mello A. Jr. José Francisco Nunes Neto RESUMO A cirurgia de reconstrução do ligamento cruzado anterior (LCA), apesar da sua evolução, ainda apresenta algum potencial de complicações. Os autores apontam as principais etapas da cirurgia onde as complicações podem ocorrer, como: retirada do enxerto, posicionamento dos túneis ósseos e fixação do enxerto. Em cada uma das etapas são apontadas as principais complicações e quais os cuidados a serem tomados para que possam ser evitadas. Ainda são relatadas algumas das complicações que podem fazer parte de qualquer cirurgia do joelho. DESCRITORES: ligamento cruzado anterior. cirurgia. complicação. ABSTRACT The anterior cruciate ligament (ACL) reconstruction surgery, still presents some potential risks for complications. The authors present the most important steps of the surgery where complications might happen, such as: graft harvest, bone tunnel positionning and graft fixation. In each step the authors point the most important complications and the proper care that should be taken to avoid them. The authors also relate some of the complications that might happen in any knee surgery. KEYWORDS: anterior cruciate ligament. surgery. complication. INTRODUÇÃO A reconstrução do ligamento cruzado anterior (LCA) é um dos procedimentos mais comumente realizados na área da medicina esportiva. Este procedimento obteve grande avanço nos últimos anos com a introdução da técnica artroscópica. Apesar da incidência das complicações ter diminuído, o cirurgião deve ter conhecimento profundo da anatomia e das técnicas cirúrgicas a serem realizadas, para procurar evita-las. Devemos sempre nos lembrar do alerta feito por Hughston: O joelho nunca é tão ruim, que não possa ficar pior após uma cirurgia 1. Como em qualquer procedimento cirúrgico, na reconstrução intra-articular do LCA existem riscos inerentes de complicações, que podem ocorrer: na retirada do enxerto, no posicionamento dos túneis ósseos e na fixação do enxerto. 1. RETIRADA DO ENXERTO Nosso objetivo nesse momento é obter um enxerto de boa qualidade, com tamanho e espessura adequados, sem provocar danos desnecessários ao sítio doador. 1.1. ENXERTO DO LIGAMENTO PATELAR: 1.1.1. Fratura da patela:

O corte do bloco ósseo, retirado da patela, normalmente é iniciado com serra oscilatória e depois completado com osteótomo. Esse é o momento em que, se não tivermos o devido cuidado, podemos provocar uma fratura na patela. Quando ocorre, em geral é uma fratura longitudinal, às vezes podendo ser incompleta; raramente é uma fratura transversa. As fissuras incompletas podem ser tratadas apenas com restrição da atividade do paciente, enquanto as longitudinais e transversas devem ser tratadas com cerclagem. Geralmente não interferem com a reabilitação e o resultado da cirurgia 2. Uma maneira de se prevenir a ocorrência dessa fratura é inclinar os cortes longitudinais do bloco ósseo dando-lhe uma forma trapezoidal. Estes devem ser realizados com instrumentais bem afiados e tomando-se o cuidado de não fazer movimento de alavanca para destacá-lo. A fratura da patela pode ainda ocorrer tardiamente, por seu enfraquecimento. Miller, em 99, fez um relato de fratura de patela associada a lesão do tendão patelar ocorridas após 6 semanas da reconstrução do LCA. O tratamento foi fixação da patela com parafuso canulado, enxerto ósseo e reinsersão do tendão 3. A enxertia do defeito ósseo da patela, com osso esponjoso oriundo do túnel tibial, pode diminuir a chance da fratura tardia. 1.1.2. Fratura do bloco ósseo do enxerto O bloco ósseo do enxerto pode sofrer fratura quando utilizamos instrumentos inadequados ou não tomamos o devido cuidado na sua retirada. Outra situação onde pode ocorrer fratura é no momento da perfuração, principalmente quando realizada após sua retirada, na mesa de instrumentos 2. Isso pode ser evitado se o bloco ósseo for perfurado antes de ser cortado do seu leito original. 1.1.3. Ruptura tardia do ligamento patelar Existem, descritos na literatura, alguns casos de ruptura do tendão patelar ocorridos após reconstrução do LCA. Além das causas traumáticas, um fator importante na sua ocorrência é o comprometimento da sua vascularização. Devemos evitar o prejuízo da circulação do ligamento patelar remanescente, preservando sua circulação anterior e posterior, oriundas respectivamente do peritendão e da bola de gordura. O peritendão deve ser cortado longitudinalmente e depois suturado, e o descolamento da bola de gordura deve restringir-se apenas à porção que será utilizada como enxerto. 1.1.4. Patela baixa Ainda não existe um consenso na literatura se o defeito do ligamento patelar deve ser suturado ou não. Se fizermos uma sutura envolvendo toda a espessura do tendão, provocaremos um encurtamento do ligamento patelar, com conseqüente abaixamento da patela. Tria, em 94, observou encurtamento do ligamento patelar em 76% dos pacientes, cujos tendões foram suturados após a reconstrução do LCA. Concluiu que a sutura do defeito do tendão levou a patela baixa, mas este fato não mostrou correlação com a dor fêmoro-patelar 4. Para evitarmos o abaixamento da patela, podemos optar por não suturar o defeito, ou fazer uma sutura que envolva apenas as fibras superficiais do tendão. 1.1.5. Tendinite patelar

A tendinite patelar é uma complicação tardia, que atrapalha o progresso da reabilitação pós-operatória 5. Pode resultar de uma agressividade maior durante a retirada do enxerto e um tratamento inadequado da área doadora. Acreditamos que uma técnica cuidadosa, a enxertia do defeito ósseo da patela com osso oriundo do túnel tibial, e a sutura do peritendão podem diminuir a sua ocorrência. Outro motivo da tendinite patelar é o emprego de um protocolo de reabilitação agressivo. 1.1.6. Lesões nervosas O nervo mais comumente afetado nas reconstruções do LCA com ligamento patelar é o ramo infra-rotuliano do nervo safeno, que pode ser seccionado ou lesado, por afastamento descuidado, na retirada do enxerto. De acordo com a literatura um terço dos pacientes apresentam parestesia na área peri rotuliana lateral à incisão 5,6. Em geral após 1 ano da cirurgia isto não representa uma queixa para os pacientes. 1.2. TENDÕES FLEXORES: 1.2.1. Amputação na retirada do enxerto Quando optamos pelo uso dos tendões flexores, não queremos passar pela frustração de ter nas mãos um pedaço de tendão de poucos centímetros ou extremamente delgado que não pode ser utilizado como enxerto. Alguns cuidados devem ser tomados para se evitar esse fato desagradável: seccionar as principais expansões existentes entre os tendões do semitendinoso e gracilis, e destes com o gastrocnêmio medial; utilizar tenótomos adequados e manter o joelho fletido a 90. 2 1.3. CONTAMINAÇÃO DO ENXERTO Uma situação trágica é quando vemos o enxerto calmamente repousando no chão da sala de cirurgia, o que devemos fazer? Delle, num estudo de 2000, comparou três produtos para desinfecção do enxerto, sendo o gluconato de clorexidina o que proporcionou melhores resultados. Recomenda que o enxerto seja retirado do chão em pelo menos 15 segundos, e após limpeza mecânica com solução salina, seja mantido em solução de clorexidina por no mínimo 90 segundos. Se o cirurgião achar que o enxerto não é viável deve ser retirado outro enxerto (semitendinoso e gracilis ou quadricipital) 7. Essa situação poderia ser evitada se: a perfuração do bloco ósseo fosse feita antes de ser cortado do seu leito original; o enxerto fosse manipulado por apenas uma pessoa, sobre a mesa; e fosse colocado em local seguro na mesa de instrumentos. 2. LOCALIZAÇÃO DOS TÚNEIS ÓSSEOS O posicionamento dos túneis ósseos tem um papel importante no resultado final da reconstrução do LCA, determinando estabilidade articular e permitindo o restabelecimento do arco de movimento normal 2,5,6,8 e 9. Sua localização é feita com fios guia e as brocas utilizadas na sua realização devem ser afiadas e ter o diâmetro compatível com o do enxerto. 2.1.TÚNEL TIBIAL O túnel tibial deve iniciar aproximadamente na margem superior da pata de ganso e 1 centímetro medial à tuberosidade anterior da tíbia, e terminar no centro da inserção

original do LCA. Se iniciar muito proximal, o túnel ficará muito angulado e a cortical anterior da tíbia muito frágil, com risco de não resistir à colocação do parafuso de interferência ou do bloco ósseo do enxerto ficar para fora do túnel. Mais importante é a posição onde ele deve terminar, pois se for posicionado muito anteriormente, o enxerto será pressionado pelo teto do intercôndilo durante a extensão do joelho, aumentando o estresse sobre o enxerto ou limitando o final da extensão. 6 e 9 (figura 1) 2.2. TÚNEL FEMORAL O erro mais freqüente cometido por cirurgiões menos experientes é posicionar o túnel femoral muito anteriormente. 6 e 9 Nessa situação ocorre perda do final da flexão e a estabilidade articular não é conseguida devido à posição não isométrica do enxerto, o que compromete definitivamente o sucesso da cirurgia. O túnel deve ser feito com o joelho posicionado a 90 de flexão, de forma que o fio guia saia na cortical ântero-lateral do terço distal do fêmur. Se o joelho estiver mais extendido corre-se o risco do túnel perfurar a cortical posterior do fêmur, impedindo a fixação do enxerto (figura 2). 3. FIXAÇÃO DO ENXERTO Outro momento onde a cirurgia de reconstrução do LCA pode falhar é o da fixação do enxerto. Esta pode ser ineficiente por não ser adequada para o enxerto escolhido, ter sido realizada de maneira incorreta, ou por provocar danos estruturais ao enxerto. 3.1. LIGAMENTO PATELAR Normalmente a fixação do enxerto é feita com parafuso de interferência, canulado, na tíbia e no fêmur. Em geral as complicações nessa fase ocorrem na fixação do enxerto no fêmur. O parafuso deve estar posicionado na face esponjosa do bloco ósseo do enxerto e paralelo ao mesmo, para garantir uma fixação eficiente. Parafusos colocados divergentes ao enxerto diminuem a resistência do mecanismo de fixação. Se o parafuso de interferência for colocado na face tendinosa do enxerto existe a chance das fibras se romperem e o enxerto se destacar do bloco ósseo. Nesse caso o enxerto é invertido, e sua porção rota é suturada e fixada num parafuso cortical e arruela na tíbia. Podemos minimizar as chances de problemas se utilizarmos fios guia para posicionar os parafusos, e protetores de enxerto. Outro detalhe interessante é se fazer uma pequena escavação no local de entrada do parafuso no túnel femoral (figura 3), para que esse não faça o enxerto rodar sobre seu próprio eixo. Os parafuso de interferência de partes moles e os absorvíveis apresentam um risco menor de provocar danos às fibras do enxerto. 3.2. TENDÕES FLEXORES Existem inúmeros métodos de fixação dos tendões flexores, cada qual com sua técnica e instrumentais próprios, que devem ser respeitados para se evitar complicações. Cuidados especiais devem ser tomados quando se utiliza o Endobutton TM. Um dos pontos onde o sistema pode falhar é na fixação do enxerto à placa. O amarrilho deve ser de material resistente e inelástico, podem ser utilizados cadarços, semelhantes a fitas cardíacas, ou o Endotape TM. Os modelos atuais de Endobutton TM já trazem um cordão de fibras contínuas preso à placa, com medidas variando de 15 a 35mm, que proporcionam uma segurança maior.

Outro ponto potencial de falha é o cálculo do comprimento do amarrilho, que deve se basear nas medidas da profundidade do túnel e da distância entre o inicio do túnel e a cortical do fêmur. Para que a placa possa virar fora da cortical do fêmur deve sobrar uma distância de 6 mm entre o enxerto e o fundo do túnel (figura 4). Se o amarrilho for muito curto, a placa não ultrapassará a cortical do fêmur e não fixará o enxerto, neste caso a profundidade do túnel deve ser aumentada ou o amarrilho deve ser mais longo. Quando o amarrilho é muito longo a fixação pode parecer eficiente no início, mas será perdida com o passar do tempo. Warren conclui que quando o avanço do Endobutton TM ultrapassa a cortical lateral mais que 10 mm, e o joelho encontra-se numa flexão superior a 110, aumenta o risco de interposição de partes moles que, quando sofrerem necrose, provocarão afrouxamento do enxerto. 10 4. OUTRAS COMPLICAÇÕES 4.1. INFECÇÃO É uma complicação muito temida e preocupante, devido aos seus efeitos que podem ser arrasadores. Felizmente, de acordo com a literatura sua incidência é baixa, variando entre 0,3 a 0,5% 11. Há alguns fatores que aumentam o risco de infecção pósoperatória, como: procedimento cirúrgico prévio, sutura meniscal com incisão posterior, falta de administração de antibiótico no intra e pós-operatório imediato, tempo cirúrgico prolongado e injeção de esteróides no final do procedimento. Segundo Burks os agentes mais comumente encontrados foram o Staphylococcus aureus e epidermidis. 12 As infecções superficiais em geral resultam da contaminação de hematomas conseqüentes a sangramento que passou desapercebido, hemostasia inadequada ou uma coagulopatia não conhecida previamente. Nesses casos geralmente a drenagem cirúrgica, limpeza com desbridamento do tecido desvitalizado, associadas à terapia antibiótica específica são suficientes para solucionar o problema. (figura 5) Quando a infecção acomete a articulação as conseqüências podem ser muito mais graves. O cirurgião deve estar atento a essa possibilidade, procurando fazer o diagnóstico mais precocemente possível, e agindo de maneira rápida e precisa. Infelizmente muitas vezes torna-se necessária a retirada do enxerto e do material de fixação, e nesses casos os túneis ósseos devem ser curetados. 4.2. DOENÇA TROMBO EMBÓLICA A doença trombo-embólica é outra complicação importante, pois quando ocorre pode provocar embolia pulmonar, às vezes evoluindo ao óbito. Os pacientes submetidos à reconstrução do LCA têm um risco menor, pois em geral são jovens e ativos. As chances desses pacientes apresentarem problemas locais ou sistêmicos predisponentes são menores. O reconhecimento dos fatores de risco e a movimentação e deambulação precoces são 5,6 e 8 as grandes armas para a sua prevenção. O uso profilático de drogas anticoagulantes para esses pacientes é uma situação de exceção. 4.3. HEMATOMAS E HEMARTROSE No pós-operatório imediato pode haver a formação de hematomas resultantes da falta de coagulação da artéria genicular súpero lateral, ou de algumas veias da região da metáfise tibial, seccionadas durante a realização do túnel tibial. 5 Quando o hematoma é extenso causando grande desconforto ao paciente, deve ser drenado, caso contrário pode ser tratado com crioterapia e enfaixamento compressivo.

A hemartrose é uma conseqüência do sangramento ósseo intra-articular, quando são realizadas plastias intercondilares amplas ou ressecção do menisco lateral próximo à sua inserção capsular. Em geral regride com crioterapia, enfaixamento compressivo e exercícios de contração isométrica do quadríceps, só deve ser puncionada se o paciente estiver muito desconfortável e não for capaz de contrair o quadríceps. COMENTÁRIOS: A cirurgia de reconstrução do LCA apresenta um potencial grande complicações, algumas das quais com efeitos desastrosos. O cirurgião deve ter um conhecimento profundo da anatomia do joelho e estar bem familiarizado com a técnica cirúrgica a ser empregada. Deve estar ciente das complicações que podem ocorrer em cada etapa do procedimento e tomar os devidos cuidados para evita-las. A avaliação pré-operatória cuidadosa do paciente pode evitar inúmeras complicações decorrentes de problemas sistêmicos ou locais prévios.

BIBLIOGRAFIA 1. Hugston JC. Complications of Anterior Cruciate Ligament Surgery. The Orthop Clinic of North Am 1985; 16: 237-240. 2. Albrigth JP. Anterior Cruciate Ligament Reconstruction Plan B Procedures: Handling Pitfalls. The AOSSM Marque Knee Course, October 1-3, 1999. Available from: http://www.medscape.com/viewarticle/408510. 3. Miller MD, Nichols T, Butler CA.Patella Fracture and Proximal Patellar Tendon Rupture following Arthroscopic Anterior Cruciate Ligament Reconstruction. Arthroscopy 1999; 15: 640-643. 4. Tria AJ, Alicea JA, Cody RP. Patella Baja in Anterior Cruciate Ligament Reconstruction of the Knee. Clin Orthop 1994; 299: 229-234. 5. Aglietti P, Buzzi R. Lesiones Cronicas del Ligamento Cruzado Anterior. In: Insall JN, Windsor RE, Scott WN, Kelly MA, Aglietti PA, editors. Insall Cirurgía de la Rodilla Tomo I. Editorial Médica Panamericana; 1993. p 440-528. 6. Gomes JLE, Marczyk LRS. Complicações Pré e Pós Operatórias nas Reconstruções Ligamentares. Clínica Ortopédica 2000; 1/3: 669-673. 7. Molina ME, Nonweiller DE, Evans JÁ, DeLee JC. Contaminated Anterior Cruciate Ligament Grafts: The Efficacy of 3 Sterilization Agents. Arthroscopy 2000; 16: 373-378. 8. Shrock KB, Jackson DW. Arthroscopic Management of the Anterior Cruciate Ligament Deficient Knee. In: Operative Arthroscopy. McGint JB, editor. Philadelphia NY, Lippincott-Raven, 1996. p 511-530. 9. Fridman MJ, Getelman MH. Revision Anterior Cruciate Ligament Reconstruction Surgery. J Am Acad Orthop Surg; 7: 189-198. 10. Simonian PT, Behr CT, Stechschulte DJ, Wickewicz TL, Warren RF. Potential Pitfall of the EndoButton. Arthroscopy 1998; 14: 66-69. 11. McAllister DR, Parker RD, Cooper AE, Recth MP, Abate J. Outcomes of Postoperative Septic Arthritis after Anterior Cruciate Ligament Reconstruction. Am J Sports Med 1999; 27:562-570. 12. Burks RT. Infection Management. In: Failed Anterior Cruciate Ligament Surgery. Program end Abstract of the AOSSM Annual Meeting, June 28- July 01, 2001; Keystone, Colorado. Symposium. LEGENDAS DAS FIGURAS: Figura 1: Túnel tibial posicionado muito anterior, o enxerto é pressionado pelo teto do intercôndilo. Figura 2: Flexão do joelho pequena, o túnel femoral pode perfurar a cortical posterior. Figura 3: Escavação do local de entrada do fio guia do parafuso de interferência. Figura 4: Cálculo do comprimento do amarrilho, considerando a profundidade do túnel femoral e a distância até a cortical femoral.

Figura 5: Infecção superficial por Staphylococus epidemiditis, pós-hematoma no 3º dia PO. Área infectada (A). Enxerto de pele laminada cobrindo toda lesão (B). Resultado final 2 anos PO (C). Artigos da Revista da Sociedade Brasileira de Cirurgia do Joelho Volume 3 - Número 1- Janeiro/Abril 2003