Fracturas do Joelho no Desporto
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- Miguel Coelho Bonilha
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1 Texto de apoio ao curso de Especialização Atividade Física Adaptada e Saúde Prof. Dr. Luzimar Teixeira Fracturas do Joelho no Desporto Síntese de comunicação pessoal apresentada no Curso de Mestrado em Medicina do Desporto da Faculdade de Medicina de Coimbra - Julho 2000 A traumatologia aguda do joelho no desporto é dominada pelas lesões menisco-ligamentares. As fracturas, menos comuns, têm na maioria das situações um diagnóstico clínico e radiológico fáceis. Englobam-se nas fracturas do joelho as fracturas distais do fémur (supra-condilianas, condilianas e inter e supra-condilianas), as fracturas proximais da tíbia e as fracturas da rótula. Em termos de sistematização destas fracturas a classificação AO é das mais completas e das mais divulgadas. Entende-se por fractura articular toda a fractura cujo traço atinja uma superfície articular. São chamadas fracturas dos pratos as fracturas articulares proximais da tíbia. As mais temidas fracturas do joelho são as fracturas articulares, por frequentemente se complicarem por rigidez e artrose. São factores de rigidez: a hemartrose, as imobilizações prolongadas, a cirurgia e a reabilitação tardias. Incongruências da superficie articular contam-se entre os mais comuns factores de evolução para artrose. Sempre que desviadas as fracturas articulares têm indicação para tratamento cirúrgico. São princípios da cirurgia desta fracturas a redução anatómica, frequentemente só conseguida por cirurgia aberta, a fixação interna rígida, mobilidade precoce e carga tardia. As fracturas metafisárias proximais da tíbia quando tratadas conservadoramente devem ser alvo de vigilância apertada, pois podem ocorrer desvios secundários, que por sua vez originam desvios de eixo com risco de prejuizo futuro da articulação. Cirurgicamente as fracturas da rótula podem ser tratadas com fixação interna, patelectomia parcial ou patelectomia total. O método preferido para a maior parte das fracturas da rótula é a estabilização com laçada em 8 com fio de aço apoiada em fios de Kirschner, comunemente conhecido como "cerclage com efeito hauban". Este método permite a função logo no dia seguinte e sendo um método dinâmico quanto mais flectir mais estímulo há para a consolidação. A patelectomia total é o método de tratamento menos desejado, já que a ausência da rótula acarreta cerca de 30% de perda da eficiência do quadricipite. Cerclage com efeito hauban Método de eleição na estabilização cirúrgica da maior parte das fracturas da rótula Entre as fracturas do joelho mais frequentes no desporto, contam-se as fracturas da rótula e as fracturas dos pratos da tíbia. As fracturas da rótula podem ocorrer por traumatismo directo na face anterior do joelho ou por contracção violenta e súbita do quadricípite. No primeiro caso estamos perante um mecanismo directo de fractura e no segundo caso perante um mecanismo indirecto. A fractura por mecanismo indirecto corresponde a uma ruptura do aparelho extensor do joelho a nível da rótula. Nesta situação o traço de fractura é geralmente horizontal e existe grande afastamento entre os fragmentos fracturados. Este afastamento é devido à ruptura das asas da
2 rótula, que geralmente está ausente no mecanismo directo. Se para efeitos de diagnóstico nos basearmos apenas na função, poderemos ser induzidos em erro, pois nas fracturas por mecanismo directo alguma capacidade de extensão do joelho poderá estar presente graças à integridade das expansões laterais da rótula. Na cirurgia das fracturas por mecanismo indirecto, para além da redução e estabilização da fractura da rótula, deverá ser feita sutura das respectivas expansões laterais. Rótula bipartida é uma situação que para os menos familiarizados poderá ser interpretada como fractura. Trata-se de uma anomalia de ossificação da rótula caracterizada pela existência de um ponto de ossificação suplementar que, mesmo na idade adulta, mantêm-se isolada do resto do osso. A sua localização (ângulo supero-externo da rótula) e a regularidade dos bordos são importantes para o diagnóstico diferencial com fractura. As fracturas dos pratos da tíbiatêm uma importância especial por ocorrerem numa das mais importantes áreas de suporte de carga. São causadas por forças compressivas, forças em valgo ou varo ou combinação de ambas. As fracturas do prato externo são as mais frequentes. No desporto ocorrem geralmente por mecanismo de valgo forçado, seja por pancada directa sobre a face externa do joelho, seja por valgo forçado aquando da recepção ao solo num salto. Podem apresentar uma morfologia de traço simples ("split"), afundamento ou combinação de ambos. As fracturas do prato externo da tíbia associam-se frequentemente a lesões meniscais (55%), sobretudo do menisco externo, e a lesões ligamentares (36%), seja do ligamento lateral interno ou mesmo do ligamento cruzado anterior. O mesmo mecanismo de valgo forçado pode lesar todas estas estruturas. Por isso, a identificação da fractura no RX não dispensa o exame do joelho a pensar naquelas lesões potencialmente associadas. Fractura do prato externo da tíbia Frequente associação a lesões ligamentares e meniscais A fractura do prato externo ocorre por varo forçado. Como um joelho protege o outro nos traumatismos por varo, esta fractura é muito mais rara. Mas quando acontece pode associar-se a lesão do ligamento lateral externo e do nervo ciático poplíteo externo. No caso de afundamento do prato da tíbia a regularidade da superfície articular deve ser restabelecida por levantamento do mesmo. O espaço vazio deixado pela desimpacção do osso deve ser preenchido com osso esponjoso. Deve ser feita fixação da fractura com parafusos ou placa de suporte. Fracturas dos pratos da tíbia com afundamento Princípios da cirurgia As fracturas por avulsão são próprias dos desportistas adolescentes. Ocorre avulsão da apófise pelos tendões ou ligamentos que aí se inserem. A fise que separa a apófise da metáfise ou da epífise é o ponto mais frágil da unidade cinético-motora no adolescente. É neste ponto fraco que ocorre a ruptura da unidade aquando de uma contração violenta e súbita dos respectivos músculos. A fractura-avulsão é menos grave que a ruptura no corpo do tendão ou ligamento ou desinserção destes sem pastilha óssea. Pois a cura da lesão tendinosa ou ligamentar é mais demorada e mais incerta que a consolidação da fractura apofisária. A fractura-avulsão deve ser tratada como fractura que é. Quando desviada a apófise deve ser reduzida e fixada com um parafuso ou um grampo. São exemplos de fracturas deste tipo a avulsão da tuberosidade anterior
3 da tíbia pelo tendão rotuliano, a avulsão da espinha tibial pelo ligamento cruzado anterior, a avulsão da inserção tibial do ligamento cruzado posterior e a avulsão do epicôndilo femoral interno pelo ligamento lateral interno. Fracturas-avulsão do joelho mais frequentes Apófise arrancada Estrutura responsável pela avulsão Tuberosidade anterior da tíbia Tendão rotuliano Espinha tibial anterior Ligamento cruzado anterior Espinha tibial posterior Ligamento cruzado posterior Epicòndilo femoral interno Ligamento lateral interno Uma fractura intracapsular origina hemartose com glóbulos de gordura. Frequentemente a hemartose é de grande volume e sob tensão. Num contexto de traumatismo agudo, acompanhado de hemartrose e Rx negativo devemos partir do princípio que uma fractura estará provavelmente presente, apesar de não identificada no RX. Tratar-se-á em princípio de uma fractura oculta, entendendo-se como tal toda a fractura não vísivel nas incidências radiológicas habituais (frente e perfil). Estas fracturas podem pois passar fácilmente despercebidas se para elas não estivermos alertados. É importante conhecer as suas localizações e os meios para as identificar. O afundamento da porção central de um prato da tíbia é uma dessas situações frequentes. O RX tomográfico ou, ainda melhor, a TAC são fundamentais para a sua identificação. As fracturas da espinha da tíbia são com frequência apenas visualizáveis nas incidências da chanfradura intercondiliana. A rótula é outras das localizações das fracturas ocultas. Fracturas verticais ou no plano frontal são frequentemente identificadas apenas nas incidências axiais. Fracturas osteocondrais e condrais contam-se também entre as fracturas ocultas. As primeiras são mais comuns entre os 16 e 18 anos. Quase sempre localizadas à rótula, resultam de forças compressivas ou rotatórias ou estão frequentemente associadas a luxação traumática. É importante saber que os fragmentos osteocondrais podem ser muito pequenos, localizam-se muitas vezes na faceta interna e muitos só são visualizáveis na incidência axial. A fractura condral é mais comum no esqueleto maduro e localiza-se habitualmente na área de suporte de carga dos côndilos, em associação com lesão do ligamento cruzado anterior. Como se trata de um fragmento cartilagíneo a sua identificação só poderá ser feita por artroscopia. Fracturas ocultas do joelho Localização Tipo de fractura Incidência radiológica Prato da tíbia (porção central) Afundamento Tomografias, TAC Espinhas da tíbia Avulsão Chanfradura intercondiliana Rótula Vertical, osteocondral Axiais da rótula Côndilos femorais (área de Condral suporte) Só identificadas na artroscopia Fractura osteocondral É um dos tipos de fractura da rótula
4 Incidência axial da rótula Importante para a identificação de fracturas verticais e osteocondrais Fractura condral do Côndilo femoral Frequentemente associada a ruptura do LCA A fractura de Segond localiza-se na face externa da tíbia, adjacente à superfície articular. Trata-se de um pequeno fragmento ósseo (2 a 3mm) de maior dimensão vertical, destacado da tíbia. Corresponde a uma avulsão pela cápsula antero-externa. Aparentemente com pouco significado, a sua importância advém do facto de em 75 a 100% dos casos estar associada a ruptura completa do ligamento cruzado anterior e em 66 a 70% dos casos a lesões meniscais. A fractura de Segond é pois a pequena ponta visível de um iceberg cujo corpo maior oculto é a lesão menisco-ligamentar associada. Convém referir que apesar da alta taxa de associação da fractura de Segond a lesão do ligamento cruzado anterior, só 6% das rupturas deste se acompanham de fractura de Segond. Perante esta fractura tem indicação estudar o joelho por ressonância magnética. A fractura de Segond é o chefe de fila de um conjunto de pequenas fracturas, aparentemente inócuas mas contudo indicativas de significante lesão interna do joelho. Encontrámo-las na literatura agrupadas sob o título "fracturas subtis do joelho". Fazem ainda parte deste grupo a fractura osteocondral da rótula, com frequente associação a luxação traumática da mesma, a fractura-avulsão da inserção do semi-membranoso, com associação a lesão do ligamento cruzado anterior e menisco interno e a fractura-avulsão da inserção do poplíteo, esta de todas a mais rara, com associação a lesão do ligamento cruzado posterior e menisco externo. Fracturas subtis do joelho Fractura Associação frequente Segond LCA, meniscos Osteocondral da rótula Luxação traumática da rótula Avulsão da inserção do semi-membranoso LCA, menisco interno Avulsão da inserção do poplíteo (rara) LCP, menisco externo Na luxação traumática da rótula esta luxa habitualmente para fora. A faceta interna impacta na parte externa do côndilo externo. A tríade lesional é constituida por ruptura da asa interna, contusão da face antero-externa do côndilo externo e fractura osteocondral da faceta rotuliana interna. A luxação pode reduzir expontâneamente ou ser reduzida instintivamente pelo atleta, podendo desta forma chegar reduzida à urgência. Pode fácilmente passar despercebida se não estivermos alertados. No Rx os únicos dados indicativos podem ser a fractura osteocondral da rótula e a tendência sub-luxante da mesma pela lesão da asa interna. Tríade lesional da luxação traumática da rótula Ruptura da asa interna Fractura osteocondral da faceta interna da rótula Contusão da face externa do côndilo externo
5 No desporto mais de metade das fracturas de stress ocorrem na perna e a maioria destas na tíbia. O terço proximal da tíbia é a localização mais comum das fracturas de stress tibial em adolescentes. Uma fractura de stress nesta localização pode clinicamente confundir-se com tendinite da pata de ganso. As fracturas fisárias são fracturas que atingem a fise. São pois próprias do esqueleto em crescimento. No joelho podem ocorrer na fise distal do fémur ou na fise proximal da tibia. Têm um pico aos anos no rapaz e um pouco mais cedo nas raparigas, aos anos. A cirurgia minimamente invasiva apresenta benefícios que estão na origem da procura cada vez maior deste tipo de cirurgia. A artroscopia cujo papel no joelho está bem instituído e divulgado nas lesões meniscais e ligamentares também no campo das fracturas tem vindo a conquistar terreno. Há muito que o seu papel é conhecido no diagnóstico e tratamento das fracturas condrais e osteocondrais. Nos últimos anos a osteossíntese percutânea assistida por artroscopia tornou-se técnica de 1ª indicação em alguns tipos de fracturas do prato tibial. Também a fixação das espinhas da tíbia pode ser assistida por artroscopia.
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