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Transcrição:

Seminário: emissão de valores mobiliários e ofertas públicas em tempos de crise O papel das agências de notação de risco e o seu impacto no funcionamento do mercado Isabel Alexandre 3 e 4 de Junho de 2013 Sala Conferência Hotel Praia Mar

I. Noção de notação de risco e figuras afins 1. Definição de notação de risco (rating) A notação de risco está definida no artigo 3º, n.º 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.º 1060/2009, relativo às agências de notação de risco, como: um parecer relativo à qualidade de crédito de uma entidade, de uma obrigação de dívida ou obrigação financeira, de títulos de dívida, de acções preferenciais ou outros instrumentos financeiros, ou do emitente de tais obrigações de dívida ou obrigações financeiras, títulos de dívida, acções preferenciais ou outros instrumentos financeiros, emitido através de um sistema de classificação estabelecido e definido com diferentes categorias de notação. Segundo esta definição, a notação de risco caracteriza se: *Pela sua natureza, dado que constitui um parecer, isto é, uma opinião dada por um especialista implicando uma actividade de transformação de informação, o que a diferencia, por exemplo, da classificação de créditos (credit score) ou dos sistemas de pontuação de crédito (credit scoring systems), figuras previstas no artigo 2º, n.º 2, alínea b), do Regulamento, e às quais este não se aplica; *Pelo seu objecto, dado que versa sobre a qualidade do crédito de certa entidade, instrumento financeiro ou emitente de instrumento financeiro. Sendo o seu objecto a qualidade do crédito, a notação de risco incide sobre o específico risco de incumprimento de obrigações assumidas e não sobre outros riscos eventualmente inerentes a um investimento em valores mobiliários, tais como a iliquidez ou a volatilidade dos mercados ; *Pela sua forma, dado que obedece a um sistema de classificação por categorias (aparecendo a figura da categoria de notação definida no artigo 3º, n.º 1, alínea g), do Regulamento (CE) n.º 1060/2009).

1. Definição de notação de risco (rating) (CONT.) O Código dos Valores Mobiliários português (e, segundo julgo, também o cabo verdiano) não contém uma definição de notação de risco, sendo, aliás, relativamente escassas as referências que faz à figura: apenas se lhe reporta nos artigos 7º, n.º 2 (a propósito da qualidade da informação respeitante a certas realidades, tais como instrumentos financeiros ou emitentes), 12º (quanto ao registo na CMVM das sociedades de notação de risco e aos requisitos dos seus serviços), 306º C, n.º s 6 e 7 (no contexto do depósito de dinheiro de clientes de empresas de investimento) e 359º, n.º 1, alínea f) (em matéria de entidades sujeitas à supervisão da CMVM: uma das quais sendo precisamente as sociedades de notação de risco registadas na CMVM). Também o Regulamento da CMVM n.º 7/2000, de 8 de Fevereiro (Sociedades d de Notação de Risco), emitido para os efeitos do artigo 12º do Código dos Valores Mobiliários (que, como se disse, prevê o registo na CMVM das sociedades de notação de risco), não contém qualquer definição de notação de risco. Existem, naturalmente, muitas definições e classificações de notação de risco, quer legais, quer doutrinárias, quer das próprias agências de notação de risco (embora interesse especialmente, por ser direito vigente, a definição que consta do Regulamento (CE) n.º 1060/2009 e a que acima se aludiu). Assim, e por exemplo, nos Estados Unidos, o Credit Rating Agency Reform Act, de 2006, define credit rating, no artigo 3, como an assessment of the creditworthiness of an obligor as an entity or with respect to specific securities or money market instruments.

2. Modalidades de notações de risco: notações de longo prazo e de curto prazo As notações de risco podem ser de longo prazo ou de curto prazo, sendo a sua forma externa de apresentação (escalas de notação) distinta e visando distinguir a capacidade do emitente de, no longo prazo ou no curto prazo, fazer face aos compromissos financeiros. Existe uma relação entre as notações de longo e de curto prazo, a qual, segundo a Fitch Ratings, "reflects the inherent importance of liquidity and near term concerns within the assessment of the longer term creditprofile profile. Additionally, it ensures that the two scales do not intuitively contradict each other for a given issuer. Ambas as notações de longo prazo e de curto prazo podem também versar sobre as emissões e, sendo esse o caso, referem se, mais precisamente, ao risco de crédito relativo de essas obrigações financeiras não serem satisfeitas. A noção de curto ou de longo prazo decorre da maturidade da emissão em causa A noção de curto ou de longo prazo decorre da maturidade da emissão em causa com base em convenções de mercado, entendendo se que são de curto prazo as obrigações com maturidade inferior, em regra, a 13 meses.

3. O objecto da notação (emitente ou emissão). Em particular, no caso da dívida soberana Como decorre da definição i do Regulamento (CE) n.º 1060/2009, a notação de risco pode versar sobre o emitente (entidade que recorre ao mercado de capitais para obter financiamento) ou sobre a emissão (instrumento de dívida com características específicas, por exemplo ao nível da rendibilidade ou maturidade). A propósito do objecto possível da notação de risco, coloca se a questão de saber se a denominada notação de risco da dívida soberana tem como objecto o próprio Estado ou as suas emissões de dívida (isto é, se a notação tem como objecto o emitente ou a emissão). Esse objecto é, regra geral, o próprio emitente, ainda que as emissões por si realizadas possam ser também objecto de notação (tal como, aliás, sucede no caso de outros emitentes, como por exemplo instituições financeiras). *Ou seja: No caso das notações de risco que respeitam à designada dívida *Ou seja: No caso das notações de risco que respeitam à designada dívida soberana, essas notações versam normalmente sobre a qualidade do crédito de uma entidade que também é emitente, isto é, sobre a qualidade do crédito de um Estado e não dos concretos instrumentos financeiros emitidos por esse Estado.

4. Alertas ou prevenções das agências quanto à utilização das notações Asagências de notação de risco normalmente esclarecem que assuas suas notações não pretendem reflectir (nem reflectem) uma probabilidade de incumprimento específica ou de insolvência (porque nem sequer constituem previsões, mas meras opiniões), mas, essencialmente, uma ordenação/gradação da vulnerabilidade relativa de uma entidade incumprir as suas obrigações financeiras, expressa através de uma escala ordinal. Adicionalmente, as agências advertem que as notações devem ser entendidas apenas como uma opinião e como um dos elementos, entre outros, a ponderar pelos investidores nas suas decisões de investimento. Finalmente, as agências costumam destacar que as suas notações versam unicamente sobre o risco de crédito. Este é convencionalmente integrado por dois componentes, conjugados de forma variável em função do instrumento objecto de notação e da agência que a esta procede: a probabilidade de incumprimento, por um lado, e os prejuízos previsíveis no caso de incumprimento, por outro. Ou seja: as agências costumam destacar que as suas notações não versam sobre riscos diversos do risco de crédito (porexemplo exemplo, o risco da depreciação de certo valor mobiliário decorrente da alteração nas taxas de juro e de outras circunstâncias do mercado. Face a estes alertas ou prevenções das agências de notação de risco, pode perguntar se o seguinte: Até que ponto estes alertas ou prevenções das agências podem funcionar como factores impeditivos de uma eventual responsabilidade civil das próprias agências perante as entidades notadas (clientes das agências ou não, conforme se trate de notação de risco solicitada ou não solicitada) ou perante os investidores?

4. Alertas ou prevenções das agências quanto à utilização das notações (cont.) A favor da exclusão da responsabilidade civil das agências pode argumentar se seque: Sendo as notações apenas um dos elementos que os investidores devem ponderar, não é possível estabelecer um nexo causal entre as notações e os prejuízos causados às entidades notadas pela depreciação de certo título; Sendo as notações mero reflexo da liberdade de expressão, não é possível aosinvestidores atribuir às agências a prática de qualquer facto ilícito; A responsabilização das agências conduziria ao fim da actividade de notação de risco. Contra a exclusão da responsabilidade civil das agências pode argumentar se seque: O estabelecimento do nexo causal entre as notações e os prejuízos causados às entidades notadas pela depreciação de certo título constitui um problema de prova, que não assume contornos específicos no caso das notações; Legalmente, as notações de risco não sãomeras opiniões, mas, como ressalta do Regulamento (CE) n.º 1060/2009, pareceres, o que provavelmente faz recair sobre as agências especiais deveres de cuidado; Não se vê por que motivo a actividade de notação deve ter um tratamento privilegiado em relação ao de outras actividades, quando provoque danos; Ao pretender se a responsabilização das agências, não se pretende necessariamente a instituição de um regime de responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, estranho aos quadros gerais do sistema.

5. Forma externa dos ratings (escalas de notação) Cada agência de notação de risco utiliza a sua própria metodologia para avaliar e mensurar a qualidade de crédito de um emitente ou emissão. Também a forma externa utilizada por cada agência para transmitir a sua opinião acerca do grau de qualidade de crédito do objecto sujeito a notação é distinta. No caso das três maiores agências, constata se que, a par de uma escala de rating genérica (seja de longo ou de curto prazo), que habitualmente é utilizada para ratings de emitentes e de emissões, coexistem outras escalas de rating específicas, que visam diferenciar a natureza distinta do objecto de avaliação (é o caso dos ratings de fundos de obrigações). Em geral, os ratings são expressos através de um conjunto de categorias de risco relativamente estandardizadas, que resultam de combinações de letras, conferindo uma gradação (ou ordenação) do entendimento da agência quanto ao nível de risco de crédito relativo do emitente ou da emissão. No caso da Standard & Poor s e da Fitch Ratings, que utilizam as mesmas designações, a amplitude da escala de notações de longo prazo varia entre as categorias genéricas de AAA (qualidade de crédito máxima) e D (situação de default). No caso da Moody s, a escala de notações varia entre Aaa (qualidade de crédito máxima) e D (situação de default). A Standard & Poor s e a Fitch Ratings prevêem ainda uma categoria de incumprimento selectivo ( SD (SD ou selective default no caso da Standard & Poor s e RD ou restricted default no caso da Fitch Ratings), que reflecte o entendimento das agências quanto à possibilidade de um emitente incumprir, selectivamente, uma obrigação específica, sendo expectável que cumpra as restantes obrigações tempestivamente.

5. Forma externa dos ratings (escalas de notação) (cont.) No que se refere às notações de longo prazo, à excepção da categoria AAA (que constitui o único nível de rating da categoria), as categorias genéricas AA, A, BBB, BB, B e CCC (ou Aa, A, Baa, Ba, B e Caa, no caso da Moody s) são complementadas pelos denominados rating modifiers (ou sufixos), que, no caso da Standard & Poor s e da Fitch Ratings, correspondem à adição dos símbolos + e, e, no caso da Moody s, aos números 1, 2 e 3. Estes sufixos permitem ordenar o nível de risco de crédito dentro de cada categoria. Em resultado de convenções de mercado, asnotações compreendidas entes os níveis AAA a BBB (ou Aaa a Baa3, na escala da Moody s) são habitualmente designadas investment grade, descrevendo emitentes e emissões que apresentam níveis relativamente elevados de capacidade e qualidade creditícia. Em contraste, as restantes notações são qualificadas como non investment grade (ou junk ou speculative grade). Porém, é excessivo o uso do termo junk ou lixo (muito frequente na comunicação social) para referenciar emitentes ou emissões com qualidade de crédito baixa: e isto porque tais activos não são desprovidos de valor, existindo mesmo investidores e fundos de investimento neles especializados, por aosmesmos estarem associadas, tendencialmente, rendibilidades mais elevadas (precisamente decorrentes da circunstância de o nível de risco associado ser superior).

Escalas Genéricas de Rating: longo prazo Grau de qualidade de crédito Standard&Poor's e Fitch Ratings Moody's Convenções de mercado Highest quality AAA Aaa High quality Strong payment capacity Adequate payment capacity Likely to fulfil obligations, ongoing uncertainty High risk obligations Vulnerable to default Near or in bankruptcy or default AA+ Aa1 AA Aa2 AA- Aa3 A+ A1 A A2 A- A3 BBB+ Baa1 BBB Baa2 BBB- Baa3 BB+ Ba1 BB Ba2 BB- Ba3 B+ B1 B B2 B- B3 CCC+ Caa1 CCC Caa2 CCC- Caa3 CC Ca SD C D D Investment Grade Non- Investment Grade ("junk")

6. Figuras afins da notação de risco 1. Uma figura distinta da notação de risco é, como se deduz do artigo 7º, n.º nº2, do Código dos Valores Mobiliários, a recomendação de investimento em valores mobiliários, regulada nos artigos 12º A a 12º E do mesmo Código e definida no artigo 1º, n.º 3, da Directiva 2003/125/CE da Comissão, de 22 de Dezembro de 2003, como a investigação ou qualquer outra informação que recomende ou sugira uma estratégia de investimento, de forma explícita ou implícita, em relação a um ou vários instrumentos financeiros ou aos seus emitentes, incluindo qualquer parecer sobre o valor actual ou futuro ou sobre o preço desses instrumentos, e que se destine aos canais de distribuição ou ao público. A notação de risco diferencia se da recomendação de investimento essencialmente pela respectiva forma externa (já que a NOTAÇÃO é definida, no Regulamento (CE) n.º 1060/2009, em atenção a este elemento) e pelo seu objecto (que, no caso da notação de risco, é a qualidade de crédito e, no caso da recomendação de investimento, é a decisão de investimento). Acessoriamente, ambas as figuras diferenciam se pela circunstância de só a recomendação de investimento visar, de acordo com a definição da Directiva 2003/125/CE, a adopção de determinada conduta pelos seus destinatários (no caso da notação de risco, o especialista que a emite adopta uma postura mais objectiva, embora possa influir e bastante nessa conduta); por outro lado, a prática vai no sentido de as recomendações de investimento serem pagas pelos clientes dos intermediários financeiros e as notações de risco pelos emitentes. 2. Uma outra figura distinta da notação de risco é a auditoria, que a doutrina tem relacionado com a certificação da informação preparada pelos emitentes e com a avaliação da fidedignidade das demonstrações financeiras. A notação de risco e a auditoria têm em comum a sua natureza, pois que ambas consubstanciam pareceres, mas diferenciam se quanto ao seu objecto, que, no caso da auditoria de informação financeira de emitentes, se encontra definido no artigo 8º do Código dos Valores Mobiliários ( Informação auditada ), e, no caso da notação de risco, no artigo 3º, n.º 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.º 1060/2009 (preceito do qual decorre que esse objecto é a qualidade do crédito). 3. Distinguem se também da notação de risco a classificação de créditos e os sistemas de pontuação de crédito, que eu referenciei logo no início, quando caracterizei a notação de risco pela sua natureza de parecer, implicando transformação de informação: no caso destas duas últimas figuras, não se está perante um parecer.

II. Utilidade dos ratings É a seguinte, nomeadamente: 1. Mitigam a assimetria de informação, existente nos mercados financeiros, entre o emitente (que procura financiamento) e o investidor 2. Agregam e sistematizam informação sobre a qualidade de crédito do emitente e dos instrumentos t de dívida emitidos 3. Constituem uma forma rápida de obter uma opinião prestada por analistas especializados, quanto ao nível de risco de crédito relativo de um emitente (ou emissão), por comparaçãocom outros emitentes (ou emissões) 4. Permitem ao investidor monitorizar a evolução do risco de crédito do emitente, atendendo a que, através da emissão de diferentes tipos de sinalizações (credit watches e outlooks), a agência de notação transmite uma indicação relativamente à perspectiva e timing de evolução do rating da entidade 5. Permitem a visibilidade e acesso dos emitentes aos mercados financeiros para captação de financiamento

III. Utilidade dos ratings de Estados É a seguinte, nomeadamente: 1. Contribuem parafacilitar o acesso do respectivo sector privado aos recursos dos mercados de capitais e ao investimento estrangeiro 2. Os Estados são, habitualmente, os maiores emitentes de dívida nos mercados de capitais 3. Os ratings atribuídos ao soberano têm impacto nos ratings de vários credores do correspondente país (normalmente, bancos) 4. As agências de notação de risco, habitualmente, não atribuem notações a emitentes (públicos ou privados) superiores à notação de risco do respectivo Estado, pelo que, de uma forma geral, o rating do soberano constitui i um limite it máximo ái aos ratings de outras entidades 5. Constituindo o rating do soberano a referência no respectivo país, as yields (taxas de rendibilidade) das suas obrigações servem habitualmente de benchmarks de risco, no sentido de que podem ser utilizadas como referencial da taxa de juro sem risco, com a qual são comparadas as taxas de rendibilidade associadas a outros investimentos domésticos

Significado de cada categoria de notação de longo prazo de Estados (na escala da Moody s)

IV. Efeitos possíveis das notações de risco 1. Nas fases negativas do ciclo il económico, os ratings tendem a ser revistos em bi baixa, contribuindo para o aumento da aversão ao risco, para a quebra ou mesmo secagem da liquidez e para a ocorrência de perdas nas carteiras dos investidores 2. Nocaso dos ratings dos soberanos, os downgrades são susceptíveis de exercer um impacto mais agudo na estabilidade do sistema financeiro do país: *porque afectam directamente o custo do financiamento directo do país nos mercados de capitais *porque, em países cujo sistema bancário desempenha um papel crucial no financiamento e intermediação da economia e assegura o crescimento económico (como é o caso de Portugal), downgrades no rating do soberano têm efeito na deterioração dos ratings do sector bancário, com impacto subsequente nos custos de financiamento na economia real 3. Os efeitos das sovereign rating news não se circunscrevem ao país ou mercado financeiro i no qual ocorreu essa alteração do rating (ou do outlook), tendo antes um efeito sistémico na estabilidade financeira de outros países e mercados financeiros

V. DEPENDÊNCIA FACE AOS RATINGS 1. As legislações l nacionais i exigem, por vezes, uma certa notação de risco para obter certo efeito 2. Os ratings relevam, no caso dos Estados da União Europeia, e nos termos da Directiva 2006/48/CE, doparlamento Europeu e doconselho Conselho, de 14 de Junho de 2006, relativa ao acesso à actividade das instituições de crédito e ao seu exercício (artigo 80º), para o cálculo dos requisitos mínimos dos fundos próprios das instituições de crédito 3. Relevam também para a avaliação da qualidade de crédito associada aos activos elegíveis para efeitos da sua utilização como garantia em operações de política monetária do Eurosistema (cfr. Orientação do Banco Central leuropeu, de 31 de Agosto de 2000, relativa lti aos instrumentos e procedimentos de política monetária do Eurosistema) 4. Os ratings são utilizados em inúmeros contratos privados como referencial deinvestimento, designadamente na área da gestão de fundos de investimento que utilizam as notações de risco para efeitos do cumprimento de requisitos contratuais de selecção de investimentos com determinados níveis mínimos de qualidade de crédito

VI. O PROBLEMA DA QUALIDADE DOS RATINGS E DA DEPENDÊNCIA FACE AOS RATINGS: PROPOSTAS DE SOLUÇÃO Exemplos de propostas das próprias agências: 1. Nocontexto da crise financeira iniciada em 2007, perante as evidentes falhas das agências no que respeita à avaliação de produtos estruturados, tais agências encetaram diversas iniciativas no sentido de corrigirem i fragilidades d e reformularem as metodologias de análise desses produtos 2. Com o escalar da crise para uma crise de dívida soberana, a S&P colocou em consulta pública uma proposta de revisão da metodologia de atribuição de ratings a Estados, tendo em vista a sistematização dos critérios e metodologia de análise, numa tentativa de tornar mais transparente a forma como são atribuídas as notações a Estados

VI. O PROBLEMA DA QUALIDADE DOS RATINGS E DA DEPENDÊNCIA FACE AOS RATINGS: PROPOSTAS DE SOLUÇÃO (cont.) 1. Codeof Conduct tfundamentals for CreditRating Agencies (Código IOSCO), aprovado pela Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários (International Organization of Securities Comissions IOSCO) em Dezembro de 2004 2. Já depois da criação da ESMA, foi alterado o Regulamento (CE) n.º 1060/2009 através do Regulamento (UE) n.º º513/2011, que, entre o mais: *Atribui à ESMA competência exclusiva e responsabilidade quanto ao registo de agências de notação de risco na União Europeia *Atribui à ESMA competência exclusiva e responsabilidade quanto à supervisão contínua (ongoing supervision) das agênciasde notação de risco registadas *Atribui à ESMA o poder de pedir informações às agências de notação de risco, bem como de conduzir investigações e inspecções * Atribui à ESMA do poder de aplicar multas às agências 3. O diploma federal Dodd Frank Wall Street Reform and Consumer Protection Act, de 29 de Junho de 2010, no seu Título IX (Investor Protections and Improvements to the Regulation of Securities), Subtítulo C (Improvements to the Regulation of Credit Rating Agencies), artigos 931 a 939H, veio introduzir significativas alterações no regime das agências de notação de risco

O PROBLEMA DA QUALIDADE DOS RATINGS E DA DEPENDÊNCIA FACE AOS RATINGS: PROPOSTAS DE SOLUÇÃO (cont.) At Actualmenteestá t tá a decorrer um outro processo legislativo l tendente à revisão do regulamento das agências de notação de risco, havendo já uma decisão do Conselho da União Europeia de 13 de Maio de 2013 de adopção de uma nova directiva e regulamento. Masas alterações não vão agora incidir em matéria sancionatória: a preocupação é a de reduzir a excessiva dependência face às notações de risco, reduzir o risco de conflitos de interesses nas actividade de notação e aumentar a transparência e a concorrência no sector da notação de risco [ reduce investors' over reliance on external credit ratings, mitigate t the risk ikof conflicts of interest in credit rating activities and increase transparency and competition in the sector ].

Alguma bibliografia portuguesa sobre o tema das notações de risco: ALEXANDRE, Isabel / DINIZ, Ana, O Regulamento (CE) n.º 1060/2009 e o problema da qualidade e da necessidade das notações de risco: o caso particular da dívida soberana, in Revista do Ministério Público, n.º 127, 2011, págs. 119 177, e n.º 128, págs. 9 82. ALMEIDA, Margarida Azevedo de, A responsabilidade civil perante os investidores por realização defeituosa de relatórios de auditoria, recomendações de investimento e relatórios de notação de risco, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 36, Agosto de 2010, in http://www.cmvm.pt/cmvm/publicacoes/cadernos/documents/artigo1cadernos36.p df. FRADA, Manuel Carneiro da, Sociedades e notação do risco (ratings): a protecção dos investidores, id in II Congresso Direito i das Sociedades d em Revista, Coimbra, 2012, págs. 341 346. SANTOS, Delfim Vidal, As agências de notação de risco e a crise financeira planetária, in Revista de Direito das Sociedades, Ano III (2011), 1, págs. 137 168. SANTOS, Hugo Moredo, A notação de risco e os conflitos de interesses, in Conflito de interesses no direito societário e financeiro, Coimbra, Almedina, 2010, págs. 471 563. SOUSA, Alfredo de, Informação, risco e rating, in Revista da Banca, n.º 11, Julho / Setembro 1989, págs.5 9.