TributAção Novembro de 2013 Edição Extraordinária MP 627/13 Regime tributário com o fim do RTT Passados quase cinco anos da convergência das regras contábeis brasileiras ao padrão internacional contábil ( IFRS ), bem como da instituição do Regime Transitório de Tributação ( RTT ) pela Lei nº 11.941/09, foi publicada, em 12.11.2013, a Medida Provisória nº 627 ( MP 627 ), que, dentre ouras disposições, revoga o RTT. O tão aguardado normativo, cujas disposições são aplicáveis a partir de 1.1.2015 (ou a partir de 1.1.2014, para os contribuintes que, a seu exclusivo critério, exerçam essa faculdade), tem como princípio regular, de forma expressa, a tributação aplicável às receitas, custos, despesas e variações patrimoniais reconhecidos pelos contribuintes segundo os novos critérios contábeis adotados no País. A MP 627 regula, dentre outros aspectos, os impactos fiscais aplicáveis a receitas e despesas decorrentes do reconhecimento de ajustes a valor presente sobre elementos do ativo e passivo, bem como de ajustes positivos e negativos do valor justo de ativos e passivos. Como regra geral, os impactos fiscais de referidos ajustes a valor presente e a valor justo são reconhecimentos à medida da realização de referidos ativos ou passivos. Ademais, a MP 627 confirma, em grande medida, procedimentos adotados pelos contribuintes na vigência do RTT, especialmente em relação a despesas relacionadas à depreciação de ativos, arrendamento mercantil, bem como teste de recuperabilidade (impairment). Apresentamos, a seguir, comentários mais específicos em relação a outras matérias relevantes trazidas pela MP 627: Ágio pago na aquisição de participações societárias Nos termos da MP 627, o custo de investimento de participação societária avaliada pelo método de equivalência patrimonial passará a ser segregado entre as seguintes contas: (i) patrimônio líquido; (ii) mais ou menos valia, que corresponde à diferença entre o valor justo dos ativos líquidos da investida e o patrimônio líquido; e (iii) ágio por rentabilidade futura (goodwill), que corresponde ao valor residual do custo de aquisição do investimento após a determinação dos valores correspondentes às contas (i) e (ii), acima.
O valor da mais-valia e do goodwill deverá estar fundamentado em laudo de avaliação elaborado por perito independente, a ser protocolado perante a Receita Federal do Brasil até o último dia útil do décimo terceiro mês subseqüente ao da aquisição da participação (ou registrado em Cartório de Registro de Títulos e Documentos em versão sumarizada). A MP 627 manteve a possibilidade de os contribuintes deduzirem as despesas de amortização do ágio por rentabilidade futura (goodwill) quando da apuração do lucro real, à razão máxima de um sessenta avos (1/60) para cada mês. Entretanto, essa possibilidade está condicionada ao cumprimento dos seguintes requisitos: (i) a aquisição deve ter ocorrido entre partes independentes, sendo que a própria MP tratou de definir o que sejam partes dependentes. Em linhas gerais, a dependência deverá ocorrer nos seguintes casos: (a) quando o adquirente e o alienante são controlados, direta ou indiretamente, pelas mesmas partes; (b) quando houver relação de controle entre adquirente e alienante; (c) quando o alienante for sócio, titular, conselheiro ou administrador da pessoa jurídica adquirente ou quando o alienante for parente ou afim até o terceiro grau dessas pessoas; e (d) quando puder ser inferida dependência em razão de outras relações entre as pessoas jurídicas, ainda que indiretas. (ii) o laudo de avaliação elaborado por perito independente deve ser tempestivamente protocolado ou registrado; (iii) a adquirente deve absorver o patrimônio da sociedade adquirida por incorporação, fusão ou cisão (ou vice-versa); e (iv) o ágio por rentabilidade futura (goodwill) não poderá ser originado em razão de operação de substituição de ações ou quotas de participação societária. A nosso ver, o fato de as condições acima terem sido expressamente enumeradas pela MP 627 pode ser usado, de certa forma, para defender, com fundamento na ausência de dispositivo legal até então aplicável, a validade dos procedimentos adotados pelos contribuintes em casos nos quais se discutem, por exemplo, a validade do chamado ágio interno, a forma de aquisição do investimento ou mesmo os casos em que as autoridades fiscais questionam as características de laudos de avaliação. Essas questões serão detalhadas no artigo A MP 627/13 e os processos administrativos que tratam da amortização fiscal do ágio do presente Boletim.
Os valores registrados pela pessoa jurídica em contas de mais ou de menos valia serão considerados como parte integrante do custo do bem ou do direito para fins de determinação de ganho ou perda de capital, depreciação, amortização ou exaustão. Nesse caso, a MP 627 também condiciona esse tratamento à ocorrência de incorporação, fusão ou cisão da sociedade adquirente com a adquirida (ou viceversa), bem como ao atendimento das disposições previstas nos itens (i) a (iii) acima. Por fim, é importante mencionar que o artigo 61 da MP 627 estabelece, de forma expressa, que as atuais regras que regulam a amortização fiscal do ágio pago na aquisição de participações societárias (artigos 7º e 8º da Lei 9.532/97) continuam aplicáveis às operações de fusão, cisão, incorporação realizadas até 31.12.2015, cuja participação societária tenha sido adquirida até 31.12.2014. Ganho em compra vantajosa (deságio) aquisição de participações societárias A MP 627/13 também reformulou o conceito e o tratamento atribuível à figura do deságio. Seguindo o padrão contábil internacional, o chamado ganho proveniente de compra vantajosa, passou a ser definido como o valor correspondente ao excesso do valor justo dos ativos líquidos da investida. A princípio, os valores registrados a título de ganho por compra vantajosa deverão ser computados na determinação do lucro real apenas no período de apuração da alienação ou baixa do investimento, pela alteração do artigo 20 do Decreto-Lei 1.598/77. Entretanto, nos casos de incorporação, fusão ou cisão, bem como de transferência do investimento, o ganho por compra vantajosa será computado na determinação do lucro real à razão mensal mínima de um sessenta avos (1/60). Dividendos e Juros sobre Capital Próprio Passado: O artigo 67 da MP 627 determinou que os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados entre 1º de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2013 que tenham sido efetivamente pagos até a data de publicação da MP (12.11.2013) em valores superiores aos apurados com observância dos métodos e critérios contábeis vigentes em 31.12.2007, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido do beneficiário. Por sua vez, o artigo 68 estabeleceu que, para fins do pagamento de JCP nos anoscalendários de 2008 a 2013, os contribuintes poderiam adotar o patrimônio líquido obtido a partir das regras contidas na Lei das Sociedades Anônimas após as
alterações promovidas pela Lei 11.638/07. Contudo, o artigo 70 da MP 627 definiu que essa regra seria somente aplicável aos contribuintes que fizerem a opção pela aplicação da MP 627/13 já a partir do anocalendário de 2014. A redação dada ao artigo 67 também não deixa claro o tratamento tributário aplicável a dividendos pagos a partir da publicação da MP 627/13 e 31.12.2013, independentemente da opção pela aplicação de suas disposições a partir de 1.1.2014. A despeito desses pontos, entendemos que existem bons argumentos para sustentar que, caso o contribuinte não opte por adotar as disposições da MP 627 a partir de 1.12014, as regras de tributação de dividendos e JCP previstas na Instrução Normativa nº 1.397/13 (ainda em vigor) não poderiam ser aplicáveis, em razão de clara violação ao princípio da irretroatividade tributária. Futuro: a partir da adoção dos dispositivos da MP 627 (1.1.2014, para os optantes, e 1.1.2015, para os não optantes), entendemos não restarem mais dúvidas a respeito da não tributação dos dividendos distribuídos aos acionistas, na medida em que o RTT estará formalmente revogado, afastando a aplicação das disposições da IN 1.397/13. Ademais, a MP 627/13 modificou a redação da Lei 9.249/95 para esclarecer que apenas as seguintes contas do patrimônio líquido devem ser levadas em consideração quando do cálculo do limite para pagamento de JCP: (i) capital social; (ii) reservas de capital; (iii) reservas de lucros; (iv) ações em tesouraria; e (v) prejuízos acumulados. Assim, os eventuais ajustes decorrentes da aplicação das novas regras contábeis que impactem a conta de Ajuste de Avaliação Patrimonial ( AAP ) não integrarão o cálculo do limite para pagamento de JCP. Contribuições ao PIS e COFINS A principal alteração trazida pela MP 627 em relação ao regime cumulativo do PIS/COFINS refere-se ao alargamento da base de cálculo dessas contribuições. Ao alterar o conceito de receita bruta previsto no Artigo 12 do Decreto-Lei nº 1.598/77, além de incluir expressamente na base de cálculo do PIS e da COFINS as receitas decorrentes de operações em conta alheia, a MP 627 também estabeleceu a incidência das contribuições sobre as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica. Adicionalmente, a nova redação dada ao Artigo 3º, 2º, inciso II da Lei 9.718/98 não mais exclui da base de cálculo do PIS e da COFINS no regime cumulativo as receitas de equivalência patrimonial.
Em relação ao regime não cumulativo das contribuições as alterações trazidas pela medida provisória visam, em grande medida, adaptar a incidência do PIS e da COFINS aos princípios e normas contábeis adotados no Brasil a partir da publicação da Lei nº 11.638/07, sendo os impactos fiscais reconhecidos, como regra geral, à medida da realização das receitas/ganhos. Conclusão A publicação da MP 627, aguardada há tempos pelos contribuintes, veio pôr fim às diversas incertezas a respeito do tratamento fiscal aplicável ao novo padrão contábil brasileiro que já vigorava há quase cinco anos. Como é comum quando da introdução de novas regras tributárias, há dispositivos que merecem ser aprimorados, o que se espera ocorrer no processo de conversão dessa medida em lei. Contudo, espera-se que com sua conversão, seja também assegurada maior segurança jurídica aos contribuintes em relação ao tratamento fiscal aplicável às suas atividades empresariais.