O poder da novela: fascínio desde os primórdios da televisão



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1 O poder da novela: fascínio desde os primórdios da televisão Kelly SCORALICK 1 Introdução Os meios de comunicação social são atores fundamentais no processo de construção da identidade de uma sociedade. Afinal, pensar a sociedade é trazer a cena os meios de comunicação social, presença constante onde quer que a vida aconteça. Entre eles, ganha destaque o poder exercido pela televisão. Ela que continua sendo um dos laços da modernidade, nos alcança nos diversos tempos e espaços. É capaz de penetrar na sociedade, principalmente através de sua programação variada, montada justamente para atender às expectativas do público, de forma a encantá-lo e cativá-lo. Não se pode negar que, entre os mass media, temos como grande fator de influência sobre a sociedade a narrativa das telenovelas, que ajuda a construir certas identidades de gênero. Auxiliam no sentido de formar mentalidades, construir valores e narrar a realidade à sua maneira, interferindo de maneira crucial na construção das identidades. É a representação social das identidades na TV. É símbolo de identificação, tanto individual quanto coletivo. Numa mistura de teleficção com realidade, o gênero apresenta-nos personagens próximos do nosso mundo cotidiano, o que facilita o processo de identificação e projeção. O homem comum se empolga com a figura do herói, tão bem representado na telenovela. Os contos de Cinderela relevam os sonhos, fantasias e esperanças de muitas mulheres. E com esses elementos, entre outros, a telenovela vai atraindo cada vez mais a audiência. Será a força da narrativa, a síndrome de Scherazade, que provoca tanto fascínio no telespectador? Será somente a fábrica de sonhos responsável por criar e manter o hábito de assistir às novelas? Por que na telenovela a pessoa se reafirma como sujeito? Projeta-se, identificase? Essa é a proposta do nosso estudo. Para o pensador francês Edgar Morin (1981), o imaginário próprio da cultura de massa funciona através de mecanismos de identificação e projeção dos indivíduos, com os mitos e modelos advindos dos produtos da indústria cultural. Enquanto produto cultural, a telenovela vai destinar-se a um grande público comum, além de trazer características inerentes à sua cultura como versatilidade de gêneros e temas, criação de estereótipos (rotulagem) e personificação e mitificação de seus personagens heróis e heroínas. Além disso, a telenovela revela, em sua essência, um processo de construção do cotidiano, a partir da análise de novas questões, polemizando e discutindo novas situações, valores, comportamentos etc. Jesús Martin-Barbero (1997), por sua vez, mostra-nos a importância do melodrama para a cultura latino-americana. Segundo Barbero, o melodrama é a matriz da nossa cultura. Mas vejamos como foi que esse grande sucesso ganhou forma na TV, veículo de comunicação que completa 60 anos na América Latina. 1 Mestranda em Comunicação Universidade Federal de Juiz de Fora, MG

2 1. MUITO PRAZER, TEVÊ A chegada do novo veículo trouxe grandes mudanças para a comunicação e para a sociedade. Tornou-se o olhar eletrônico que documenta imagens impressionantes. O mundo começou a ver o mundo pela TV. As primeiras tentativas para criação do veículo aconteceram em 1925 quando o cientista John Lodgie Baird, natural da Escócia, projetou a imagem de um vizinho "em um complexo de fios emaranhados, lâmpadas e uma maquineta razoavelmente assemelhada a uma câmera fotográfica" (VAMPRÉ, 1979, p.193). Essa foi a primeira experiência de sucesso de transmissão de TV que se tem conhecimento. Por esse motivo, Baird foi considerado como o mais destacado cientista de televisão. Mas não se pode precisar quem a inventou, nem quando foi inventada. Ela foi criada graças ao trabalho de inúmeros estudiosos. A NBC foi registrada, em 1931, como a primeira emissora de televisão do mundo. Na época, havia somente televisores coletivos com grandes telas, instalados em locais públicos. Mas logo a população tomou gosto pelo novo veículo de comunicação e iniciou-se a industrialização dos televisores domiciliares. No final dos anos 40 e início dos 50, a magia da TV espalhou-se definitivamente pelos quatro cantos do planeta. No Brasil, as primeiras transmissões e recepções de televisão se realizaram em Juiz de Fora, em 1948. Com a aparelhagem técnica construída por Olavo Bastos Freire, a Rádio Industrial passou a transmitir diferentes programas de televisão, festas do centenário da cidade e também jogo de futebol, como o de maio de 1950, entre Bangu, do Rio de Janeiro, e Tupi, de Juiz de Fora. Mas oficialmente a televisão foi implantada no país em 18 de setembro de 1950, com a inauguração da PRF-3 TV Difusora, TV Tupi de São Paulo, canal 3. Com imagens em preto-ebranco que foram transmitidas para um pequeno número de aparelhos, o Brasil entrou definitivamente para a Era da Televisão. A televisão pioneira da América Latina foi inaugurada por iniciativa do jornalista Assis Chateaubriand, proprietário de importantes veículos de comunicação da época, como jornais (Diário da Noite, Diário de São Paulo), revistas (O Cruzeiro) e emissoras de rádio (Rádio Tupi). Quanto à televisão, chegara ao Brasil, logo no primeiro ano da década de 50, trazida por Assis Chateaubriand. Diferentemente do rádio, cuja técnica também fora pioneiramente pesquisada (Roquete Pinto) em território brasileiro, a tevê entrou no país como um dos tantos equipamentos e novidades que se importavam febrilmente no período de pós-guerra. Embora já fosse um medium amplamente comercializado nos Estados Unidos, aqui não passava de uma novidade tecnológica (SODRÉ, 1990, p.98). TV na Taba estreou a programação da televisão brasileira, com um show dirigido por Cassiano Gabus Mendes, com a participação de artistas de sucesso, como Lolita Rodrigues, Hebe Camargo, Mazzaroppi, Lima Duarte, Walter Foster, entre outros. A segunda emissora de TV entrou no ar em janeiro de 1951, desta vez na cidade do Rio de Janeiro. Era a TV Tupi do Rio. Sem melhores condições, trabalhando somente com emissões ao vivo, a TV se apoiou por muito tempo no espírito do rádio, principalmente da radionovela, estilo campeão de audiência na programação. Os anos 60 consolidaram a TV no Brasil. Estabeleceu-se um estilo próprio para o veículo que, aos poucos, foi criando uma linguagem específica e uma programação baseada na associação da informação à imagem.

3 A publicidade chegou de vez a telinha e, assim, iniciou-se a disputa pela audiência. Junto com ela, chegaram os primeiros equipamentos de videotape. Começou aí a fase revolucionária da televisão. Com a inovação, o comercial passou a ser gravado; ampliou-se a cobertura jornalística, permitindo tomadas em outras cidades, em outros Estados e até mesmo no exterior, dando impulso às chamadas Redes de Televisão; os programas passaram a ter um melhor acabamento, sem imprevistos de última hora; com a possibilidade de gravação antecipada de capítulos, o teleteatro foi favorecido, as novelas passaram a ser diárias na programação da televisão. Em 26 de abril de 1965 surgiu a maior emissora do país: a Rede Globo de Televisão. Contando com uma bem-sucedida experiência radiofônica e com uma parceira estabelecida com o grupo Time-Life, dará nova dimensão à produção das telenovelas no Brasil (COSTA, 2000, P. 151). Nessa mesma época, foi criada a Embratel - Empresa Brasileira de Telecomunicações. Segundo Vera Iris Paternostro (1987, p. 28), a Embratel foi responsável por implantar uma extensa malha de microondas ligando diversos pontos do país, possibilitando, assim, a criação da estrutura para as redes nacionais de televisão, com a transmissão via satélite. O primeiro programa transmitido para todo o Brasil foi o Jornal Nacional, gerado em 1 o de setembro de 1969 pela Rede Globo. Em 1972, a televisão ganhou cor. A primeira novela colorida foi ao ar em janeiro de 73, produzida pela TV Globo: O Bem Amado, de Dias Gomes, grande sucesso da época, dentre tantas outras telenovelas transmitidas no mesmo período. Um gênero que foi inaugurado na TV logo no ano seguinte de sua fundação e reina até hoje como vedete no horário nobre da televisão brasileira. 2. Telenovelas A novela é um estilo que fez sucesso nas rádios do país e permanece até hoje embalando as noites do grande público, agora direto das telas da TV. Os anos 30 já apresentavam as primeiras estórias dramatizadas ao microfone através do radioteatro. Mas foi na década de 40 que teve início a idade de ouro das radionovelas produzidas no Brasil, que se estendeu por duas décadas. Com a chegada da TV, na década de 50, a radionovela emprestou suas características à criação do mesmo gênero na telinha. Sua vida me pertence foi a estréia do gênero na TV Tupi no ano de 1951, com toda a transmissão feita ao vivo. A partir da criação do videoteipe, as novelas começaram a ser gravadas antecipadamente e tornaram-se diárias, criando-se o hábito entre as pessoas de assisti-las. Um dos primeiros grandes sucessos da telenovela foi A moça que veio de longe, que a TV Excelsior pôs no ar em 1964. Nesse mesmo ano, uma das maiores audiências do rádio foi adaptada para a televisão, alcançando, mais uma vez, grande popularidade. O direito de nascer foi transmitida pela TV Tupi e retransmitida no Rio pela TV Rio. E os anos 60 trouxeram a consolidação da telenovela que manteve, por algum tempo, a temática baseada em tragédias e melodramas. Mas logo, a realidade e o comportamento brasileiros chegaram às telas, tendo início com Beto Rockfeller, em 1968. Foi, então, a ruptura com o estilo fantasioso, também conhecido como mexicano, que dominava na produção anterior - Sheik de Agadir, transmitida pela Rede Globo, em 1966 propondo uma alternativa mais realista, com referências compartilhadas pelos brasileiros. Desde então, o produto novela não parou de crescer. No Brasil, por força do sucesso das novelas, a programação no horário nobre é absolutamente igual de segunda a sábado: uma novela, uma novela, um jornal, outra novela, um filme ou show ou humorístico ou programa especial (ALMEIDA et al, 1988, p. 34).

4 Hoje é apresentado com um padrão estético já consolidado e com uma audiência cativa, o que o torna o programa da família brasileira, além de um hábito comum entre as pessoas. O telespectador adquire o hábito de todo o dia, numa determinada hora, assistir ao mesmo programa. O horário da novela é uma instituição na TV brasileira e costuma determinar a hora do jantar e até de dormir. As classes populares têm o hábito de dormir "depois da novela das oito", que continua a ser assim chamada, apesar de atualmente ir ao ar das 9h à 10h da noite. Também é comum as pessoas marcarem seus compromissos noturnos para "depois da novela (LOPES, 2002, p. 07). A novela é marcada pela reconstituição, semana após semana, das tramas e o desenvolvimento do enredo, comparado ao desenrolar de um novelo, segundo trançados dramáticos, apresentado, aos poucos, como uma história parcelada. Aqui nos remetemos a uma espécie de Suma da sabedoria ancestral: o desempenho de Scherazade como contadora de histórias, apresentada em As mil e uma noites, uma coletânea de contos da literatura árabe e retomada na obra de Roberta Manuela Barros de Andrade (2003a). Disposta a pôr fim na ira do sultão Schariar, que depois de traído pela esposa, passou a dar fim em cada uma das mulheres com as quais passava a noite, Sherazade se entrega ao Sultão. Sob o pretexto de desejar passar sua última noite com a irmã, solicita que pudesse esta também dormir no quarto nupcial, pois conforme combinara, uma hora antes do amanhecer, a irmã deveria acordar Scherazade e pedir-lhe que contasse uma de suas histórias. Assim se deu. Só que rompido o dia e para respeitar os hábitos do Sultão, ela suspende o final da história, e quando a irmã a considera maravilhosa, Sherazade afirma ser a continuação mais encantadora ainda e, se o Sultão lhe permitisse mais um dia de vida, ela a terminaria na noite seguinte. Deslumbrado com a narrativa, ele o concede. E desse modo os episódios vão se sucedendo por mil e uma noites (ANDRADE, 2003a, p.15). Esse grande invento de Sherazade é uma estratégia narrativa que foi absorvida pelas telenovelas. Os pontos principais da estória são distribuídos de forma a manter a tensão dramática, através de sucessivos capítulos. O suspense mantém o desenrolar da estória, induzindo o telespectador a acompanhar, dia após dia, a telenovela, sentindo as paixões e sofrimento dos personagens. Aliás, são estes paixões, emoções e afetos que formam o enredo das telenovelas. Como não se lembrar das estórias de amores impossíveis, dos heróis e heroínas sofredores, vilões obstinados por sentimentos de vingança, entre outros, tão variados, em grande número e de grande sucesso que compõem a novelas brasileiras? A telenovela trouxe com ela características marcantes, com uma versatilidade de temas que fascinam os telespectadores e satisfazem, assim, ao gosto dos mais diversos públicos. Desde enredos tradicionais, clássicos, de suspense, aqueles conhecidos como água com açúcar, de humor escrachado, chamados de comédia pastelão, até aqueles mais urbanos, realistas, centrados em abordar assuntos polêmicos da sociedade. Falam do cotidiano e problemas das pessoas às quais se dirigem.

5 Pressinto que nossa percepção da sociedade brasileira, os modos de ver e compreender nossa realidade são mediados, para uma grande parcela da população, pela telenovela, que, com sua intensa penetração na paisagem urbana e rural brasileira, fornece um repertório comum por meio do qual pessoas de classes sociais, gerações, gênero e regiões diferentes se posicionam entre si e interpretam o mundo ao seu redor. Esse repertório adquire, assim, foros de veracidade e medeia a compreensão que temos de nós mesmos e da sociedade a que pertencemos (ANDRADE, 2003b, p.02). A telenovela funciona como evasão do cotidiano, quando permite sonhar e vislumbrar novos universos, e como ponto de partida para refletir sobre temas pouco discutidos pela sociedade. Enfim, o contexto sócio-cultural dá forma à produção simbólica. 4- O cotidiano na narrativa ficcional: identificação e projeção A negociação/interação/troca funciona como componente que aproxima os telespectadores da realidade de nossa sociedade, de uma forma geral. A novela se tornou um veículo que capta e expressa a opinião pública sobre padrões de comportamento privado e público, produzindo uma espécie de fórum de debates no país. Ela propõe pontos de vista diferentes sobre problemas sociais e constitui uma discussão sobre uma variedade de princípios morais. Retrata temas polêmicos, peculiares ao espectador, que consegue se identificar com os personagens da obra e seus conflitos, justamente por descobrirem semelhanças da ficção com a vida real e vice-versa. Esta capacidade de exacerbar emoções decorre, em parte, do fato de que a telenovela é uma dramatização e representação da vida cotidiana, com todos os seus problemas, conflitos, resoluções e comportamentos. Essa noção de que se trata de uma narrativa que conta como a vida é, atua como um fator que minimiza a distância entre a personagem e o ator, criando a ilusão de que se trata de uma história real (ANDRADE, 2003a, p.58). Essa aproximação com temas da vida real é bem acentuada no horário dedicado às novelas das 20 horas. Mais do que as demais, a novela exibida nesse horário pretende ser a representação da verdade. Ela ficcionaliza o real e realiza a ficção. Há uma mistura do mundo de fantasia, próprio da telenovela, com a vivência da realidade. Uma tendência capaz de transformar o verossímil em real. E personagens em pessoas. Manoel Carlos, idealizador de grandes sucessos, como Por Amor (1997), Laços de Família (2000), Mulheres Apaixonadas (2003), Páginas da Vida (2006) e a atual Viver a Vida, é um dos autores de novela que bem sabe fazer isso. Em Páginas da Vida, por exemplo, foram montadas narrativas com situações corriqueiras do nosso dia-a-dia, que resumem a rotina comum de qualquer cidadão. Ao retratar diálogos e tipos comuns da sociedade estabelece-se aí uma relação de reconhecimento e questionamento de identidades em meio a temas polêmicos, educativos e atuais. Já em Viver a Vida, a personagem Luciana, uma cadeirante interpretada por Aline Moraes, tenta retratar desde as mínimas vivências das pessoas com deficiência, em uma experiência que mistura ficção com realidade. Para nós, o ápice da dramatização do real ficou registrado em Mulheres Apaixonadas, na cena da bala perdida, no centro do Rio de Janeiro, que causou a morte da personagem Fernanda, interpretada pela atriz Vanessa Gerbelli. E em Páginas da Vida, o incêndio de um ônibus por ladrões, também no Rio de Janeiro, aonde estavam a mãe Angélica (Cláudia Mauro) e a filha Gabi

6 (Carolina Oliveira), ocorrendo a morte da mãe. Ambas, situações que realmente fizeram e fazem parte da vida real e foram levadas para dentro da tela(e)-ficção. Podemos citar ainda a identificação na novela entre personagens da ficção e figuras públicas reais, e entre tramas e os problemas reais. Aqui, os exemplos mais lembrados são a associação da novela Vale Tudo (1988) à eleição do ex-presidente Fernando Collor de Mello. Tal identificação se estendeu ainda para uma minissérie, exibida três anos mais tarde - Anos Rebeldes a qual influenciou no processo de impeachment desse mesmo presidente. Verifica-se que as questões que são transportadas do plano fictício para o real contribuem para aproximar ainda mais a população desse gênero televisivo. Justamente esses aspectos de realidade dentro da dramaturgia, como os citados acima, é, entre outros fatores, que provocam um processo de identificação ou projeção nos telespectadores para com os personagens até mesmo para com os atores e atrizes que fazem a representação - e junto à obra, justamente pela verossimilhança com fatos do nosso cotidiano. Com o melodrama veiculado na telenovela, transportando o dia-a-dia das pessoas para dentro da tela, nos identificamos e nos projetamos. A identificação se dá através das características, tanto afetivas quanto físicas, presentes nas personagens que o público leva à sua própria vida. A projeção ocorre mediante aquelas ações menos possíveis de serem realizadas socialmente. Ao se projetarem, os indivíduos aliviam as tensões diante de uma história narrada pela indústria cultural (MORIN, 1981, p.78). Dessa forma, as identificações se dão naqueles aos quais admiramos ou temos compaixão, em um movimento de simpatia com que se tenha por uma causa, ou de empatia, pela adoção voluntária de seu sistema de valores. Os processos de identificação e projeção se dão de forma que o indivíduo molde sua conduta, de forma a parecer com alguém que lhe sirva de modelo, de modo que espere ser aceito, com a sua nova identidade. O público deixa-se influenciar de alguma forma e passa a querer ser como, torna-se idêntico a, e, muitas vezes, pretende-se ser reconhecido como tal personagem. O processo de identificação ocorre quando o espectador assume o ponto de vista da pessoa ou da personagem, tomando-o para si como um reflexo de sua situação de vida. Já a projeção acontece quando o espectador projeta seus sentimentos sobre o sujeito ou personagem televisivo, amando aqueles que o outro ama, odiando da mesma forma que o outro odeia e assim por diante. Esses processos de identificação e de transferência referem-se a níveis muitas vezes inconscientes do espectador. Anteriormente, as projeções davam-se com deuses e heróis, com seus poderes sobre-humanos. Hoje, os heróis pertencem à indústria cultural, são as estrelas do cinema e das novelas, os ídolos do esporte e da música. Podemos projetar no ídolo da televisão não só nossos desejos, mas também, sobretudo, nossos medos, tristezas, incertezas e, principalmente, aquilo que não temos coragem de viver, ou não temos condições de fazer (ORMEZZANO, 2005, p.03). Dentre tantos personagens em uma só novela, com tão diversos contextos e características, alguma coisa acaba nos enredando e provocando a identificação, em especial, quando há um envolvimento emocional com a obra. Galãs, beldades femininas, vilões, pobres ou ricos, protagonistas ou antagonistas na trama, qualquer que seja o personagem, o processo de identificação tende a ocorrer.

7 Só nos últimos meses, quantas mulheres já não sonharam em encontrar um grande amor, como o de Luciana (Aline Moraes) e Miguel (Mateus Solano), casal da novela Viver a Vida da TV Globo? E quem não sofreu junto com Luciana e família diante das maldades feitas pela irmã Isabel (Adriana Birolli)? Ou ainda quem não se comoveu com a separação de Helena (Thaís Araújo), traída pelo marido cafajeste Marcos (José Mayer)? Aqui a projeção se efetuou quando mulheres brasileiras passaram a odiar, da mesma forma que a personagem, em um primeiro momento, homens traidores e cafajestes e, em um segundo momento, mulheres que se envolvem com homens casados, no caso, a personagem Dora (Giovanna Antonelli). Esta dose de sofrimentos e injustiças presentes nas telenovelas é um dos mais eficientes mecanismos para produzir o engajamento emocional (ANDRADE, 2003a, p.65). Relembrando personagens de sucesso recente, quem não se divertiu com Bebel (Camila Pintanga) na novela Paraíso Tropical (2007), da TV Globo, e não se identificou com ela através de um processo de simpatia? As personagens é que representam a possibilidade de adesão afetiva e intelectual ao enredo ficcional, seja através de projeções, identificações ou transferências etc. As personagens vivem o enredo, são os seus valores e atitudes que trazem veracidade às narrativas. Não espanta, então, que a personagem seja o que há de mais vivo na telenovela e que de sua leitura dependa basicamente o sucesso da história (Id., Ibid., p.70). Além do processo de identificação/projeção que ocorre através das personagens, há também um desejo forte de identificação com os ambientes apresentados na dramaturgia, entre outros. Objetos de decoração, roupas, jóias, corte e cores de cabelo, bebidas utilizadas, praticamente tudo relacionado às telenovelas não fica imune nesse processo. As gírias e maneirismos usados por certos personagens são incorporados rapidamente no dia-a-dia das pessoas comuns a catigoria de Bebel, por exemplo; nomes das personagens viram moda; nomes das novelas viram nomes de lojas e produtos; e ainda nomes de personagens são usados como adjetivos para designar o caráter desviante de pessoas. A Isabel (Adriana Birolli), personagem de Viver a Vida, talvez seja hoje o nome mais cotado para ser usado neste último caso. Aqui vale ressaltar a importância das imagens na tela. A organização delas, seja pela seleção, enquadramento e montagem durante as gravações, influencia na representação e reconhecimento da uma dada realidade. A TV treina o olho do espectador. Assim, as imagens interferem no processo de identificação. As respostas produzidas pela decodificação de imagens são muito mais emotivas do que racionais e toda a linguagem televisiva é pensada para provocar isso. A câmera mostra os objetos com uma aproximação afetiva, verdadeira sedução, como que proporcionando ao espectador a possibilidade de tocá-los com os olhos. O discurso negativo que subjaz principalmente em relação à propaganda desaparece diante do tratamento mágico dado à imagem. Esse tratamento pode ser dado também às pessoas ou às personagens, um dos motivos prováveis que leva a que as pessoas se identifiquem com alguém ou projetem em alguém sentimentos ou desejos (ORMEZZANO, 2005, p.03).

8 De acordo com RAMOS TRINTA (2007), a televisão traz à imaginação arquétipos, projeta-os como protótipos e, vendo-os aceitos e adotados, os transforma em estereótipos. Este último é o que mais opera nos processo de identificação e projeção. 5- Arquétipos, protótipos e estereótipos em telenovelas Em todo o indivíduo sempre haverá arquétipos operantes. Constituem-se como uma verdade universal e imutável. Designam figuras primitivas exemplares. Fazem parte do nosso inconsciente coletivo. Como exemplo, podemos citar a imagem de Afrodite/Vênus como o arquétipo de mulher bonita; O Príncipe Encantado, como arquétipo do homem perfeito; e Cinderela, como arquétipo da mulher à procura de seu príncipe encantado, uma pessoa que a ame eternamente. Podemos, assim, afirmar que a TV traz à imaginação arquétipos, uma vez que a sustentação da estória de uma telenovela é baseada no arquétipo do encontro do Príncipe Encantado com a Cinderela. Afinal, toda novela tem como tema principal um bom rapaz que tenta ser feliz ao lado de uma mulher, que está à procura do seu grande amor. O protótipo é, por definição, um exemplar. Serve de padrão estabelecido. Estão no nosso consciente coletivo e tendem à criatividade. As telenovelas introduzem alguns personagens polêmicos, como protótipos de alguma coisa. Quando não aceitos, por causarem uma dissonância sociocultural, ao se oporem à norma vigente, os personagens acabam por ser eliminados da trama. Como exemplo, citamos a representação de um casal de lésbicas na novela Torre de Babel (1998). Por não terem sido aceitas junto à sociedade, por provocarem uma discrepância perante à moral social, o autor Sílvio de Abreu decidiu pela morte das duas durante a explosão de um shopping, colocando fim ao protótipo de homossexualidade proposto. Aqui, abrimos um parênteses para acrescentar outras características da telenovela. É considerada uma obra aberta, uma vez que as personagens e a trama podem ser modificadas ao longo da história, em decorrência das opiniões do público, medidas nas groups discussions. Retornando aos protótipos, quando aceitos, por sua vez, banalizam-se em estereótipos. São fórmulas fixas, onde não se fertiliza a criatividade ou a inovação, dificultando outras formas de pensar ou observar a realidade. É referente a idéias ou convicções preconcebidas, julgamentos antecipados. É o pensamento por clichês, é a tipificação das coisas, se faz caricatural. Faz parte do nosso sub-consciente. Tendem à imobilidade e à generalização e, portanto, pensar por estereótipos é resignar-se a não pensar. Não se pode falar de identificação e projeção sem abordar os estereótipos. São utilizados porque promovem uma identificação ou decodificação da mensagem mais rapidamente, sem qualquer tipo de reflexão sobre o que está sendo abordado. Os estereótipos mais significativos são os que se referem aos papéis sexuais, raciais, profissionais e sociais, o que pode provocar sérios problemas nas populações apresentadas de forma estereotipada, como os negros ou homossexuais, por exemplo. (Id., Ibid., p.04). Alguns personagens são belos, ricos, bacanas, doutores e madames. Outros, por sua vez, considerados como a classe subalterna, são caricatos, quase nunca bem-sucedidos. As personagens principais são mais ou menos fixadas em seus papéis e as secundárias tendem a ser estereotipadas, o que acaba gerando uma rejeição ou uma assimilação pelas avessas. Os estereótipos, pela freqüência com que aparecem nas telenovelas, assemelham-se a uma idéia próxima da verdade, mas que pode ser apenas uma perspectiva deformada e grave.

9 Se a informação não é cuidada, acaba reforçando estigmas e posturas preconceituosas, que podem significar, no mínimo, um empecilho à evolução e ao desenvolvimento social. Se a telenovela influi de forma decisiva na maneira como vemos nossa realidade social e, se a forma como nos é apresentada é estereotipada, então entendemos que nossa visão sobre a realidade fica comprometida. Daí a preocupação com os estereótipos apresentados na telenovela. 6- Conclusão Alçada à posição de principal produto de uma indústria televisiva de grandes proporções, a novela passou a ser um dos mais importantes e amplos espaços de problematização do Brasil, das intimidades privadas às políticas públicas. Ela propõe pontos de vista diferentes sobre problemas sociais. O tratamento realístico confere à telenovela alta credibilidade junto ao público. O fascínio e a repercussão pública das novelas estão relacionados também a essa ousadia na abordagem dos dramas comuns de todo dia. A maioria dos brasileiros recebe a realidade como ela é apresentada na novela, considerando as personagens e as intrigas como fazendo parte da ordem social brasileira, mas, ao mesmo tempo, utiliza as personagens para discutir suas vidas, dando um sentido à narrativa ainda maior que ela já tem. Ela põe em cena lugares comuns da condição humana. O telespectador se relaciona com a telenovela, com as suas personagens, seu meio, as situações que apresenta, o desenvolvimento das intrigas e suas resoluções. O fato das personagens também passarem pelos mesmos problemas do telespectador vivem desejos, experimentam frustrações, já que o gênero imita a vida real - é o que consideramos como a grande atração da telenovela. Como essa participação do telespectador se dá frequentemente sob um processo de identificação/projeção com uma ou várias personagens, analisamos que essa participação se efetua com intensa carga emocional. Existe um conflito psicológico. O público ama ao mesmo tempo que odeia as personagens. Os vilões, por exemplo, amamos odiar. Já os mocinhos e mocinhas, queremos sempre que a estória deles termine em final feliz. Entretanto, em vários trechos da trama, consideramos o mocinho e a mocinha como personagens enfadonhos e tendemos a gostar um pouco mais do vilão, ainda que rejeitemos suas atitudes. Os telespectadores realizam seus afetos, posicionam-se uns em relação aos outros, distribuindo sua simpatia ou sua antipatia sobre as personagens. É um processo no qual ocorrem julgamentos, contradições, ambivalências, mas que todos acabam no molde de identificação/projeção com as personagens. Essa mistura de significações instantâneas acaba por desenhar e provocar uma reflexão no telespectador sobre si mesmo, o que se revela no seu engajamento e fascínio com o gênero. Consideramos de suma importância também a representação das minorias excluídas dentro da telenovela. Como exemplo, podemos citar as pessoas com deficiência inseridas em Viver a Vida; a discussão sobre grupo de homossexuais, iniciadas já em Torre de Babel, entre outros temas. Pelo enorme poder que o gênero exerce sobre grande parte dos brasileiros, como aqui discutido, acreditamos que essa representação dá visibilidade a esse outro como diferença a ser reconhecida socialmente. Junto aos personagens da empregada, da patroa, da adolescente rebelde, do empresário, do profissional liberal, do artista, pode ganhar ainda mais espaço na telenovela o homossexual, a pessoa com deficiência, o negro, a mulher, etc. Mesmo tratando-se de ficção, lembramos que as representações devem estar desprovidas de seus estereótipos para que, como aqui apresentado, não comprometa nossa visão sobre a realidade social.

10 Toda uma vida social se investe dentro das figuras da ficção. A telenovela leva o público a fabricar sentidos e fabricar um lugar social para ele. Funciona como eficaz instância de socialização do mundo atual. Referências Bibliográficas - ALMEIDA, Cândido José Mendes de, FALCÃO, Ângela, MACEDO, Cláudia (orgs.). TV ao vivo: depoimentos. São Paulo: Brasiliense, 1988. - ANDRADE, Roberta Manuela Barros de. O fascínio de Sherazade. Os usos sociais da telenovela. São Paulo: Annablume, 2003a. - ------. A multiplicidade de leituras e de leitores na telenovela brasileira. In: Trabalho apresentado no Núcleo de Ficção Seriada, XXVI Congresso Anual em Ciência da Comunicação, Belo Horizonte/MG, 2 a 6 de setembro de 2003b. - BORELLI, Silvia Helena Simões, MIRA, Maria Celeste. Sons, imagens, sensações: radionovelas e telenovelas no Brasil. INTERCOM, São Paulo, v.xix, jan.-jun. 1996, p.33-56. - COSTA, Maria Cristina Castilho. A milésima segunda noite. Da narrativa mítica à telenovela análise estética e sociológica. São Paulo: Annablume, 2000. - FREDERICO, Maria Elvira. História da Comunicação: Rádio e TV no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1982. - LOPES, Maria Immacolata Vassalo de. Narrativas Televisivas e Identidade Nacional : O Caso da Telenovela Brasileira. In: Trabalho apresentado no Núcleo de Ficção Seriada, XXV Congresso Anual em Ciência da Comunicação, Salvador/BA, 4 e 5 de setembro de 2002. - MARCONDES FILHO, Ciro. Televisão: a vida pelo vídeo. São Paulo: Moderna, 1988. - MARTÍN-BARBERO, J. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997. - MORIN, E. Cultura de massas no século XX: o espírito do tempo - 1, Neurose. Rio de Janeiro: Florense Universitária, 1981.5ª edição. - ORMEZZANO, Graciela, POTRICH, Cilene Maria, FRIDERICH, Bibiana, CORDEIRO, Lílian. Cultura e esterótipos veiculados pela televisão. In: Trabalho apresentado grupo de trabalho de Audiovisual, VIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul, Passo Fundo/RS, 2005. - PATERNOSTRO, Vera Iris. O texto na TV:manual de telejornalismo. São Paulo: Brasiliense, 1987. - RAMOS TRINTA, Aluízio. Identidades, identificação e projeção. In: Texto de conclusão de curso na disciplina Televisão e Identidade cultural do Mestrado em Comunicação e Sociedade, FACOM/UFJF. Julho/2007. - SODRÉ, Muniz. A máquina de Narciso. São Paulo: Cortez, 1990. - VAMPRÉ, Octavio Augusto. Raízes e evolução do rádio e da televisão. Porto Alegre: Feplam - RBS, 1979. - WOLTON, Dominique. Pensar a comunicação. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2004.