Título: O USO DA DINÂMICA DE GRUPO NA SALA DE AULA Área Temática: Didática, metodologia e prática na educação escolar Autor: FRANCISCO CARLOS DA VEIGA Instituição: Universidade Federal Do Estado De Santa Catarina - Mestrado em Educação e Cultura Quando o professor(a) usa uma dinâmica de grupo na sala de aula, normalmente o que ocorre é o uso de uma técnica pedagógica quase sempre de cumprimento de tarefa ou de sensibilização, descomprometida com o processo e a história do grupo, e que não pretende continuidade ou avaliação (leitura) para nova prática afinada com a realidade grupal, suas aspirações e suas necessidades, com o objetivo da disciplina e do grupo. O uso da dinâmica de grupo implica em muito mais: 1) Antes de tudo, O quanto você tem vivido conscientemente grupo na sua vida? Você faz parte de algum grupo que se olha, se avalia, tenta entender seus processos, como funciona a relação interpessoal, sem perder de vista a intrapessoal? Você acredita no desenvolvimento do potencial humano em direção a excelência? 2) O que você tem lido a respeito de Dinâmica de Grupo? Na atualidade é grande a quantidade de trabalhos sobre o assunto, os pioneiros como Kurt Lewin, William Schutz, Dorwin Cartwright, Alvin Zander, Carl R. Roggers, Geraldo Corey e Mariane Schneider Corey, Patrick J. Callanan, J. Michael Russell, W. R. Bion, J. L. Moreno, Pichon-Riviére, Gilles Amado e André Guittet. Os contemporâneos Pierre Weil, Agostinho Miniculli, David e Zimermamm, Aurea Castilho, Fela Moscovici e inúmeros outros autores e pesquisadores tem produzido farto material, longe porém de esgotar o assunto. Cada um desses autores tem um referencial, e encaminha seu trabalho focando aspectos da vida de grupo. Seus trabalhos, quase todos nasceram de longo tempo de pesquisa em grupos laboratórios, e suas conclusões foram testadas pela prática, inclusive com tipos de grupos diferentes, a saber: grupos de treinamento psicoterapia de grupo
grupos de encontro grupos de treino de sensibilidade grupos centrados na tarefa grupos de percepção corporal grupos de criatividade grupos de desenvolvimento de equipe grupo gestáltico grupos synanon (alcoólicos anônimos, Tratamento de drogados) 3) Porém ler somente em dinâmica não basta, como você vai aprender a lidar com o dar e receber Feedback?, que consiste num movimento de tomar contato com seu sentimento e, na relação com o outro, dizer frente a todo grupo objetivamente, com clareza, sem mentir, desculpar-se, que se sente desse ou daquele jeito quando o outro faz tal ou qual coisa. Nesse momento você tem que contatar a alegria ou a raiva, o medo ou a tristeza ou o amor, e falar e ouvir sobre as coisas que você faz surgir nos outros, e que você sente. Que dizer então do papel da coordenação e da observação que como professores nos toca diretamente. Na vivência grupal, somos convidados o tempo todo a olharmos para nós mesmos, especialmente quando estamos na condição de coordenador/observador. Melhor dizendo, não é possível boa atuação, tanto como coordenador ou como observador, se não soubermos nos conhecer com coragem e verdade. O mais saudável é que o quadrante do eu aberto da janela de Johari ocupe a maior parte da figura geométrica. Para tanto é necessário gostar de si mesmo, confiar em si mesmo. Todos os bons atributos de um bom coordenador/observador estão intimamente ligados a sua abertura. Observar, olhando as pessoas como as muitas coisas visíveis e invisíveis que elas são acreditando que a observação é a porta do ajustamento e do êxito do homem, pois proporciona possibilidade de crescimento. Isso se dá em virtude de procurarmos modelos certos para copiar e errados para corrigir. Devemos então, coordenar descobrindo um estilo que se ajuste a nossa personalidade, ouvindo intuições, correndo riscos, aprendendo com os erros, usando sensibilidade, aplicando poder de síntese para fechar o que emergiu da vivência grupal. Enfim, quaisquer que sejam as habilidades necessárias para bem observar e bem coordenar, só faz bem para quem usa tudo para lidar
consigo mesmo. Só para quem gosta de grupo e de si e tem vontade firme de enfrentar o eu secreto, o eu cego, e o eu desconhecido. 4) Pelo acima descrito, gostaríamos agora de pontear alguns conceitos sobre grupo: de acordo com Kurt Lewin no livro Dinâmica de Grupo, o grupo a que o indivíduo pertence constitui a base de suas percepções e sentimentos. Assim, explica o autor, como o leito do rio talha a direção e o fluxo da água, o grupo determina o curso da vida do indivíduo. Esta interdependência entre a base e o curso configurado é inevitável, íntima, dinâmica e indefinível. Já Rogers em seu livro intitulado Grupos de Encontro refere-se a grupos como a invenção social do século. Um conceito de encontro é apresentado por Schultz em seu livro Psicoterapia pelo Encontro, é um método de relacionamento humano baseado em abertura e honestidade, consciência de si mesmo, responsabilidade por si mesmo, percepção alerta do corpo, atenção aos sentimentos e ênfase no aqui e agora. Dito isto, é importante destacar que o grupo é uma entidade com uma vida, uma linguagem, um ciclo próprio, e uma das maneiras de entender estes ciclos de vida do grupo, não importando qual seja a duração deste grupo, é observá-lo através das fases (teoria de desenvolvimento de grupo, segundo Shultz). Fase de inclusão: esta fase começa com a formação do grupo. Cada membro de um novo grupo, em primeiro lugar, procura descobrir onde se enquadra. Isto implica estar dentro ou fora do grupo, firmar-se nele como um indivíduo específico e verificar se terá a afeição do grupo ou será deixado para trás e ignorado. Quando experimenta ansiedade a respeito destes problemas, tende a mostrar um comportamento individual centrado em si mesmo, como falar em excesso, retrair-se ao extremo, exibir-se, discorrer sobre seus dados biográficos e sobre experiências anteriores. O comportamento de inclusão refere-se a associações entre pessoas, exclusão, posse, companhia. Esta necessidade de sentir-se incluído manifestase pelo desejo de receber atenção A fase de inclusão não implica fortes conexões emocionais com outros indivíduos. Como a inclusão está implícita no processo de formação do grupo,
ela em geral ocorre com o primeiro contato interpessoal na vida de um grupo. Em primeiro lugar, há a decisão de querer ou não fazer parte do grupo. Ao mesmo tempo, há uma demonstração de interesse pelo problema básico do comprometimento com o grupo. Cada novo membro está implicitamente decidido até que ponto se tornará um membro efetivo do grupo, quanto de investimentos irá retirar de outros compromissos par aplicar a esta nova relação. Fase de controle: nesta fase o interesse do indivíduo se volta para o procedimento a se utilizar para se obter uma decisão; ocorre a medição de forças, a distribuição de poder e de controle pelo grupo, a divisão de responsabilidades, competição fraternal, discussões sobre os objetivos, a organização, as regras de proceder, os métodos para tomadas de decisões. O comportamento de controle refere-se ao processo de tomar decisões em conjunto em áreas de poder, influência e autoridade. A necessidade de controle varia ao longo de um continuum, desde o desejo de ter autoridade sobre os outros (e portanto sobre seu futuro) até a necessidade de ser controlado e não assumir responsabilidade. O exemplo de uma discussão pode ajudar a distinguir entre uma pessoa que busca inclusão e outra que busca controle. Quem procura inclusão ou proeminência, quer participar da argumentação; quem procura controle, quer ser o vencedor ou estar do mesmo lado do vencedor. Quando forçado a escolher, o que busca inclusão prefere ser um participante perdedor, enquanto quem busca controle prefere ser um não participante vencedor.. O controle manifesta-se também pelo comportamento dirigido àqueles que procuram controlar. Cada expressão de independência e rebeldia exemplifica a falta de vontade, a relutância em deixar-se controlar, enquanto ser condescendente, ser submisso e ser obediente as ordens indicam graus diversos na aceitação do controle. Não há, necessariamente, relação entre o comportamento visando controlar os outros e o comportamento ao ser controlado. O controle refere-se a relações de poder, em vez de buscar proximidade emocional. Fase de afeição: resolvidos os problemas de controle da influência, os participantes de um grupo tentam integrar-se a ele emocionalmente. Vê-se então aparecer, hostilidade pessoal direta, ciúme, manifestações de
sentimentos positivos, formação de pares e, em geral, emoções e sentimentos intensificados entre os pares. Cada um procura expressar e receber manifestações afetivas e estabelece sua forma pessoal, no que concerne à intensidade e ao calor das trocas. O comportamento de afeição refere-se a emoções íntimas, de contato estreito entre duas pessoas. Afeição é uma relação diádica, isto é, ocorre entre pares, ao passo que as relações de inclusão e de controle podem ocorrer entre pares ou entre uma pessoa e um grupo. Como membro do grupo, suas ansiedades primárias concentram-se em não ser apreciado, em não ser suficientemente íntimo das pessoas ou ser íntimo demais. Há luta para obter o máximo no intercâmbio efetivo e o melhor posicionamento em dar e receber afeição. 5) Na fase de controle descrito acima é onde mais freqüentemente se instala o conflito, essa preciosa oportunidade de crescimento e transformação no grupo e que infelizmente muitos professores detestam, por terem medo ou não saberem lidar com ele. Entendido como uma das etapas do processo de grupo, o conflito se instala a qualquer tempo e em qualquer grupo, obedecendo fases evolutivas, tendo porém sua gênese nas divergências de percepções e de idéias. O coordenador do grupo normalmente é o mediador ou facilitador nas questões conflituosas, dependendo de sua idiossincrasia, o conflito poderá ser evitado, negociado, utilizado como instrumentação de crescimento ou simplesmente abafado. Para explorar-se o aspecto positivo de um conflito, deve-se trilhar o caminho da comunicação completa, colhendo as informações e percepções, entendendo-se os papéis e, principalmente, dando e recebendo feedback. O feedback, deverá ser empático, consciente, autêntico, criativo, oportuno e objetivo. Um conflito em um grupo de trabalho ou de estudo, mesmo que velado, obviamente traz prejuízo aos conflitantes, ao grupo e ao resultado dos trabalho. Apesar disso, não é errado pensar que os conflitos, de alguma forma são positivos.
Se existem diferenças, estas vêm enriquecer o desenvolvimento do grupo, em função da reação que surge, endereçando os contendores ao entendimento e ao equacionamento do problema. O conflito funciona como dispositivo para mudanças: o subserviente, eterno concordante, pode, diante de um desentendimento, agir de forma diversa daquela que lhe dava a condição comodista de aceitar tudo sem reclamar. Terá oportunidade de expor suas idéias e defendê-las, modificando sua lassidão, tornando-se combativo para expressar seu ponto de vista. Dependendo do nível de intensidade, do tempo de existência, do estágio em que se encontra, do assunto que envolve e da maneira como está sendo conduzido, o conflito pode ter conseqüências diversas: serve de impulsionador de mudanças, estimulador de desafios, faz emergirem problemas ocultos ou desconhecidos, e, o que é mais importante, proporciona a resolução desses problemas estagnadores da produção e do bem estar. A comunicação é outro elemento vital da vida de um grupo. Não se pode separar o homem da comunicação, o homem do comportamento, nem tão pouco, a comunicação do comportamento. Tudo está tão intimamente ligado e tem como e epicentro o homem na sua individualidade. O ser humano tem a capacidade de compartilhar das experiências do seu semelhante, de comunicar aos outros as suas intenções, de indicar isto por gestos, voz ou tantas outras qualidades comunicadoras. Afirma Fela Moscovici que estamos sempre comunicando algo, seja por meio de palavras ou outros meios não verbais, tais como: gestos, postura corporal, posição e distância em relação aos outros. Os grupos de encontro que Rogers anima há vários anos representam sem dúvida a melhor ilustração dessa tentativa de comunicação entre pessoas. Para que esta comunicação se estabeleça, não basta querê-la. É necessário que certas qualidades sejam postas em prática: a congruência, a atenção positiva e incondicional e a empatia. a) Ser congruente em sua relação com o outro significa ser você mesmo, estar presente em sua relação, estar aberto e não defensivo em relação aos próprios sentimentos para com o outro, dar prova em suma de uma autenticidade transparente.
b) Dar uma atenção positiva incondicional é estar pronto para aceitar qualquer manifestação do outro sem querer julgá-la c) Ser empático consiste em perceber o quadro de referência interno de uma outra pessoa com exatidão, e com os componentes emocionais e as significações a eles ligados, como se você fosse a outra pessoa, mas sem jamais perder a condição se você fosse..., do contrário trata-se de identificação. Acreditamos ser inúmeras as vantagens que o uso de recursos da dinâmica de grupo nos permite, contando que ela não seja reduzida a um recurso, jogo ou receita de bolo. Para o aluno as vantagens estão no crescimento constante, na direção da autonomia sonhada por Piaget. Em atender outras inteligências, além da lógico-matemática, convivendo com o ritmo natural da integralidade da experiência cognitiva emocional, considerando o corpo, habilidades e expressão criativa. Para o professor o trabalho com uma sala comprometida, interessada no que está acontecendo, facilitará seus esforços no cumprimento de tarefas, será uma oportunidade ímpar (porque cada grupo é diferente e o mesmo grupo não é igual de um momento para o outro), de aprender a observar e tomar decisões a partir dos fatos apresentados pelo grupo, de compartilhar a responsabilidade pelos objetivos da disciplina e instituição; de criar laços e trabalhar contando com eles. Viver sem medo, autêntica e honestamente cada momento sem o peso de ser melhor ou saber tudo, sem a tarefa de produzir conhecimento, mas com o prazer de desenvolver perfectibilidades. As vantagens para a instituição é de constituir-se num elo de uma rede que comporta o imenso bem do desabrochar, para as pessoas tornarem-se capazes de ser o que são, onde a alegria e o interesse vivo são tão naturais como o ar que se respira. Isso irá conferir mérito a escola, lhe dará fama de competente e de ser respeitosa aos valores humanos. Uma instituição animada desse fazer constituir-se-á numa equipe afinada, amada, podendo usufruir do que há de melhor na relação interpessoal.