PESSOAS COM SINDROME DE DOWN E A ATRIBUIÇÃO DE NORMALIDADE David M. Perrenoud Lindolpho FFC, UNESP Campus de Marília. Eixo Temático: Aspectos Sociais da Deficiência Agência Financiadora: Fapesp TT3 (processo 2015/10549-5) Palavras-Chave: Síndrome de Down. Desvio. Normalidade. 1. Introdução Diante as relações interpessoais encontradas na sociedade, é possível destacar que tais relações existem gestões que permitem intermediar o controle da convivência social. Gestão essa que apresenta o poder de ser difundir nos grupos sociais a função de proteção e de legitimação, sendo que nas relações sociais podem ser construídas barreiras em função de aspectos que não atendam as normas que diferenciam o normal e correto, o diferente e incorreto, assim justificando a necessidade de tal proteção. (JODELET, 2001) Diante do estranho, da ausência de informações, da falta de vocabulário e de noções que possibilitam a compreensão e descrição de certos fenômenos que estão presentes no meio ambiente, a sensação de distância é formada, fomentada justamente pelo estranho. Naturalmente uma tensão é gerada e o que é distante e não presente do círculo de convívio motiva a supressão de determinados fenômenos que não convém explorar. (MOSCOVICI, 1978) Para Becker (1977) os grupos sociais instituem regras, que estabelecem o que são considerados legais e ilegais. Tal regulamento tende a estabelecer, em momentos e circunstâncias específicas, situações sociais e tipos de comportamentos apropriados ao grupo que estabelece as normativas. A partir dos argumentos dos autores supracitados, permite-se compreender que os indivíduos que não atenderem a norma estabelecida por determinado grupos sociais, tais sujeitos seriam considerados desviantes da normativa imposta. Para Omote (2004), o desvio é um fenômeno social, o qual põe em evidência características negativas em relação aos atributos, diferenças pessoais, comportamentos ou afiliação grupal. Por intermédio desses
fatores são atribuídas características negativas, pois esses atributos ou diferenças não podem ser tolerados por não contemplarem a norma estabelecida pela audiência. É oportuno ressaltar as palavras de Bogdan e Taylor (apud GLAT, 1989, p.25), ao salientar o ponto de vista das pessoas com deficiência, os autores denotam que as pessoas rotuladas com atributos negativos, apresentam a sua maneira peculiar de compreensão sobre si mesma. Tal compreensão é geralmente distinta das outras pessoas. E diante a licitude e da capacidade de se expressar o seu pensamento, suas ideias, emoções e desejos, ressalta-se a necessidade de voltarmos nossas atenções para o que as pessoas com síndrome de Down têm a dizer. 2. Objetivos normalidade. Abordar a atribuição das pessoas com síndrome de Down em relação aos aspectos de 3. Método Participaram deste estudo cinco alunos com síndrome de Down e deficiência intelectual de uma escola especial do interior do Estado de São Paulo. Foi elaborado um roteiro de entrevista semi-estruturado, sendo formado em seu início por uma descrição pessoal do participante, e em seguida são descritas dezesseis perguntas. Para realização da coleta de dados foram realizadas entrevistas com base no roteiro supracitado, sendo devidamente gravadas e transcritas. Após a esse procedimento, os dados obtidos foram analisados com base dos estudos desenvolvidos na Analise de Conteúdo de Bardin (2008). 4. Resultados e discussão Amaral (1999) ressalta que a sociedade elege um tipo ideal para comparar os indivíduos que estão abrigados por essa sociedade, haja visto que tais comparações ocorridas no meio social podem evidenciar o afastamento ou a aproximação desses indivíduos do tipo ideal eleito pela sociedade. Com a prerrogativa da eleição de uma normativa ou tipo ideal a fim de gerar comparações sociais, ao ser questionado sobre o que considera normal ou não, destaca-se o a fala do participante P1.
Não pode xingar os outros, não pode bater. P1 A partir do relato acima, é possível observar, Quanto às questões de normalidade e da deficiência intelectual, o participante P1 utiliza o comportamento como referência para representar tanto o que ele considera normal. O participante credita ao comportamento de não agressão, seja física ou verbal, como sendo a representação de normalidade. Assim como o participante P1, pode-se observar a valorização do respeito ao próximo, conforme a abordagem o relato do participante P2. Errado, não pode bater. P2 É possível ter como hipótese que a representação de normalidade do participante P1 e do P2, ser uma reprodução procedente do seu cotidiano, considerando que o participantes possam ter vivenciado situações em que foram advertidos ou instruídos por seus responsáveis, sejam eles escolares ou não, que agredir o seu próximo é um comportamento errado, anormal. Cabe ressaltar que dos cinco participantes em que se abordou questões os aspectos sobre o que eles consideram normal, os participantes P3 e P4 não apresentaram consistências em seus relatos. Em seguida é possível destacar o relato do participante P5. Sabe falar bem, que a muda, que não sabe falar, essas coisas ai. Não é normal. Que ele se sabe falar, que não sabe, que faz um (o participante faz gestos com a mão) com a mão. Gestos com as mãos, né? Que você não entende. A pessoa não sabe entende que faz sem falar ou falar com a mão. E com a mão eu sofri, eu sei falar, sei entende que você sabe. P5 O participante P5 e as suas representações passam a ter como referência as diferenças concretas, ou seja, as diferenças originadas pelo comprometimento orgânico. Ao ser questionado sobre o que considera normal, é possível observar que o participante utiliza o
comprometimento orgânico ou a ausência de alguma funcionalidade manifestada no homem para representar o que seria normal. As diferenças do corpo humano, em especial as diferenças proporcionadas por intermédio do comprometimento orgânico, podem servir de referência para a pessoa com deficiência síndrome de Down representar as questões de normalidade e também a deficiência. Esse movimento de percepção e representação está em conformidade com a literatura especializada. A pessoa com deficiência intelectual tende apresentar a necessidade de buscar a diferença ou a sua falta e inadequação do corpo como principais referências para representar a deficiência. Oliveira (2002) por intermédio de seu estudo salienta que a falta de algum membro ou falha no funcionamento orgânico, como não enxergar, não ouvir ou não falar, podem servir como fatores preponderantes para indicar o sujeito como deficiente. Para o participante P5, a competência do sujeito em utilizar a funcionalidade de se comunicar por intermédio da oralidade e/ou da capacidade de ouvir são os principais fundamentos que utiliza para representar o que ele considera normal. Também é admissível considerar que o cotidiano e as vivencias estabelecidas pelo participante P5 marcaram profundamente as suas representações. Alguns relatos por ele apresentado, trazem imperativas significações sobre como as relações interpessoais estabelecidas entre a audiência. Ao ser questionado sobre a sua escolaridade, o participante relatou que quando estudava em outras escolas regulares, enfrentou dificuldade em se relacionar com os seus colegas, apresentando um comportamento agressivo. Tal comportamento agressivo, cabe ressaltar o seguinte relato. Porque sou as pessoas xinga que eu sou doente porque as pessoa sabe sou mal P5 É possível compreender a percepção que o participante obteve no meio social. Apresenta a atribuição de descrédito por parte das pessoas sem deficiência em relação as pessoas com deficiência. Segundo Omote (1999), um atributo ou comportamento deixa de se apenas uma diferença, quando não atingem as expectativas de determinada audiência, sendo marcadas as pessoas com atribuição de algum descrédito.
5. Conclusão Oliveira (2002) salienta que conceber a deficiência a partir da referência dos aspectos individuais de origem patológica e funcional fixa a ideia de que ser normal é estar de acordo com a expectativa social, seja do ponto de vista físico e funcional, seja do ponto de vista do comportamento e respeito às regras dos diversos grupos sociais. A partir da iniciativa das pessoas das pessoas com síndrome de Down em representar o que lhe é estranho, conjectura-se sobre a valorização dessas pessoas, como sendo sujeitos capazes de atribuir sentido para suas interações, ao invés de simples e erroneamente considera-los incapazes de realizarem tal processo de significação. Referências AMARAL, Lígia Assumpção. Conhecendo a deficiência: em companhia de Hércules. São Paulo: Robel editorial, 1995. BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. 5º ed. Lisboa, Pt: Edições70, 2008. BECKER, Howard Saul. Uma teoria da ação coletiva. Trad. Márcia Bandeira de Mello Leite Nunes: Zahar, 1977. GLAT, R. Somos iguais a vocês: depoimentos de mulheres com deficiência mental. Rio de Janeiro: Agir, 1989. JODELET, Denise. Representações Sociais: um domínio em expansão. In: JODELET, Denise (Org.). As Representações Sociais. Trad. Lilian Ulup. UERJ: Rio de Janeiro, 2001. MOSCOVICI, Serge. A representação social da psicanálise. Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro. Zahar, 1978. OLIVEIRA, Anna. Augusta Sampaio de. Representações sociais sobre educação especial e deficiência: o ponto de vista de alunos deficientes e professores especializados. 2002. 348f. (Doutorado em Educação). Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2002. OMOTE, Sadao. Deficiência: da diferença ao desvio. In: MANZINI, E. J.; BRANCATTI, P. R. (Orgs) Educação Especial e estigma: corporeidade, sexualidade e expressão artística. Marília: UNESP-Marília-Publicações/ CAPES, p. 3-21. 1999.