A UTILIZAÇÃO DA INFORMÁTICA NA ASSISTÊNCIA À CRIANÇA HOSPITALIZADA COMO FORMA DE HUMANIZAÇÃO DO AMBIENTE HOSPITALAR: O PROJETO EIC-HOSPITAIS Beatriz Rosana Gonçalves de Oliveira 1 Neusa Collet 2 Cláudia Silveira Viera 3 Flávia Antunes Ferreira 4 Suzane Snak 4 Leilane Guis 4 Ana Cláudia Sierra 4 Bárbara Souza Rodrigues da Costa 4 Mirela da Silva 4 Saionara Savarine 4 Tallyne Ariane Leuski 4 4 Michelli Vanessa Caprioli 4 Adeline Rina Furutani 4 Fernanda de Oliveira Borges 51 RESUMO: Em 1995, o Ministério da Justiça e Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente publicaram os Direitos da Criança e do Adolescente 1 Enfermeira, Mestre em Enfermagem Fundamental pela EERP-USP, docente da disciplina de Enfermagem em Puericultura, Criança e Adolescente Sadios, Criança e Adolescente Hospitalizados do curso de Enfermagem da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. 2 Enfermeira, Doutora em Enfermagem pela EERP-USP, docente do curso de Enfermagem da Unioeste. 3 Enfermeira, Mestre em Enfermagem Fundamental pela EERP-USP, docente do curso de Enfermagem da Unioeste. 4 Alunos de graduação do curso de Enfermagem da Unioeste. 5 Aluna de graduação do curso de Enfermagem da Unioeste. Endereço: Rua Mauro Tolentino, 600 Cascavel/PR. CEP:85803-070. Tel.: (45)3324-1982/9974-8727. E-mail: fernanda_borges20@yahoo.com.br.
Hospitalizados. A resolução representa um desdobramento do Estatuto da Criança e do Adolescente, cujo texto foi sugestão da Sociedade Brasileira de Pediatria. No nono item destes direitos é colocado que a criança tem direito a desfrutar de recreação, educação para a saúde ou acompanhamento do currículo escolar durante o período de internação. A partir da parceria entre a Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Universidade Federal do Mato Grosso e Comitê para a Democratização da Informática do Paraná (CDI-PR), implantou-se a Escola de Informática e Cidadania (EIC) na unidade pediátrica do Hospital Universitário do Oeste do Paraná da UNIOESTE de Cascavel/PR e do Hospital Universitário Júlio Müller da UFMT de Cuiabá/MT. Por meio da ferramenta da informática, são desenvolvidas atividades de informática e cidadania, interatividade entre as crianças dos hospitais envolvidos e realização de atividades lúdicas. O público atendido são crianças a partir de três anos e adolescentes hospitalizados. Esse projeto surge com o objetivo de humanizar a assistência à criança hospitalizada, com o sentido de minimizar os efeitos da hospitalização, por meio da recreação planejada. Busca-se ainda incluir a criança no mundo digital, tirando-a do foco da doença e proporcionando-lhe momentos de prazer. PALAVRAS-CHAVE: criança hospitalizada, informática, assistência. INTRODUÇÃO: A doença é uma situação de crise que vem a alterar a vida da criança e de sua família. Se a necessidade de hospitalização é concretizada, essa crise aumenta. Este fato pode ocasionar um amadurecimento e maior desenvolvimento psíquico ou resultar em prejuízo físico e mental. Quando o atendimento é centrado na patologia, a abordagem ao pequeno paciente se dá pela doença e na pela criança em si. O que gera desinformação e falta de afetividade entre a equipe e o paciente, causando sensações de ameaça e impotência, contribuindo para um estado de maior sofrimento e angústia nas crianças internadas (COLLET, OLIVEIRA; 2002). Quando a criança passa pelo processo de adoecer e hospitalizar, ela é obrigada a enfrentar situações como a separação dos pais ou a ausência de adultos confiáveis; o mal físico
ou dano corporal, expresso em dor e desconforto; a perda relativa da autonomia e competência; a percepção da fragilidade, de estar a mercê de; de estar se submetendo ao estranho, ao desconhecido e à possibilidade de surpresas, assim como a perda do convívio familiar, de sua rotina e suas brincadeiras (SCHMITZ; 1989). Segundo Wong (1999), a doença e a hospitalização constituem crise na vida da criança, e como estas situações são freqüentemente carregadas de estresses enormes, as crianças precisam desvincilhar-se de seus medos e ansiedades como um meio para lidar com estes estresses. Assim, as crianças precisam de oportunidades para que possam expressar suas emoções, incluindo a liberação segura da raiva e hostilidade. Essas oportunidades podem ser proporcionadas a partir de atividades recreativas. Essas atividades são essenciais para o bem-estar mental, emocional e social das crianças e, da mesma forma que suas necessidades de desenvolvimento, a necessidade de brincar não pára quando as crianças estão doentes ou no hospital. Pelo contrário, a brincadeira no hospital serve para muitas funções, podendo inclusive ser terapêutica (WONG; 1999). Consciente de que a criança merece cuidado humanizado nos hospitais, o Ministério da Justiça e o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente promulgaram os Direitos da Criança e do Adolescente Hospitalizados. Esta resolução representa um desdobramento do Estatuto da Criança e do Adolescente, cujo texto foi sugestão da Sociedade Brasileira de Pediatria. Em seu nono item garante que a criança hospitalizada tem direito a desfrutar de alguma forma de recreação, programa de educação para a saúde, acompanhamento do currículo escolar durante sua permanência hospitalar (BRASIL, 1995). Embasado neste item, o Comitê para a Democratização da Informática (CDI-PR), a Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) e Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), implantaram Escolas de Informática e Cidadania (EIC s) anexas à unidade pediátrica do Hospital Universitário do Oeste do Paraná (HUOP), em Cascavel/PR, e do Hospital Universitário Júlio Muller (HUJM), de Cuiabá/MT. A EIC do HUOP entrou em funcionamento em outubro de 2003 e a do HUJM em fevereiro de 2004. Foi implantada uma nova EIC no Hospital do Trabalhador em Curitiba/PR, totalizando agora três EIC s no Brasil. Por meio do computador e de seus recursos interativos, as atividades desenvolvidas na EIC buscam instigar a curiosidade e promover recreação
junto às crianças e adolescentes hospitalizados, desviando o foco do sofrimento decorrente da hospitalização a fim de amenizar o estresse e a pressão psíquica desencadeados pelo ambiente hospitalar. Este trabalho demonstra o funcionamento da EIC do Hospital Universitário do Oeste do Paraná apontando a informática como uma das ferramentas para a humanização do ambiente hospitalar em unidades de alojamento conjunto pediátrico. OBJETIVOS: Apresentar o funcionamento da EIC-HUOP como forma de humanização da assistência à criança hospitalizada por meio da ferramenta da informática, bem como as transformações ocorridas na assistência a partir dessa metodologia de ação/humanização. METODOLOGIA: Por se tratar de um projeto inédito, a metodologia de funcionamento da EIC-HUOP encontra-se em fase de construção e reavaliação constante por parte das pessoas e instituições envolvidas. Atualmente funciona com recursos humanos e materiais específicos, a saber: a) recursos humanos: coordenação e acompanhamento é realizado pelas docentes da disciplina de pediatria, os educadores do projeto são acadêmicos do curso de Enfermagem da UNIOESTE, que possuem conhecimentos das ferramentas tecnológicas e que se mostram habilidosos no relacionamento com crianças e adolescentes hospitalizados, além de estarem sensibilizados com a questão da hospitalização; b) recursos materiais: o projeto faz uso de cinco computadores cedidos pelo CDI-PR, caixas de som para cada computador, sala com instalação elétrica e ponto de rede, decoração e mobiliário adequado à clientela (crianças e adolescentes hospitalizados) e seis note-book para uso individual com aquelas crianças que não podem sair dos leitos. As atividades desenvolvidas contemplam aquelas de informática e cidadania, que são desenvolvidas com o uso de histórias eletrônicas que abordam a cidadania como tema, criação de apresentações eletrônicas sobre cidadania e apresentação de softwares com essa temática; de interação (entre crianças de hospitais diferentes) por meio da comunicação on-line em chat específico
(http://buscar.com.br/batepapo/chat1/chat.php?chat=infantil), com mediação de um responsável; e atividades lúdicas, como o uso de jogos recreativos, jogos pedagógicos, navegação em sites, entre outros. As atividades cotidianas dos acadêmicos do curso de Enfermagem, que são denominados educadores e desenvolvem suas atividades em duplas dedicando, no mínimo, duas horas semanais ao projeto estão descritas a seguir. Num primeiro momento dirigem-se à sala da EIC para ligar os computadores e verificar se tudo está adequado para o início das atividades. Então, deslocam-se ao alojamento conjunto pediátrico e verificam com a equipe de enfermagem quais as crianças podem sair da unidade para irem à sala dos computadores. Reúnem essas crianças e as conduzem até a sala da EIC, de preferência acompanhadas de suas mães (ou responsável). A mãe é incentivada a participar das atividades. O educador e a mãe trocam informações sobre e com a criança. Quanto ao controle de freqüência, os educadores devem deixar registrado o dia em que estiveram na EIC, o horário de início e de término das atividades, as crianças que participaram com a idade de cada uma, e o nome dos educadores. Ainda devem fazer um breve relatório sobre as atividades desenvolvidas diariamente. Quando ocorre algum problema com os computadores, registra-se o que aconteceu para mais tarde o Serviço de Informática realizar manutenção. Ao término das atividades, as crianças são levadas ao alojamento conjunto pediátrico. Os educadores devem retornar à sala da EIC para desligar os computadores e fechar a sala. O acompanhamento e avaliação continuados do projeto ocorrem através de relatórios realizados pela equipe, e, posteriormente, esses relatórios retroalimentam o projeto. Participam das atividades da EIC crianças com idade a partir de três anos e adolescentes hospitalizados. Considerando que o hospital de Cascavel é um hospital universitário e participante do Sistema Único de Saúde (SUS), as crianças atendidas pela EIC apresentam uma diversidade de realidades sócio-culturais. Devido à alta rotatividade das crianças e adolescentes, característica da unidade de intenação para crianças e adolescentes do hospital em questão, fica impossível formar um grupo específico para estudos, motivo pelo qual o trabalho é direcionado para cada criança e/ou adolescente individualmente, respeitando-se as limitações das crianças/adolescentes e a diferença de idade entre elas. Ainda, em decorrência dessa
alta rotatividade, também é inviável criar uma proposta de aprendizado seqüencial, pois a média de permanência na instituição é de sete dias. Contudo, a aproximação com a tecnologia da informática, o manuseio do computador, a conversa em rede, a exploração de jogos e sites é possível, mesmo nesse período reduzido, e por si só já garante o contato com as ferramentas da informática e a inclusão digital. RESULTADOS: As atividades desenvolvidas na EIC do HUOP com crianças e adolescentes têm tido aceitação de todos que dela participam, tornando-se uma ferramenta para a humanização do ambiente hospitalar. Após participarem da EIC as crianças e adolescentes imediatamente mudam sua expressão facial e tem-se observado diminuição do estresse da hospitalização; redução dos prejuízos escolares que os internamentos prolongados provocam às crianças enfermas, inclusão digital de crianças cujas condições socioeconômicas não permitiriam esse acesso se não fosse pelo espaço que a EIC propicia; favoreceu um espaço diferente de ensinoaprendizagem e desenvolvimento da humanização da assistência prestada pelos acadêmicos de enfermagem. Tem-se percebido o envolvimento das crianças para com as atividades. Outro ponto que merece destaque é a questão da humanização do atendimento hospitalar, que promove a redução da ansiedade e do estresse durante a hospitalização, dá apoio psicológico-emocional à criança internada, preservando-se as naturezas afetivas, cognitivas e sociais da mesma. Essas atividades criam um brincar criativo e espontâneo; fortalecem o vínculo entre crianças e acompanhantes e destes com a equipe; estimulam a integração das crianças internadas e de seus acompanhantes, fazendo a criança lidar com a situação de grupo, lidando com regras e limites; tiram a doença do foco de atenção da criança e dos familiares; mantêm a lucidez mental através dos jogos; desenvolvem a atenção e a coordenação motora; trabalham situações de agressividade e destrutividade; possibilitam obter noções de informática por meio do contato com o computador (que para muitas crianças é pela primeira vez). O projeto abre um campo para inúmeras possibilidades que se propõe tratar questões de cidadania com as crianças e adolescentes hospitalizados por terem um espaço para refletirem sobre comportamentos e atitudes diante de fatos da vida
cotidiana. Promove a possibilidade se dar mais valor à criança como ser humano, digno e merecedor de respeito, e por isso, também merecedor de vida digna. O Projeto EIC-HOSPITAIS traz ainda a possibilidade da própria criança suprir seus anseios de realização humana, de poder se reconhecer como um ser ativo na construção da felicidade e bem-estar individual e coletivo, dando a ela outra proposição de vida. Ainda, para os acadêmicos envolvidos no projeto, possibilita experienciar a extensão universitária e sua inclusão na comunidade como agentes de transformação social, uma vez que modificam sua realidade e são por ela modificados, à medida em que se envolvem com as crianças/adolescentes e suas famílias, conhecem seu cotidiano de hospitalização e interferem pela melhoria da experiência de hospitalização do binômio criança-família. Pode-se perceber que um dos maiores desafios enfrentados pelos acadêmicos/educadores é a tarefa de prestar atendimento de boa qualidade, se considerarmos que o mundo está caracterizado por mudanças rápidas, seja pelos avanços técnico-científicos ou pela transformação dos valores sociais e morais, e as crianças devem ser preparadas para esse mundo. Então, é responsabilidade do educador estar sempre pensando nas melhores oportunidades de desenvolver novas formas de cidadania capazes de criar uma sociedade mais justa e democrática. A pessoa que realiza a educação dentro do hospital deve estar apta para criar melhores condições que faça com que os educandos se constituam como pessoas, construindo conhecimentos, significados e valores importantes para a sua vida e para a sociedade. Essa constitui-se a tarefa cotidiana dos acadêmicos/educadores integrantes do projeto. CONCLUSÃO: O Projeto EIC-Hospitais traz uma proposta inovadora e inédita o computador, como uma das ferramentas que contribui com o processo de busca da humanização da assistência hospitalar à criança e ao adolescente, atraindo a atenção destes e tirando-os do sofrimento que a hospitalização causa. No entanto, ter um computador à disposição não basta, é preciso criar metodologias e avaliá-las para que essa tecnologia contribua no processo de recuperação da saúde da criança. Para
tanto, é fundamental que os educadores tenham a sensibilidade de perceber que o público atendido são crianças, que na maioria das vezes se encontram fragilizadas e amedrontadas. Este projeto é de grande importância porque traz inovação ao ambiente hospitalar por meio da tecnologia da informação, propiciando a oportunidade das crianças hospitalizadas interagirem; é educativo porque proporciona aprendizado de informática e cidadania, ao mesmo tempo em que promove a socialização das crianças e sua família. Não se pode esquecer que este projeto colabora para o desenvolvimento da ciência visto que proporciona um campo de extensão universitária organizando suas ações por meio do planejamento conjunto com os educadores, sistematiza a produção científica e consolida uma linha de pesquisa, e ainda promove a integração das instituições (UNIOESTE, UFMT, Hospital do Trabalhador e CDI-PR). Quando se espera das crianças apenas o papel de pacientes, buscando restabelecer o mais rápido possível o seu bem-estar físico e emocional, não se valoriza o fato de que o paciente é uma criança, que necessita interagir com o meio e que a principal forma de expressão da criança é o brincar (LENZI; 1992). Como Collet e Oliveira relatam, durante as brincadeiras existe a possibilidade de expressão e verbalização de seus anseios e necessidades, em relação ao seu bem-estar tanto físico quanto emocional. É importante para a equipe de saúde reconhecer a capacidade da criança de se exprimir por meios das atividades de recreação. Logo, os jogos e as brincadeiras consistem no trabalho das crianças de todas as idades e assumem uma forma crítica em seu desenvolvimento. Por causa de suas outras finalidades importantes no ambiente hospitalar, os jogos e brincadeiras constituem o foco de uma discussão em separado (WONG; 1999). Portanto, o Projeto EIC-HOSPITAIS proporciona um novo olhar para a assistência à criança hospitalizada, porque cria a oportunidade de valorizar a mesma como ser humano, que merece atendimento digno e respeito. Desse modo, possibilita à criança a chance de expressar seus sentimentos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Ministério da Justiça (BR). Resolução nº 41 de 13 de outubro de 1995. Dispõe sobre os direitos da criança e do adolescente hospitalizados. Diário Oficial da União. Brasília (DF), Seção I, p. 16319-16320, 17/10/95. COLLET, N.; OLIVEIRA, B.R.G. de; VIERA, C.S. Manual de Enfermagem em Pediatria. Goiânia: AB, 2002. LENZI, T.P. Recreação para crianças em enfermaria pediátrica. In: FRIEDMANN, A.; et. al. O Direito de Brincar. 2. ed. São Paulo: Scrita, 1992. MOURA, E. Biologia Educacional: Noções de Biologia Aplicadas à Educação. 1. ed. São Paulo: Moderna, 1993. SCHMITZ, E. M. A Problemática da Hospitalização Infantil: Aspectos Psicológicos. In:. A Enfermagem em Pediatria e Puericultura. Rio de Janeiro: Atheneu, 1989. Cap. 18, p. 181 196. SEWO, M.T.; RIBEIRO, R.L.R.; COLLET, N.; et. al. Projeto EIC-HOSPITAIS: primeiros resultados. In: FREITAS, R.C. de (org.). Inclusão digital: pressupostos teóricos. 1. ed. Curitiba: CDI-PR, março de 2005. WONG, D. L. Enfermagem Pediátrica: Elementos Essenciais a Intervenção Efetiva. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1999.