ESTRESSE POLICIAL MILITAR: EFEITOS PSICOSSOCIAIS



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Transcrição:

ESTRESSE POLICIAL MILITAR: EFEITOS PSICOSSOCIAIS Sérgio Lopes Santana 1 Alini Daniéli Viana Sabino 2 PALAVRAS-CHAVE Policial Militar, Estresse, Efeitos Psicossociais RESUMO A ação da ansiedade e o estresse durante o cotidiano humano têm sido notados por modificações em aspectos que podem acarretar modificações de caráter negativo, tanto em aspectos físicos como mentais, contribuindo para o surgimento de patologias. Dessa maneira, o trabalho policial é descrito pela literatura como o mais estressante de todos os ofícios, sendo que os policiais estão entre os profissionais que mais sofrem estresse, pois, estão constantemente expostos ao perigo e à agressão, devendo freqüentemente intervir em situações de conflito e tensão Assim, o objetivo do presente estudo é apresentar o impacto da ansiedade e o estresse no cotidiano do funcionamento executivo de Policiais Militares que desenvolvem o trabalho de policiamento operacional. O funcionamento das pessoas que trabalham com policiamento operacional pode sofrer alterações ao longo do tempo de trabalho, sendo que o resultado dessa alteração pode reduzir a qualidade do serviço de segurança pública. A presença de níveis de ansiedade e estresse considerados acima da média de uma determinada população policial militar pode de uma forma efetiva ser base de estudo para descoberta de estratégias de enfrentamento, mecanismos de controle ou extinção da ansiedade. O equilíbrio da ansiedade pode trazer qualidade de vida pessoal ao policial militar, prazer profissional e conseqüente elevação do padrão de serviço a população. 1. Estresse emocional: aspectos orgânicos No Século XVII, pela primeira vez foi utilizada a palavra stress, para definir qualquer estímulo que afetasse negativamente a pessoa humana provocando-lhe sentimento de angústia, aflição e opressão. Durante os séculos XVIII e XIX, o significado do termo se alterou para denotar na ciência física qualquer força que aplicada sobre um sistema leva à sua deformação ou destruição (Couto, 1997). 1 1 Graduando do curso de Psicologia/AEMS. 2 Mestre em Ciências pela FFCLRP/USP. Coordenadora e Docente do Curso de Psicologia/AEMS.

Na área de saúde, o termo stress foi utilizado pela primeira vez em 1926 por Hans Selye, ao observar que muitas pessoas sofriam de várias doenças físicas e queixavam-se de alguns sintomas fisiológicos em comum, tais como: falta de apetite, pressão, desânimo e fadiga. (LIPP, 1998). Atualmente, há um consenso entre os pesquisadores da área de que o estresse resulta de uma sensação de desequilíbrio entre o indivíduo e o meio social. Dessa maneira, Couto (1987), define o estresse como um estado em que ocorre um desgaste anormal da máquina humana e/ou uma diminuição da capacidade de trabalho, ocasionados basicamente por uma incapacidade prolongada do indivíduo de tolerar, superar ou se adaptar às exigências da natureza psíquica existentes no seu ambiente de trabalho de vida.1 Segundo Lipp (2010), o estresse é um desgaste geral do organismo causado pelas alterações psicofisiológicas que ocorrem quando a pessoa se vê forçada a enfrentar uma situação que de um modo ou outro, a irrite, amedronte, excite ou confunda, ou mesmo a faça imensamente feliz. Em geral, seria uma reação do organismo que ocorre quando ele precisa lidar com situações que exijam um grande esforço emocional para serem superadas. Santos (1988) define o estresse como um estado intermediário entre a saúde e a doença, durante o qual o corpo luta contra os agentes causadores da doença. Sendo assim, o estresse não é considerado, portanto, uma doença em si, mas pode tornar-se um fator desencadeante para o desenvolvimento de transtornos mentais caso o indivíduo seja submetido a uma ação constante de agentes estressores, podendo desencadear ainda o que é denominado de estresse crônico (Lipp, 2010; Kaplan, Sadock, Greeb, 1997). Para alguns autores, o estresse é sempre ruim, não contribuindo para o aumento da produtividade. Em determinadas pessoas, as reações ao estresse podem desencadear desequilíbrios em órgãos mais sensíveis, podendo causar o que é chamado de órgãos de choque. Durante algum tempo, acreditou-se que essas reações ao estresse desencadeavam uma situação específica chamada de doença psicossomática, o que atualmente se denomina de transtorno somatoforme (Benevides, 2005; Lipp, 2004; Santos, 1988). No entanto, uma outra corrente de pesquisadores consideram certo nível de estresse uma forma de aumentar a motivação. Witkin-Lanoil (1985) esclarece que o estresse pode ser de curta ou longa duração, indicando que tanto a ação imediata do sistema nervoso quanto à 2

ação de liberação retardada do sistema endócrino funcionam com o objetivo de preparar e manter o corpo para ação destinada a preservar a vida. Assim, alterações tanto físicas quanto psicológicas podem ser provocadas pelo estresse no ser humano. Couto (1987) descreve os alguns quadros físicos decorrentes do estresse como dores musculares, cefaléias, enfarte precoce, fadiga fácil, taquicardia, úlcera, abafamento no peito, palpitações, dores abdominais generalizadas, dores generalizadas no corpo, artrite, adinamia, urticária, asma, emagrecimento e infecções graves. Dessa maneira, as reações ao quadro também podem ocorrer em nível psicológico. Segundo Lipp (1998), os principais sintomas psicológicos associados às reações fisiológicas são mãos frias, problemas com a memória, boca seca, impossibilidade de trabalhar, pesadelos, nó no estômago, dúvida quanto a si próprio, enxaqueca, mudança de apetite, diarréia, dificuldades sexuais, aumento súbito de motivação, entusiasmo súbito, músculos tensos, vontade de fugir de tudo, problemas dermatológicos, apatia,depressão ou raiva prolongada, insônia, aumento de sudorese, náusea, má digestão, tiques, hipertensão arterial, pensar continuamente em um assunto, tédio, irritabilidade excessiva, taquicardia, angústia ou ansiedade, excesso de gases, tontura, hipersensibilidade emotiva, perda do senso do humor, aperto da mandíbula ou ranger dos dentes. Sendo assim, é possível que ocorram os sentimentos de raiva e agressão no nível emocional; irritabilidade, taquicardia, dispnéia ou sudorese na dimensão corpórea; e timidez, prudência, ousadia e outros comportamentos no mundo externo (Lipp (201); Benevides, 2005; Couto, 1987). Contudo, a reação ao estresse pode afetar simultaneamente três áreas ou dimensões distintas: o corpo, a mente e o mundo externo. Todo e qualquer ato praticado pelo o homem, assim como toda e qualquer reação, desenvolve-se simultaneamente nestas três áreas de sua vida. Nesse sentido, ao ato de sentir e pensar ocorrem equivalentes ao nível do corpo e do mundo externo (Lipp, 2004; Kaplan, Sadock, Greeb, 1997; Delboni, 1997). Buscando o entendimento da interligação entre essas três esferas, torna-se necessário compreender o mecanismo das emoções. Sendo que, a emoção é considerada algo difícil de ser definido, mas envolveria um fenômeno subjetivo em que estão presentes três estados: o sentimento, a resposta fisiológica e o comportamento. Esses três estados correspondem a três componentes: o psicológico, o fisiológico e o social (Lipp, 2010; Kaplan, Sadock, Greeb, 1997). Contudo, o estresse e suas manifestações podem ser observados tanto 3

pelo o estado afetivo, como pelo componente psicológico. Esta é uma experiência consciente e subjetiva que pode sofrer influências das vivências pessoais e do meio ambiente como família, trabalho, comunidade e outros (Lipp, 2004); Delboni, 1997). Para Girdano e Everly (apud Romano, 1989), os estímulos que propiciam a resposta de estresse são chamados de estressores, e podem ser decorrentes de três causas básicas: causas psicossociais envolvendo adaptação à mudanças excessivas, frustração, sobrecarga e privação; causas bioecológica como ritmos biológicos, hábitos nutricionais e ruídos excessivos; e ainda causas relacionadas à personalidade como auto conceito, padrões de comportamento e ansiedade excessiva. Spielberg (apud Romano, 1989), por outro lado, considera como fonte de estresse o próprio desenvolvimento humano, que em cada fase apresenta situações novas e estressantes com as quais o indivíduo precisa aprender a lidar, como a aprendizagem da criança, o desenvolvimento da adolescência, as experiências da idade adulta, como o casamento e as dificuldades da velhice. A própria escolha profissional envolve conflito e stress ocupacional. Romano (1989) e Portella Bugay (2007) consideram ainda como significativa fonte de estresse, os fatores ligados à natureza da atividade e da instituição Policial Militar. 2. O Estresse na atividade operacional do Policial Militar O estresse está presente na vida do policial militar e pode influenciar de maneira decisiva no seu comportamento dentro e fora de sua atividade profissional (Silva, Vieira, 2008; Allegrette, 1996). A polícia militar, pela natureza do trabalho, expõe o profissional a constantes desgastes físico, mental e emocional em sua prática profissional diária. A atuação em ambiente desumano, complexo e hostil estão entre os fatores que contribuem para este fenômeno (Portella, Bugay, 2007; Dourado, 1993; Zuluar, 1997). A convivência diária com a injustiça social, violência urbana e, sobretudo, com o risco de matar ou morrer no atendimento a ocorrências, influencia consideravelmente o comportamento, as decisões e a forma de ver, ouvir e entender as realidades da vida (Silva, Vieira, 2008). Entretanto, o policial não é o único que sofre as conseqüências do es- 4

tresse provocado pelo seu trabalho (Finn, 1997). No ambiente familiar, o membro da corporação militar tende a desligar as emoções em relação a sua família e é levado a um processo de afastamento e procura de relações fora de casa. Na rua, alguns podem extravasar suas frustrações sobre os cidadãos tornando-se arbitrários, agressivos e grosseiros (Portela, Buagy, 2007; Romano, 1989). Alguns estudos apontam o estresse e outros problemas emocionais ligado ao policial militar como sendo um dos responsáveis pelo alto índice de suicídio, divórcio e alcoolismo no meio Policial (Silva, Vieira, 2008; Portella,Bugay, 2007; Finn, 1997). Selye (1996), afirma, com efeito, que o trabalho Policial é uma das ocupações mais estressantes quando comparado a outras atividades, sendo que os policiais apresentam diversas doenças relacionadas ao estresse da prática profissional. Em pesquisa realizada foi verificado que, dentre 149 profissões estudadas apenas 10 excediam a Policial em doenças do coração, diabetes, insônia, suicídio e outras relacionadas com o estresse (Farias, 1998). No trabalho diário, o policial encontra alta taxa de adrenalina estando sempre preparado para agir. À medida que aumenta o nível de tensão, aumenta também o nível de vigilância e de expectativa, passando a estar pronto para agir a qualquer instante de maneira enérgica. O profissional vive sob pressão constante e em conseqüência, sofre alteração no seu padrão normal de pensar e agir, além de apresentar dificuldades para estabelecer prioridades ocasionando sensações de hesitação, visão estreita, raciocínio confuso e ilógico que passam a fazer parte do seu dia a dia (Portela, Bugay, 2007; Farias, 1998, Besse, 1995). Em matéria intitulada na revista Isto É (09-08-95), Os campeões da neurose, segundo a revista, estudos feitos pelo instituto de Ciências e Tecnologia da Universidade de Manchester na Inglaterra, apontam a profissão policial como a segunda mais estressante do mundo. 3. Efeitos psicossociais: resultado de ocorrências anteriores No trabalho policial, o atendimento das ocorrências se faz com equilíbrio, usando a força de forma moderada apenas para quebrar a resistência do indivíduo infrator. No entanto, não devemos supor que o policial prossiga imune após o atendimento de uma ocorrência de alto risco, especialmente se houver morte ou ferimentos grave, uma vez que estas deixam seqüelas irreparáveis 5

(Zalluar, 1999; Allegretti, 1996). Spielberguer (1981) em estudo realizado para identificar as principais fontes de estresse no trabalho da policia, selecionou oitenta itens considerados estressores e que envolviam todas as fases do trabalho da polícia. A seleção desses itens foi realizada com a ajuda de um comitê consultivo do qual faziam parte experientes policiais e administradores de policia. Os itens foram testados através de uma pesquisa-piloto para cinqüenta policiais. Foram selecionados sessenta, por ordem de importância como marcadores de elemento estressor. Entre os itens selecionados, os três considerados mais importantes e que receberam alta classificação de estresse pelos profissionais foram morte de colega no cumprimento do dever; matar alguém no cumprimento do dever e contato com a exposição de crianças espancadas ou mortas. Do mesmo modo, Romano (1998) realizou um estudo com o objetivo de identificar as fontes de estresse no trabalho de soldados da Policia Militar do Estado de São Paulo. A pesquisa foi realizada com o objetivo de verificar o nível de tensão que os policiais atribuem às fontes de estresse ocupacional com as quais lidam, bem como elaborar uma proposta de programa de curso de controle de estresse específico para soldados daquela corporação. De acordo com os resultados do estudo, os eventos considerados mais estressantes foram ver colega morto no comprimento do dever; morte de parceiros; e receber salários insuficientes. O evento ver colega morto no cumprimento do dever apareceu como o evento mais estressante nos estudos associados ao estresse emocional de policiais militares. Dessa forma, os resultados apontam para o fato de que a morte de outras pessoas e até aquela provocada pelo Policial no cumprimento do dever não apareceu como evento estressante na pesquisa brasileira. A explicação dada pela autora brasileira é que: Talvez o fato dos soldados desta amostra terem no máximo, cinco anos de experiência profissional possa tê-lo influenciado a fazer uma classificação suposta deste evento; isto é talvez na realidade não tenham tido contato com essa situação. Assim é possível que os soldados tenham respondido de acordo com o pressuposto adquirido no treinamento, de que o policial pode matar em legitima defesa no comprimento do dever, portanto fazendo parte de sua rotina de trabalho (Romano, 1989: 56 p. ). 6

Dessa maneira, o policial é constantemente exposto à agressão, violência e crueldade, devendo freqüentemente intervir em situações de problemas humanos de alta tensão que podem gerar sentimentos de raiva, ansiedade, alienação e depressão. Proibidos são de Expressar estes sentimentos, os quais são respostas normais à frustração muitos policiais desenvolvem características de esquiva emocional, cinismo e autoritarismo (Silva, Vieira, 2008; Reiser, apud Romano, 1989:23) Conclusão O estresse está presente na vida do policial militar e pode influenciar de maneira decisiva no seu comportamento dentro e fora de sua atividade profissional. A exposição e atuação em ambiente desumano, complexo e hostil, bem como o contato com constante desgaste físico, mental e emocional são fatores que contribuem para o desenvolvimento do estresse (Silva, Vieira, 2008; Delboni. 1997) Entretanto, estudos indicam que os responsáveis pela saúde física e mental dos policiais já se mostram atentos para as mudanças ocorridas em decorrência do estresse profissional, embora algumas vezes os sintomas passem despercebidos até para os familiares e amigos (Silva, Vieira, 2008; Portela, Bugay, 2007; Romano, 1989). Assim, algumas corporações preocupadas com a quantidade avassaladora dos problemas de ordem física e mental, e, sobretudo, procurando zelar pela imagem e a qualidade do serviço tem procurado criar programas de prevenção ao estresse. É um assunto polêmico e que ainda causa certa resistência dentro das corporações, uma vez que os chefes dos serviços e até mesmo o próprio policial não admitem a existência de problemas emocionais e não precisam de ajuda (Silva, Vieira, 2008; Portela, Bugay, 2007; Besse, 1995; Romano, 1989). Algumas polícias nacionais já desenvolvem trabalhos voltados diretamente para prevenção e controle do estresse, como as polícias de São Paulo e Minas Gerais, dentre outras, que já estão preocupando-se em enfrentar o problema em questão. Os responsáveis deverão estar atentos, já que as mudanças que ocorrem provocadas pelo estresse no comportamento do homem são lentas e muitas vezes passam despercebidas, até para os familiares e amigos (Silva, Vieira, 2008; Farias, 1999) 7

Assim, combater o estresse e a ansiedade na atividade policial militar não é uma tarefa fácil. O sucesso deste trabalho demandará certo empenho, bem como do apoio e da ajuda de familiares, amigos e colegas de trabalho. Contudo, como afirmam alguns policiais militares a coexistência foi imposta, mas a convivência deve ser trabalhada. Referências Bibliográficas. ALLEGRETTI, Roberto-Cel PM, Estudo da validade de programa assistencial para Policiais Militares envolvidos em ocorrências de natureza grave. São Paulo: PMESP,1996. Monografia. Mimeo. BENEVIDES, Antonio. Estresse aumenta 3 vezes a chances do primeiro surto. Agências URS de Notícias.Psiquiatria, 2005. Artigo disponível em: http://www. usp.br/agen/repgs/2005/pags/191.htm. Acesso em: 22/06/2010 BESSE, Maria Izabel, A Meditação como facilitadora da atividade policial militar. Monografia,PMSP,1995. CARVALHO, C., Carlos, I. Constituição do Estado e leis complementares de Mato- -Grosso de1988. Belém: Cejusp.,1994. COUTO, H.A. Stress e qualidade de vida dos executivos. Rio de Janeiro: COP, 1987. DELBONI,T.H., Vencendo o Stress. São Paulo: Makron Books.1997. DOURADO,Luiz Ângelo. Raízes Neuróticas do crime. Rio de Janeiro: Zahar, 1965. Estatuto dos Servidores Públicos Militares de Mato grosso, Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso 1993. FINN,Peter et al. Developing a law enforcement Stress Program for Officers and Their Families, USA:U.S Departament of justice, March, 1997. IARA, P. F.,SABATOVISKI,E., Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, Editora Juruá,4º Edição, Curitiba - Pr., 1999. 8

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