O Yoga: Uma Introdução Esclarecedora Por Kamalakali www.kamalakali.com www.trikainstitute.org Como muitos, você já deve ter feito algumas aulas de Yoga e até dominado algumas posturas. No entanto, pode ser que você não tenha ciência de tudo o que o Yoga pode lhe oferecer, não só para o corpo, mas principalmente para a mente e consciência profunda. O que é Yoga, então, em sua essência? Hoje estamos familiarizados com as populares imagens de Yoga como um sistema de exercício que confere a seus praticantes uma figura esguia, flexível e bela. Estas imagens são abundantes nas capas de revistas ao redor do mundo. As aulas de Yoga
podem ser encontradas em quase todas as comunidades ao redor do mundo e se tornaram populares com a ajuda de celebridades e atletas. Esta tendência, esta versão comercial do Yoga se encaixa perfeitamente na busca pelo fitness, afluência e felicidade individual que dominam nosso mundo hoje. Ouvimos que se praticarmos Yoga regularmente, perderemos peso, nos tornaremos mais bonitos e lidaremos melhor com o estresse. Apesar de todas estas coisas serem possíveis, o Yoga possui uma mística espiritual adicional de ordem totalmente diferente. O Yoga tradicional reflete todo um conjunto de práticas de elevação de consciência que inclui mantras e inúmeras formas de meditação. O desenvolvimento espiritual sempre foi mais relevante que o bem estar físico. Além do mais, o corpo yóguico reflete uma mente yóguica, uma consciência yóguica e um estado de beatitude yóguico superior ou auto-realização além do tempo e espaço. Este Yoga místico e mais profundo tem suas próprias fascinação e magia. Leva sua atenção à figura do Guru, ashrams e à Índia, terra do Yoga com seus templos exóticos e vasta paisagem tropical. Traz à mente a imagem de yogis misteriosos com poderes sobrenaturais que, tendo conquistado a morte e tristeza, vivem no alto dos Himalaias. Mesmo não estando ausente nos movimentos modernos de Yoga, esta paisagem espiritual nem sempre é tão aparente para o estudante comum de Yoga. Os movimentos antigos de Yoga que se espalharam na Índia e fora dela eram mais espirituais, nos quais exercícios de posturas e controle de respiração não desempenhavam papéis tão importantes. Então, o que é o Yoga? Será que estamos nos beneficiando ao máximo do Yoga executando exercícios que mais parecem
alongamento durante uma hora de aula na academia? Ou será que estamos apenas arranhando a superfície deste oceano de Yoga que pode nos levar a uma dimensão de consciência totalmente diferente? O Yoga certamente inclui saúde física e bem estar, mas se estende muito além disto, direcionando-nos à verdadeira felicidade e bemaventurança perene. DEFININDO YOGA Um bom lugar para iniciarmos nossa análise do Yoga é observando como o Yoga tem sido definido através dos séculos. A palavra Yoga deriva da raiz sânscrita yuj que significa trabalho, coordenação, integração. Yoga está conectado ao termo inglês yoke, como em yoking a horse to a chariot (amarrando um cavalo à carruagem). Especificamente Yoga é definido como união, um estado de unidade com o divino como nosso mais íntimo self. Neste sentido, Yoga é a integração de nosso ser individual com a realidade cósmica suprema. É o meio para a reunificação com a consciência superior, que é nossa verdadeira origem, objetivo e natureza mais profunda. O Yoga se refere também às mais variadas práticas espirituais usadas na Índia desde tempos imemoriais. Estas práticas não incluem somente asanas (posturas), mas complexos rituais, mantra, pranayama, meditação e contemplação - todas ferramentas para o desenvolvimento da consciência superior. Sendo assim, é impossível separar Yoga e espiritualidade; os dois estão intimamente unidos desde sempre, um é o meio para o outro. Abaixo, os cinco primeiros caminhos do Yoga:
I- Jñana Yoga (Yoga do Conhecimento): auto-realização através do conhecimento interior e insight II- Bhakti Yoga (Yoga da Devoção): auto-realização através da devoção ou amor divino III- Karma Yoga (Yoga do Serviço/Ação): auto-realização através do trabalho altruísta e ritual sagrado IV- Raja Yoga (Yoga Real): auto-realização através da combinação de conhecimento, devoção e trabalho V- Hatha Yoga (Yoga da Técnica): auto-realização através da combinação de asana, pranayama, mantra e meditação. Enquanto estes são os cinco primários, o número de possíveis caminhos é ilimitado. Muitos tipos de Yoga existiram em diversas tradições na Índia antiga, medieval e moderna. Todos os maiores grupos espirituais, religiosos e culturais da Tradição Indiana (Hinduísmo, Budismo e Janinismo) incluem alguma forma de Yoga em suas práticas, princípios ou aspirações. Estas práticas Indianas de Yoga também possuem paralelos em tradições místicas ao redor do mundo desde o Egito antigo, senão antes. No entanto, estes ensinamentos interiores parecem melhor preservados na tradição do Yoga, desenvolvidos e integrados numa totalidade harmoniosa, muito mais que em qualquer outra tradição no mundo. Talvez porque como cultura a Índia sempre honrou mais a experiência espiritual individual que quaisquer autoridades, dogmas, credos ou instituições externas. A continuidade desta tradição de ensinamentos interiores nunca foi quebrada desde a era mais antiga, graças à relação guru-discípulo. Hoje as pessoas comentam sobre os tipos de Yoga que encontram, Iyengar, Astanga ou Kundalini. No entanto, elas apenas os entendem como diferentes tipos de práticas de asanas ou posturas ao invés dos grandes caminhos espirituais
mencionados acima. A maioria destes estilos de asanas são invenções recentes, apesar de alguns serem baseados em princípios antigos. Para se entender a essência do Yoga, é importante olhá-lo como um caminho espiritual abrangente, e não só uma variedade de métodos de asanas. O Yoga asana moderno é freqüentemente chamado de Hatha Yoga. No entanto, o Hatha Yoga tradicional não consiste primariamente na prática de asanas, mas sim pranayama e meditação e o uso de técnicas energéticas para o desenvolvimento da consciência superior. Entre as muitas definições de Yoga na literatura tradicional, uma importante é mencionada nos Yoga Sutras, o primeiro texto dedicado ao Raja Yoga atribuído ao sábio Patanjali. Os Sutras definem Yoga como: citta vritti nirodha, que se traduz: tranqüilizando as modificações da mente. Esta definição de Yoga é primariamente a definição de meditação, que é o foco central dos ensinamentos tradicionais do Yoga. Outras definições bem antigas de Yoga incluem: estado de equilíbrio, habilidade em ação, alívio das causas de sofrimento, concentração contínua dos sentidos, e etc. Muitas dessas definições vêm do Bhagavad Gita, que aborda o tema Yoga de diversos ângulos. As Upanishads também se referem ao Yoga como yoga da meditação e yoga do self interior. Ambos os textos são mais antigos que os Yoga Sutras e são considerados autoridades. Notem que nenhuma destas definições tradicionais se refere ao yoga como asana, exercício e mesmo terapia de cura. Isto porque tradicionalmente o Yoga foi e é uma pratica espiritual (sadhana). Sadhana no Yoga tem por objetivo estabelecer contato direto com o divino ou consciência superior (Siva). Yoga como uma forma de
exercício ou terapia existe secundariamente, apenas auxiliando o objetivo principal que é a busca da união com a realidade suprema. YOGA, AUTO-REALIZAÇÃO E O DIVINO Tradicionalmente, a meta do Yoga é a auto-realização, um termo compreensível para a maioria de nós. Todos nós queremos perceber nosso potencial superior, ser ganhar tudo o que pudermos na vida. Alguns termos como auto-potencial, autoestima e autopromoção são comuns hoje em dia. No entanto, o Yoga não tem a ver com a realização do ego humano ou self exterior, nossos talentos pessoais, desejos e ambições. O self yóguico é nosso ser mais interior, nossa verdadeira essência, a consciência superior dentro de nós que está ligada ao Universo como um todo. A auto-realização yóguica considera o alcance de uma consciência além do tempo e espaço ao invés de qualquer realização material temporária. Foi desenvolvido para nos levar em uma jornada ao self profundo dentro de nós, que é uma parte do divino. Dizem que o Yoga também é um caminho até a realização com Deus, um termo que a maioria de nós pode ter dificuldades em compreender. Se acreditamos em Deus, duvidamos que qualquer ser humano possa se tornar um. Se não acreditamos em Deus, podemos achar que o Yoga é mais uma ilusão religiosa. Então, devemos perceber que o Yoga olha para o divino de uma maneira muito diferente da maioria de nós (o oriental geralmente tem outra percepção do divino). O Yoga se refere ao divino ou Deus como o poder da consciência que existe dentro de nós e que
simultaneamente permeia todo o Universo. Esta visão do divino como pura consciência tem afinidades não só com a religião, mas também com a ciência, arte e misticismo. Não tem a ver com credo, mas sim com a experiência da verdadeira natureza da realidade, que é universal. O Yoga é uma tradição que nos ajuda a alcançar o bem-estar supremo, não só físico, mas psicológico e espiritual. Para este propósito, emprega um conjunto enorme de práticas ligadas ao corpo, mente, coração e consciência. Esta tradição rica e complexa de asanas que vemos no Yoga moderno se contrapõe aos detalhados e profundos sistemas de pranayama, mantra e meditação. Somente quando entendermos o objetivo maior do Yoga, poderemos nos abrir à possibilidade de conexão com o desapegado plano de consciência e felicidade. A TRADIÇÃO DO YOGA No sentido amplo do termo, o Yoga é uma vasta tradição filosófica que se estende desde a história antiga com uma quantidade enorme de mestres, ensinamentos, grupos e práticas na Índia e arredores. Um bom local para se começar o estudo da tradição do Yoga é pelos Yoga Sutras de Patañjali (YSP) e o Hatha Yoga Pradipika de Swami Swatmarama (HYP). Os Sutras permanecem uma compilação importante dos princípios e práticas do Yoga e o HYP quase um manual. Comentários à parte, uma coisa é clara após qualquer investigação real dos textos: o yoga tradicional não confere tanta importância assim aos asanas ou posturas. Dos mais de 200 aforismos presentes nos YSP, somente dois mencionam asanas e no HYP fica claro que a
função dos asanas (entre eles, o mais importante, padmasana) é fazer com que o indivíduo consiga se manter em postura para a prática mais relevante, a meditação. Percebemos a discrepante diferença em relação ao Yoga moderno, onde os asanas e até danças com posturas compreendem a maior parte da prática. Ao examinarmos outros textos tradicionais, descobrimos que Patañjali é apenas um dos muitos mestres antigos. O Yoga e sua terminologia são encontrados em numerosos livros da Índia, refletindo uma variedade de tradições e referenciando muitos grupos diferentes, dos quais a maioria nem mesmo menciona Patañjali. Nenhum mestre ou professor domina a tradição do Yoga sozinho. Não podemos estereotipar o Yoga como uma prática particular, como asana, ou como os ensinamentos de um professor ou grupo. Yoga tem a ver com a integração máxima de todos os aspectos de nossa natureza e pode ser estudado de vários ângulos. A essência do Yoga reside em sua habilidade em harmonizar todos os diferentes fatores de nossa experiência. Enquanto esta visão do Yoga pode parecer confusa a princípio, nos permite embarcar numa nova jornada em um universo de Yoga e olhar para a vida de maneira mais integral. YOGA E RELIGIÃO Quando começamos a ver além dos asanas, uma das maiores dúvidas é se yoga é ou não uma religião. Será que se executar as práticas mais avançadas de yoga requer a adoção de um credo religioso específico? Requer que desistamos de nossa religião
atual? Alguns nem mesmo querem seguir uma religião...tem que acreditar em Deus para praticar Yoga? Qualquer estudioso mediano do Yoga examinando sua tradição percebe que o Yoga tem um inegável lado religioso e espiritual. O Yoga tradicional sempre esteve ligado ao divino, nosso ser interior e o alcance da imortalidade. A diferença é que estes conceitos e concepções orientais se diferem radicalmente do pensamento religioso ocidental. As tradições do Yoga na Índia possuem ordens monásticas, templos e lugares sagrados. Eles têm rituais especiais e congregações incluindo grandes festivais religiosos como o famoso Kumbha Mela, onde milhares de pessoas se encontram. Das religiões mundiais, muito pouco não se acha incluído no Yoga, no que se refere tanto à pratica quanto à filosofia. Os ensinamentos do Yoga contêm visões teístas, enfatizando um criador do Universo, que é venerado como pai, mãe, amigo, amado e guru. Alguns ensinamentos são politeístas, honrando diferentes deidades e reconhecendo a face do divino em montanhas e na natureza em geral. Outros ensinamentos são monoteístas, enfatizando a realidade única ou absoluta chamada de Brahman. A tradição do Yoga lembra uma coleção de religiões sob a bandeira do Yoga como um conjunto de práticas espirituais. Parece que o Yoga consegue acomodar qualquer número de visões religiosas enquanto objetivem a autorealização. Lembremos o significado original da palavra religião: conectar, ligar. Um significado muito similar ao do Yoga: união, integração. Como o Yoga está ligado ao Hinduísmo e tradição Védica no contexto no qual o Yoga clássico apareceu? Se olharmos para a cultura Indiana, veremos que alguns
aspectos do Yoga são integrais Ao estilo de vida Hindu, permeando a música, dança, arte, medicina, poesia e filosofia indianas. Na Índia antiga todos os meios de conhecimento poderiam ser caminhos para o Yoga, até mesmo estudos de gramática e astronomia. Porque a tradição Védica não só é a mais antiga do mundo, mas também a mais diversa e complexa das tradições religiosas do mundo. A conexão do yoga com esta tradição infunde uma vastidão similar e muitas visões para seu propósito. O Yoga inclui não só religião, mas arte, ciência e cultura como parte de uma orientação interna para que conheçamos nossa verdadeira natureza. É um estilo de vida sagrado que nos permite equilíbrio e nos auxilia em diversos aspectos de nossas vidas. E este sim é o verdadeiro significado de religião.