PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ ESCOLA DE DIREITO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO E PROCESSO TRIBUTÁRIAO EMPRESARIAL ALINE BILEK BAHR



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Transcrição:

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ ESCOLA DE DIREITO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO E PROCESSO TRIBUTÁRIAO EMPRESARIAL ALINE BILEK BAHR A SUJEIÇÃO PASSIVA OBRIGACIONAL E SUAS IMPLICAÇÕES EM ILÍCITOS PENAIS TRIBUTÁRIOS CURITIBA 2013

ALINE BILEK BAHR A SUJEIÇÃO PASSIVA OBRIGACIONAL E SUAS IMPLICAÇÕES EM ILÍCITOS PENAIS TRIBUTÁRIOS Artigo de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Especialização em Direito e Processo Tributário Empresarial da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Especialista em Direito e Processo Tributário Empresarial. Orientador: Prof. Dr. André Parmo Folloni CURITIBA 2013

ALINE BILEK BAHR SUJEIÇÃO PASSIVA OBRIGACIONAL E SUAS IMPLICAÇÕES EM ILÍCITOS PENAIS TRIBUTÁRIOS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Especialização em Direito e Processo Tributário Empresarial da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Especialista em Direito e Processo Tributário Empresarial. BANCA EXAMINADORA Professor 1(Titulação e nome completo) Instituição 1 Professor 2 (Titulação e nome completo) Instituição 2 Professor 3 (Titulação e nome completo) Instituição 3 CURITIBA, 03 DE ABRIL DE 2013.

A SUJEIÇÃO PASSIVA OBRIGACIONAL E SUAS IMPLICAÇÕES EM ILÍCITOS PENAIS TRIBUTÁRIOS THE PASSIVE SUBJECT REVIEW AND ITS IMPLICATIONS IN CRIMINAL TAX ILLEGAL Autora: Aline Bilek Bahr 1 Orientador: Prof. Dr. André Parmo Folloni 2 RESUMO O presente artigo objetiva elucidar a autoria dos crimes contra a ordem tributária, tendo como parâmetro a sujeição passiva obrigacional tributária. O tema envolve os constantes enfrentamentos levados ao Poder Judiciário em processos criminais, havendo um debate instalado entre as partes. Por iniciativa da defesa dos réus é trazida a discussão sobre a negativa de autoria, com base em fundamentos utilizados na seara executiva fiscal. Esta tese vem sendo rebatida pelo Ministério Público em sentido contrário, ratificando os termos da exordial acusatória, com base na teoria do domínio funcional do fato. A importância do trabalho está na resolução desse impasse judicial, alcançando, com base em fundamentos doutrinários e jurisprudenciais tanto no direito tributário como no direito penal. Ao final, conclui-se pela improcedência dos argumentos defensórios, preponderando as razões ministeriais, para manutenção da autoria delitiva recaindo no contribuinte ou em seu representante legal. Palavras-chave: Autoria Delitiva. Responsabilidade Tributária. Embate Judicial. ABSTRACT This article aims to elucidate the authorship of crimes against tax order, having as parameter the passive subject tax review. The theme involves the constant clashes brought to the Judiciary in criminal cases, there is a debate installed between the parties. On the initiative of the defence of defendants is brought to discussion about the denial of authorship, based on fundamentals used in harvest tax Executive. This theory has been refuted by prosecutors to the contrary, ratifying the terms of criminal libelous, based on the theory of the functional domain of fact. The importance of the work is in the resolution of this discussion, reaching, based on doctrinal and 1 Promotora de Justiça do Ministério Público do Paraná, Bacharel em Direito pela UniCuritiba e aluna do Curso de Especialização em Direito e Processo Tributário Empresarial pela PUC/PR 2 Professor do Curso de Especialização em Direito e Processo Tributário Empresarial pela PUC/PR

jurisprudential foundations both in tax law as criminal law. In the end, concluded by dismissal of the defenses arguments, preweighing the Ministerial reasons for maintenance the authorship of crimes as a burden on the taxpayer or his legal representative. Keywords for this page: The authorship of crimes. Tax Liability. Legal Clash.

4 1 INTRODUÇÃO O presente tema se torna importante no contexto jurídico penal tributário, haja vista os constantes enfrentamentos levados ao Poder Judiciário em processos criminais, notadamente quando se discute a autoria dos crimes contra a ordem tributária, ou seja, em ações fraudulentas tendentes à supressão e/ou redução de tributos. Por um lado, os réus, por seus defensores, sustentam a tese de negativa de autoria, valendo-se como principal argumento de que no processo administrativo fiscal não foi comprovada a responsabilidade pessoal do diretor, gerente ou administrador, como também estes mesmos não foram incluídos como pessoas físicas solidariamente responsáveis pelo crédito tributário definitivamente constituído, razão pela qual não poderiam se enquadrar como sujeitos ativos de ilícitos penais tributários. De outra parte, o Ministério Público, como titular da ação penal pública incondicionada, ocupando o pólo ativo da demanda processual penal, rebatendo as alegações defensórias e fundamentando na desnecessidade de se fazer prova no processo administrativo fiscal de que referidas pessoas físicas foram consideradas pessoalmente responsáveis em solidariedade com o contribuinte e incluídas na certidão de dívida ativa. O órgão ministerial sustenta que as mesmas pessoas naturais ao representarem seja de fato ou de direito o contribuinte (este muitas vezes como pessoa jurídica), agindo com poderes de gerência e administração, com domínio do fato, já seriam consideradas autoras dos ilícitos penais tributários. Deste modo, este artigo não pretende contemplar e esgotar toda a discussão a respeito do assunto, entretanto, abordará algumas questões importantes, esclarecendo pontualmente as distorções nos referidos embates jurídicos, demonstrando qual o posicionamento que sobressai em matéria penal tributária. Assim, o estudo se pautará tanto na doutrina como na jurisprudência, explicando inicialmente a relação obrigacional tributária, trazendo noções gerais sobre sujeição passiva tributária e descrevendo as hipóteses de imputação de

5 responsabilidade tributária. Seguem as diferenciações entre crime e ilícito civil (tributário), estabelecendo o sujeito ativo do crime contra a ordem tributária, traçando-se um comparativo entre a sujeição passiva tributária e a autoria/participação em ilícitos penais tributários, bem como a problematização, por uma abordagem jurisprudencial. E, por fim, com base em tais estudos, concluindo quem será dentre os sujeitos passivos tributários a responder como autor penalmente responsável pela prática de tais ilícitos. 2 DA RELAÇÃO OBRIGACIONAL TRIBUTÁRIA A relação obrigacional tributária, sob a ótica de Hugo de Brito Machado (2011, p. 140) é uma espécie de relação jurídica, sendo o vínculo que se instaura entre a entidade tributante e a pessoa que se coloca na condição de sujeito passivo de obrigações tributárias. Complementa, ainda, que muito embora haja situações em que relação tributária se confunde com obrigação tributária, existe distinção entre elas, porque a primeira é mais abrange e a segunda, especificamente considerada. Por sua vez, o Código Tributário Nacional trata da obrigação tributária no artigo 113 e seus parágrafos, da seguinte forma: Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória. 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente. 2º. A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. 3º. A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária. Com efeito, essa obrigação tributária tem o mesmo tratamento que a relação jurídica tributária na visão de Eduardo Marcial Ferreira Jardim (2011), como podemos verificar, eis que se utiliza da mesma expressão como sinônimos:

6 Em consonância com o que fora exposto no item precedente, cumpre dizer que a obrigação tributária ou relação jurídica tributrária é o liame abstrato pelo qual uma pessoa, denominada sujeito ativo, o Estado, ou quem lhe fizer as vezes, fica cometida do direito subjetivo de exigir de outro sujeito, nomeado sujeito passivo, designado comumente como contribuinte, uma prestação de índole tributária (p.391). Mais a fundo, o jurista Paulo de Barros Carvalho (2009, p. 327) entende que o legislador incorreu em equívoco ao estabelecer que a obrigação tributária surge também com a prática de ilícitos, pois na verdade se tratam de duas relações jurídicas diferenciadas, uma tributária e outra sancionadora. A primeira, somente poderá corresponder à realização de fatos lícitos e a segunda, será efeito insopitável de todos os ilícitos. Veremos sequencialmente, o quanto é importante essa consideração traçada por Paulo de Barros Carvalho, em matéria de crimes contra a ordem tributária, devido à sua relação com a obrigação tributária principal. Há, todavia, mais uma crítica asseverada pelo mesmo doutrinador (2009, p. 328) quanto ao referido dispositivo legal, ou seja, quanto à separação entre obrigação e crédito, porque ambos são indissociáveis entre si, não existindo obrigação sem crédito e nem crédito sem obrigação, portanto, a leitura que se deve fazer do parágrafo 1º, do artigo 113, do CTN, é de que, ocorrido o fato jurídico tributário, inaugura-se a relação obrigacional, com o crédito para o sujeito ativo e o débito para o sujeito passivo. Assim, nascendo a relação jurídica tributária, há necessidade de se identificar quem ocupará a posição de sujeito passivo. 3 DA SUJEIÇÃO PASSIVA OBRIGACIONAL TRIBUTÁRIA 3.1 NOÇÕES GERAIS Quando se trata da eleição do sujeito passivo da obrigação tributária principal, aspecto pessoal do consequente da regra matriz de incidência compete ao

7 legislador infraconstitucional esta tarefa, conforme entendimento esposado por Maria Rita Ferragut (2007, p. 10), pois o texto constitucional assim não o disciplinou. Por sua vez, Andréa Medrado Darzé (2007, p. 50) arremata que essa competência foi deixada a cargo do legislador infraconstitucional, em face do princípio da estrita legalidade, com o dever de indicar todos os elementos do tributo. Não se pode olvidar da observância dos princípios da capacidade contributiva, do direito de propriedade e da vedação ao confisco que constituem em verdadeiras limitações constitucionais ao poder de tributar. Assim, o Código Tributário Nacional, no artigo 121 dispõe sobre as duas espécies de sujeitos passivos para a relação jurídica tributária, in verbis: Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se: I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei. Importantes considerações ainda faz Ferragut (2007), esclarecendo que existem dois aspectos distintos quando se trata de sujeição passiva obrigacional, referente ao sujeito que realiza o fato e aquele obrigado a cumprir com a prestação objeto da relação jurídica, senão vejamos: São dois aspectos distintos. O primeiro diz respeito ao sujeito realizador do fato previsto no antecedente da regra-matriz de incidência tributária, fato este que, como regra, se encontra indicado na Constituição. Já o segundo refere-se ao sujeito obrigado a cumprir com a prestação objeto da relação jurídica, ou seja, aquela pessoa que integra o pólo passivo da obrigação. Esta pessoa é a única obrigada ao pagamento do tributo, e pode ou não coincidir com o sujeito que realizou o fato jurídico revelador de capacidade contributiva: se realizou será contribuinte; se não, responsável (p.10). A respeito disso, Jardim (2011), em sua obra, cita o estudo elaborado pelo mestre Rubens Gomes de Sousa, a respeito do conteúdo econômico sobre sujeição

8 passiva, distinguindo duas modalidades de sujeito passivo, em direto e indireto. Senão vejamos: O primeiro, sujeito passivo direto, ocorre quando o tributo é cobrado da pessoa que realiza o fato jurídico passível de tributação. O segundo, sujeito passivo indireto, verifica quando o tributo é exigido de uma pessoa que não tenha praticado o fato jurídico tributário, mas que esteja apenas relacionada indiretamente com aquele fato. Nesse último caso, comporta duas modalidades, a transferência e substituição (p.413). O mesmo professor referido por Jardim subdivide a modalidade de transferência em solidariedade, sucessão e responsabilidade. Portanto, existem diferenciações evidentes entre contribuinte e responsável, razão pela qual no tópico que se segue, teceremos considerações mais detalhadas a respeito da responsabilidade tributária. 3.2 DA RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA 3.2.1 BREVES CONSIDERAÇÕES Quando a relação jurídica é integrada por sujeitos passivos alheios ao fato tributado, encontramos a figura dos responsáveis, que responderão pela prestação tributária de forma supletiva ou exclusiva. A responsabilidade tributária é definida no artigo 128, do CTN: Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação. Já o conceito de responsabilidade nos é trazido pelo trabalho elaborado por Darzé (2010):

9 Responsabilidade Tributária é nomra jurídica que descreve em seu antecedente notas de um fato não tributário (lícito ou ilícito), mas que tem como pressuposto necessário um fato tributário (ainda que presumido), e em seu consequente notas de relação jurídica, na qual um terceiro, escolhido dentro da moldura de levar dinheiro aos cofres públicos a título de tributo. Trata-se, portanto, de norma que colabora na fixação do critério subjetivo passivo do tributo, entrando em relação com os demais enunciados que integram a regra-matriz de incidência tributária em sentido amplo, cujo resultado variará a depender da espécie ou das características da responsabilidade de que se trate (pp. 494-493). De acordo com a mesma doutrinadora (2007, p. 49), a figura do responsável tem por objetivo punir este terceiro, bem como viabilizar e simplificar a arrecadação. Já para Carvalho (2009, p. 358), essas relações apresentam natureza de sanções administrativas tanto que o legislador tratou no regime de solidariedade, conforme disposto no artigo 134, do referido diploma legal. Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: I - os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores; II - os tutores e curadores, pelos tributos devidos por seus tutelados ou curatelados; III - os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes; IV - o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio; V - o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo concordatário; VI - os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício; VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas. Parágrafo único. O disposto neste artigo só se aplica, em matéria de penalidades, às de caráter moratório. Existem diversas hipóteses de responsabilidade contempladas na legislação infraconstitucional, porém especificamente neste trabalho, daremos especial enfoque à responsabilidade de terceiros, na modalidade de responsabilidade

10 pessoal dos administradores até porque está vinculada à problematização a que se propõe discorrer. 3.2.2 DA RESPONSABILIDADE PESSOAL DOS ADMINISTRADORES A responsabilidade pessoal dos administradores é tratada pelo artigo 135, do CTN, nos seguintes termos: Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os mandatários, prepostos e empregados; III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado. Essa modalidade de responsabilidade prevista em lei decorre de atos ilícitos praticados por terceiros, que não incluem obviamente a substituição tributária e a responsabilidade por sucessão advindas de atos lícitos e direcionadas particularmente aos administradores das pessoas jurídicas de direito privado. Segundo Jardim (2011, pp. 418-419), no comando legal supra exposto, o legislador mencionou como responsabilidade solidária de terceiros quando tornar-se impossível a exigência do tributo junto ao contribuinte, ocasião em que a Fazenda Pública poderá cobrar de interpostas pessoas que, por ato omissivo ou comissivo, tenham concorrido para o inadimplemento da obrigação tributária, porém de acordo com seu entendimento se trata na realidade de responsabilidade subsidiária, pois somente após a verificação da impossibilidade de exigir o tributo do contribuinte é que o terceiro é alcançado no pólo passivo da relação jurídica tributária. O mesmo autor (2011, p. 420) adota o mesmo raciocínio mesmo em se tratando de reponsabilidade de terceiros pelo cometimento de ato ou fato com excesso de poder, infração à lei ou infringência a estatuto ou contrato social, incluindo no caso, os mandatários, prepostos, empregados, diretores, gerentes ou

11 representantes de pessoas jurídicas de direito privado, como é o caso da hipótese contemplada pelo artigo 135, do CTN. Entrementes, tanto a doutrina como a jurisprudência dos Tribunais Superiores vem se debatendo quanto à possibilidade de inclusão dessse mesmo terceiro no pólo passivo da relação jurídica tributária, fazendo-a no lançamento de ofício, na emissão da Certidão em Dívida Ativa em nome do responsável decorrente de decisão administrativa definitiva ou no redirecionamento da execução fiscal. Com efeito, Maria Lucia Aguilera (2007) quando trata das obrigações tributárias resultantes de atos ilícitos, assim se expressa, a saber: No caso, o conceito de obrigações tributárias resultantes estaria a denotar a ocorrência de um ato/fato jurídico complexo, composto de três aspectos: (i) um ato praticado com excesso de poderes, infração de lei, contrato social ou estatutos (ato ilícito); (ii) um fato gerador de tributo (ato/fato lícito); e (iii) uma relação de causalidade entre o ato ilícito do administrador e o fato lícito, hipótese de incidência do tributo devido pela sociedade (p. 131). A aplicação da norma de responsabilidade tributária do administrador prevista no artigo 135, inciso III, do CTN se harmoniza com as normas gerais de responsabilidade dos administradores de sociedades limitadas e anônimas previstas nos artigos 47 e 50, da Lei 10.406/2002 (Código Civil Brasileiro) 3 e artigos 154 e 158, da Lei 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas) 4. 3 Art. 47. Obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo. [...] Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. 4 Art. 154. O administrador deve exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe conferem para lograr os fins e no interesse da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa.

12 Significa dizer que o administrador que agir fora dos limites de sua competência (previstas no contrato social ou estatuto social) e contra os interesses e finalidades da pessoa jurídica, para favorecer exclusivamente seus interesses 1º O administrador eleito por grupo ou classe de acionistas tem, para com a companhia, os mesmos deveres que os demais, não podendo, ainda que para defesa do interesse dos que o elegeram, faltar a esses deveres. 2 É vedado ao administrador: a) praticar ato de liberalidade à custa da companhia; b) sem prévia autorização da assembléia-geral ou do conselho de administração, tomar por empréstimo recursos ou bens da companhia, ou usar, em proveito próprio, de sociedade em que tenha interesse, ou de terceiros, os seus bens, serviços ou crédito; c) receber de terceiros, sem autorização estatutária ou da assembléia-geral, qualquer modalidade de vantagem pessoal, direta ou indireta, em razão do exercício de seu cargo. 3º As importâncias recebidas com infração ao disposto na alínea c do 2º pertencerão à companhia. 4º O conselho de administração ou a diretoria podem autorizar a prática de atos gratuitos razoáveis em benefício dos empregados ou da comunidade de que participe a empresa, tendo em vista suas responsabilidades sociais. [...] Art. 158. O administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão; responde, porém, civilmente, pelos prejuízos que causar, quando proceder: I - dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo; II - com violação da lei ou do estatuto. 1º O administrador não é responsável por atos ilícitos de outros administradores, salvo se com eles for conivente, se negligenciar em descobri-los ou se, deles tendo conhecimento, deixar de agir para impedir a sua prática. Exime-se de responsabilidade o administrador dissidente que faça consignar sua divergência em ata de reunião do órgão de administração ou, não sendo possível, dela dê ciência imediata e por escrito ao órgão da administração, no conselho fiscal, se em funcionamento, ou à assembléia-geral. 2º Os administradores são solidariamente responsáveis pelos prejuízos causados em virtude do não cumprimento dos deveres impostos por lei para assegurar o funcionamento normal da companhia, ainda que, pelo estatuto, tais deveres não caibam a todos eles. 3º Nas companhias abertas, a responsabilidade de que trata o 2º ficará restrita, ressalvado o disposto no 4º, aos administradores que, por disposição do estatuto, tenham atribuição específica de dar cumprimento àqueles deveres. 4º O administrador que, tendo conhecimento do não cumprimento desses deveres por seu predecessor, ou pelo administrador competente nos termos do 3º, deixar de comunicar o fato a assembléia-geral, tornar-se-á por ele solidariamente responsável. 5º Responderá solidariamente com o administrador quem, com o fim de obter vantagem para si ou para outrem, concorrer para a prática de ato com violação da lei ou do estatuto.

13 pessoais responderá, de maneira solidária (para alguns subsidiária), pelo crédito tributário, podendo constar o seu nome na certidão da dívida ativa para legitimar-se o direcionamento da execução fiscal para sua pessoa, sem muitas vezes ficar efetivamente demonstrado o evento da responsabilidade, respaldado por diversos precedentes do Superior Tribunal de Justiça neste mesmo sentido. Por outro lado, encontramos também em determinados casos ações de exeução fiscal ajuizadas contra a pessoa jurídica e também em face do sócio que consta da CDA, determinando que a este incumbiria o ônus da prova para afastar as circunstâncias previstas no artigo 135, do CTN e conseguir eximir-se pessoalmente da obrigação. A par das inúmeras discussões que estão surgindo sobre esses posicionamentos jurisprudenciais, notadamente na esfera cível, sob o argumento da falta de lastro do título executivo, por não ter sido comprovado o fato da responsabilidade pela prática de ilícito, em flagrante violação a direitos e garantias constitucionais, é certo que para fins da caracterização de crime contra a ordem tributária outro enfoque é dado e que será devidamente explicitado neste artigo. 4 DO CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA 4.1 DA DIFERENCIAÇÃO ENTRE CRIME E ILÍCITO CIVIL (ADMINISTRATIVO - TRIBUTÁRIO) Primeiramente, importante traçar a diferenciação entre crime e ilícito civil (tributário) para uma melhor compreensão do assunto. A infração é o resultado de um comportamento humano que se traduz no descumprimento de um dever jurídico. Se este dever tiver conteúdo tributário, carcacterizada esta uma infração tributária e dependendo de sua gravidade pode além de tipificar um ilícito administrativo também um ilícito penal.

14 Para Hugo de Brito Machado (2011, p. 10) a diferenciação é determinada pela natureza do ilícito, pela sanção correspondente a cada um deles e pela competência da autoridade para a respectiva aplicação. Por outro lado, Andreas Eisele (1998, p. 40) sustenta que não existe diferença ontológica entre as diversas espécies de ilícitos (civis e penais), pois a ilicitude dos fatos continua sendo a mesma, o único elemento variante é a natureza da sanção. Sobre as duas espécies de ilícito, o prefalado jurista ainda discorre: Cada esfera de apuração do ato ilícito e aplicação de suas consequências possui formas, limites e resultados independentes e, devido a essa diferença, os fatos tipificados como crime devem ser objeto do Direito Penal, sendo cientificamente incorreto seu tratamento ou inclusão na legislação tributária. Quanto às formas de aplicação de sanções, saliente-se que a satisfação dos efeitos civis pode ser levada a cabo por ato voluntário do agente, consistente na satisfação da obrigação e reparação do dano ou recolhimento da multa compensatória, sendo que a sanção penal apenas pode ser aplicada pelo Judiciário em processo regular, e independe da vontade do agente. Portanto, a aplicação de sanções penais depende da decisão judicial, ao passo que as sanções administrativas são aplicadas de ofício por órgãos da Administração (p. 41). Já para Rogério Greco (2003), embora inicialmente afirme não haver diferença alguma, acaba por reconhecê-la pela gravidade da sanção, como assim o faz: A diferença entre ilícito penal e o civil, obviamente observada a gravidade de um e de outro, encontra-se também na sua consequência. Ao ilícito penal, o legislador reservou uma pena, que pode até chegar ao extremo de privar o agente de sua liberdade, tendo destinado ao ilícito civil, contudo, como sua consequência, a obrigação de reparar o dano, ou outras sanções de natureza civil (p. 151). Harada e Musumecci Filho (2012, p. 58), pactuam do entendimento de que a infração ou ilícito tributário significa ato comissivo ou omissivo contrário à lei, relacionado com a obrigação tributária principal (pagamento de tributo ou multa pecuniária, conforme art. 113, parágrafo 1º, do CTN) ou obrigação acessória (prática ou abstenção de ato no interesse da arrecadação ou fiscalização tributária, conforme art. 113, parágrafo 2º, do CTN).

15 Ainda, para os mesmos estudiosos (p.p 58-59), o ilícito tributário quando relacionado com a obrigação tributária principal (não pagamento total ou parcial do tributo devido) tem conteúdo patrimonial, ensejando a aplicação de sanção, normalmente de cunho pecuniário. Porém algumas infrações além de configurar ilícito tributário, também incidem nas normas de natureza penal, provocando a atuação ao mesmo tempo do órgão administrativo fiscal e do órgão judiciário. Como é o caso do crime contra a ordem tributária, que além de se configurar um ilícito tributário apurado pelo Fisco, a conduta se amolda também aos tipos penais dispostos pela Lei 8.137/90, pois o agente não só suprime ou reduz tributo, deixando de cumprir com sua obrigação tributária e se tornando inadimplente, mas pratica ações ou omissões de conteúdo fraudulento, atos próprios disciplinados pela sobredita legislação penal. Assim, embora os crimes contra a ordem tributária tenham suas peculiaridades próprias, não estão isolados apenas na dinâmica penal, estando atrelados diretamente ao direito tributário, que os complementa. A respeito disso, Roque Antonio Carrazza (2011), assevera: A lei penal que descreve delitos de fundo tributário não pode ser aplicada sem apoio no direito tributário, exatamente porque os tipos penais nela descritos são complementados pelas normas tributárias. Realmente, só é possível entender os delitos penais tributários (contrabando, descaminho, sonegação fiscal, apropriação indébita etc.) compreendendo corretamente os fenômenos que o direito tributário regula. Não é por outro motivo que, nesse campo, o direito penal deve buscar subsídios no direito tributário (p. 687). Dentro deste contexto, por oportuno, destacamos a Súmula Vinculante n. 24, do STF 5 reforçando a importância da atuação da Autoridade Fazendária em crimes contra a ordem tributária, pois estes delitos somente se consumarão após o lançamento definitivo do tributo, ou seja, após encerrada toda a discussão no 5 Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.

16 processo administrativo fiscal, não mais passível de recurso administrativo, com a inscrição em dívida ativa. Tecidas estas considerações iniciais, passamos a elucidar quem são os sujeitos ativos desses crimes. 4.2 DO SUJEITO ATIVO DO CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA Explica Eisele (1998) com propriedade quem é o sujeito ativo do crime contra a ordem tributária: Sujeito ativo do delito é a pessoa física que pratica a conduta tipificada na norma penal. No caso de crime contra a ordem tributária é o agente que realiza o fato descrito no tipo, ou seja, o contribuinte, ou o sujeito que age em nome desse, juntamente com o mesmo, ou não, ou terceiro com aquele relacionado (pp. 42-43). Como não há previsão legal para que a pessoa jurídica seja penalmente responsável por crimes contra a ordem tributária, tratando-se esta de uma ficção legal, a responsabilidade recairá nas pessoas naturais, ou seja, de todos os que direta ou indiretamente ligados à pessoa jurídica, de modo permanente ou eventual, tenham praticado ou concorrido para a prática da sonegação fiscal, consoante disposto no artigo 11, da Lei 8.137/90. Art. 11. Quem, de qualquer modo, inclusive por meio de pessoa jurídica, concorre para os crimes definidos nesta lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida de sua culpabilidade. Parágrafo único. Quando a venda ao consumidor for efetuada por sistema de entrega ao consumo ou por intermédio de outro em que o preço ao consumidor é estabelecido ou sugerido pelo fabricante ou concedente, o ato por este praticado não alcança o distribuidor ou revendedor. Reiteramos que no ordenamento jurídico brasileiro, a pessoa jurídica não comete crime contra a ordem tributária, mas sim as pessoas físicas que agem por intermédio daquela, determinando a atuação empresarial, social, associativa e ao

17 administrarem a pessoa moral possuem o elemento volitivo da conduta, indispensável à configuração da culpabilidade. Segue este mesmo raciocínio, Machado (2011), assim explicando: Embora o agente do crime seja geralmente o sujeito passivo da obrigação tributária, tal condição não é essencial. O sujeito passivo da obrigação tributária pode ser uma pessoa jurídica e esta jamais é autora de crime. Autor de crime será a pessoa física ou natural que age em seu nome. Pode ocorrer também que uma pessoa natural seja o sujeito passivo de determinado tributo, mas o agente do crime que se consubstancia com a supressão deste seja outra pessoa natural (p. 360). No caso em apreço, cabe estabelecer a autoria dos crimes contra a ordem tributária, classificando-a em mediata e imediata. Na primeira hipótese, o sujeito age somente na condição de autor intelectual da conduta criminosa e na segunda, o terceiro executa materialmente o fato típico. Aquele que possui a consciência e o domínio intelectual do ato é efetivamente o autor, de modo, que se um administrador de uma empresa determina que diversos empregados realizem tarefas individualmente lícitas, mas que culminam em evasão fiscal pelo resultado do procedimento como um todo, o domínio finalístico da conduta global que pertence ao gerenciador da atividade determina a autoria. Independente do administrador não executar efetivamente nenhuma tarefa que culmine em sonegação de tributos, mas ao se utilizar de interpostas pessoas para assim agir, valendo-se de empregados, contadores autonômos, testas de ferro, laranjas, porém exercendo o controle desses atos como o senhor de todas as decisões e com o propósito de reverter tais proveitos ilícitos à pessoa jurídica a qual gerencia, atua com domínio funcional do fato, respondendo como autor mediato do crime em tela. Já os terceiros que praticam os atos a mando do administrador, desde que tenham consciência e vontade dirigida ao resultado típico, não se vislumbrando qualquer excludente, também respondem pelo cometimento do delito, como autores imediatos ou partícipes, tudo na medida de sua culpabilidade.

18 O chamado domínio funcional do fato, visando a caracterização da autoria e não participação apenas, é explicado no concurso de agentes por Zafaroni e Pierangeli (1997, p. 674) como a contribuição que cada um traz para o fato e de tal natureza que, de acordo com o plano concreto do fato, sem ela o fato não poderia ter se realizado. Ainda, sobre a teoria do domínio do fato, Greco (2003, p. 479) assim discorre: A teoria do domínio do fato é considerada objetivo-subjetiva. Aquele que realiza a conduta descrita no núcleo do tipo penal tem o poder de decidir se irá até o fim com o plano criminoso, ou, em virtude de seu domínio sobre o fato, isto é, em razão de ser o senhor de sua conduta, pode deixar de lado a empreitada criminosa. Para aqueles que adotam um conceito restritivo de autor, não haveria dúvida em reconhecer como autor aquele que viesse a executar a conduta descrita no tipo (p. 479). Outrossim, convém agora estabelecer um comparativo entre a sujeição passiva tributária e a autoria/participação em ilícitos penais tributários. 4.3 COMPARATIVO ENTRE SUJEIÇÃO PASSIVA TRIBUTÁRIA E AUTORIA/PARTICIPAÇÃO EM ILÍCITOS PENAIS TRIBUTÁRIOS Como vimos anteriormente o sujeito passivo de uma relação jurídica tributária, aquele disposto no artigo 121, do CTN nem sempre é o contribuinte, ou seja, aquela pessoa que mantém uma relação pessoal e direta com a materialidade da hipótese de incidência do tributo, podendo figurar um terceiro responsável, cuja obrigação decorra de lei. Já o autor de crime contra a ordem tributária é a pessoa física que pratica a conduta tipificada pela norma ou que detem o domínio intelectual volitivo da conduta. Já o partícipe é aquele que, em um concurso de pessoas, concorre para a realização do resultado típico, seja através de uma decisiva colaboração material (cumplicidade) ou moral (instigação ou induzimento).