PARECER N.º 13.795 PROCESSO ADMINISTRATIVO- DISCIPLINAR. A CASSAÇÃO DA APOSENTADORIA É MEDIDA PUNITIVA DE EXCEÇÃO, APLICÁVEL EM RELAÇÃO A INFRAÇÕES QUE CAUSARAM DANOS IRREPARÁVEIS AO DECORO DO SERVIÇO PÚBLICO, QUANDO NO OCASO DA VIDA FUNCIONAL DO PROCESSADO. CONVERSÃO DA PENA CASSATÓRIA DA JUBILAÇÃO EM MULTA SOBRE OS PROVENTOS. INTELECÇÃO DO ARTIGO 93, DA LEI N.º 7.366/80, COMBINADO COM O ARTIGO 19, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. ANTECEDENTE: PARECER N.º 12.790. Vem a exame e parecer da Equipe de Revisão da Procuradoria de Probidade Administrativa e de Processo Administrativo-Disciplinar, o expediente n.º 09385-29.00/92.9, que encarta o expediente n.º 76.474/91, do Conselho Superior de Polícia, que se refere ao processo administrativo-disciplinar instaurado pela Resolução n.º 24.347, de 17 de outubro de 1991, editada por aquela corte, com base na Sindicância Administrativa n.º 224/91, realizada pela Delegacia de Polícia de Tapes, que indicia o servidor Investigador de Polícia, ora inativo, RUI LEONES OLIVEIRA SALGADO como incurso nas cominações do art. 317, 1º, do Código Penal Brasileiro, cujo reflexo na esfera disciplinar é a previsão do inciso XXXVIII, do artigo 81, da Lei n.º 7.366/80. Segundo se depreende dos autos da Sindicância predita e do Inquérito Policial n.º 21/91, a administrada Maria Venis de Oliveira Roth, residente na Rua Professor Luiz Vieira, 655, Tapes, no dia 13 de fevereiro de 1991, foi chamada ao telefone por um amigo seu e do marido dela, de nome Ronaldo Dias, de codinome Zóia, a quem o casal emprestara um veículo Volkswagen, placas VZ 1123, ano 1968. Ronaldo informava à administrada referida que, naquela noite, ele se envolvera em um acidente de automóvel com o carro dela, lesionando algumas pessoas e sem socorrê-las. Por isso, recomendava Ronaldo que fosse a polícia e fizesse uma comunicação falsa de que o Volkswagen havia sido furtado e, deste modo, livraria a responsabilidade dele e da administrada.
Maria Venis hesitou um pouco em atender a esse pedido ilegal. Foi, porém, mais tarde persuadida a fazê-lo, uma vez que Ronaldo ligou novamente e, desta vez, usando a argumentação de um sedizente policial, que também lhe falou ao telefone. Registrada a falsa ocorrência do furto do veículo, no dia seguinte, com a chegada do marido de Maria Venis, resolveram redirecionar a história e foram à Delegacia. Entretanto, ao serem recebidos pelo ora processado, este lhes disse que deixasse assim mesmo, porque ele tinha uma maneira de contornar o problema em Porto Alegre, liberando o veículo sinistrado, pertencente a Maria Venis, que, contudo, ainda não estava em seu nome. Para isso, o processado, após vários contatos entre o casal e o Ronaldo que fora a Tapes, a fim de ajudar a remediar o problema, passou a exigir-lhes dinheiro. Como Ronaldo não tivesse dinheiro disponível, por recomendação do marido de Maria Venis, ofereceu ao policial uma Brasília, cor Azul, como dação em pagamento, sendo a proposta aceita. Por isso, a Brasília foi entregue ao Policial em Tapes e, nela, durante alguns dias, os filhos do processado passearam na Cidade (fls. 20/21). O fato é que o casal não teria conseguido liberar o Volkswagen em Porto Alegre e, por isso, o processado se teria livrado da Brasília, deixando-a no pátio da Delegacia de Tapes, onde foi apreendida. Ouvido o processado Investigador Rui Leones Oliveira Salgado, este disse que conheceu Luiz Paulo Roth, quando estava no fim de um plantão em Tapes. Paulo lá compareceu, pedindo uma certidão de ocorrência de furto de veículo, que lá fora registrada, uma vez que o veículo em tela fora encontrado em Porto Alegre e precisava desse comprovante para retirá-lo do depósito da Polícia. O processado disse-lhe que pedisse a outro colega, porque já estava saindo em direção a Porto Alegre. Dessa circunstância se valeu Paulo e lhe ofereceu uma carona em seu caminhão, pois se dirigia naquele momento a Porto Alegre, com o propósito de liberar o VW/Fusca. Nessa viagem, o processado ofereceu-se para auxiliar na liberação, indo, inclusive, ao depósito dos veículos junto com Paulo, mas, lá, foram informados de que o automóvel envolvera-se em acidente e, por isso, deveriam dirigir-se à Delegacia de Delitos de Trânsito. Limitando-se a esse contato com Paulo. Nega que tenha falado com Ronaldo e entretido negociações (fls. 21/22). Luiz Paulo Roth, marido de Maria Venis, disse que foi a Delegacia, a fim de contar tudo como acontecera e que, ao ser atendido pelo processado, este lhe convenceu a manter a história engendrada por Ronaldo e a mulher do declarante, pois senão esta responderia pelo delito de falsa comunicação de crime. Daí, em diante, o levou duas vezes a Porto Alegre, a fim de tentar liberar o veículo e entreter conversações com Ronaldo, no sentido de obter uma compensação financeira por seu empenho na solução do caso.
(fls. 46-47). Ronaldo acabou concordando em entregar uma Brasília azul ao indiciado Diante deste fato, acrescentado do detalhe de que o indiciado não comunicou ao Delegado que o veículo Volkswagen não fora furtado, mas se envolvera em um acidente com vítimas, o enquadrou no artigo 317, 1.º, do Código Penal Brasileiro. Levado o problema ao conhecimento do Egrégio Conselho Superior de Polícia, aquele colegiado instaurou o processo administrativo-disciplinar, designando Autoridade Processante o Delegado Cleiton Silvestre Munhoz de Freitas, o qual, após ter realizado a instrução, ouvindo todos os envolvidos no affair, tendo todos confirmado as versões dadas na fase inquisitorial, concluiu que, sendo as versões contraditórias, seria mais prudente esperar o decisão do Poder Judiciário (fls. 102/111). O Egrégio Conselho Superior de Polícia, através da Resolução n.º 33.750, de 14 de setembro de 2000, por maioria, decidiu pela cassação da aposentadoria do indiciado, por estarem convencidos de que houve o fato imputado e ele, em razão dos firmes depoimentos do casal Paulo Roth e Maria Venis e de Ronaldo Dias (fls. 164/169). Na esfera penal, o indiciado foi absolvido com fulcro no artigo 386, inciso VI do Código de Processo Penal (fls. 133/136) É o relatório. Não há nulidade a sanear. No mérito, ouso discordar parcialmente da decisão à que chegou a maioria da composição do Egrégio Conselho Superior de Polícia, uma vez que a cassação de aposentadoria, para ser viável exige a prática comprovada de fato extremamente gravoso ao bom nome da instituição policial, uma vez que a hipótese fática é a ocorrência de ato praticado que, na atividade, cominasse a pena de demissão, consoante a dicção do artigo 93, da Lei n.º 7.366/80. Ora, a pena demissória pode ser comutada por pena de suspensão, ex vi do artigo 190, inciso IV, da Lei Complementar n.º 10.098/94 e, por interpretação analógica do artigo 90, da Lei n.º 7.366/80, onde se diz que a pena de demissão poderá ser aplicada pela prática das transgressões previstas nos incisos XXXIII a XLIII, do artigo 81. Segue-se que, se a pena demissória pode ser aplicada ou não, é conclusivo que a pena de cassação da aposentadoria também não é de aplicação obrigatória, sob pena
de violentar-se o princípio da isonomia, consagrado pela Lei Maior, artigo 5.º, caput e artigo 19, inciso III, e agredir-se o princípio da justiça, que modela todo o fazer jurídico. De outra banda, segundo a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, a cassação da aposentadoria é medida de exceção, só aplicável em casos altamente atentórios ao decoro do serviço público e de alto teor deletério aos fins da administração, componentes estes não presentes no vertente caso, uma vez que, sequer, lhe foi reconhecida a culpabilidade na instância judiciária. Em face do exposto, proponho a aplicação de uma multa de 60 (sessenta) dias deduzida do valor dos proventos de aposentadoria, obedecendo os percentuais do artigo 82, da Lei Complementar n.º 10.098/94 e do Parecer n.º 12790, aprovado pelo Senhor Governador do Estado em 20 de julho de 2000, registrado no Boletim n.º 95/00, publicado no Diário Oficial do estado em 24 de julho de 2000. É o parecer. Sala de sessões, 13 de novembro de 2000. José Hermílio Ribeiro Serpa, Relator. Dea Mara Ribeiro Lima, Roque Marino Pasternak, Sérgio Gualdi Ferreira da Silva, Luiz Felipe Targa.
Processo nº 009385-29.00/92-9 Acolho as conclusões do PARECER nº 13.795, da Procuradoria de Probidade Administrativa e de Processo Administrativo-Disciplinar, de autoria do Procurador do Estado Doutor JOSÉ HERMÍLIO RIBEIRO SERPA, em especial ante a aplicação imediata da norma procedimental inserida no Art. 195, Parágrafo Único, da Lei Complementar 10.098, de 03 de fevereiro de 1994, pela Lei Complementar 11.928, de 13 de junho de 2003. Submeta-se o expediente à deliberação do Excelentíssimo Senhor Governador do Estado. Em 07.10.03. Helena Maria Silva Coelho, Procurador-Geral do Estado.
Processo nº 009385-29.00/92-9 Aprovo o PARECER nº 13.795, da Procuradoria-Geral do Estado, cujos fundamentos adoto para aplicar a pena de MULTA de 60 (sessenta) dias deduzida do valor dos proventos de aposentadoria do Investigador de Polícia RUY LEONES OLIVEIRA SALGADO, matrícula nº 1.123792.9, obedecendo os percentuais do artigo 82, da lei Complementar nº 10.098/94, e do Parecer nº 12.790. À Procuradoria-Geral do Estado para as devidas anotações e publicação. Após, à Secretaria da Justiça e da Segurança para as demais providências pertinentes. PALÁCIO PIRATINI, em Porto Alegre, 08 de outubro de 2003. GERMANO ANTÔNIO RIGOTTO, GOVERNADOR DO ESTADO.