A explosão do fenômeno: reality show



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Transcrição:

A explosão do fenômeno: reality show Deomara Cristina Damasceno Garcia, Antoniella Santos Vieira e Cristiane Carneiro Pires Índice 1 A história dos reality-shows 1 2 O que pensam os espectadores sobre os reality-shows 3 3 Discutindo a importância do reality show 5 4 Referências Bibliográficas 7 A pesquisa teve o intuito de verificar as possíveis causas da crescente audiência e sucesso do reality show, contando com a contribuição teórica de diversos pesquisadores e tendo investigados, aleatoriamente, 14 sujeitos, cujas idades variavam de 12 a 55 anos, através de entrevistas abertas. Diante da invasão da intimidade das pessoas famosas ou não, do olhar voyeur dos espectadores, da expectativa de conhecer de fato seu ídolo, sendo que não há conteúdo específico nesta programação e o ibope continuar crescendo, tivemos o interesse de investigar o fenômeno do reality show. 1 A história dos reality-shows A partir de 1992, a televisão mundial presenciou a criação do primeiro programa televisivo que prometia mostrar a convivência Psicólogas Clínicas de pessoas comuns, estranhas umas às outras e vivendo juntas num cativeiro. Suas vidas eram filmadas e expostas para todos. Esta foi a estréia do primeiro reality show da história, um programa produzido e veiculado pela MTV, o The Real World (Na Real), em Nova Iorque nos Estados Unidos (MU- NIZ et. al., 2002). Reality show é um tipo de programa televisivo apoiado na vida real. Exemplo deste é o programa mundialmente conhecido Big Brother criado em 1999 por John de Mol e inspirado no livro de George Orwell, "1984". Em 1999, John de Mol, um executivo da TV holandesa, sócio da empresa Endemol, inspirando-se no livro de Orwell, teve a idéia de criar um Reality Show onde pessoas comuns seriam selecionadas para conviverem juntas dentro de uma mesma casa, vigiadas por câmeras, 24 horas por dia. O nome do programa não poderia ser outro: Big Brother (em alguns países o nome do programa é traduzido e é chamado Grande Irmão) (Wikipédia, 2005). A febre européia em torno dos realityshows conseguiu até mesmo transpor as barreiras conservadoras do povo francês, transformando o Big Brother Francês num sucesso de público em 2001. A América não resistiu aos programas de realidade, com seu culto às novidades vindas da Europa; porém,

2 Deomara Garcia, Antoniella Vieira e Cristiane Pires o Brasil demorou um pouco para sentir os efeitos da febre (MUNIZ et. al., 2002). A MTV Brasil foi a primeira a apresentar um reality show no país, uma filial do Na Real americano, o programa 20 e Poucos Anos, mas com pouca repercussão. Mais tarde, a Rede Globo veiculou para todo o Brasil a primeira versão de No Limite, também baseado em um programa americano chamado Survivor, alcançando grandes índices de audiência. O boom brasileiro aconteceu com a criação, no Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), do programa Casa dos Artistas (MUNIZ et. al., 2002). Nestes shows de realidade, as pessoas são confinadas em casas ou isoladas em ilhas ou barcos e submetidas à vigilância permanente, competindo entre si e eliminando um participante por semana. Neste contexto, o termo realidade significa "sem roteiro". Segundo PRIOLLI (2002), os realityshows são programas familiares, atingem com igual impacto todas as faixas etárias e podem ser vistos coletivamente na sala de estar. Trata-se de um novo gênero universal de programação de TV, que deverão desdobrar-se numa infinidade de novos produtos e põem em crise a teledramaturgia. O que leva o telespectador a vê-los é a mera curiosidade, a pura bisbilhotagem, ancestral impulso que pode ser inconveniente e até condenável, mas não é doentio, salvo as devidas exceções. Nelson Rodrigues (apud (JABOR, 2002) dizia que a novela era importante para satisfazer nossa fome de mentiras. O show de realidade é para satisfazer nossa fome de verdade. Os programas de televisão vendem desejos e os desejos não cessam: "... o reality show atende a um desejo do homem comum de ver a própria concepção, a cena primária, como dizem os psicanalistas, ver pelo buraco da fechadura, edipicamente, papai e mamãe transando na cama sagrada do drama burguês". Você quer mesmo é invadir a TV como os assaltantes invadem uma casa. Você quer ver o que acontece no mundo dos que amam, dos que consomem, dos que existem. Você quer ver ; não sabe bem o quê ainda, mas quer ver o que te escondem, ver algo que te é negado. Você quer estar onde tem tudo: iogurte, carro do ano, cerveja com mulher boa, carros sport, luxo no shopping virtual da tela, você quer morar lá dentro como uma rosa púrpura do Cairo (JABOR, 2002). Umberto Eco, em seu texto Tevê: a transparência perdida, afirma que a televisão criou uma ilusão da realidade, transformando-a de um veículo de fatos em um aparato para a produção dos fatos. Logo, a televisão passa a ser uma produtora da realidade (ECO, 1984). Tem-se que a intimidade e o direito de estar só é uma criação burguesa que divide o espaço social entre a esfera pública e a esfera privada, no interior da qual se situará outra ainda mais recolhida, a esfera "íntima". Ao explorar a arquitetura das casas e o significado de suas divisões para os seus moradores, podemos avaliar o sentido de intimidade entre as pessoas no decorrer dos séculos. Os reality shows tentam, através das câmeras de TV, mostrar a intimidade na realidade, porém a partir do momento em que existe um cameraman, o livre arbítrio e a espontaneidade dos personagens passam a ser meras produções artísticas.

A explosão do fenômeno: reality show 3 Esses programas trazem dois componentes extremamente procurados pela sociedade contemporânea: fama acessível a todos aqueles que não a possuem e a saciação da curiosidade em querer saber o que se passa na vida das pessoas. Simples atos ordinários tornam-se espetáculos trabalhados pelas mídias. Os acontecimentos comuns transformados em imagem passam a ser considerados extraordinários. É a espetacularização das práticas sociais, onde o ator se confunde com o espectador, desempenhando papéis semelhantes, mas separados pela tela da máquina (MUNIZ et. al., 2002). Diante de tamanha audiência, esses programas se mostram como uma ótima fonte para atrair investimentos publicitários, além de ser um canal de exposição para os seus participantes. O merchandising gerado por este gênero televisivo provocou algumas alterações no setor publicitário, considerando o fato de que os reality-shows eram praticamente um gênero novo no Brasil para atingir alto nível de publicidade; enquanto outros gêneros levaram anos e anos para se consolidar - como a telenovela. Além disso, vários produtos foram criados com a marca desses programas, desde fitas de vídeo até acessórios (MUNIZ et. al., 2002). Quem participa deste tipo de programa também lucra com sua superexposição. Um importante índice que ocorre em tais programas é o número de capas e ensaios eróticos que têm os participantes como tema. Alguns dos participantes aproveitam a visibilidade alcançada para posar nos ensaios, mas outros já antevêem esta visibilidade, cuidando esteticamente do corpo ou, até mesmo, assinando os contratos para posar antes mesmo do início do programa (MUNIZ et. al., 2002). A mídia é uma das principais fontes de espetacularização no contemporâneo e como um aparato sócio-tecnológico, possui dispositivos próprios que levam à espetacularização, como é o caso dos reality-shows. A espetacularização é um processo, não um ato, um evento ou um acontecimento no qual algo se enquadra nos parâmetros específicos do espetáculo. Abarca qualquer coisa e não é isenta de conflitos, como os existentes entre conteúdo e forma, por exemplo (DEBORD, 1997). Notam-se, nestes tipos de programa, os aspectos do exibicionismo e do voyeurismo, tanto dos participantes quanto dos espectadores. Entende-se por exibicionismo o desejo mórbido de se expor, na presença de outras pessoas, partes do corpo que se encontram normalmente ocultas (CABRAL, 1990); enquanto o voyeurismo implica na obtenção do prazer sexual através da observação voluntária e intencional de outras pessoas. Através do olhar, o voyeur obtém uma gratificação sexual pela tentativa de repetir visualmente a cena ansiógena, excitantes da primeira infância (cena primária), as quais os tranquilizam contra a angústia de castração. O interesse pelo outro ocorre pela curiosidade, os indivíduos agem pelo princípio do prazer, lutam para satisfação de seus impulsos, ignorando de certa forma os julgamentos de valor (NOYA e GARCIA, 2002). 2 O que pensam os espectadores sobre os reality-shows Programas, por exemplo, como o Big Brother e Casa dos Artistas se, por um lado, atraem a atenção de uma grande mai

4 Deomara Garcia, Antoniella Vieira e Cristiane Pires oria de telespectadores adeptos do trivial como forma de lazer, por outro, atraem os adeptos do voyeurismo, numa proporção bem menor, porém excessivamente significativa. Isto por colecionarem insinuações provocantes devido à exposição física de seus personagens. A curiosidade do voyeur é reforçada pela mídia e faz dos realityshows quase uma tara, sendo impossível para alguns deixarem de assistir aos episódios, compram pacotes das emissões privadas para terem acesso às imagens 24 horas por dia (MARIZ, 2002). Quando se comparam os dois programas, "Big Brother Brasil"e "Casa dos Artistas", a ambigüidade fica evidente na contradição entre os objetivos e o comportamento dos participantes, presente na tentativa de promover sua individualidade abdicando da privacidade (BOURDOUKAN, 2002). Estas argumentações vão ao encontro das respostas dos sujeitos da nossa pesquisa, que notaram certas diferenças entre esses programas. Segue a fala de um dos nossos entrevistados: Tem uma certa diferença: no Big Brother as pessoas entram lá pelo dinheiro e para serem famosas. Na Casa dos Artistas é mais pelo dinheiro, pois eles já são famosos e com isso quando saem usam a Casa para se promover. Em ambos, há um prêmio em dinheiro para quem sobreviver até o final, mas para os famosos, o prêmio é mais uma conseqüência agradável do que um objetivo. A verdadeira meta é dar-se a conhecer ao público, é expor-se para vender seus produtos (CDs, livros, fotos) e para ser chamado para novos trabalhos (BOURDOUKAN, 2002). Considerando a influência da TV na vida dos telespectadores, faz-se necessário destacar o estudo de Bittencourt Jr. (apud MA- RIZ, 2002), que vê a TV como um forte instrumento de poder e, como tal, deveria cumprir o seu papel de educar, entretendo; informar, educando. As afirmações coincidem com a argumentação de MARIZ (2002) que a televisão é um forte meio de comunicação de massa, sendo utilizada de maneira escabrosa na manipulação de pessoas. O interesse comercial desregrado, dissociado das normas de conduta, prefere os apelos, na maioria das vezes sexuais, para aumentar a venda de seus produtos. De forma contraditória ao exposto, o artigo do colunista-cineasta Walter Salles (apud MUNIZ et. al., 2002) aponta que " No Limite é a irrealidade cotidiana", o reality show é um mundo de faz-de-conta pois os concorrentes fingem que a infra-estrutura em volta deles não existe, sendo que o espectador aceita esse código. Suas fronteiras estão se desfazendo, para vender uma ilusão de que o indivíduo pode fazer (MUNIZ et. al., 2002). O que fica claro na resposta de um de nossos pesquisados: Acho que a intenção desses realityshows, inicialmente, era mostrar a vida da pessoa na realidade, mas acho que lá as pessoas mais representavam do que viviam. Deveriam mostrar o que são na verdade e não o que as pessoas querem ver. Por outro lado, Andacht (apud FREITAS, 2002) salienta que a mídia é parte dinâmica da cultura. Mesmo considerando que há interesses comerciais, antes de relacionar televisão com dominação, devemos relacioná-la

A explosão do fenômeno: reality show 5 com interação, porque os temas que a TV apresenta são justamente aqueles pelos quais o telespectador já demonstrou interesse, já escolheu. Portanto, em vez de falar sobre dominação ou lavagem cerebral, é mais próprio falar de interação, embora exista uma guerra de interesses comerciais por temas que dão mais ibope, mais dinheiro (FREITAS, 2002). Rolim (apud MORAES, 2002) nos aponta uma visão sócio-econômica da TV e nos informa que, atualmente, no Brasil, estamos vivenciando uma cisão da televisão em: TV dos pobres e TV dos ricos. A televisão aberta seria a TV dos pobres, pobres tanto economicamente quanto de espírito. E a TV paga, com muito mais opções, seria a TV dos privilegiados. O ideal seria que a população tivesse acesso a mais canais e, conseqüentemente, mais alternativas. Ele não acredita que isso venha de um processo de decadência, por conta da disputa pela audiência. O que se torna contraditório: ao invés das emissoras melhorarem a qualidade de seus programas para conquistar mais pontos no ibope, elas estão apelando cada vez mais para uma programação de baixo nível. Esta discussão está mais em foco hoje devido a problemas que estão em evidência na sociedade e que podem ser estimulados pela programação atual (MORAES, MACHADO e OLIVEIRA, 2002). Segundo Andacht (apud FREITAS, 2002) de um determinado ponto de vista, nada mudou sob o sol. Acontece que as pessoas já se graduaram na televisão. Andacht diz que existe uma oposição bem forte entre educação (que é uma coisa formal, como aqui na Universidade) e aprendizagem (que acontece o tempo todo, na rua ou diante da TV). Os jovens são os graduados, gente que passou toda a sua vida na frente da televisão e agora estão devolvendo tudo o que a televisão lhe deu. E não apenas fisicamente: tem o gesto, a expressão, a linguagem, a forma de agir. Quer dizer, antes, o estúdio de televisão era o lugar fixo, fechado, onde estavam os profissionais. E o público, imenso, a famosa maioria silenciosa, estava fora, olhando, passivamente. Hoje, o que faz a televisão? Chama, faz um apelo a essa gente que já escutou bastante, já olhou bastante para ter assimilado totalmente esse roteiro. Andacht (apud FREITAS, 2002) acredita que já se pode dizer que moramos numa telesfera, num globo cheio de aparelhos de televisão por toda parte, nos aeroportos, residências, bares, banheiros. O que era a Bíblia oral na Idade Média, o que era a catedral, é hoje esse contínuo fluxo de imagens e sons. 3 Discutindo a importância do reality show Nos reality-shows, o comportamento dos "personagens"é ambíguo e, portanto, humano. Os artistas são humanizados e os espectadores ganham poder de Deus. Nessa inversão, está a fórmula de sucesso dos realityshows. Essa tensão entre o desejo de se expor e a necessidade de se proteger pode ser um dos atrativos desse tipo de programa. É algo com que todas as pessoas podem se identificar (BOURDOUKAN, 2002). Riccio (apud AZEVEDO, 2002), utilizou como instrumento de sua pesquisa o Programa do Ratinho, por ser um material interessante e inaugurar, talvez, a maior ênfase no individual da TV brasileira. Um programa que sintetizava diversos tipos de situ

6 Deomara Garcia, Antoniella Vieira e Cristiane Pires ações que aparecem nos programas de realidade. A característica da televisão de realidade está no conteúdo, feito por pessoas comuns, fatos reais, depoimentos individuais. Um reality show que trata de questões de família, traz depoimentos pessoais, problemas do cotidiano, pessoas que sofrem expondo sua experiência. Um programa que trata de reconstituição de crimes, faz a reconstituição de problemas individuais e permite que pessoas comuns se expressem no espaço televisivo. Existe, portanto, uma característica comum, mas existem diversos subgêneros desse gênero maior que é o show de realidade, seja ela cotidiana ou produzida. Questionado quanto ao fato de que os reality-shows de entretenimento são uma invasão da privacidade às avessas, ou seja, os telespectadores se sentem invadidos pelo convívio com aquelas pessoas. Riccio remete ao debate sobre a qualidade da programação, o gosto popular e qual o grau de autonomia do espectador para decidir o que lhe convém, ou seja, isto é uma categoria muito difícil de definir, a do chamado gosto duvidoso. Há sempre o argumento de que, quem não quiser assistir, é só desligar a TV ou mudar de canal. Mas há os que dizem que a televisão é uma concessão pública, deve se guiar por parâmetros públicos e não exclusivamente individuais. Ainda mais num país em que a TV aberta é que atinge a maioria da população (AZEVEDO, 2002). Se de um lado, a maioria combate os reality-shows, o professor e pesquisador uruguaio Fernando Andacht, não. Para ele, o papel do pesquisador não é julgar e sim compreender os fenômenos que estuda. O Big Brother é uma tentativa de, olhando o outro, entender-se a si próprio. Por isso mesmo, é um marco na programação da televisão mundial, que a partir de agora se dividirá em dois períodos: antes e depois de Big Brother (FREITAS, 2002). Andacht (apud FREITAS, 2002) considera que os intelectuais, inclusive professores de comunicação, podem achar totalmente grotesca essa idéia de exibicionismo, de voyeurismo, de estar espiando. Pedro Bial, o apresentador do Big Brother, diz: Vamos dar uma espiadinha, fazendo piada com a idéia, normalmente terrível, de olhar a vida íntima dos outros. Esse é, justamente, o segundo tema da pesquisa do professor uruguaio: a barreira entre o público e o privado está mudando rapidamente. Essa idéia de que o que acontece na casa de alguém é privado, já morreu. Agora temos essa nova possibilidade de ver pessoas que se desesperam para ser olhadas, para ser fiscalizadas, espiadas (FREITAS, 2002). Andacht (apud FREITAS, 2002) diz que, mais que espiar, o reality show é um modo de buscar a certeza de si mesmo: Ao olhar este elenco, que é um pouco a Comédia Humana, de Balzac, acho que a motivação básica é: olhar o outro para poder se compreender. Poder fazer sentido num mundo que cada vez fica mais complexo, mais cheio de tecnocracia. Então, o que era a Bíblia, o que era a religião forte, da Idade Média e da Idade Clássica, é hoje a televisão, e mais concretamente o reality show, uma procura da certeza de si mesmo. E mais que olhar artistas, agora estamos olhando pessoas comuns, como nós, que agem sem ter certeza de que estão sendo olhados naquele momento. Qual é o rosto último? Como é a última máscara?. O reality show

A explosão do fenômeno: reality show 7 não vai sumir, vai tomar outras mecânicas, mas sempre à procura da realidade, justamente no momento em que é mais difícil conhecer o real. A popularidade dos reality-shows é explicável devido à facilidade de digerir, apelam ao voyeurismo do público e têm custos de produção acessíveis, sendo sempre possível exportar o formato para países diferentes. A partir do momento que haja audiência e interesse voltados para esses tipos de programas, existiram tantos Big Brother Brasil, Casa dos Artistas, Fama, Ilha da Sedução, No Limite, Acorrentados, O aprendiz, Sem saída, Joga 10, Popstar, O grande perdedor quantos forem a motivação, a projeção, o olhar voyeur, a procura da realidade, do lazer e do cômico dos espectadores (FREITAS, 2002). Desta forma, pode-se verificar que determinados canais de televisão não estão preocupados em cumprir o seu papel de educar e de informar e buscam nos reality-shows uma forma de promover o entretenimento, a satisfação dos publicitários, dos participantes dos programas e dos espectadores. Mesmo estes programas sendo considerados não culturais ou não informativos, os pesquisados interessam-se por eles devido à curiosidade (voyeurismo), à falta de escolhas quanto à programação ou para ter assunto no dia-adia, dando a idéia de estarem bem informados. Há uma interação entre a TV e o público, cujo binômio está nos próprios interesses e escolhas por parte da audiência. De certa forma, esses programas alimentam o que pode ocorrer na vida dos outros ou tentam antecipar o próprio comportamento, através da observação do comportamento alheio. A vida na telinha torna-se um verdadeiro espetáculo de consumo, onde o desejo está no interese pelo outro, na curiosidade, na pura bisbilhotagem, num olhar para fora, como se os espectadores buscassem no outro um modelo de identificação para orientar suas próprias vidas. 4 Referências Bibliográficas AZEVEDO, E. Justiceiros dos reality shows. Resumo disponível na Internet: http://jbonline.terra.com.br/jb/papel/ca dernob (em 13/09/2002). BOURDOUKAN, A. A inversão dos reality shows. Resumo disponível na Internet: http://www.speculum.art.br/article.php (em 13/09/2002). CABRAL, A.; NICK, E. Dicionário Técnico de Psicologia. São Paulo: Cultrix, 1990, p.112. DEBORD, G. A Sociedade do Espetáculo - Comentários sobre a sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997. ECO, U. Tevê: a transparência perdida. In: Viagem na Irrealidade Cotidiana. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. FREITAS, A.V. Entrevista com o professor Fernando Andacht - Big Brother é um marco mundial na programação de TV. Resumo Disponívelna Internet: http://www.ufrgs.br/jornal/abril2002/p ag07.html (em 13/09/2002). JABOR, A. Reality shows matam fome de verdade. Resumo disponível na Internet:http://www.estado.estadao.com.br/

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