CARACTERIZAÇÃO AMBIENTAL E REGENERAÇÃO NATURAL NA REGIÃO DE DOIS VIZINHOS-PR Bruna Elisa Trentin 1, Fernando Campanhã Bechara 2* [orientador], Daniela Aparecida Estevan 2, Gilmar Poser Brizola 1, Murilo Lacerda Barddal 3 1 Alunos do curso de Engenharia Florestal. 2 Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Câmpus Dois Vizinhos, Paraná. E-mail: bechara@utfpr.edu.br 3 COPEL Companhia Paranaense de Energia. *Autor para correspondência Resumo: A região sudoeste do Paraná apresenta apenas 13.966,11 hectares de cobertura florestal original remanescente (incluindo florestas nativas e campos naturais) ou 1,2% em relação à sua área total, possui de média a forte degradação de terras. A formação florestal predominante é um ecótono entre Floresta Ombrófila Mista Montana e Floresta Estacional Semidecidual Montana, gerando uma biodiversidade diferenciada classificada pelo Ministério do Meio Ambiente como Área Prioritária para Conservação, Uso Sustentável e Repartição de Benefícios da Biodiversidade Brasileira. O seguinte trabalho foi elaborado em uma área degradada, com o objetivo de avaliar a sua regeneração natural após o seu isolamento. A área foi dividida em quatro parcelas, subdivididas em 24 sub-parcelas. Após oito meses do isolamento foram sorteadas dentro de cada parcela, três sub-parcelas subdivididas em seis unidades amostrais. Avaliou-se riqueza de espécies, densidade e freqüência das plantas com mais de 50 centímetros. Amostrou-se um total de 3.355 indivíduos entre 10 famílias, predominando Asteraceae, e em seguida Solanaceae. Verificou-se que Vernonia polyanthes Less. apresentou maior densidade e freqüência. O número de plantas mortas foi alto, ocupando o segundo lugar nestes parâmetros. As características das espécies amostradas definiram a área como pertencente ao estágio inicial de sucessão, por apresentar em geral espécies efêmeras de fisionomia herbáceo/arbustiva, lianas herbáceas, plantas pioneiras e heliófitas. Palavras-chave: plantas pioneiras, área degradada, levantamento fitossociológico, estágio inicial de sucessão Introdução A região sudoeste do Paraná apresenta apenas 13.966,11 hectares de cobertura florestal original remanescente (incluindo florestas nativas e campos naturais) ou 1,2% em relação à sua área total, sendo a terceira menor cobertura do Estado, provavelmente dada pela colonização que foi baseada na exploração de madeiras nativas. Esta região apresenta 96,6% de áreas com uso da terra agrossilvipastoril, sendo a segunda região mais antropizada do Estado (IPARDES, 2002). Adicionalmente, o sudoeste do Paraná possui a terceira menor representatividade das unidades de conservação por remanescentes vegetais do Estado, com um índice de apenas 6% (IPARDES, 2003). Esta informação relaciona-se diretamente com a conservação do solo, biodiversidade e manutenção da qualidade e quantidade das águas. Segundo o ITCG (2008), o município de Dois Vizinhos possui de média a forte degradação de terras. O Município de Dois Vizinhos está inserido, segundo o Ministério do Meio Ambiente, nas Áreas Prioritárias para Conservação, Uso Sustentável e Repartição de Benefícios da Biodiversidade Brasileira, segundo a Portaria MMA n o 9 de 23 de janeiro de 2007. Neste documento, Dois Vizinhos foi classificado como município principal do Corredor Rio Iguaçu Rio das Cobras, o qual perfaz área de 621 km 2 e onde consta: Ação prioritária: mosaico/corredor; Prioridade de ação: muito alta; e Importância para biodiversidade: extremamente alta. Os critérios para estabelecer a prioridade de ação destas áreas são: importância biológica, grau de estabilidade, grau de ameaça e oportunidades para uso sustentável e repartição de benefícios. Quanto às tipologias de solos, a região Sudoeste apresenta, nas áreas de relevo plano, nos aluviões dos cursos d água, principalmente os solos aluviais e hidromórficos. Nas áreas de relevo suave ondulado ocorrem 17 e 18 de Outubro de 2011 196
Latossolo vermelho, Latossolo bruno, Cambissolo e Nitossolos. Os Neossolos litólicos estão presentes nas partes mais acidentadas do relevo. Os solos mais usados para a prática da agricultura apresentam frágil equilíbrio ecológico, principalmente quando submetidos a uma agricultura intensiva em mecanização e em insumos modernos. A paisagem da área de pesquisa apresenta pequenos remanescentes florestais de 1 a 50 hectares inseridos em uma matriz agrícola composta, essencialmente, por culturas anuais de verão e inverno, além de pastagens. A formação florestal predominante é um ecótono entre Floresta Ombrófila Mista Montana e Floresta Estacional Semidecidual Montana, gerando uma biodiversidade diferenciada. Diante da inexistência de artigos em revistas científicas (do conhecimento dos autores) sobre a flora da região, o seguinte trabalho foi elaborado em uma área degradada, com o objetivo de avaliar a sua regeneração natural após o seu isolamento, descrevendo a sua diversidade florística e seu potencial de resiliência ambiental. Material e Métodos O clima predominante do Município de Dois Vizinhos é do tipo Cfb, segundo a classificação de Köppen.. Quanto à geologia, o município apresenta unidade litoestratigráfica do Mesozóico, Grupo São Bento, JKsg Formação Serra Geral, efusivas básicas toleíticas com basaltos maciços e amigdalóides, afaníticos, cinzentos a pretos, raramente andesíticos. No tocante à pedologia, há predomínio de nitossolos e latossolos. Derrames de vulcanismo de fissura continental (ITCG, 2008). A unidade morfoestrutural é a bacia sedimentar do Paraná, terceiro planalto paranaense, sub-unidade morfoescultural do planalto de Francisco Beltrão (ITCG, 2006). A unidade aqüífera do município é a Serra Geral Sul, composta por derrames basálticos da Formação Serra Geral na Área de Abrangência da Bacia do Rio Iguaçu (ITCG, 2008). A área de pesquisa possui 8 ha e está situada na região norte do município de Dois Vizinhos. A altitude varia entre 475 e 510 m. Esta área está inserida dentro da fazenda da UTFPR, Câmpus Dois Vizinhos, na Bacia Hidrográfica do Rio Iguaçu, dentro da Unidade Hidrográfica dos Afluentes do Baixo Iguaçu, segundo a Superintendência de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental - SUDERHSA, em rio de quarta ordem que alimenta o Rio Erveira, o qual abastece o Rio Chopim, principal afluente do Rio Iguaçu, na região sudoeste do Estado do Paraná. A área experimental está situada entre as coordenadas geográficas 25 o 41 44-25 o 41 49 S e 53 o 06 23-53 o 06 07 W. De 1993 a 2005, o uso do solo foi com culturas anuais de inverno (aveia e trigo) e verão (feijão, milho e soja). De 2006 a 2008 a área foi plantada com mudas de pastagem (capim estrela africana; Cynodon nlemfuensis Vanderyst) para bovinocultura. Em 2009, o local voltou a ser usado com culturas anuais até a última colheita realizada em 15 de outubro de 2009. Em 20 de outubro de 2010, a área experimental foi roçada. A partir desta data, a área encontrou-se isolada de fatores de perturbação. O experimento foi delineado através de quatro parcelas de 40 x 54 m ou 2.160 m². Cada parcela foi quadriculada em 24 sub-parcelas de 9 x 10 m (90 m²). Para a avaliação da presença de plantas, após oito meses do isolamento da área contra os fatores de perturbação, foi feito um levantamento em três sub-parcelas aleatórias para cada parcela. Cada sub-parcela foi dividida em seis unidades amostrais de 1,5 x 10 m. Foram identificados e quantificados todos os indivíduos maiores que 50 cm de altura, totalizando 1.080 m 2 de área amostral distribuídas em 72 unidades amostrais. Foi calculada a riqueza e a freqüência de espécies, além da densidade de indivíduos. Foram calculados os parâmetros fitossociológicos de freqüência (absoluta e relativa), densidade (absoluta e relativa) e riqueza de espécies. 17 e 18 de Outubro de 2011 197
Resultados e Discussão Foi amostrado um total de 3.355 indivíduos entre 10 famílias botânicas, predominando Asteraceae, e em seguida Solanaceae (Tabela 1). Foram identificados, ao nível de espécie, 98% dos indivíduos levantados. Considerando o grande número de indivíduos amostrados, a diversidade encontrada foi baixa. As cinco espécies com maior número de indivíduos amostrados são herbáceo/arbustivas, incluindo 88,61% do total de indivíduos (3.355). Vernonia polyanthes Less (assa-peixe) foi a que apresentou maior densidade (1.041), compreendendo 31,02% do total. Trata-se de uma espécie rústica de ciclo curto, estrategista r e característica de sucessão pioneira. Sua dispersão anemocórica facilita a sua disseminação. Em seguida, as plantas mortas (907) compreenderam 27,03% da densidade. Esse índice é aceitável por se referir a uma área de regeneração natural que encontra-se em estágio de sucessão pioneira. Esta fase é caracterizada por plantas heliófitas e efêmeras, que são pouco exigentes quanto às condições edafoclimáticas. Elas têm função de preparar o solo para espécies mais exigentes que virão a se desenvolver no local. Por conseguinte, notou-se que a maior parte das plantas mortas eram, provavelmente, V. polyanthes. A terceira espécie com maior número de indivíduos amostrados (692) foi Sida rhombifolia L. (guanxuma) que apresentou 20,62% de densidade relativa. Esta possui dispersão por zoocoria, importante para a atração precoce de animais. Em seguida, Mikania cordifolia (L.f.) Willd (guaco) liana herbácea, apresentou 6,55%. Sua dispersão é anemocórica assim como Chromolaena maximilianii (Schrader) R.M. King & H. Rob. (mata-pasto) que apresentou 3,39% da densidade relativa. Gorenstein et al. (2010), em fragmento florestal de 40 hectares em estágio médio de regeneração adjacente à área de estudo, encontraram uma densidade de 575,80 árvores.ha -1, entre 24 espécies. Já Valério et. al. (2008) em um fragmento de Floresta Ombrófila Mista Montana com uma área de 240 hectares, no município de Clevelândia (segundo o IBGE localizado na região centro-sul do Paraná), encontraram uma densidade de 290 árvores.ha -1, entre 26 espécies amostradas. No presente levantamento, ocorreu um número de 24 espécies, porém com uma densidade muito maior (31.064,81 plântulas.ha -1 ). Deste modo, espera-se que no futuro, ocorra um raleamento na densidade de plantas e um provável aumento na riqueza de espécies. Hovenia dulcis Thunb. (uva-do-japão) não está entre as cinco populações mais densas, porém, apresentou uma densidade (509,26) alta, considerando que trata-se de espécie exótica com alta capacidade invasora que se dissemina rapidamente, através de pássaros e morcegos. Sua presença em sucessão pioneira de apenas oito meses de idade, é extremamente negativa, pois indica que ela posteriormente tomará o hábitat de plantas nativas, dificultando o processo de regeneração natural. Conclusão Verificou-se através do levantamento fitossociológico que a formação florestal da área encontra-se em estágio inicial de sucessão de vegetação secundária, tal como definido pela resolução CONAMA nº 2 de 18 de março de 1994, caracterizada pela presença de uma fisionomia herbáceo/arbustiva, formando um estrato aberto sem dossel, com a presença de espécies predominantemente heliófitas, lianas herbáceas abundantes e árvores nativas de vida média curta que formarão o futuro dossel. 17 e 18 de Outubro de 2011 198
Agradecimentos Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq Brasil pelo apoio financeiro. À COPEL pelo apoio logístico, coordenado no campo pelo Técnico Florestal Claudemir Dantas da Silva. Aos alunos da Engenharia Florestal UTFPR, Ana Suelem Sgarbi, Ciro Duarte de Paula Costa e Aline Paula Pastorio, pelo auxílio na coleta de dados. Referências GORENSTEIN, M. R.; BECHARA, F. C.; ESTEVAN, D. A.; SGARBI, A. S.; GALLO, I. C.; Estrutura e diversidade da comunidade arbórea na trilha ecológica da UTFPR, Câmpus Dois Vizinhos através do método de quadrantes. In: SEMINÁRIO: SISTEMAS DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA CIÊNCIAS AGRÁRIAS, ANIMAIS E FLORESTAIS UTFPR CÂMPUS DOIS VIZINHOS, 4., 2010, Dois Vizinhos. Anais... Dois Vizinhos: Editora UTFPR, 2010. p. 1-4. IPARDES - INSTITUTO PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL. Intensidade do uso da terra por atividade agrossilvopastoril nas mesoregiões do Paraná. 2002. Disponível em: < http://www.ipardes.gov.br/pdf/indices/uso_da_terra.pdf>. Acesso em: 17 ago. 2011. IPARDES - INSTITUTO PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL. Indicador de representatividade das UC s por remanescentes vegetais nas mesoregiões do Paraná. 2003. Disponível em: <http://www.ipardes.gov.br/pdf/indices/unidades_de_conservacao.pdf>. Acesso em: 17 ago. 2011. ITCG - INSTITUTO DE TERRAS, CARTOGRAFIA E GEOCIÊNCIAS. Cartas geomorfológicas. 2006. Disponível em: <http://www.itcg.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=55>. Acesso em: 17 ago. 2011. ITCG - INSTITUTO DE TERRAS, CARTOGRAFIA E GEOCIÊNCIAS. Produtos cartográficos. 2008. Disponível em: <http://www.itcg.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=47>. Acesso em: 17 ago. 2011. VALÉRIO, A. F; WATZLAWICK, L. F.; BALBINOT, R.; Análise florística e estrutural do componente arbóreo de um fragmento de floresta ombrófila mista em Clevelândia, sudoeste do Paraná. Revista Acadêmica Ciência Agrárias e Ambientais, Curitiba, PR, v. 6, n. 2, p. 239-248, abr./jun. 2008. 17 e 18 de Outubro de 2011 199
Tabela 1. Levantamento fitossociológico em área de vegetação pioneira, UTFPR, Dois Vizinhos-PR. Onde: NI Número de indivíduos; DA Densidade absoluta (ind.ha -1 ); DR Densidade relativa (%); NPC Número de parcelas em que a espécie ocorreu; FA Freqüência absoluta (%); e FR Freqüência relativa (%). Espécie Família NI DA DR NPC FA FR Vernonia polyanthes Less. Asteraceae 1.041 9.638,89 31,03 72 100,00 17,22 Mortas Indeterminada 907 8.398,15 27,03 66 91,67 15,79 Sida rhombifolia L. Malvaceae 692 6.407,41 20,63 44 61,11 10,53 Mikania cordifolia (L.f.) Willd Asteraceae 220 2.037,04 6,56 30 41,67 7,18 Chromolaena maximilianii Asteraceae 114 1.055,56 3,40 31 43,06 7,42 (Schrader) R.M. King & H.Rob. Baccharis trinervis Pers. Asteraceae 83 768,52 2,47 31 43,06 7,42 Hovenia dulcis Thunb. Rhamnaceae 55 509,26 1,64 8 11,11 1,91 Euphorbia heterophylla L. Euphorbiaceae 49 453,70 1,46 17 23,61 4,07 Senecio brasiliensis (Spreng.) Asteraceae 38 351,85 1,13 28 38,89 6,70 Less. Indeterminada sp.1 Asteraceae 29 268,52 0,86 13 18,06 3,11 Symphyotrichum squamatum Asteraceae 27 250,00 0,80 12 16,67 2,87 (Spreng.) G.L. Nesom Indeterminada sp.1 Indeterminada 18 166,67 0,54 11 15,28 2,63 Bidens subalternans DC. Asteraceae 11 101,85 0,33 6 8,33 1,44 Solanum cf. bullatum Vell. Solanaceae 11 101,85 0,33 10 13,89 2,39 Indeterminada sp.1 Solanaceae 10 92,59 0.30 3 4,17 0,72 Solanum americanum Mill. Solanaceae 9 83,33 0.27 9 12,50 2,15 Raphanus raphanistrum L. Brassicaceae 8 74,07 0,24 5 6,94 1,20 Sonchus asper (L.) Hill Asteraceae 7 64,81 0,21 3 4,17 0,72 Melampodium divaricatum Asteraceae 4 37,04 0,12 4 5,56 0,96 (Rich.) DC. Schinus terebinthifolius Raddi. Anacardiaceae 3 27,78 0,09 3 4,17 0,72 Indeterminada sp.2 Asteraceae 3 27,78 0,09 1 1,39 0,24 Solanum aculeatissimum Jacq. Solanaceae 3 27,78 0,09 1 1,39 0,24 Asclepias curassavica L. Apocynaceae 2 18,52 0,06 2 2,78 0,48 Baccharis dracunculifolia DC. Asteraceae 2 18,52 0,06 1 1,39 0,24 Indeterminada sp.1 Fabaceae 2 18,52 0,06 1 1,39 0,24 Leonotis nepetifolia (L.) R. Br. Lamiaceae 2 18,52 0,06 1 1,39 0,24 Vernonia platensis (Spreng.) Asteraceae 1 9,26 0,03 1 1,39 0,24 Less. Sonchus oleraceus L. Asteraceae 1 9,26 0,03 1 1,39 0,24 Desmodium barbatum (L.) Benth. Fabaceae 1 9,26 0,03 1 1,39 0,24 Indeterminada sp.1 Lamiaceae 1 9,26 0,03 1 1,39 0,24 Solanum viarum Dunal Solanaceae 1 9,26 0,03 1 1,39 0,24 TOTAL 3.355 31.064,81 100-580,56 100 17 e 18 de Outubro de 2011 200