Alexa B. Leirner A arte é uma mentira que nos ajuda a perceber a verdade. (Pablo Picasso) 1
Objetivos Conhecer os principais fundamentos que demonstram os benefícios da utilização de imagens de arte e metáforas como um método terapêutico. Tópicos 1) O que é a utilização de imagens de arte como um método terapêutico Atividade imaginativa que utiliza técnicas expressivas Espelho natural para o processo de individuação Entrada para os sentimentos mais profundos Expressão de material inconsciente de maneira observável Linguagem simbólica de comunicação Expressão criativa no contexto de um relacionamento seguro Encontros regulares no mesmo lugar Utilizado com crianças, adultos, casais, famílias e grupos 2) Por que usar imagens? O preço de uma vida emocional mal administrada é evidente quando a pessoa considera a extensão da miséria, a ansiedade e o desespero no mundo, as dificuldades contínuas, o sofrimento e abuso em muitas relações, a ocorrência de enfermidades psicossomáticas e doenças relacionadas ao stress. Também quando as pessoas parecem estar comunicando o seu sofrimento, ódio ou raiva, mas de modo destrutivo para si ou para outros, variando entre suicídio, comportamento delinqüente, atos criminais, assassinato ou guerra, até as comunicações destrutivas mais cotidianas que especificamente são planejadas para ferir outros, como emburrar, fazer críticas negativas ou argumentos insignificantes. mais repertório Individuação A individuação é o conceito central da psicologia junguiana (analítica). Entende-se por individuação um processo de tornar-se a si mesmo, que leva a pessoa à realização máxima de seus potenciais inatos. Psicossomática A rigor é uma concepção de Medicina, onde sempre em qualquer doença são levantados todos os aspectos do homem-doente, ou seja, os fatores orgânicos, os fatores psicológicos e o seu mundo social. Toda doença é psicossomática, pois quem adoece não é um órgão, mas sim o indivíduo em seu mundo particular. Porém, genericamente, entende-se doença psicossomática aquela que é agravada ou desencadeada por fatores emocionais e que apresenta alguma alteração orgânica constatada em exames (diferente da somatização onde há a queixa, mas não há correspondência orgânica). 2
Em resumo, quando as pessoas não têm nenhum lugar onde possam expressar, explorar ou aprender sobre os seus sentimentos, elas decidem freqüentemente permanecer caladas, guardar ou engolir os seus sentimentos. Isto leva a um estado constante de desconforto que em alguns casos, é notadamente prejudicial psicológica e fisicamente. Como alternativa, elas atuam (acting out) os seus sentimentos de forma que possam ser altamente destrutivos a si mesmos, aos outros ou até mesmo a populações inteiras. Muitas pessoas freqüentemente estão tão impossibilitadas como despreparadas para ver ou pensar em outras opções mais criativas para lidar com os seus sentimentos. Quanto sofrimento e miséria, violência e abuso, confusão e desespero ainda precisa haver, para que seja percebido que as pessoas precisam de ajuda para administrar a sua vida emocional? As imagens podem ser usadas para: mais repertório Atuam (acting out) Noção criada pelos psicanalistas para traduzir o que Sigmund Freud denomina colocação em prática ou em ato. Nesta perspectiva o termo indica uma operação através da qual o inconsciente age diretamente sem ter, por assim dizer, atravessado o juízo consciente. 1. Explorar, expressar e comunicar os sentimentos 2. Clarificar, identificar e organizar os sentimentos 3. Conter ou liberar a energia emocional 4. Achar novos modos de pensar sobre os sentimentos 5. Ensaiar novos modos de lidar com os sentimentos 3) O valor terapêutico das imagens de arte e metáforas Sinestesia Relação subjetiva que se estabelece espontaneamente entre uma percepção e outra que pertence ao domínio de um sentido diferente (por exemplo, um perfume que invoca uma cor ou um som que invoca uma imagem). 1. Arte é uma mentira que pode nos ajudar a perceber a verdade. - PABLO PICASSO As imagens ou metáforas proporcionam uma verdade mais sucinta e profunda eliminando o que é superficial ou irrelevante. 2. Memórias de experiências emocionais intensas são guardadas em parte como imagens mentais (sinestésicas, auditivas, visuais). 3. As imagens ou metáforas podem expressar os aspectos multisensoriais e os vários níveis de uma experiência. 4. As imagens podem capturar as qualidades energéticas, as intensidades, a atmosfera e os fluxos de uma determinada experiência emocional. 5. As imagens ou metáforas podem capturar um quadro mais completo da percepção da realidade. 3
6. As imagens podem dar forma e expressar a experiência pré-verbal. 7. A linguagem do inconsciente é uma linguagem metafórica. 8. As imagens podem oferecer um espelho para o self (si mesmo) do paciente, aspectos do mundo interno que normalmente não são ditos, vividos, ou aspectos abandonados ou negados. 9. As imagens pedem um novo insight, algo que previamente estava fora da consciência. 10. As imagens ou metáforas podem proporcionar um alívio catártico, através de uma descarga emocional, oferecendo uma ação criativa no lugar de uma ação destrutiva. 11. As imagens ou metáforas podem clarificar algo já conhecido ou aumentar a conscientização de algo presente de forma vaga na consciência. 12. O alivio de exteriorizar algo que interiormente estava sendo vivenciado como uma pressão interna. Criando assim uma ordem externa fora do caos interno. Quando as palavras simplesmente não são suficientemente sólidas. 13. As imagens ou metáforas permitem à pessoa se distanciar de emoções perturbadoras e que a tomam completamente, de modo que estas possam ser pensadas mais calmamente. 14. As imagens de arte podem proporcionar um container (recipiente) para sentimentos que são vivenciados como perigosos, intratáveis ou esmagadores. 15. As imagens ou metáforas facilitam uma pessoa que está presa à padrões fixos de pensamento ou defesas racionais, a mudar para uma experiência mais comprometida emocionalmente. 16. As imagens de arte ou metáforas oferecem proteção às pessoas que de outra forma poderiam sentir-se expostas ou envergonhadas para conversar somente através da verbalização. Si-mesmo (Self) A psicologia analítica compreende o simesmo como o arquétipo central da unidade e totalidade de toda a personalidade. O si-mesmo engloba consciente e inconsciente. O simesmo é o arquétipo da ordem e, ao mesmo tempo, tem efeito ordenador sobre a psique. Catarse mais repertório Catarse é o método que visa a eliminar perturbações psíquicas, excitações nervosas, tensões, angústia, através da provocação de uma explosão emocional ou de outras formas, e baseando-se na rememorização da cena e de fatos passados que estejam ligados àquelas perturbações. 17. As imagens ou metáforas freqüentemente geram sentimentos de alivio e satisfação ao ter comunicado com precisão algo muito importante a um outro, desde que ele seja empático e significante. 4
4) Quem se beneficia da utilização terapêutica das imagens de arte mais repertório 1. Aqueles que sofrem de distúrbios ou feridas psíquicas pré-verbais, que se formam já antes do nascimento ou na primeira infância devido a um distúrbio da relação primária com a mãe ou figuras maternas, que o impossibilita de crescer com saudável confiança no mundo e no seu próprio processo de vida. O processo terapêutico com as imagens pode levar às camadas vivenciais profundas da primeira infância, não acessíveis ao consciente e a verbalização. 2. Aqueles que, sentindo ser necessária a expansão da consciência, entram conscientemente no processo. 3. Aqueles que estão em momentos difíceis de transição e necessitam uma reorganização criativa da vida pessoal. 4. Indicado no tratamento de perturbações psicossomáticas. Nem todas as pessoas com estas características se beneficiam. Também são úteis certas características como: - Disposição para o inconsciente criativo - Interesse na transformação Persona Originalmente designa, no teatro grego, a máscara usada pelos atores. De acordo com Carl Gustav Jung a persona é o sistema de adaptação ou a forma que se dá a comunicação com o mundo. A persona não seria o que somos verdadeiramente, mas sim o que nós mesmos e os outros pensam que somos. Segundo Jung o perigo estaria na identificação com a persona. - Coragem para suportar o sofrimento e desconforto exigido para ir além da persona ou máscara social - Disposição a riscos psicológicos para expandir a consciência - Interesse em fatos da vida como morte, abuso, traumas, que são inexpressáveis verbalmente - Capacidade de pensar metaforicamente 5
Texto Complementar saiba mais O inconsciente possui o dom de dar forma às imagens - imagens abstratas e personagens O inconsciente personifica (Jung). Nos sonhos, pessoas conhecidas e desconhecidas representam verdadeiros dramas, que se desvanecem ao despertar. Mas, nos estados patológicos, nos quais o consciente está invadido e submerso pelo inconsciente, entidades estranhas apoderam-se em permanência de todo campo psíquico. O consciente, debilitado e fracionado, não consegue enfrentá-las. Se o doente tem a possibilidade de pintar ou de fazer modelagem, veremos que ele tenta se defender arrancando-as de si mesmo. Dando a tais entidades autônomas, uma forma objetiva, elas parecerão menos perigosas e decrescerá seu poder encantatório sobre aquele que delas se apoderou. Se fosse possível ao esquizofrênico concretizar tais conteúdos arquetípicos e (ajudado pelo psicoterapeuta) entrar em contato com essas imagens a ponto de integrá-las, estaria então no caminho mais seguro da cura, na opinião de Jung. Infelizmente, tais imagens se apresentam múltiplas e a energia que delas emana é terrivelmente poderosa e desintegradora. A pintura dará ainda, as próprias forças curativas instintivas, a oportunidade de adquirirem forma (expressão) e, desta maneira, tornarem-se eficazes pelo efeito de retorno (impressão) que podem exercer sobre aqueles que as pintou. Tais forças se concretizam por imagens circulares cujos elementos se dispõem ao redor de um centro. São as mandalas. Jung descobriu-lhes o simbolismo e as funções na vida psíquica. Como regra geral, disse Jung, a mandala aparece nos estados de dissociação ou de desorientação, por exemplo... nos esquizofrênicos cuja imagem do mundo foi perturbada pela invasão de conteúdos incompreensíveis provenientes do inconsciente. Vê-se claramente, em tais casos, como a forma exata e ordenada desta imagem circular compensa a desordem e a confusão do estado psíquico, pelo fato de estabelecer um ponto central relativamente ao qual tudo se inter-relaciona, ou ainda uma ordem concêntrica da pluralidade desordenada e contraditória de elementos múltiplos. Trata-se evidentemente de uma tentativa de autocura (Selbstheilingsversuch) da própria natureza que não tem sua origem na reflexão consciente, mas num impulso instintivo. Em nosso trabalho no Centro Psiquiátrico Nacional do Rio de janeiro, vimos surgir, com impressionante constância, essas imagens circulares da pintura espontânea dos esquizofrênicos. O objetivo das forças curativas instintivas que se expressam por este símbolo é sempre o de reunir o que está fragmentado e unir o que está separado. SILVEIRA, Nise & LE GALLAIS, Pierre. Experiência de Arte Espontânea com Esquizofrênicos num Serviço de Terapia Ocupacional. Quatérnio Revista do Grupo de Estudos C.G.Jung. Rio de Janeiro, 1066, n VII,p.40-41. 6
mais repertório Carl Gustav Jung (1875-1961) psiquiatra suíço, fundador da psicologia analítica Saiba mais: http://www.friesian.com/jung.htm Arquétipos: Entende-se por arquétipos elementos nucleares dinâmicos na psique humana que, de um lado, são estruturalmente inatos e, de outro, parecem ter sido adquiridos por meio da experiência de vida. Eles são, entre outras coisas, os geradores de imagens simbólicas similares ou parecidas no espírito de diversos povos e culturas. Mandala: Na obra de C.G.Jung, símbolo do centro, da meta, e do si-mesmo, enquanto totalidade psíquica; auto-representação de um processo psíquico de centralização da personalidade, produção de um centro novo desta última.a mandala exprime-se,simbolicamente, por um círculo, um quadrado ou um quatérnio, num dispositivo simétrico do número quatro e de seus múltiplos. (Jung 1963-356) www.global-vision.org/ indexfr.html Nise da Silveira: Nasceu em Maceió (Alagoas). Curso médico na Faculdade de Medicina da Bahia. Dirigiu a seção de terapêutica ocupacional (1946-1974) no Centro Psiquiátrico Pedro II. Fundou em 1952 o Museu de Imagens do Inconsciente, centro de estudo e pesquisa. Em 1956 fundou a Casa das Palmeiras, clínica destinada ao tratamento em regime de externato, de egressos de instituições psiquiátricas, onde atividades expressivas são realizadas livremente. Formou o Grupo de Estudos C.G.Jung. Publicou Imagens do Inconsciente, Jung Vida e Obra, O Mundo das Imagens, entre outros. 7
conecte-se saiba mais Saiba mais: http:// www.museuimagensdoinconsciente.org.br/ nise/biograf.htm Visite estes sites: http://www.museuimage nsdoinconsciente.org.br http://www.scielo.br/scielo. php?pid=s010340142003 000300012&script=sci arttext&tlng=pt 8
Anotações: bibliografia ADAMSON, Edward. Art as Healing. London, Conventure Ltda, 1990 (1 edicao 1984) FURTH,Greeg M. O Mundo dos desenhos- uma abordagem junguiana da cura pela arte. São Paulo: Paulus, 2004. HARK, H. Léxico dos Conceitos Junguianos Fundamentais a partir dos Originais de C.G.Jung. São Paulo, Loyola, sd JUNG,C.Gustav. Memórias Sonhos Reflexões.Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira,1963. SILVEIRA, Nise. Imagens do Inconsciente. Rio de Janeiro, Alhambra,1981 O mundo das Imagens. São Paulo, Editora Atica, 1992 Jung:vida e obra. 16 ed. Rio de janeiro, Paz e Terra,1999. SILVEIRA, Nise & LE GALLAIS, Pierre. Experiência de Arte Espontânea com Esquizofrênicos num Serviço de Terapia Ocupacional. Quatérnio Revista do Grupo de Estudos C.G.Jung. Rio de Janeiro, 1066, n VII,p.40-41. 9