LABORATÓRIO DE PESQUISA E VIVÊNCIA SOBRE CORPO

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Transcrição:

1 LABORATÓRIO DE PESQUISA E VIVÊNCIA SOBRE CORPO Maria Luiza Mello de Carvalho Marcus Vinícius Machado de Almeida RESUMO A graduação dos cursos voltados para a saúde e educação pode oferecer condições para que os alunos aprendam a partir da integração entre suas funções intelectuais e suas vivências corporais e emocionais. Com o objetivo de estimular a reflexão científica sobre a compreensão integral do ser humano e a formação vivencial dos alunos, desenvolve-se o Laboratório de Pesquisa e Vivência sobre Corpo do Curso de Graduação em Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da UFRJ. Este Laboratório reúne as ações de ensino, pesquisa e divulgação científica em torno da reflexão teórica e vivencial sobre a unidade psicocorporal humana, na perspectiva da filosofia, da psicologia corporal, das práticas corporais, da saúde e da educação. Suas ações visam contribuir para que os alunos estejam mais aptos para a produção de habilidades e sensibilidades cuidadoras integrando mente e corpo, aspectos objetivos e subjetivos, o singular e o coletivo, o sujeito e o mundo. São ministradas disciplinas teórico-vivenciais e realizados projetos de extensão em saúde do trabalhador, pesquisa e seminários abertos. Palavras-chave: Educação. Corpo. Oficinas vivenciais. Integralidade. Formação...-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-.. Apesar dos cursos de graduação em saúde evidenciarem uma intencionalidade de trabalhar com o conceito de humanização, proposto pelo Ministério da Saúde, não costumam apresentar oportunidades para o exercício de práticas cuidadoras com base na intersubjetividade e na percepção integral do ser humano. Têm se caracterizado pela priorização da formação teórica, expressando a predominância do pensamento cartesiano que dissocia corpo de mente e razão de emoção. Em geral, suas disciplinas privilegiam as atividades intelectuais com quase nenhuma oferta de oportunidades para que alunos desenvolvam sensibilidades para as vivências emocionais próprias e das outras pessoas. Mantém-se assim, a compreensão de um ser humano fragmentado que provavelmente se perpetuará nas práticas destes futuros profissionais, sem atenção à intensidade vivencial presente no sofrimento da clientela (CARVALHO, 2010).

2 A valorização da dimensão subjetiva, o acolhimento, a escuta qualificada das demandas dos usuários e o protagonismo do profissional e da clientela fazem parte da Política de Humanização da Assistência (BRASIL, 2006). Vínculo, intersubjetividade e compreensão integral do ser humano necessitam entrar para a atenção dos profissionais de saúde (AYRES, 2001, 2003). A humanização implica na criação de abordagens que respeitem a relação humana no cuidado em saúde, as chamadas tecnologias leves (MERHY, 2003). Portanto, é necessário que os cursos de graduação em saúde preparem os alunos de maneira a integrar sua subjetividade com sua criatividade e desenvolver competências comunicativa para relacionar-se com o outro (CIUFFO, RIBEIRO, 2008). No entanto, o que observamos é que os currículos carecem de oportunidades que facilitem a compreensão do ser humano de maneira integral. Podemos comparar esta situação com o desafio de ensinar a nadar com bota de alpinista, ou como aprender a nadar no seco. Entendemos portanto, que a formação precisa facilitar o acesso à subjetividade de cada aluno no contato consigo mesmo, com suas emoções e com o próprio corpo, oferecendo condições para que os alunos aprendam a partir da integração entre suas funções intelectuais e suas vivências corpóreas e emocionais. Desta maneira, poderão desenvolver sensibilidades e habilidades para compreensão e atenção às demandas da clientela, sem cisão entre corpo e mente (CARVALHO, 2010). Mesmo estudantes e profissionais interessados em relações cuidadoras estão imersos nas normas sociais e educacionais que regem seus corpos, além do alcance da sua consciência imediata (JAGGAR, BORDO, 1997; REICH, 1981). Podem ver seus esforços de sensibilidade e empatia pela clientela serem solapados nas suas práticas profissionais, já que o exercício do amor pode estar aprisionado em um encouraçamento corporal e emocional que se expressa na vida individual e se propaga nas relações, como discute Reich (1981). Os impulsos para buscar a conexão com o outro no ato de cuidar, encontram esse encouraçamento e não conseguem se expressar livremente,

3 de forma a reproduzir nas práticas, a fragmentação corpo-mente tradicional na ciência. Para a implantação das propostas de humanização do SUS, há necessidade de implantação de laboratórios para criação de propostas para o desenvolvimento de habilidades com dimensão cuidadora e de compreensão do sujeito como um todo (CECCIM, FEUERWERKER, 2004). Trata-se de estimular a ética do cuidado, suporte real da criatividade, da liberdade e da inteligência (BOFF, 1999). Para a construção desta perspectiva, encontramos novas formas de saber que integram todas as funções do ser humano. Destaca-se neste âmbito, a denominada ciência feminista com um paradigma científico holístico e ecológico, que contesta a hierarquização da mente sobre o corpo, do sujeito sobre o objeto e da subjetividade sobre a objetividade. A ciência feminista cria um pensamento científico não binário, relacional e dialético (CAPRA, 1982; GIFFIN, 1999). O principal método de trabalho do feminismo foram os grupos de reflexão focados nas vidas das participantes e principalmente nas suas próprias vivências corporais (GIFFIN, 1999, p. 81). Destes grupos surgiu a formulação de que o pessoal é político e o questionamento da suposta neutralidade científica. A ciência feminista, portanto, propõe a valorização da subjetividade no processo de transformação social (GIFFIN, 1999). Também neste sentido surgem os estudos sobre corporeidade entendendo o corpo formado pela história, cultura e experiências vividas. Considera-se que o corpo tem a função de estabelecer relações com o mundo. É o lugar de maior força criativa e exatamente por isso é alvo da dominação. Mas é no corpo que surgem as novas tecnologias singulares que criam novas formas de lidar consigo mesmo e com o mundo (ALMEIDA, 2004, 2011). Outra contribuição científica importante está na Psicologia Corporal com base na obra de Wilhelm Reich e de autores pós e neorreichianos, que entendem corpo e mente numa unidade funcional. Esta abordagem possibilita a construção de intervenções terapêuticas que lidam com a pessoa como um todo. Possibilita também a criação de técnicas educacionais que facilitam a consciência da unidade psicocorporal de cada um, na formação dos estudantes

4 de diversas áreas da saúde (CARVALHO, 2010). É importante lembrar que Reich indica que o trabalho de desencouraçamento corporal e psicológico é fundamental para a formação de educadores de forma a possibilitar a criação de crianças mais saudáveis (ALBERTINI, 2004). Podemos dizer o mesmo com relação à formação de profissionais cuidadores com relação à saúde e felicidade de sua clientela. Há pouca literatura científica sobre práticas educacionais que considerem a vivência integral corporal e subjetiva dos alunos na sua formação. Podemos citar o estudo que vem sendo desenvolvido sobre o processo de ensino-aprendizagem sob a ótica da Psicologia Corporal nas disciplinas teórico-vivenciais ministradas em cursos de graduação de Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da UFRJ e de Psicologia nas Faculdades Integradas Maria Thereza. Em disciplinas que tratam da obra de Wilhelm Reich e de autores pós e neorreichianos, são oferecidas oficinas vivenciais sobre o conteúdo teórico estudado, com oportunidade para o exercício da consciência corporal dos alunos que têm relatado que se beneficiam do aumento de seu autoconhecimento e da sua consciência corporal. Em geral, descrevem o relaxamento das suas tensões psicocorporais, com conseqüente bem estar em sala de aula e na sua vida pessoal. Esta prática pedagógica também tem facilitado o relacionamento dentro da sala de aula, diminuindo a distância afetiva entre os alunos e entre estes e a professora, indicando uma maior abertura para a compreensão da vivência emocional dos outros. Alguns alunos têm introduzido breves trabalhos psicocorporais na sua prática e algumas monografias têm sido orientadas sob a ótica psicocorporal. Muitos alunos têm se queixado da ausência de conteúdo com esta abordagem ao longo do curso de graduação (CARVALHO, 2010). Embora a Psicologia Corporal tenha se desenvolvido bastante em consultórios particulares e em cursos de formação de pós-graduação lato sensu, muito recentemente começa a ser discutida nos cursos de pósgraduação strictu sensu e ainda encontra bastante resistência de inserção nos currículos nos cursos de graduação (MATHIESEN, 2007). Como parte da resistência epistemológica presente na hegemonia do pensamento racionalista,

5 muitas são as dificuldades encontradas para realização de oficinas no espaço acadêmico, tanto com relação às condições materiais (espaço físico, aparelhagem de som) quanto à cultura acadêmica que estranha a prática vivencial nas disciplinas. Apesar dos desafios, há viabilidade de realização de práticas vivenciais psicocorporais no espaço acadêmico, com a criação de campo de aprendizagem criativo e afetivo (CARVALHO, 2010). Encontramos nos cursos de Terapia Ocupacional, a possibilidade de aliança entre a formação intelectual e vivencial e a compreensão do corpo singular, vivencial, relacional, histórico e não fragmentado (ALMEIDA, 2004, 2011). Nestes cursos, há práticas vivenciais que consideram a vivência emocional e corporal dos estudantes para sua capacitação para a qualidade do contato com a clientela (LIBERMAN, 2008, 2010). Estas práticas educacionais que incluem as vivências nos lembram a perspectiva feminista que considera que o pessoal é político e que a consciência de si mesmo, de suas sensações corpóreas e emoções são necessárias à formação de profissionais de saúde cuidadores. Trabalham com a possibilidade de estimular a consciência de si e compreensão do ser humano como uma totalidade. No entanto, ainda é raro este tipo de prática educacional nos cursos de graduação em saúde. Constituem grande desafio, pois dependem da possibilidade de professores e alunos se libertarem das amarras de uma visão científica reducionista e de ideológicas para a possibilidade de trabalho com o corpo expressivo e sensível. Em função do ineditismo de tais práticas, há demanda de pesquisa sobre esse tipo de metodologia educacional vivencial. Há necessidade de avaliação destas práticas educacionais no sentido da capacitação dos alunos para lidarem com sua totalidade psicocorporal e do cuidado com a subjetividade e com o corpo vivencial da clientela. Urge que haja aprofundamento e formulação de conceitos que dêem suporte para esta perspectiva na educação profissional. Com o objetivo de incentivar a pesquisa sobre estas metodologias educacionais vivenciais, foi recentemente criado o Laboratório de Pesquisa e Vivência sobre Corpo do curso de Terapia Ocupacional da Faculdade de

6 Medicina da UFRJ. O objetivo deste Laboratório é criar estratégias educacionais através de práticas corporais e o aprofundamento dos estudos sobre a compreensão da unidade psicocorporal e do conceito de corporeidade. Objetiva o levantamento e análise de técnicas educacionais vivenciais que facilitem a formação de profissionais de saúde sensíveis à integralidade dos sujeitos. Este Laboratório é constituído por professores que têm em suas práticas didáticas, a realização de oficinas vivenciais na formação de alunos de graduação de Terapia Ocupacional, de Dança, de Psicologia, de Fisioterapia, de Enfermagem e de outras categorias profissionais. A característica interinstitucional do Laboratório permite reunir profissionais, com práticas em diferentes cursos de graduação e de diferentes instituições de ensino superior, com interesse na pesquisa de conceitos e práticas com a perspectiva de facilitar a consciência psicocorporal dos alunos. No sentido de fomentar o intercâmbio científico desta discussão e divulgar seus estudos, o Laboratório realizou em agosto de 2011, o I Seminário de Pesquisa e Vivência sobre Corpo na UFRJ, com participação de profissionais estudantes de diferentes instituições de ensino públicas e privadas. O Laboratório inicia pesquisa sobre o processo de ensino-aprendizagem em disciplinas de cursos de graduação na área de saúde com oficinas vivenciais, a partir do estudo da vivência dos alunos e da experiência didática dos professores. Discute concepções filosóficas e científicas que compreendem o ser humano em sua totalidade física e psicológica e se interessa em conhecer as práticas educacionais realizadas em instituições de nível superior na área de saúde, que facilitam a consciência da vivência da unidade psicocorporal de alunos dos cursos de graduação em saúde. Este Laboratório pretende analisar a potencial contribuição da realização de oficinas vivenciais para a formação profissional na área de saúde, e produzir publicações e material didático sobre a compreensão psicocorporal e de corporeidade, e sobre a realização de oficinas vivenciais em cursos de graduação em saúde.

7 O Laboratório tem a intenção de contribuir para a reflexão científica sobre a realização de oficinas vivenciais, promovendo intercâmbio entre educadores voltados para o trabalho com a consciência vivencial dos alunos, em diferentes cursos de graduação em saúde. Serão formuladas parcerias com professores e pesquisadores voltados para o tema no país e internacionalmente. O Laboratório de Pesquisa e Vivência sobre Corpo do Curso de Graduação em Terapia Ocupacional da UFRJ tem como meta contribuir para a formação de pesquisadores e profissionais interessados na compreensão integral do ser humano. REFERÊNCIAS..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-.. ALBERTINI, Paulo. Reich: História das Idéias e Formulações para a Educação. São Paulo: Agora, 1994. ALMEIDA, M. V. M. Corpo e arte em Terapia Ocupacional. 1. ed. Rio de Janeiro: Enelivros, 2004.. A Selvagem dança do Corpo. Curitiba: CRV, 2011 AYRES, José Ricardo Carvalho de Mesquita. Cuidado e reconstrução das práticas de saúde. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, v.8, n.14, p. 73-92, 2003.. Sujeito, intersubjetividade e práticas de saúde. Ciência e Saúde Coletiva, v. 6, n. 1, p. 63-72, 2001. BRASIL, MINISTÉRIO DA SAÚDE Secretaria de Atenção à Saúde. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. Documento Base para Gestores e Trabalhadores do SUS. Brasília, 2006. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/. Em 07 julho 2010. CARVALHO, Maria Luiza Mello de. Aprendizagem teórico-vivencial da Psicologia Corporal em curso de graduação em Psicologia In: Encontro Paranaense, Congresso Brasileiro, Convenção Brasil/Latino-América, XV, XX, 2010. Anais. Curitiba: Centro Reichiano, 2010. CD-ROM. Disponível em: http://www.centroreichiano.com.br. CECCIM, Ricardo Burg; FEUERWERKER, Laura C. Macruz. Mudança na graduação das profissões de saúde sob o eixo da integralidade. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20, n. 5, Oct. 2004. Disponível em: http://www.scielosp.org, em 03 agosto 2011.

8 CIUFFO, Roberta Signorelli; RIBEIRO, Victoria Maria Brant. Sistema Único de Saúde e a formação dos médicos: um diálogo possível? Interface, Botucatu, 2008, vol.12, n.24, pp. 125-140. GIFFIN, Karen. Corpo e Conhecimento na Saúde Sexual: uma visão sociológica. In: GIFFIN, Karen; COSTA, Sarah Hawker (Orgs). Questões de Saúde Reprodutiva. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1998. p. 79-91. JAGGAR, A., BORDO, S. (orgs). Gênero/Corpo/Conhecimento. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1997 LIBERMAN, F. Delicadas Coreografias: Instantâneos de uma Terapia Ocupacional. 1. ed. São Paulo: Summus Editorial, 2008 LIBERMAN, Flávia. O corpo como pulso. Comunicação Saúde Educação. v.14, n.33, p.449-60, abr./jun. 2010. MATHIESEN, Sara Quenzer. 50 anos de morte de Wilhem Reich. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Jul-Set 2007, Vol. 23 n. 3, pp. 361-362. MERHY, E.E. & FRANCO, T.B., Por uma Composição Técnica do Trabalho Centrada nas Tecnologias Leves e no Campo Relacional. Saúde em Debate, Ano XXVII, v.27, N. 65, Rio de Janeiro, Set/Dez 2003. REICH, Wilhelm. A função do orgasmo: problemas econômico-sexuais da energia biológica. São Paulo: Brasiliense, 1981. AUTORES..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-..-.. Maria Luiza Mello de Carvalho CRP-05/4335 - Psicóloga, Psicoterapeuta corporal (Biossíntese), Doutora e Mestre em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social, Professora e Coordenadora do Laboratório de Pesquisa e Vivência sobre Corpo da UFRJ, do Curso de Graduação em Terapia Ocupacional da UFRJ. E-mail: luiza.carvalho@globo.com Marcus Vinicíus Machado de Almeida CREFITO-2-3532TO Terapeuta Ocupacional e Licenciado em Dança. Professor dos Cursos de Dança e de Terapia Ocupacional da UFRJ. Doutor em Pedagogia do Movimento (Unicamp). Coordenador do Lab. de Pesquisa e Vivência sobre Corpo do Curso de Graduação em Terapia Ocupacional da UFRJ. E-mail: marcusvmachado@globo.com