Alterações Pulmonares nas Doenças Linfoproliferativas

Documentos relacionados
Estudo das lesões fundamentais observadas à TCAR através de casos clínicos

- TC Tórax - - Terminologia descritiva - - Lesões elementares / padrões fundamentais - Dr. Mauro Edelstein R3 Gustavo Jardim Dalle Grave

Padrão intersticial. Gustavo de Souza Portes Meirelles 1. 1 Doutor em Radiologia pela Escola Paulista de Medicina UNIFESP.

Pneumonia intersticial. Ana Paula Sartori

9 de Novembro de Professor Ewerton. TC de alta resolução dos pulmões

Pneumonias - Seminário. Caso 1

Padrão acinar Gustavo de Souza Portes Meirelles 1. 1 Doutor em Radiologia pela Escola Paulista de Medicina UNIFESP. 1 Terminologia

TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE ALTA RESOLUÇÃO NAS COMPLICAÇÕES PULMONARES PÓS-TRANSPLANTE DE MEDULA ÓSSEA: ENSAIO ICONOGRÁFICO*

Dr. Domenico Capone Prof. Associado de Pneumologia da Faculdade de Ciências Médicas do Estado do Rio de Janeiro-UERJ Médico Radiologista do Serviço

OUTRAS INFECÇÕES FÚNGICAS DO PULMÃO EM IMUNODEPRIMIDOS

Imagem da Semana: Radiografia e TC. Imagem 01. Radiografia simples do tórax em incidência póstero-anterior.

Nódulos pulmonares múltiplos-causas. Metástases pulmonares. Doenças pulmonares multinodulares-bases

ALTERAÇÕES TORÁCICAS EM DOENTES IMUNODEPRIMIDOS PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES EM RADIOLOGIA CONVENCIONAL E TC DE ALTA RESOLUÇÃO

NÓDULO PULMONAR SOLITÁRIO

MODELO DE INTERPRETAÇÃO DA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE ALTA RESOLUÇÃO NO DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DAS DOENÇAS INTERSTICIAIS CRÔNICAS*

Pneumonite por Droga: Abordagem Prática. João G. Pantoja

APRESENTAÇÃO TOMOGRÁFICA TÍPICA DE GERMES INCOMUNS NO PULMÃO MARCELO CARDOSO BARROS

Sinal do Halo e Sinal do Halo Invertido: Como Podem Ajudar na Condução Diagnóstica?

Cistos e cavidades pulmonares

09/07/ Tromboembolismo Pulmonar Agudo. - Tromboembolismo Pulmonar Crônico. - Hipertensão Arterial Pulmonar

Sumário. Redução da Transparência Radiológica

Atlas de Imagens do Tórax

Raio X Simples do Tórax

Complicações pulmonares após transplante de células tronco hematopoéticas

Sumário. Opacidades em toalha. Por redução do componente aéreo: Colapso Patologia pleural (derrame)

Semiologia das alterações parenquimatosas

Pneumonias Intersticiais O que o radiologista precisa saber

TOUR RADIOLÓGICO: NÓDULOS PULMONARES

16/04/2015. Doenças Intersticiais Pulmonares Classificação. Doenças Intersticiais Pulmonares Classificação

manejo do nódulo pulmonar subsólido Dr. Mauro Esteves -

Tuberculose na infecção pelo VIH: O contributo da imagiologia

Sinal do halo invertido

ÁREA/SUB-ÁREA DO TERMO (BR): Medicina saúde pública pneumopatias

A Imagem na Infecção Pulmonar - É Possível o Diagnóstico Diferencial?

02/06/2010. Derrame Pleural. Sarcoidose

INFECÇÕES FÚNGICAS. Luis Vieira Luis Vieira Assistente Hospitalar de Radiologia CHLC Hosp. Capuchos, Lisboa (Coord.: Dra.

Aspergilose pulmonar e suas diferentes apresentações

INTERPRETANDO A RADIOGRAFIA DE TÓRAX NA EMERGÊNCIA

Sistema respiratório. Funções. Anatomia do sistema respiratório. Brônquios, bronquíolos e alvéolos. Promover troca de gases circulantes: Vocalização

Imagem em Fibrose Cística

Manifestações radiológicas da Sarcoidose

PET-CT NO NÓDULO PULMONAR SOLITÁRIO. Dr. Mauro Esteves -

Plano de aula. Aspectos Técnicos. Novos conceitos em Pneumonias Intersticiais 16/04/2015

Nódulos e massas pulmonares

TROMBOEMBOLISMO PULMONAR EMERGÊNCIAS AÓRTICAS. Leonardo Oliveira Moura

PNEUMONIA INTERSTICIAL LINFOCÍTICA: CORRELAÇÃO DA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE ALTA RESOLUÇÃO COM A ANATOMOPATOLOGIA*

PNEUMOCONIOSE POR EXPOSIÇÕES À SÍLICA, AFECÇÃO DE ORIGEM OCUPACIONAL ADQUIRIDO ATRAVÉS DE TRABALHO EM MINERAÇÃO - RELATO DE CASO.

Abordagem dos Nódulos Pulmonares em Vidro Fosco e dos Nódulos Sub-sólidos

TÓRAX: infecções pulmonares 2. R3 Carolina Reiser Dr. Rubens Gabriel Feijó Andrade

Múltiplos nódulos pulmonares, que diagnóstico?

É um nódulo pulmonar?

Disciplina: Específica

Patologia pulmonar. Doenças intersticiais. Alunos 5º semestre. Prof. Jane Maria Ulbrich. Prof. Adjunta do Departamento de Patologia Famed/Ufrgs

Raio X Simples do Tórax. Aula V

PNEUMOLOGIA. Introdução ao estudo Radiológico do Tórax. PEC III. Acad. Franchesca Luz

36º Imagem da Semana: Radiografia de tórax

Pneumonias intersticiais idiopáticas

PNEUMOLOGIA. Argumentação referente às reclamações apresentadas à. Prova Nacional de Seriação

GABARITO PROVA TEÓRICA QUESTÕES DISSERTATIVAS

Radiografia e Tomografia Computadorizada

É a resultante final de várias doenças caracterizadas por inflamação persistente que leva à dilatação irreversível de um

UNIVERSIDADEE DE SÃO PAULO

04/06/2012. vias de condução aérea. brônquios/bronquíolos. vias de trocas gasosas. ductos alveolares/alvéolos

DOENÇAS RELACIONADAS AO AMIANTO Diagnóstico e critérios de atribuição: Doenças pleurais

EXERCÍCIOS REFERENTES AOS TEXTOS DIDÁTICOS (ESTUDO DIRIGIDO) ED1 = ASPECTOS TÉCNICOS E ROTEIRO DE ANÁLISE DA RADIOGRAFIA DE TÓRAX

RADIOLOGIA PULMONAR INCIDÊNCIA : PÓSTERO-ANTERIOR (PA)

RECOMMENDATIONS FOR THE MANAGEMENT OF SUBSOLID PULMONARY NODULES RECOMENDAÇÕES NO MANEJO DO NÓDULO PULMONAR SUBSÓLIDO

Tuberculose Juliana Aquino

Radiografia simples do tórax: noções de anatomia

Radiografia simples do tórax: incidências, aspectos técnicos e sistematização da análise

DIP (pneumonia intersticial descamativa): como quadro do pulmão do tabaco apresentação de um caso

RADIOGRAFIA DO TÓRAX Reunião Clínica Serviço de Imagiologia do Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca, EPE Drª Clara Aleluia

Doenças pulmonares intersticiais

16/04/2013. Caso Clínico. História. História. Feminina, 32 anos, faxineira. Natural de Foz do Iguaçu

TESTE DE AVALIAÇÃO. 02 novembro 2013 Duração: 30 minutos. Organização NOME: Escolha, por favor, a resposta que considera correta.

COMPROMETIMENTO PULMONAR NAS LEUCEMIAS: AVALIAÇÃO POR TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE ALTA RESOLUÇÃO*

Imagem da Semana: Fotografia

Imagiologia Mamária. Manuela Gonçalo. Director: Prof. Doutor F. Caseiro Alves. Serviço de Radiologia HUC

Artigo Original. Achados de TCAR nas pneumonias bacterianas após transplante de medula óssea* Resumo. Abstract

Dr. Ricardo Diagnostico por imagem Tórax 2017

Prof. Claudia Witzel DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA

Índice Produtivo - GPD

BRONQUIOLITE CONSTRITIVA: ASPECTOS TOMOGRÁFICOS E CORRELAÇÃO ANATOMOPATOLÓGICA*

ÁREA/SUB-ÁREA DO TERMO (BR): Medicina saúde pública pneumopatias

GESF no Transplante. Introdução

SELEÇÃO DE MÉDICOS RESIDENTES PARA 2017 ÁREA DE ATUAÇÃO COM PRÉ-REQUISITO GABARITO

Caso Número 4/2018: Uma sessão interativa de casos em radiologia torácica Parte 2

EXAMES LABORATORIAIS: IMUNOLOGIA

Envelhecimento do Sistema Respiratório


XXIII Jornadas ROR-SUL. 15, 16 e 17 Fevereiro 2016 Lisboa

Estudo Radiológico do Tórax

e38 CAPÍTULO Atlas de Biópsias Hepáticas CAPÍTULO e38 Atlas de Biópsias Hepáticas Jules L. Dienstag Atul K. Bhan 38-1

Pericárdio Anatomia e principais patologias

do colágeno na tomografia computadorizada de alta resolução do tórax*

LESÕES MAMÁRIAS BENIGNAS MIMETIZADORAS DE MALIGNIDADE

Linfoma extranodal - aspectos por imagem dos principais sítios acometidos:

TROMBOSE ASSOCIADA AO CANCRO II. Como diagnosticar. Perspectiva Imagiológica. Carina Ruano Hospital de Santa Marta

SISTEMA RESPIRATÓRIO PROF. JAIR

Infecções Recorrentes na Criança com Imunodeficiências Primárias Pérsio Roxo Júnior

Transcrição:

Acta Radiológica Portuguesa, Vol.XIX, nº 76, pág. 91-95, Out.-Dez., 2007 Alterações Pulmonares nas Doenças Linfoproliferativas Isabel Duarte Departamento de Imagiologia, Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil, Centro de Lisboa Introdução O tecido linfático é um componente normal do pulmão: a) gânglios do hilo e gânglios intrapulmonares peribrônquicos; b) folículos linfáticos da mucosa brônquica (BALT=bronchus-associated lymphoid tissue); c) agregados linforeticulares periféricos (septos interlobulares e pleura visceral); d) linfocitos e células fagocíticas dispersos no epitélio das vias aéreas [1]. O tecido linfático está localizado predominantemente no interstício axial (associado aos septos interlobulares, veias e artérias pulmonares, brônquios e pleura) e daí as doenças linfoproliferativas terem grande tendência para envolver este compartimento [1]. Doenças Linfoproliferativas Malignas Incluem o linfoma pulmonar primário e o linfoma pulmonar secundário ambos com manifestações radiológicas semelhantes. O linfoma pulmonar secundário ocorre mais frequentemente que o primário, é mais frequente na doença de Hodgkin (DH) e ocorre em 5% dos linfomas não Hodgkin (LNH). Os linfomas pulmonares primários são geralmente linfomas de células B de baixo grau [1]. Entre os achados radiográficos incluem-se opacidades focais mal definidas, com margens irregulares e diâmetros que podem oscilar entre 2-8 cm (Fig. 1), consolidações localizadas que podem ir duma extensão subsegmentar ao envolvimento lobar completo e podem conter broncogramas/bronquilogramas aéreos, nódulos ou infiltrados múltiplos que podem ser bilaterais (Fig. 2). São envolvidos preferencialmente os lobos inferiores e é frequente a associação com adenomegalias nos hilos e no mediastino (quase sempre na DH e em 50% dos LNH) [1]. Quando foi realizada radioterapia prévia aos hilos e mediastino a recorrência aparece confinada ao pulmão. São achados menos frequentes, a infiltração do interstício perilinfático, traduzida na TC com cortes finos ou em alta resolução por espessamento peribroncovascular, espessamento dos septos interlobulares e espessamento pleural, e áreas em vidro fosco que traduzem a presença de células linfocíticas no interstício parenquimatoso e nos espaços aéreos [1]. Fig. 1 - LNH primário num indivíduo com S. de Sjögren; consolidação/ opacidade no lobo inferior do pulmão esquerdo, mal definida com margens irregulares Fig. 2 - LNH B difuso de células grandes; múltiplos nódulos/infiltrados na pirâmide basal esquerda Na DH o envolvimento secundário do parênquima pulmonar é na maioria resultado da invasão a partir de gânglios dos hilos e mediastínicos e daí a frequência da sua localização perihilar ou justamediastínica, não ARP!91

interferindo no estadiamento como doença extraganglionar[2]. Formas de Doença Linfoproliferativa Benigna Incluem a pneumonia intersticial linfocítica (PIL) e a bronquiolite folicular e ocorrem em pacientes com distúrbios auto-imunes (S. de Sjögren, SIDA, artrite reumatóide, hepatite crónica, tiroidite crónica ). A PIL está incluída nas Pneumonias Intersticiais Idiopáticas, de acordo com a reunião de consenso de 2002 da ATS (American Thoracic Society) e da ERS (European Respiratory Society). É uma entidade rara que resulta da proliferação pulmonar difusa de tecido linfático. Nas áreas atingidas predominam alterações intersticiais, estando os espaços aéreos tipicamente poupados. Não está associada a fibrose, pelo que não são encontradas bronquiectasias de tracção nem alterações em favo de mel. O diagnóstico definitivo é obtido por biopsia cirúrgica e a terapêutica geralmente usada no seu tratamento é a corticoterapia [1,3]. São raros gânglios do hilo ou do mediastino aumentados. Os principais achados radiográficos são feitos em TC de alta resolução e incluem focos bilaterais em vidro fosco e quistos. Os quistos têm paredes finas e são peribroncovasculares, resultando da distensão do espaço aéreo distal aos bronquíolos obstruídos pelo infiltrado linfocítico (Fig.3). Mais raramente aparecem espessamento dos eixos broncovasculares e espessamento dos septos interlobulares [1]. A bronquiolite folicular constitui uma hiperplasia linfática difusa com focos de proliferação/infiltrado linfocítico peribronquiolar com centros germinais. Radiograficamente aparece traduzida por nódulos centrolobulares. Mais raramente ocorrem espessamento das paredes brônquicas com dilatação brônquica [1]. As implicações prognósticas não são claras e o tratamento é geralmente dirigido à doença associada, quando é conhecida. Nos doentes que não têm causa directamente relacionada opta-se geralmente por administrar broncodilatadores com corticoides e mais recentemente também a eritromicina foi referida com benefício [4]. As diversas formas de apresentação pulmonar dos linfomas condicionam dificuldades diagnósticas porque muitos destes doentes têm outras razões para apresentar lesões pulmonares: infecções oportunistas, pneumonite pósradioterapia e doença pulmonar induzida pelos fármacos. Pneumonia e Imunodepressão Os doentes imunodeprimidos ficam susceptíveis a infecções por um largo espectro de microrganismos onde os aspectos imagiológicos estão longe de serem específicos. A pneumonia aparece nestes doentes como um problema clínico major e a TC tem grande aceitação na avaliação do doente febril e neutropénico porque mostra alterações pulmonares em doentes com radiogramas normais ou equívocos e consegue melhorar a caracterização das alterações conhecidas [5]. Apesar da avaliação clínica/laboratorial ser essencial, a combinação com os aspectos radiológicos (TC/alta resolução) constitui o melhor meio ao dispor para a avaliação das infecções pulmonares no doente imunodeprimido [6]. Os principais padrões encontrados em TC/alta resolução incluem nódulos, padrão de tipo tree-in-bud, opacidades em vidro fosco e consolidações. NÓDULOS: a aspergilose angioinvasiva ocorre exclusivamente no doente imunodeprimido com neutropenia severa. As características em TC incluem nódulos circunscritos por um halo em vidro fosco (sinal do halo) e a presença deste critério morfológico é suficiente para o diagnóstico de aspergilose angioinvasiva (Fig. 4). Os nódulos também são característicos de infecções por Cândida e citomegalovirus (CMV). As infecções virais ocorrem em doentes com transplantes de órgãos e medula óssea (MO) A infecção por CMV desenvolve-se entre 1 e 4 meses depois do transplante e os achados em TC/alta resolução são variáveis, incluindo consolidações, distorções parenquimatosas focais e difusas, múltiplos e pequenos nódulos com áreas de densidade em vidro fosco associadas [6]. Os fungos oportunistas constituem o segundo grupo de agentes patogénicos com grande probabilidade de causar Fig. 3 - Alterações de PIL em doente com S. de Sjögren Fig. 4 - Aspergilose angioinvasiva (sinal do halo) 92! ARP

infecção nos receptores de transplantes de MO. Os fungos que frequentemente produzem opacidades nodulares incluem Cryptococcus, Coccidioides e Blastomyces. PADRÃO TREE-IN-BUD : foi descrito inicialmente na panbronquiolite difusa e na disseminação endobrônquica da tuberculose e representa os bronquíolos cheios de muco ou material inflamatório. Uma grande variedade de bactérias, micobactérias, fungos e vírus podem ser causa de disseminação broncogénica e impactação bronquiolar por muco ou pus e resultar num padrão típico. A bronquiolite por Aspergillus pode também caracterizar-se por este tipo de apresentação [6] OPACIDADES EM VIDRO FOSCO: são achados frequentes, mas inespecíficos nos doentes imunodeprimidos não-hiv. Podem representar doença alveolar ou intersticial e estão associadas com diversas entidades. No diagnóstico diferencial incluem-se infecções (pneumocystis, CMV e mycoplasma), toxicidade farmacológica e pneumonia organizada criptogénica [6]. CONSOLIDAÇÃO: áreas de consolidação focal ou multifocal podem ser identificadas em várias infecções. As infecções bacterianas são as mais frequentes. Os fungos são mais frequentes nos doentes neutropénicos com doenças hematológicas. A aspergilose semi-invasiva também designada por aspergilose crónica necrotizante pode ser identificada em doentes cronicamente debilitados (diabéticos, malnutrição, alcoolismo, idosos, corticoterapia prolongada e doença pulmonar crónica obstrutiva). É uma forma rara de aspergilose invasiva que progride insidiosamente durante meses ou anos. Radiograficamente traduz-se por áreas de consolidação unilateral ou bilateral com ou sem cavitação (Fig. 5). O diagnóstico baseia-se nas alterações radiográficas e na biopsia endobrônquica [6]. As manifestações clínicas e radiológicas reflectem geralmente uma série de processos histopatológicos que incluem difuse alveolar damage (DAD), pneumonia intersticial não específica (NSIP), pneumonia organizada (PO), pneumonia eosinófila, bronquiolite obliterante, hemorragia pulmonar, edema ou doença veno-oclusiva [7]. As manifestações histopatológicas estão longe de ser específicas de um fármaco e ao mesmo fármaco pode estar associada grande variedade de padrões, que podem inclusivamente não ser puros Ao DAD corresponde radiologicamente (TC/alta resolução) um padrão conhecido por crazy-pavy e que resulta da associação de opacidades lobulares em vidro fosco com um padrão reticular representando espessamento dos septos interlobulares (Fig. 6). O diagnóstico diferencial inclui infecções (vírus, pneumocystis, mycoplasma, bactérias), edema pulmonar, hemorragia pulmonar, síndrome da dificuldade respiratória do adulto, pneumonias eosinófilas[8]. A NSIP é uma designação reservada por alguns autores para as formas idiopáticas ou associadas a colagenoses que referem este tipo de alterações, quando associadas à toxicidade farmacológica, como pneumonia intersticial/ fibrose pulmonar [1,2,7]. Tem distribuição preferencial basal e periférica e pode mostrar duas formas de representação com implicações prognósticas. Uma forma de prognóstico mais favorável com episódios recurrentes, celular e radiologicamente traduzida por densidades em vidro fosco, com ou sem áreas de consolidação, e a forma fibrótica de evolução insidiosa e pior prognóstico, conduzindo ao aparecimento de fibrose com bronquiectasias de tracção, onde o padrão desorganizado em favo de mel, característico da pneumonia intersticial usual está ausente, aparecendo essencialmente um padrão reticular harmonioso e densidades lineares [9,10]. A PO foi outrora designada por bronquiolite obliterante/ pneumonia organizada, mas este termo caiu totalmente em desuso, porque as suas manifestações não estão relacionadas com a obliteração bronquiolar. A PO é essencialmente uma pneumonia intersticial com ou sem Fig. 5 - Aspergilose semi-invasiva em LNH B difuso de células grandes; a doente foi submetida a pleuropneumectomia que confirmou pneumonia a Aspergillus e envolvimento pulmonar por linfoma Toxicidade Pulmonar Induzida pelos Fármacos Numerosos agentes, incluindo citostáticos e fármacos nãocitotóxicos, têm potencial para causar toxicidade pulmonar. Fig. 6 - Pneumomediastino espontâneo, como manifestação inicial da toxicidade pulmonar à bleomicina ARP!93

proliferação endobronquiolar. Responde bem à suspensão do tóxico, mas alguns doentes requerem a administração de cortocoides. São características em TC a multifocalidade de consolidações e áreas em vidro fosco, que podem conter dilatação brônquica, com distribuição subpleural e peribrônquica mais frequente nos lobos inferiores [3,7.10]. Transplante de Medula Óssea (BMT) As complicaçõe pulmonares aparecem em 40-60% dos receptores de BMT e muitas das complicações têm mortalidade significativa. Os transplantes autólogos têm menor incidência de infecções por CMV e fungos e pneumonia idiopática e não estão sujeitos a GVHD (graft versus host disease), sendo rara a bronquiolite obliterante (BO). As complicações são geralmente divididas em 3 fases: fase neutropénica (1º mês), fase precoce (entre os 30º e 100º dias depois do transplante) e fase tardia (depois do 100º dia). A vantagem desta divisão é porque permite sistematizar as complicações que, apesar de mostrarem manifestações clínicas e radiológicas semelhantes, podem relacionar-se com intervalos de tempo específicos [5]. Complicações no 1º mês: os doentes estão profundamente neutropénicos e imunodeprimidos. As infecções mais frequentes são por bactérias, Aspergillus ou Cândida e as complicações não infecciosas mais comuns incluem o edema e a hemorragia pulmonares e a toxicidade farmacológica. Os transplantes autólogos não fazem neutropénias tão profundas e por isso as complicações neste período são geralmente não infecciosas. É frequente a infecção por bactérias (50% dos receptores de BMT), geralmente gram-negativos. Os gram-positivos são mais frequentes com o uso de cateteres venosos centrais. As ulcerações orais e traqueobrônquicas são factor predisponente e o uso profilático de antibioterapia evita o aparecimento de manifestaçõoes radiográficas, que quando surgem são inespecíficas e semelhantes às achadas noutros grupos de doentes imunodeprimidos. As infecções virais apesar de raras, na fase neutrópénica, podem potenciar as infecções bacterianas e geralmente manifestam-se por opacidades mais difusas. Entre os vírus registam-se o herpes simples, o vírus respiratório sincial e o adenovírus (particularmente na população pediátrica) [5]. Complicações da fase precoce: as duas complicações mais importantes desta fase são a pneumonia a CMV e a pneumonia idiopática. Pelo menos 70% dos receptores de BMT desenvolvem infecções clínicas ou subclínicas a CMV. A pneumonia constitui a manifestação mais grave, aparecendo entre 10-40% dos transplantes alogénicos e podendo atingir 85% de índice de mortalidade. O diagnóstico precoce e o tratamento adequado com antivirais e imunoglobulinas tende a reduzir este valor. A pneumonia é responsável por 40% das mortes neste período e em metade dos casos não se consegue identificar agente infeccioso, ficando esta condição registada como pneumonia idiopática. Mais frequente nos transplantes alogénicos, tem mortalidade elevada, na ordem dos 70%, manifestando-se histopatologicamente com DAD progressivo. Nos estados mais tardios pode mostrar em TC opacidades lineares com distorção da arquitectura pulmonar. O diagnóstico é tipicamente de exclusão e manifesta-se nos testes de função respiratória por alterações da difusão e de restrição [5]. Complicações da fase tardia: a complicação major é a rejeição crónica (GVHD) nos transplantes alogénicos. O risco de pneumonia idiopática e por infecção a CMV persiste ainda por vários meses e a associação entre o desenvolvimento de GVHD crónica e pneumonia bacteriana deve-se provavelmente à presença de lesões pulmonares e das vias aéreas. A ocorrência de GVHD crónica estima-se entre 1/3 e 1/2 dos receptores de BMT alogénicos, mas a incidência precisa de doença pulmonar é desconhecida. Podem ocorrer NSIP, DAD, PO e BO e estão registados exemplos de doentes que desenvolvem fibrose progressiva com morte por falência respiratória [5]. As manifestações clínicas e radiográficas da BO nos transplantes alogénicos de MO são semelhantes àquelas que ocorrem nos transplantes de pulmão. Alteração Pós-Radioterapia (pneumonite radiógena) As alterações após radioterapia (RT) estão dependentes do volume e da forma da área tratada, da dose, da duração do tratamento, possíveis efeitos cumulativos com outras terapêuticas, incluindo a quimioterapia, e da resposta individual de cada doente [2]. Os radiologistas definem a pneumonia pós-radioterapia pela evidência de alterações radiográficas no pulmão. Para os clínicos é necessário que existam sintomas (febre, tosse ) acompanhantes, mas as alterações radiográficas não são necessariamente acompanhadas por sintomas. A pneumonite radiógena instala-se geralmente entre a 6ª e a 8ª semanas após completar uma dose total de 35-40 Gy (gray). Abaixo dos 30 Gy não surgem habitualmente alterações, a sua incidência é variável entre 30 e 35 Gy e acima de 35-40 Gy estão quase sempre presentes. Tornase mais extensiva entre os 3º e 4º meses após completar a terapêutica (fase aguda, exsudativa, com alterações inflamatórias e edema) e posteriormente evolui para fibrose com bronquiectasias e perda de volume. Histologicamente não existem alterações patognomónicas o que torna difícil separar os efeitos da radioterapia com alterações por toxicidade farmacológica e/ou infecções. As alterações de fibrose tendem a estabilizar entre o 9º e o 12º meses. Qualquer alteração que surja posteriormente sugere sobreinfecção ou recorrência. O conhecimento do campo de irradiação e da data final da terapêutica, tornamse essenciais para a identificação radiológica de sobreinfecção, doença residual ou recorrência [2]. Constituem complicações menos frequentes, derrames pleurais e calcificações ganglionares. Os derrames são geralmente pequenos e mais frequentemente detectados em TC e resolvem espontaneamente. O seu agravamento rápido ou recuperação sugerem outra origem. As calcificações ganglionares são mais frequentes na DH e mais frequentes após RT, relativamente aos doentes tratados exclusivamente por quimioterapia. Aparecem um ano após a terapêutica e tornam-se progressivamente mais densas [2]. 94! ARP

Bibliografia 1. Müller, N. L.; Fraser, R. S.; Lee, K. S.; Johkoh, T. - Diseases of the lung. Lippincott Williams & Wilkins, 2003, 97-109. 2. Husband, J.; Reznek, R. - Imaging in Oncology. Taylor e Francis, 2004, 836-840 e 1263-1268. 3. Wittram, C.; Mark, E. J., McLoud, T. C. - CT-Histologic correlation of the ATS/ERS 2002 classification of idiopathic intersticial pneumonias. Radiographics, 2003, 23:1057-1071. 4. Ryu, J. H.; Myers, J. L.; Swensen, S. J. - Bronchiolar disorders. Am j Respir Crit Care Med, 2003, vol168:1277-1292. 5. Hansell, D. M.; Armstrong, P.; Lynch, D. A.; McAdams, H. P. - Imaging of diseases of the chest. Elsevier Mosby, 2005, 315-323 e 517-525. 6. Franquet, T. - Clinical applications of pathology and imaging in 7. Rossi, S. E.; Erasmus, J. J.; McAdams, P.; Sporn, T. A., Goodman, P. C. - Pulmonary drug toxicity: radiologic and pathologic manifestations. Radiographics, 2000, 20:1245-1259. 8. Webb, W. R. - Thin-section CT of the secondary pulmonary lobule: anatomy and the image. The 2004 Fleischner lecture RSNA 2006 9. Costabel, U. - Clinical applications of pathology and imaging in 10. Hensell, D. M. - Clinical applications of pathology and imaging in ARP!95