A concepção dos enfermeiros no processo gerencial em Unidade Básica de Saúde



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Transcrição:

A concepção dos enfermeiros no processo gerencial em Unidade Básica de Saúde NURSE S CONCEPT IN THE MANAGERIAL CONCEPTION OF A BASIC HEALTH UNIT LA CONCEPCIÓN DE LOS ENFERMEROS EN EL PROCESO GERENCIAL EN UNIDAD BASICA DE SALUD RELATO DE PESQUISA Joanir Pereira Passos 1, Suely Itsuko Ciosak 2 1 Professora do Departamento de Saúde Pública da Escola de Enfermagem Aldredo Pinto da UNIRIO. joanirpassos@bol.com.br 2 Professora Doutora do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP) siciosak@usp.br RESUMO Trata-se de um recorte da pesquisa A utilização de indicadores na prática gerencial do enfermeiro em Unidades Básicas de Saúde da cidade do Rio de Janeiro, realizada nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) da Área de Planejamento 5.3 e que teve como objetivos: identificar a concepção dos enfermeiros quanto aos elementos constitutivos do processo de trabalho gerencial em UBS e discutir a gerência como instrumento do processo de trabalho na organização de serviços de saúde. Para este trabalho, optou-se por um estudo descritivo, com abordagem qualitativa cujos dados foram coletados por meio de entrevista com sete gerentes enfermeiros, norteada por questões orientadoras. Os resultados apontaram que a organização das ações dos serviços de saúde é articulada e direcionada à finalidade do processo de trabalho mediante relação estabelecida entre o objeto, os instrumentos e o produto final, sendo que a satisfação da clientela e a qualidade da assistência foram os resultados esperados na produção de bens e serviços. ABSTRACT This study is part of a larger survey called Use of indicators in nurses managerial practice in Basic Health Care Units in the city of Rio de Janeiro, which was carried out in the Basic Health Care Units of the Planning Area 5.3 and whose objectives were to identify nurses conception regarding the tools required for management in those units and to discuss the role of management in organizing health services. The study is descriptive and data were collected in interviews with seven nurse managers. The results show that health services actions are organized and directed to the purpose of the working process through the relationship established between the object, the instruments and the final product, and that for those nurses the end result to be achieved is client s satisfaction and the quality of medical and nursing care. RESUMEN Este artículo se trata de un recorte de la investigación, La utilización de indicadores en la práctica gerencial del enfermero en Unidades Básicas de Salud de la ciudad de Rio de Janeiro, realizada en las Unidades Básicas de Salud (UBS) del Área de Planificación 5.3 y que tuvo como objetivos: identificar la concepción de los enfermeros en cuanto a los elementos constitutivos del proceso de trabajo gerencial en UBS y discutir la gerencia como instrumento del proceso de trabajo en la organización de servicios de salud. Para este trabajo, se optó por un estudio descriptivo, con abordaje cualitativo cuyos datos fueron recolectados por medio de entrevista a siete gerentes enfermeros, norteada por preguntas orientadoras. Los resultados muestran que la organización de las acciones de los servicios de salud es articulada y orientada a la finalidad del proceso de trabajo mediante la relación establecida entre el objeto, los instrumentos y el producto final, siendo la satisfacción de la clientela y la calidad de la asistencia los resultados esperados en la producción de bienes y servicios. DESCRITORES Processo de trabalho. Gerência. Enfermagem. Sistemas locais de saúde. KEY WORDS Working process. Management. Nursing. Local health systems. DESCRIPTORES Proceso de trabajo. Gerencia. Enfermeria. Sistemas locales de salud. 464 A concepção dos enfermeiros Recebido: no processo 06/01/2004 gerencial em unidade básica de saúde Aprovado: 27/07/2005

INTRODUÇÃO Desde da década de 70 o sistema de saúde vem se transformando, com a redemocratização do Estado Brasileiro. O eixo básico para discussão da gestão de serviços de saúde perpassa pela formulação e a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS). O SUS compreende o modelo vigente de política de saúde no Brasil, ao qual deve estar articulado o conjunto das ações governamentais no setor. Significa um importante avanço na luta por direitos de cidadania. Representa um importante passo para o fortalecimento dos sistemas de administração locais e regionais, contribuindo para o aumento do controle local e para as mudanças no processo de trabalho. Nos últimos anos, temos observado que um número significativo de enfermeiros vem assumindo a função de gerente de Unidade Básica de Saúde (UBS), na cidade do Rio de Janeiro, Coordenação de Saúde de Área de Planejamento, Direção de Unidades, como também, em Coordenação de Programas, o que lhes permite ocupar posições estratégicas no processo de tomada de decisão e responder pela formulação e implementação das políticas a nível local. No contexto sócio-histórico-político, o enfermeiro gerente elabora pensamentos e a sua idealização se projeta no modo como organiza o trabalho para produção de bens e serviços. Este pode ser de natureza técnica ou política, simultaneamente, influencia e pode ser influenciado por diferentes atores sociais. Além de direcionar o atendimento das necessidades geradas por uma determinada sociedade. No processo de trabalho, o gerente deve se adequar a determinados mecanismos próprios da Unidade, que propiciem o desenvolvimento da execução da prática gerencial, visando a garantia dos princípios do SUS. A organização institucional do SUS prevê como políticas de descentralização, a criação dos distritos de saúde e/ ou a municipalização dos serviços de saúde, mediante a Lei 8.080, de setembro de 1990. A municipalização se aplica aos níveis menores do sistema onde se localiza a UBS, que deve exercer as atribuições de autoridade sanitária na sua área de atuação (1). A municipalização da saúde conduz e pressupõe o aumento do poder de operação e decisões em âmbito local. Realiza transformações nos serviços e mudanças efetivas nas ações de saúde, fundamentadas nos princípios de universalidade, eqüidade e integralidade da atenção à saúde e nas diretrizes de regionalização e hierarquização da oferta da assistência e descentralização político-administrativa. A atenção básica de saúde, compreende uma estratégia para alcançar o aumento da cobertura das ações de saúde na população. Ela é ofertada pelas Unidades Básicas de Saúde ou Centros de Saúde, as quais correspondem a porta de entrada do usuário ao sistema, destinadas a um determinado grupo populacional, que mora ou trabalha na área geográfica de sua abrangência (2). Neste sentido, as ações compreendidas nos níveis de atenção à saúde promoção, proteção e recuperação, devem ser constituídas e operacionalizadas de maneira articulada e integrada, de tal forma que permita a ampla cobertura e acesso da população, com maior eficiência econômica e social possível. Portanto, no gerenciamento de uma UBS, o gerente necessita dominar uma gama de conhecimentos e habilidades das áreas de saúde e de administração, bem como, ter uma visão geral no contexto em que elas estão inseridas e, compromisso social com a comunidade. Em suma, o gerente de uma UBS tem como atividade precípua a organização da produção de bens e serviços de saúde ao indivíduo ou à coletividade. Com este enfoque é importante considerar, alguns referenciais teóricos, dos quais destacamos a Norma Operacional Básica SUS/1996 NOB 96, que define gerência como sendo a administração de uma unidade ou órgão de saúde (ambulatório, hospital, instituto, fundação etc.), que se caracteriza como prestador de serviços ao Sistema (3). Gerenciar é a função administrativa da mais alta importância é o processo de tomar decisões que afetam a estrutura, os processos de produção e o produto de um sistema. Implica coordenar os esforços das várias partes desse sistema, controlar os processos e o rendimento das partes e avaliar os produtos finais e resultados. Numa organização, o gerente se responsabiliza pelo uso efetivo e eficiente dos insumos, de forma a traduzi-los em produtos (serviços, por exemplo) que levam a organização a atingir os resultados que se esperam dela (4). Assim, as práticas de saúde devem referir as necessidades sociais, cujas práticas comportam uma racionalidade com a finalidade concreta, um projeto de ação; criam e consolidam um sistema de necessidades cujo contorno é dado pela sociedade, mediante valores e normas (5), evidenciado que as necessidades sociais são fortemente influenciadas pelas relações decorrentes do processo de trabalho. O trabalho é sempre ação transformadora intencionalmente realizada, que combina, com base nessa intenção, seus elementos internos constituintes, que são o objeto, os instrumentos materiais e os conhecimentos que permitem operar esses instrumentos. Portanto, o trabalho é sempre técnica que opera no objeto, uma transformação. Esta é exercida pelo agente do trabalho que, para tal, possui um saber competente, que organiza e preside a ação, o saber operatório em unidade básica de saúde 465

do trabalho (...). Em outros termos, o agente antevê o produto do trabalho, que não é um produto qualquer, mas sim o que melhor corresponde às necessidades que justificam o trabalho (6). Assim, dentro do processo de trabalho em saúde, as relações que se estabelecem entre o objeto, instrumentos e produto, diante das necessidades colocadas e que direcionam a finalidade do mesmo, são dirigidas pela intencionalidade do trabalho frente a um certo saber operatório que encaminha os agentes para o cumprimento de um certo projeto de vida em sociedade (7). A gerência pode ser entendida como um instrumento importante para efetivação de políticas; ela é ao mesmo tempo, condicionante do e condicionada pelo modo que se organiza a produção de serviços. Esta dupla posição de produto de um determinado contexto e de criador deste mesmo contexto torna o processo de gestão permeável à influência dos diferentes sujeitos sociais interessados em diversas políticas de saúde (7). A partir destas concepções teóricas, entendemos a gerência como instrumento do processo de trabalho, já configurado à rede básica de serviços de saúde, por referência ao processo de municipalização, pelo seu caráter articulador e integrativo, ou seja, a ação gerencial é determinante do processo de organização de serviços de saúde e fundamental na efetivação de políticas sociais, em especial, as de saúde. No entanto, em algumas situações os escassos recursos de ordem organizacional, material, cognitivo e, até mesmo ético, fazem com que o trabalho gerencial se reduza a controlar e executar tarefas visando alcançar o produto e o impacto esperado. Diante do exposto, este estudo teve por objetivos: identificar a concepção dos enfermeiros quanto aos elementos constitutivos do processo de trabalho gerencial em UBS e discutir a gerência como instrumento do processo de trabalho na organização e produção de serviços de saúde. MATERIAL E MÉTODOS Optamos por realizar uma pesquisa descritiva, com abordagem qualitativa como forma de melhor apreender o significado da gerência como instrumento do processo de trabalho do enfermeiro em UBS. O cenário do estudo foi constituído pelas Unidades Básicas de Saúde, localizadas no município do Rio de Janeiro, na Área de Planejamento 5.3, da XIXª Região Administrativa, compreendendo os bairros de Paciência e Santa Cruz; prestadoras da assistência primária à saúde de uma população determinada, através desenvolvimentos de programas de saúde e de atividades básicas. Os sujeitos deste estudo foram sete enfermeiros, pertencentes ao quadro de pessoal efetivo da Secretaria Municipal de Saúde da cidade do Rio de Janeiro (SMS-RJ); exercendo a função de gerência/direção de UBS, independentemente do tempo do exercício na função e de possuir cursos na área de gerência ou administração; lotados em Unidade Básica de Saúde (CMS, PS, UACPS) da Área de Planejamento - 5.3. Para a coleta de dados foi utilizado como instrumento o formulário (Anexo), contendo cinco questões norteadoras, acompanhado do termo de consentimento livre e esclarecido, em cumprimento ao disposto no art. 4º, da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (8). A coleta de dados foi realizada pelas pesquisadoras, mediante a técnica de entrevista, na segunda quinzena do mês de setembro de 2003, após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP) e autorização da Coordenação de Saúde da Área de Planejamento 5.3, da SMS-RJ. Os dados, foram relacionados e classificados conforme emergiam no discurso, através de palavras ou frases e analisados a partir do referencial teórico adotado. RESULTADOS E DISCUSSÃO Considerando os seguintes elementos constitutivos do processo de trabalho: objeto, finalidade, meios, instrumentos e produto final, que emergiram de forma significativa nos discursos dos entrevistados em relação ao processo gerencial dos enfermeiros em UBS, podemos colocar que: A visão dos enfermeiros-gerentes quanto ao objeto do processo de trabalho nas UBS, pode ser verificada pelas seguintes expressões:... Satisfação da clientela. (UBS 1)... Clientela. (UBS 2 e UBS 4)... Gerenciar, supervisionar, orientar. (UBS 3)... Clientela, profissionais. (UBS 5)... Estrutural -infra-estrutura; supervisão PSF. (UBS 6)... Clientela, profissionais, pessoas. (UBS 7) Tais afirmativas nos levam a refletir que o gerente deverá direcionar suas ações administrativas/gerenciais, no atendimento das necessidades básicas de saúde e sociais da clientela, de modo a transformá-las (necessidades) em melhores condições e de qualidade de vida. Neste contexto, identificamos que a maioria dos enfermeiros gerentes atribui à clientela, o objeto do seu processo trabalho gerencial. 466 em unidade básica de saúde

O trabalho é sempre a técnica que opera no objeto uma transformação, exercida pelo agente do trabalho que, para tal, possui um saber competente que organiza e preside a ação, o saber operatório do trabalho (6). Na organização de trabalho os objetos não são dados, mas pensados pelo saber; cada objeto do trabalho contém a necessidade social que gerou o trabalho (9). A visão dos enfermeiros-gerentes, quanto à finalidade do processo de trabalho nas UBS, é assim compreendida:... Oferta de serviço de qualidade com o envolvimento de todos. (UBS 1)... Prestação de todos serviços básicos de saúde com rapidez e eficiência. (UBS 2)... Responsabilidade: dar assistência adequada à comunidade. (UBS 3)... Ampliação do atendimento de saúde à clientela. (UBS 4)... Prestação da assistência com qualidade à clientela. (UBS 5)... Alcance e melhora nos indicadores de saúde. (UBS 6)... Atendimento à clientela, prestação de serviços com qualidade de forma humanizada. (UBS 7) Ao considerarmos a finalidade como sendo a antevisão do objeto transformado, ou seja, sua idealização (9), o estudo aponta uma estreita e efetiva relação entre o objeto (clientela) e a finalidade, com vistas ao atendimento das necessidades de saúde e sociais dos usuários. Todos os processos de trabalho têm como finalidade à realização de necessidades humanas (6). Desta forma, esta relação é evidenciada nas citações dos enfermeiros-gerentes, as quais destacamos: a oferta de serviços de qualidade e eficiência, a assistência adequada, a ampliação de atendimento e o alcance dos indicadores de saúde, como finalidade do processo de trabalho gerencial. Para compreensão dos meios e instrumentos, como elementos constitutivos do processo de trabalho, os dados obtidos foram analisados simultaneamente, visto que são momentos de um só conjunto que realiza interna e externamente as necessidades de reprodução social (9). Além disso, os meios e instrumentos são fatos que o gerente coloca entre si e o objeto de trabalho. Em relação aos meios do processo de trabalho nas UBS, a visão dos enfermeiros-gerentes:... Informação; articulação c/os profissionais; ouvir a comunidade e os profissionais envolvidos; vivência - observação, compromisso, visão. (UBS 1)... Gerência participativa, envolvendo todos profissionais. (UBS 2)... Supervisão, observação, orientação. (UBS 3)... Recursos humanos; construção de parcerias com a comunidade; capacitação profissional. (UBS 4)... Reuniões de equipe com a comunidade; implantação de novos serviços. (UBS 5)...Atividades intersetorial (escolas, creches, secretaria) que contemplem a interdisciplinaridade; busca de novas estratégias. (UBS 6)... Diálogo; manter confiança direção/equipe. (UBS 7) E quanto à visão dos enfermeiros-gerentes em relação aos instrumentos do processo de trabalho nas UBS, pode ser definida como:... Reunião com a equipe dos setores; capacitação profissional; ofícios; relatórios; estatísticas. (UBS 1)... Dinâmica de trabalho de grupo; reuniões; quadro de aviso. (UBS 2)... Rotinas; normas; formulários; reuniões. (UBS 3)... Grupos de trabalho; discussão conjunta; reunião semanal com equipe específica. (UBS 4)... Fluxograma; documentos oficiais / rotina de setores; quadro de aviso. (UBS 5)... Estatísticas; reuniões de equipe; motivação; coleta de dados, análise. (UBS 6)... Diálogo; memo. (UBS 7) Assim, podemos dizer que os meios e os instrumentos: força de trabalho em saúde (trabalho coletivo), conhecimentos, materiais específicos e o local de trabalho, possibilitam a articulação e a manipulação do objeto pelo sujeito, com vista a transformar um determinado objeto em produto final. Partindo destas afirmativas, verificamos a predominância das atividades de articulação e reuniões com os profissionais e com a comunidade, como meios e instrumentos utilizados pelos enfermeiros para obtenção do resultado do seu processo de trabalho gerencial. A visão dos enfermeiros-gerentes quanto ao produto final do processo de trabalho nas UBS:... Satisfação da clientela e qualidade do atendimento. (UBS 1, UBS 2 e UBS 7)... Consolidação; relatório geral. (UBS 3)... Melhoria da qualidade de atendimento de saúde da população. (UBS 4 e UBS 6)... Assistência à clientela com qualidade. (UBS 5) em unidade básica de saúde 467

Verifica-se que, a maioria dos depoimentos dos enfermeiros-gerentes, o produto final do processo de trabalho indica a satisfação da clientela e qualidade no atendimento, como resultado idealmente pensado, para realização da sua efetiva prática gerencial. Em relação ao produto final, ainda, observamos que o gerente articula a sua prática em uma totalidade social, uma vez que ao identificar as necessidades colocadas pela clientela, direciona a finalidade do processo de trabalho mediante as relações que se estabelecem entre o objeto, os instrumentos e o produto final. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo possibilitou identificar que os enfermeiros gerentes de UBS estabelecem uma efetiva relação entre o objeto e a finalidade do seu processo de trabalho, ou seja, as ações gerenciais são direcionadas ao atendimento das necessidades de saúde da clientela. Os meios e instrumentos para consecução dos resultados esperados pela idealização dos enfermeiros gerentes referem-se aos aspectos internos e externos, necessários para formulação das ações programáticas em saúde, com vistas à atenção das necessidades básicas dos usuários. A satisfação da clientela e assistência com qualidade são os resultados esperados na produção de bens e serviços. Assim, podemos apontar que os enfermeiros gerentes de UBS na organização das ações dos serviços de saúde articulam e direcionam a finalidade do processo de trabalho, através da relação estabelecida entre o objeto, os instrumentos e o produto final. Portanto, a gerência como instrumento do processo de trabalho na organização de serviços de saúde, implica na tomada de decisões que afetam a estrutura, o processo de produção e o produto de um sistema, visando ações que possibilitem intervenções impactantes no processo de trabalho em saúde, ou seja, viabilizar meios para prestação da assistência à clientela com eficiência, eficácia e efetividade, a fim de possibilitar a satisfação das necessidades de saúde desta clientela. REFERÊNCIAS (1) Nemes Filho A. A unidade básica e o sistema de saúde. In: Schraiber LB, Nemes MIB, Mendes-Gonçalves RB, editores. Saúde do adulto: programas e ações na Unidade Básica. 2ª ed. São Paulo: Hucitec; 2000. p. 276-86. (2) Almeida ES, Castro CGI, Lisboa CA. Distritos sanitários: concepção e organização. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da USP; 1998. (Série Saúde & Cidadania, 1). (3) Conselhos dos Secretários Municipais do Estado do Rio de Janeiro (COSEMS-RJ). Manual do gestor SUS. Rio de Janeiro; 1997. Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde NOB-SUS 01/96; p.76-113. (4) Tancredi FB, Barrios SRL, Ferreira JHG. Planejamento em saúde. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da USP; 1998. (Série Saúde & Cidadania, 2). (5) Matumoto S, Mishima SM, Pinto IC. Saúde coletiva: um desafio para a enfermagem. Cad Saúde Pública. 2001;17(1):233-41. (6) Nemes MIB. Prática programática em saúde. In: Schraiber LB, Nemes MIB, Mendes-Gonçalves RB, editores. Saúde do adulto: programas e ações na Unidade Básica. 2ª ed. São Paulo: HUCITEC; 2000. p. 48-65. (7) Mishima SM, Villa TCS, Silva EM, Gomes ELR, Anselmi ML, Pinto IC, et al. Organização do processo gerencial no trabalho em saúde pública. In: Almeida MCP, Rocha SMM, organizadoras. O trabalho de enfermagem. São Paulo: Cortez; 1997. p. 251-96. (8) Conselho Nacional de Saúde. Resolução n. 196, de 10 de outubro de 1996. Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos. Bioética. 1996;4(2):15-25. (2 Supl) (9) Egry EY, editor. Bases filosóficas para a compreensão do método. São Paulo: Ícone; 1996. Saúde coletiva: construindo um novo método de enfermagem; p. 20-2. ANEXO FORMULÁRIO Considerando os elementos constitutivos do processo de trabalho: objeto, finalidade, meios / instrumentos e produto final. Na sua visão, como você os relaciona à sua prática gerencial: a) Objeto: b) Finalidade: c) Meios: d) Instrumentos: e) Produto final: 468 A concepção Correspondência: dos enfermeiros no Joanir processo Pereira gerencial Passos em unidade Rua básica Fritz Feigl, de saúde 690 - Freguesia - Jacarepaguá Passos JP, CEP Ciosak 22750-600 SI. - Rio de Janeiro - RJ