BRIQUEDOTECA HOSPITALAR: A IMPORTÂNCIA DESTE ESPAÇO PARA REDUCAÇÃO DO TRAUMA DA HOSPITALIZAÇÃO DA CRIANÇA



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Transcrição:

BRIQUEDOTECA HOSPITALAR: A IMPORTÂNCIA DESTE ESPAÇO PARA REDUCAÇÃO DO TRAUMA DA HOSPITALIZAÇÃO DA CRIANÇA CARVALHO * *Adnan de - UEL adnancarvalho@yahoo.com.br BATISTA **, Cleide Vitor Mussini - UEL cler@uel.com.br Resumo A doença e hospitalização constituem uma crise na vida da criança, esta é uma experiência altamente estressante e traumática para ela, levando-as a apresentar alguns comportamentos, dentre eles: apatia, fuga, culpa, tristeza, protesto e medo. Alguns hospitais objetivando minimizar a dor e o sofrimento das crianças no período de internação hospitalar, buscam desenvolver ações recreativas, tais como brincadeiras, jogos, brinquedos, oficinas de histórias entre outras atividades. O brincar seria de primordial importância, sendo seu uso preconizado na assistência em geral, e especificamente, na assistência de enfermagem. A brinquedoteca é um espaço criado para favorecer a brincadeira possibilitando a criança o acesso a uma grande variedade de brinquedos; dentro deste ambiente especialmente lúdico, onde tudo convida a mexer, a explorar, a experimentar e construir. A criança hospitalizada elabora através de brincadeiras suas frustrações e traumas, expressa as suas emoções e personaliza seus conflitos, explora o mundo, constrói o seu saber, aprende a respeitar o outro, desenvolve o sentimento de grupo, ativa a imaginação e se auto-realiza. A brincadeira vai refletir o seu modo de ser e reagir, aos conteúdos vivenciados, fantasias, desejos, receios e conflitos afetivos.através de algumas técnicas de brinquedo terapêutico como dramatização, desenho e pintura, uso de histórias; é possível diminuir a ansiedade da criança, melhorar o relacionamento desta com a equipe de saúde. Sendo assim a brinquedoteca torna a hospitalização mais suportável e menos traumática para a criança, produz relaxamento, proporciona um meio para aliviar tensão e expressar sentimentos, diminui o estresse da separação e os sentimentos de estar longe de casa, ajuda a criança a sentir-se mais segura em um ambiente estranho, proporciona diversão, diminui o tempo de hospitalização e conseqüentemente reduz o índice de infecção hospitalar. Palavras-chave: Brincar; Criança; Hospital. * Mestranda em Educação pela Universidade Estadual de Londrina. Especialista em: Deficiência mental, Psicopedagogia, Metodologia e Didática, Saúde Pública. Graduada em Pedagogia e Enfermagem. ** Professora do Mestrado em Educação da Universidade Estadual de Londrina, Professora adjunta da Universidade Estadual de Londrina. Pós-doutorado pela Universidade de São Paulo USP/ Brasil; Pós-doutorado Universidade de Salamanca - USAL /Espanha. Pesquisadora nos seguintes temas: educação infantil, desenvolvimento infantil, brincar nos diferentes contextos, o jogo como intervenção psicopedagógia e terapêutica, jogo simbólico e a criança enferma

1438 Sabemos que um indivíduo quando procura um hospital para tratamento de uma doença, ele não deixa de ser um uma pessoa psicossocial, mesmo assim, o atendimento que lhe é prestado é apenas com o objetivo de curar da doença física instalada sem se preocupar com o todo. Se quando tratado apenas como paciente, ficando a mercê do tratamento de outros como um objeto é ruim para um adulto, imagine para uma criança que foi tirada do seu ambiente familiar, que na maioria das vezes não entende o que esta acontecendo com ela. Para Sigaud (1996), em pediatria não devemos destinar o atendimento às crianças apenas como objeto de resolver um problema físico, mas devemos tratar essas crianças como um todo, um ser biopsicossocial em pleno desenvolvimento. Para Matos e Muggiati (2001), quando uma criança está psicossocialmente abalada á evolução e os prognósticos de sua doença são piores, o fator emocional, o social e o psicológico influenciam no tratamento da doença. Conforme Matos e Muggiati (2001), devemos levar em conta os procedimentos conservadores da maioria dos hospitais, que ainda hoje contribuem para que a realidade se mostre fria, impessoal e totalmente impregnada de carência de afetividade. Colocando o paciente a mercê de funcionários desmotivados que uma influencia negativa no ambiente hospitalar. Durante o processo de hospitalização deve se levar em conta durante o atendimento da criança, sua história, sociedade da qual faz parte e, principalmente, que ela está em pleno desenvolvimento. Se isto não for respeitado durante o processo de cura da doença as chances de sucesso no tratamento não serão as melhores e as possibilidades de recidivas são grandes. A realidade do atendimento hospitalar com vista ao processo de humanização tem procurado mudar, mas ainda continua impessoal, fria e o tratamento do paciente é sempre bastante formal, ficando o doente nas mãos de profissionais que executam suas atividades de forma mecânica se esquecendo que em suas mãos estão crianças assustadas com medo e que não conhecem aquela realidade. A criança tem sua maneira de pensar, sentir e reagir. Elas têm o direito a conhecer a verdade, a ter privacidade e ser compreendida nos seus desejos e preferências, enfim a criança deve ser respeitada e tratada como pessoa (SIGAUD,1996). A atenção à saúde da criança enferma, implica não só nos cuidados biológicos a ela dispensados pela equipe de saúde, mas também, em cuidados psicológicos e sociais. Está

1439 assistência deve ser integral, observando que a criança possui dúvidas, medos, anseios e, principalmente esta tentando entender o processo de adoecer. Este fenômeno de adoecimento da criança constitui-se em um fenômeno provocador de desajuste na criança, levando a mesma a reconhecer as limitações e as agressões que sofre no seu corpo. Segundo Ortiz e Freitas (2005), na hospitalização da criança, ela traz consigo uma fragilidade, um desconforto da dor e a insegurança. Neste momento ela vivencia situações traumáticas e diversas mudanças em sua vida cotidiana. O contexto familiar geralmente passa por um processo de fragilidade e ansiedade também, onde em alguns casos isso é passado para criança agravando seu processo de recuperação e aceitação do tratamento. Para Krammer (1986), criança como todo ser humano é um sujeito social e histórico e faz parte de uma organização familiar que está inserida em uma sociedade, com uma determinada cultura, em um determinado momento histórico, onde está profundamente marcada pelo meio social em que vive e se desenvolve. As crianças possuem uma natureza singular, onde as mesmas pensam e sentem o mundo de um jeito muito próprio. Nas interações que estabelecem desde cedo com as pessoas que lhe são próximas e com o meio que estão inseridas, as crianças revelam seu esforço para compreender o mundo em que vivem, as relações contraditórias que presenciam, através das brincadeiras, explicitam as condições de vida a que estão submetidas e seus anseios e desejos. No processo de construção do conhecimento, as crianças utilizam as mais diferentes linguagens e exercem a capacidade que possuem de terem idéias e hipóteses originais sobre aquilo que buscam desvendar, para conseguir compreender e interagir no mundo. Krammer (1986), descreve que as crianças constroem o conhecimento a partir das interações que estabelecem com as outras pessoas e com o meio em que vivem, onde o conhecimento não se constitui em cópia da realidade, mas sim, fruto de um intenso trabalho de criação, significação e re-significação da qual elas processam. As crianças estão em constante descoberta do mundo, anseiam pela aceitação social, gostam de brincar, mexer e explorar, tem medo de estranhos e de serem abandonadas pela família. Vygotsky (1984) afirma que na brincadeira a criança se comporta além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário. No brinquedo, é como se ela fosse maior do que ela é na realidade, isso porque a brincadeira, na sua visão, cria uma

1440 zona de desenvolvimento proximal, permitindo que as ações da criança ultrapassem o desenvolvimento já alcançado (desenvolvimento real), impulsionando-a a conquistar novas possibilidades de compreensão e de ação sobre o mundo. Brinquedos criam nas crianças uma nova forma de desejos. Ensinamos a desejar, relacionando seus desejos a um eu fictício, ao seu papel no jogo e suas regras. Dessa maneira, as maiores aquisições de uma criança, são conseguidas no brinquedo, aquisições que no futuro vão melhorar o seu nível de desenvolvimento, sua relação com o real e moral. Para Kishimoto (2006), a brincadeira, o jogo, o humor colocam o indivíduo em estado criativo. Entretanto, se a brincadeira que estimula a criatividade só pode florescer num ambiente de liberdade e flexibilidade psicológicas, de busca de prazer, de auto-realização, devemos concluir que o desenvolvimento daquela encontra-se profundamente vinculado aos objetivos educacionais. O brincar é apontado por vários autores enquanto expressão de primordial importância à criança, sendo seu uso preconizado na assistência em geral, e especificamente, na assistência de enfermagem. Brincar é um ato natural da criança, todas brincam e por meio destas brincadeiras desenvolvem suas capacidades motora, afetiva, cognitiva, moral e social. As diferentes formas de brincar permitem a criança hospitalizada representar seus medos, ansiedades e pode proporcionar-lhe um meio para enfrentar tal condição de estresse. Brincando, a criança, também, coloca para fora as suas emoções e personaliza os seus conflitos, ela explora o mundo, constrói o seu saber, aprende a respeitar o outro, desenvolve o sentimento de grupo, ativa a imaginação e se auto-realiza. Sabemos que o indivíduo criativo é importantíssimo para o funcionamento efetivo da sociedade, pois é ele quem pesquisa, faz descoberta, inventa e promove as mudanças. Para Macedo, Petty & Passos (2005), o brincar é fundamental para o desenvolvimento da criança, sendo a principal atividade das mesmas quando dedicadas as suas necessidades de sobrevivência (alimentação, repouso, etc). Todas as crianças brincam se não estão cansadas, doentes ou impedidas. Brincar é envolvente, interessante e informativo. Envolvente porque coloca a criança em contexto de interação com o seu corpo e suas fantasias e interessante porque canaliza, orienta, organiza as energias da criança, dando-lhe forma de atividade ou ocupação. Informativo porque, neste contexto, ela aprende sobre as características dos objetos, os conteúdos pensados ou imaginados.

1441 De acordo com Vygotsky (1984) um dos principais representantes dessa visão, o brincar é uma atividade humana criadora, na qual imaginação, a fantasia e a realidade interagem na produção de novas possibilidades de interpretação, de expressão e de ação pelas crianças, assim como de novas formas de construir relações sociais com outros sujeitos, crianças e adultos. Tal concepção se afasta da visão predominante da brincadeira como atividade restrita à assimilação de códigos e papéis sociais e culturais, cuja função principal seria facilitar o processo de socialização da criança e a sua integração à sociedade. Segundo Teles (1999), a criatividade faz com que o sujeito participe mais da vida, o que gera um sentimento profundo de felicidade, uma auto-estima positiva e uma sensação de adequação. Tudo isso, é claro, aumenta a alegria de viver. As brincadeiras aprofundam para a criança a compreensão da realidade, ao mesmo tempo em que estimula a imaginação, condições básicas para se tornarem criativas. O ato de brincar é primordial para que a criança se torne um adulto sadio, criativo, independente e feliz. Para Meyer (2003), valorizar a brincadeira é uma forma de expressão que possibilita a construção de conhecimentos pela criança. Através do brincar a criança experimenta, organiza, constrói, regula, imagina, cria e recria, o mundo que a cerca. A brincadeira é uma forma de linguagem que a criança usa para compreender e interagir consigo, com o outro e com o mundo. Os valores específicos do brinquedo e as funções a que ele serve durante a infância incluem: desenvolvimento sensório-motor, desenvolvimento intelectual, socialização, criatividade, autoconsciência, valor terapêutico e moral. Segundo Huerta (1990), brinquedos e brincadeiras não são apenas para se divertir e distrair a criança sadia ou doente, e as pessoas que com ela brincam. Brincar é também uma das maneiras principais de descoberta de si mesmo, dos outros e do mundo que a cerca. Através da brincadeira, a criança aprende, exercita sua nova habilidade, percebe coisas novas, digere medos e angustias, repete incessantemente o que gosta, explora, investiga o que está ao seu redor. Por meio do brinquedo, que é um meio de expressão por excelência, a criança exerce um papel ativo, agindo sobre o real, segundo suas fantasias, projetando no mundo externo, seus receios e angústias, com o objetivo de exercer domínio sobre eles. Assim, sendo durante a brincadeira, a criança procura em primeiro momento, dominar as experiências penosas, com o objetivo de dominar sua angustia, a criança projeta no mundo exterior seus medos e suas apreensões.

1442 A forma como a criança brinca revela sua personalidade e como está estruturando o seu relacionamento com o mundo. Brincando ela reelabora conteúdos vivenciados, para que possa reagir positivamente em relação a estás situações. Neste aspecto podemos entender que o brincar é um fator de proteção da criança. Cunha (1994), define brinquedoteca como sendo um espaço criado com o objetivo de proporcionar estímulos para que a criança possa brincar livremente, possibilitando o seu desenvolvimento dentro de um ambiente totalmente lúdico. O principal enfoque da brinquedoteca é a valorização da atividade lúdica, respeitando as necessidades afetivas da criança, estimulando o seu pleno desenvolvimento; conseqüentemente reduzindo o trauma da hospitalização. Segundo Cunha (2007), brinquedoteca é um espaço criado para favorecer a brincadeira, é um espaço onde tudo convida a brincar, manipular, e mexer. Este é um espaço onde as crianças brincam livremente, com todo estímulo á manifestação de suas potencialidades e necessidades lúdicas. Possuem muitos brinquedos, jogos variados e diversos materiais que permitem a expressão criativa da criança. Quando alguém chega em uma brinquedoteca deve se sentir tocado e atingido pela magia do local, precisa sentir que chegou a um lugar muito especial, pois ali se respeita o ser humano criança e o mistério de seu vir a ser. É um espaço que tem magia, enquanto, beleza e alegria. As finalidades de uma brinquedoteca são: proporcionar um espaço onde a criança possa brincar sossegada, sem cobranças e sem sentir que está atrapalhando ou perdendo tempo; estimular o desenvolvimento de uma vida interior rica e da capacidade de concentrar a atenção; favorecer o equilíbrio emocional; dar oportunidade à expansão de potencialidades; desenvolver a inteligência, criatividade e sociabilidade; proporcionar acesso a um número maior de brinquedos, de experiências e de descobertas; dar oportunidade para que aprenda a jogar e a participar; incentivar a valorização do brinquedo como atividade geradora de desenvolvimento intelectual, emocional e social; enriquecer o relacionamento entre as crianças e suas famílias; valorizar os sentimentos afetivos e cultivar a sensibilidade. Além de resgatar o direito á infância, a brinquedoteca tenta salvar criatividade e a espontaneidade da criança tão ameaçada pela tecnologia educacional de massa. Segundo Santos (1997), a brinquedoteca é um ambiente especialmente alegre, colorido, diferente, desafiante, um lugar onde a criança pode brincar e brincando possa desenvolver sua

1443 autonomia, criatividade, iniciativa, senso-crítico e responsabilidade, tornando-se pessoa, cultivando sua auto-estima e desenvolvendo um auto-conceito positivo. O cultivo da sensibilidade e da criatividade são indispensáveis á formação de uma personalidade íntegra e à plena realização do homem. CUNHA (1994) Sendo a brinquedoteca um espaço onde existem as melhores condições para que isto aconteça, lá as crianças podem ser livres para descobrirem novos significados, em resposta às novas experiências, ao invés de serem conduzidas para adquirir significados criados por outros. Segundo Cunha (2007), brinquedoteca hospitalar além de ser um espaço totalmente lúdico, onde a criança pode expressar seus sentimentos, explorar o mundo, sentir e experimentar, é um importante preparo para a criança voltar ao lar, principalmente, se a permanência no hospital for longa, alguns vínculos podem ser rompidos provocando um atraso no desenvolvimento infantil. Ela oferece um suporte para o enfrentamento dos diferentes comportamentos, vivenciados pelas crianças durante a hospitalização, sem julgamentos, sem perdas irreversíveis. Está possibilita viver a realidade de maneira menos traumática para criança. A brinquedoteca no hospital também pode ser utilizada pela equipe como um meio para o preparo da criança, para procedimentos invasivos ou cirurgia por meio de brinquedos e brincadeiras, permitindo que ela vivencie essas experiências. Este tipo de estratégia possibilita maior entendimento para criança daquilo que ela está vivenciando, reduz sua angustia a cerca do que vai acontecer com ela e melhora muito o seu relacionamento com a equipe. O ato de brincar pode ser entendido como terapêutico, pois cria um espaço psíquico, no qual a criança passa a vivenciar de forma ativa aquilo que viveu passivamente. A partir disto ela tem a possibilidade de ressignificar a experiência anteriormente vivida em sofrimento. No entanto, defendemos aqui não apenas a construção de espaços lúdicos a criança, pois muitas vezes encontramos brinquedotecas em hospitais que se transformam em espaços para os brinquedos. O que consideramos importante é que além dos brinquedos a criança encontre no espaço das pediatrias parceiros lúdicos, ou seja, pessoas que brinquem com as crianças, ora se calando para que ela atue, ora emprestando recursos simbólicos para o enriquecimento do brincar infantil. Assim, mais do que brinquedos, o espaço lúdico é um lugar de humanização e este só se faz possível no encontro com o outro.

1444 Enfatizamos, então, o uso do lúdico no contexto hospitalar, afirmando que é possível e viável que a instituição abra suas portas para receber toda magia terapêutica que a atividade lúdica pode proporcionar as crianças enfermas. Constatamos que a doença e hospitalização constituem uma experiência altamente estressante e traumática para a criança. O ambiente hospitalar deveria melhorar as suas condições institucionais de cuidados às crianças, já fragilizadas bio-psico e socialmente. A perspectiva deveria ser de busca, em circunstâncias e períodos de hospitalização, da melhor qualidade de oportunidade para cada criança assistida. O brinquedo utilizado de forma terapêutica através de dramatização, desenho pintura, uso de histórias e durante a própria assistência prestada a criança é possível diminuir a ansiedade da mesma. Nas brincadeiras, as crianças praticam como lidar com o complicado e estressante processo de viver, de se comunicar e de estabelecer relacionamentos satisfatórios com outras pessoas. Assim, nas brincadeiras, devemos encorajar ao máximo as fantasias utilizando-as como instrumento terapêutico. Acreditamos que através destas brincadeiras podemos descobrir qual é o processo psicológico da criança, penetrar nos recantos mais íntimos de seu ser, trazendo à luz de sua consciência o que está oculto ou o que evita e, enfim, desvendar o que ela sente a partir de sua perspectiva. Desta forma, o processo de cuidar da criança hospitalizada deve objetivar a promoção, a manutenção e a recuperação de seu processo de desenvolvimento, de modo a propiciar seu melhor funcionamento pessoal e social. Sendo assim, a brinquedoteca torna a hospitalização mais suportável e menos traumatizante para a criança, possibilitando melhor interação desta com equipe, proporcionando diversão e produzido relaxamento, ajudando à criança a sentir mais segura em um ambiente estranho, ajudando a diminuir o estresse da separação e os sentimentos de estar longe de casa, proporcionando um meio para aliviar tensão e expressar sentimentos, estimulando o seu pleno desenvolvimento, diminuindo assim, o tempo de hospitalização e, conseqüentemente, o índice de infecção hospitalar.

1445 REFERÊNCIAS CUNHA, N. H. S. Brinquedoteca: um mergulho no brincar. São Paulo: Maltese, 1994. Brinquedoteca: um mergulho no brincar. São Paulo: Aquariana, 2007. FURIATO, R. C. Uma vivência de brinquedo terapêutico no ambiente hospitalar. Pediatria Atual, v.10, n.5, maio, Editora USP: 1997. HUERTA, E. D. P. N. Brinquedo no hospital. Revista da Escola de Enfermagem. USP. São Paulo, v. 24, n. 3, dezembro, 1990. KISHIMOTO, T. M. (org). Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2006. KRAMMER, S. (et al). Com a Pré-Escola nas Mãos: uma Alternativa Curricular para a Educação Infantil. São Paulo: Ática, 1986. MATOS, E. L. M.; MUGGIATI, M.M.T.F. Pedagogia hospitalar. Curitiba: Champagnat, 2001. MACEDO, L.; PETTY, A.L.; PASSO, N. C. Os jogos e o lúdico na aprendizagem escolar. Porto Alegre: Artmed, 2005. MEYER, I. C. R. Brincar e viver: projetos em educação infantil. Rio de Janeiro: WAK, 2003. ORTIZ, L.C.M. e FREITAS, S.N. Classe hospitalar: caminhos pedagógicos entre saúde e educação. Santa Maria: UFSM, 2005. SANTOS, S. M. P dos (org). Brinquedoteca: o lúdico em diferentes contextos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1997. Brinquedoteca: a criança, o adulto e o lúdico. Petrópolis: Vozes, 2000. SIGAUD, C. H. S. (Org.) Enfermagem pediátrica: o cuidado de enfermagem à criança e ao adolescente. São Paulo: EPU, 1996. TELES, M. L. S. Socorro! É proibido brincar! Petrópolis: Vozes, 1999. VIGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.