UMA HISTÓRIA DA TELEFONIA NO RIO DE JANEIRO (1930-1962)



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Transcrição:

UMA HISTÓRIA DA TELEFONIA NO RIO DE JANEIRO (1930-1962) Ana Christina Saraiva Iachan Doutoranda HCTE/ UFRJ anacsi@superig.com.br 1. A Telefonia no Rio de Janeiro O ano de 1877 é o marco inicial da telefonia no Brasil, quando foi instalada a primeira linha telefônica na cidade do Rio de Janeiro, logo após sua invenção em 1876. No Brasil, até a década de 1930, a evolução tecnológica e do negócio da telefonia foram lentas. As ligações telefônicas eram feitas de maneira totalmente manual, através de telefonistas que manipulavam painéis nas centrais telefônicas manuais. Somente em 1930 a cidade do Rio de Janeiro pôde contar com a sua primeira central automática, possibilitando que os usuários completassem ligações locais sem o auxílio das telefonistas. O aparelho telefônico gerava, durante a discagem, pulsos elétricos que possibilitavam o encaminhamento da chamada, passo a passo, pelos seletores eletromecânicos da central telefônica. A história da telefonia no Rio de Janeiro, durante as primeiras seis décadas do século XX, está intimamente ligada a de uma empresa: a Companhia Telefônica Brasileira. Essa empresa foi o braço de telefonia do grupo canadense Brazilian Traction Light and Power (LIGHT), que operava também os serviços de eletricidade, gás e bondes em grande parte do Sudeste. 2. O Amadurecimento do Setor Vitoriosa a Revolução de 1930, houve um fortalecimento do Executivo e a transferência para o governo federal de funções antes desempenhadas pelos governos estaduais. A nova concepção do papel do Estado como propulsor do desenvolvimento determinava a sua intervenção na economia, mas a situação na telefonia não foi alterada e o grupo LIGHT, através da Brazilian Telephone Company, permaneceu exercendo seu monopólio na capital federal. O foco principal da regulamentação criada pelos Decretos nº 20.047 e nº 21.111 de 1931 e 1932, respectivamente, eram as atividades de radiodifusão e não a telefonia (BRASIL, 1931, 1932). Desde os primeiros contratos de concessão de exploração de serviços públicos, haviam sido incluídas cláusulas que impunham, nos serviços e produtos oferecidos no território brasileiro, o preço internacional e a conversão em moeda estrangeira. O Decreto nº 23.501 de 1933 cancelou para todos os contratos a polêmica cláusula OURO, impactando, assim, a remuneração das concessionárias estrangeiras (BRASIL, 1933). A partir de 1931, acompanhando o ritmo de recuperação da economia, começou uma pequena expansão do sistema, visando atender ao segmento de empresas. A Companhia Telefônica Brasileira instalou o primeiro grande PABX (Private Automatic Branch Exchange) em empresa particular, com 40 ramais internos. Todo o equipamento utilizado era importado, assim como o material de reposição. A administração e as atividades técnicas eram lideradas por profissionais estrangeiros indicados pela matriz canadense (SINO AZUL, 1930). Na década de 1930, os serviços telefônicos ainda eram usados por uma pequena parcela da população. Somente em 1935 que o primeiro posto telefônico público entrou em atividade no Rio de Janeiro, instalado na antiga galeria Cruzeiro. Os telefones de uso público

foram instalados aos poucos em estabelecimentos comerciais, ampliando, assim, a oferta de serviços telefônicos à população. Em novembro de 1937, foi instaurado o Estado Novo, o qual estabeleceu um poder forte e autoritário e reforçou o intervencionismo estatal na economia e na vida social iniciado em 1930. Embora a telefonia não tenha sido afetada diretamente pelas reformas introduzidas, a expansão e a qualidade dos serviços passaram a ser alvo de atenção governamental. O Decreto nº 5.144 de 1942 demonstra essa atenção, determinando que nenhuma concessão de serviço devesse ser outorgada sem que fossem seguidas normas que garantissem a qualidade e a continuidade dos serviços (BRASIL, 1942). 3. A Deterioração da Rede e a Falta de Expansão Em 1939, o Brasil contava com 300 mil telefones, sendo 100 mil do Rio de Janeiro. No mundo, já existiam 41 milhões, com cerca de 50% instalados nos Estados Unidos. Nova Iorque, sozinha, tinha cinco vezes mais telefones que o Brasil inteiro. O número de telefones na cidade do Rio de Janeiro, na década de 1940, cresceu mais de 87,6%, passando de 113 para 212 mil aparelhos (KESTELMAN, 2002: 230). Essa taxa era bem superior à do crescimento de domicílios, que fora de 29,8%. Com isso, o incremento da demanda por telefones superava em muito o crescimento da população. A eclosão da Segunda Guerra Mundial afetou a prestação de serviços telefônicos, devido à dificuldade de importação de equipamentos. A Constituição de 1946 restaurou o princípio federalista, estabelecendo a divisão de atribuições entre a União, os estados e os municípios (ABREU, 2001: 1571). A regulação e a exploração dos serviços locais de telefonia permaneceram sob a responsabilidade dos estados, que poderiam repassá-las para os seus municípios. No segundo Governo Vargas (1951-1954), o discurso de defesa dos interesses nacionais e de combate à participação estrangeira na esfera econômica, principalmente nos serviços públicos, tornou-se dominante entre as lideranças populares. O serviço telefônico na capital federal era falho, insuficiente para atender à demanda, mas ainda assim era o melhor do Brasil. Como sede do governo, a cidade do Rio de Janeiro era naturalmente o alvo prioritário de reclamações (OLIVEIRA, 1992: 32). A degradação dos serviços telefônicos atingiu tal ponto que passou a ser considerada um gargalo ao desenvolvimento econômico do país. 4. A Crise na Cidade do Rio de Janeiro Em 1953, a prefeitura do Distrito Federal e a CTB celebraram um novo contrato de concessão com novas regras, obrigações e, inclusive, um cronograma de expansão. (OLIVEIRA, 1992: 226). O prefeito Negrão de Lima (1956-1958) estabeleceu em 1956 uma comissão fiscalizadora para averiguar a real situação. O relatório nº 2 da Comissão apontava que a concessionária não estava interessada em obter novos recursos, fosse por aumento de capital social ou pela obtenção de novos empréstimos, e que o Fundo de Encampação, constituído pela contribuição compulsória de 4% sobre a conta mensal dos assinantes, não se configurava como gerador de recursos para a expansão necessária. A Comissão elaborou, em conjunto com a CTB, um plano para a instalação dos novos telefones, considerando, inclusive, os custos de importação, pois praticamente inexistia uma indústria nacional de equipamentos. O problema da CTB no Rio de Janeiro era visto, também, em outros serviços públicos de outras localidades. O Governo Kubitscheck (1956-1961) acompanhou de perto a ação da Prefeitura do Distrito Federal. Para JK, as dificuldades nas comunicações dificultavam o

desenvolvimento almejado pelo seu Plano de Metas. Em 1956, o Decreto nº 40.439 de 1956 procedeu à nacionalização da CTB, mas o controle acionário continuou com a LIGHT canadense, não alterando a situação de precariedade operacional (BRASIL, 1956). O principal problema apontado na época era a insuficiência das tarifas para cobrir a operação e a expansão da rede. As fontes de financiamento para o setor eram escassas e o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE) não possuía linha de crédito para a telefonia. O Decreto Federal nº 41.800 de 1957 criou uma comissão responsável pelo estudo da expansão dos serviços telefônicos em todo o país (BRASIL, 1957). Os estudos foram encaminhados ao Estado Maior das Forças Armadas (EMFA) como subsídio à implantação das comunicações em Brasília (OLIVEIRA, 1992: 39). A Lei nº 3.683 de 1959 que concedeu incentivos à produção de equipamentos de telecomunicações, representou a primeira iniciativa para o estabelecimento de uma indústria nacional de equipamentos de telecomunicações (BRASIL, 1959). 5. As Disputas Políticas pela Telefonia Até o início da década de 1960, a CTB ainda conseguiu fazer instalações de novos terminais. No entanto, a pressão, gerada não só pela demanda reprimida como pelo surto de crescimento industrial que ocorria no país, causou um impacto na qualidade dos serviços, levando à demora para a obtenção do tom de discar a 30 minutos no centro da cidade do Rio de Janeiro (TELERJ, 1995: 3-37). A resolução dos problemas que afetavam a capital federal era vista como um indicativo de eficiência da administração e de sua capacidade em resolver os problemas do país. Logo após sua posse como primeiro governador da Guanabara, em dezembro de 1960, Carlos Lacerda (1960-1965) procurou a direção da CTB para solucionar o problema da falta de telefones. Como não obteve sucesso, nomeou uma Comissão de Intervenção a fim de efetuar um levantamento técnico-financeiro da empresa. No Rio Grande do Sul, a situação das telecomunicações também era precária. A concessionária local era a Companhia Telefônica Nacional (CTN), controlada pela norteamericana International Telephone and Telegraph (ITT). O governador Leonel Brizola (1959-1963) também procurou a CTN com o objetivo de resolver a situação da crise na telefonia. O presidente Jânio Quadros (1961) foi alertado sobre a possibilidade de Lacerda, caso assumisse o sistema telefônico do Rio de Janeiro, controlar as comunicações de todo o país (OLIVEIRA, 2005; SILVA, 1990: 17). Jânio criou um grupo de trabalho para estudar a situação dos serviços telefônicos em âmbito nacional, o qual elaborou o Plano Nacional de Telefonia, que propunha a criação de um órgão central de supervisão. Em maio de 1961, foi criado o Conselho Nacional de Telecomunicações, subordinado ao Presidente da República, passando esse a centralizar as decisões sobre as telecomunicações em âmbito nacional englobando: telefonia local, interestadual, internacional, integração nacional, formação de indústria no Brasil e geração de mão-de-obra especializada. A Comissão de Intervenção da CTB procurou o grupo para apresentar a solução para a Guanabara, que seria a criação de uma empresa estadual de economia mista. A proposta foi rechaçada, pois o grupo desejava dar uma solução global, e não em separado por estado. Em dezembro de 1961, o BNDE iniciou negociações com a COBAST, representante brasileira da Brazilian Traction, para a compra da CTB. Em março de 1962, Lacerda convocou o presidente da empresa, Antônio Galotti, e propôs-lhe a compra das ações. Galotti recusou, informando que estava negociando com o BNDE a compra de toda a empresa. Em represália, Lacerda ameaçou de desapropriação todos os bens da empresa na Guanabara. Em 30 de março de 1962, Lacerda baixou o Decreto nº 940 de 1962, declarando de utilidade pública para fins de desapropriação todos os bens da Companhia Telefônica

Brasileira (OLIVEIRA, 2005; SILVA, 1990). No dia seguinte, mediante o Decreto nº 814 de 1962, foi executada a intervenção federal na CTB com o argumento de que os serviços interestaduais dependiam da eficiência dos serviços locais e que estes eram deficientes na área de concessão da companhia (BRASIL, 1962). As disputas entre o governo federal e os governos estaduais para controle das telecomunicações continuaram, sendo levadas, no caso da CTB, à justiça para deliberação sobre a legalidade da intervenção. Através do Decreto nº. 13.186 de fevereiro de 1962, o governo do Rio Grande do Sul cassou as concessões e desapropriou os bens da CTN (BRASIL, 1962). A desapropriação da CTN criou um problema nas relações entre o governo brasileiro e o norte-americano, pois feria o artigo 6º do Foreign Aid Act dos EUA, já que não houvera garantia de justa compensação. Em abril de 1962, Jango viajou a Washington para buscar recursos financeiros e discutir os temas que afetavam as relações entre os dois países, entre eles a nacionalização de empresas norte-americanas. O governo não desejava que o problema causado pela encampação da CTN se repetisse. Derrotado na sua luta pelo controle da CTB, Lacerda assinou, em 24 de dezembro de 1962, a Lei estadual nº 263, criando a Companhia Estadual de Telefones - CETEL (OLIVEIRA, 2005; SILVA, 1990). Em 20 de janeiro de 1963, foi estabelecida a área de concessão da CETEL, cobrindo toda a região que não era atendida pelo serviço automático da CTB, como a Ilha do Governador, Barra da Tijuca, Jacarepaguá e Zona Oeste. A CTB continuou sob intervenção federal, somente em 1966 foram completadas as negociações para sua compra, ficando a recém criada EMBRATEL (1965) como principal acionista. 6. À Guisa de Conclusão Percorremos, assim, pouco mais de três décadas da trajetória da telefonia no Rio de Janeiro. E vimos como, no início da década de 1960, a telefonia foi alvo de acirradas disputas políticas. Referências Bibliográficas ABREU, A. A. Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós-1930. Rio de Janeiro: FGV, 2001. v. 5. BRASIL. Decreto do Conselho de Ministros nº 814, de 31 de março de 1962. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 2 abr. 1962. Seção 1, p. 3732. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/legin/fed/decmin/1960-1969/decretodoconselhodeministros- 814-31-marco-1962-352877-publicacao-1-pe.html>. Acesso em: 20 nov. 2010. BRASIL. Decreto do Conselho de Ministros nº 13.186, de 13 de setembro de 1962. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 13 set. 1962. Seção 1, p. 9563. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/legin/fed/decmin/1960-1969/decretodoconselhodeministros- 1386-13-setembro-1962-352530-publicacao-1-pe.html>. Acesso em: 20 nov. 2010. BRASIL. Decreto Federal nº 41.800, de 9 de julho de 1957. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 9 jul. 1957. Seção 1, p. 17173. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/legin/fed/decret/1950-1959/decreto-41800-9-julho-1957-380596-publicacao-1-pe.html>. Acesso em: 19 nov. 2010. BRASIL. Decreto nº 20.047, de 27 de maio de 1931. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 6 jun. 1931. Seção 1, p. 9385. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-20047-27-maio-1931-519074-publicacao-1-pe.html>. Acesso em: 20 nov. 2010.

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