Métodos classificatórios dos indígenas do Brasil do póscontato: uma rápida revisão bibliográfica Juvandi de Souza SANTOS 1 1 Historiador e Arqueólogo. Doutor em Arqueologia pela PUC/RS. Diretor do LABAP/UEPB. E-mail: juvandi@terra.com.br
MÉTODOS CLASSIFICATÓRIOS DOS INDÍGENAS DO BRASIL DO PÓS-CONTATO: UMA RÁPIDA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA RESUMO O presente artigo apresenta como principal objetivo o de realizar um breve levantamento historiográfico acerca das inúmeras tentativas que foram feitas para classificar os indígenas do Brasil, especialmente aqueles contactados. Para tanto, buscamos subsídios nos referenciais teóricos dos cronistas que escreveram acerca dos grupos humanos pretéritos do que hoje é o Brasil, desde os primórdios da colonização até pesquisadores que estudaram e ainda estudam a temática nas últimas décadas. PALAVRAS-CHAVE: Cronistas, indígenas, contato. ABSTRACT This article presents as the main objective to carry out a brief survey about the historiographical numerous attempts that have been made to classify the indigenous people of Brazil, especially those contacted. To this end, we seek the theoretical benefits of the chroniclers who wrote about the human past tense groups of what is now Brazil, since the beginning of colonization to researchers who have studied and still studying the issue for decades. KEY-WORDS:. Chroniclers, Indigenous, Contact
CRONISTAS, HISTORIADORES, ANTROPÓLOGOS E ARQUÓLOGOS E SEUS MÉTODOS CLASSIFICATÓRIOS. Do século XVI aos nossos dias, inúmeras tentativas em classificar os indígena do Brasil contactados pelos europeus foram feitas, mas sem que surtisse grandes efeitos. Qualquer classificação é excludente e seletiva. No entanto, visa enquadrar os grupos humanos em troncos com traços comuns. São essas características que destinguem os grupos humanos. Martius esboçou uma classificação partindo do princípio que os lusos primeiramente os classificaram e os agruparam-nos em nações aqueles que podiam compreender-se reciprocamente, mesmo que de tribos diferentes, geralmente sendo agrupados por falantes de uma mesma língua ou dialetos aparentados. Alertaram os naturalistas que tal classificação não pode e não deve ser admitida como uma verdade geral, pois eram comuns as misturas étnicas e os deslocamentos, motivados por guerra e/ou acordos de paz (MARTIUS, 1938, p. 22). Em documento português do século XVI, escrito por Gaspar Soares, enumeravam-se apenas três povos no Brasil: os Tupis divididos em nove tribos (SOARES, 1825), seria o principal. No ano de 1633 Lactéus já enumerava 76 nomes de diversas nações e século e meio depois, Hervas acredita poder admitir pelo menos 150 línguas e dialetos e, portanto, igual número de povos e tribos (MARTIUS, 1938, p. 22). A terra de Pindorama 2, se comparado com o reino português, era bastante povoada. Coube aos Tupis, habitantes de parte do Litoral e estendendo-se também para os Sertões, transmitir aos colonizadores de que o mundo dos indígenas, a Pindorama, estava dividido em dois grandes grupos: os do Litoral, falavam o abanheén, ou língua de gente, e os que viviam no interior e eram selvagens (AQUINO, 2000, p. 39). Aos primeiros designaram-se de Tupis e aqueles dos Sertões ou do interior foram chamados de Tapuias, ou inimigos. Aquino (2000) recorre a três critérios básicos para classificar os indígenas do Brasil: A 984, pp. 25-26) três grandes grupos linguísticos foram identificados no Brasil, que sintetizaremos a seguir: a-1 -Guarani pode ser considerada como principal, Jurema, Tupari, Ariquem, Puruborá, Mondé e Ramorana; 2 Um dos oitos nove nomes que recebera o território do Brasil, antes de 1527, quando, em definitivo, passa-se a chamar-se Brasil.
a-2 -se quatorze povos que falam a língua Aruaque mais os Arauás; a-3. Tronco Macro- -se os Caiapós, os Timbiras e os Acuéns (Xavantes e Xerentes). Fazem parte ainda os Bororos, Maxacalés, Fulniôs e Carajás. O autor não inclui neste tronco alguns grupos denominados de Tapuias, a exemplo dos Cariris e Tarairiús. Além desses troncos linguísticos, Aquino nos noticia de que numerosas tribos não tiveram ainda suas línguas classificadas em troncos e/ou famílias: Caribes, Tucanos, Panos, Guaicurus, Nhambiquaras e outros grupos que não foram contactados, devido, provavelmente, a extinção rápida. B. tratando de atividades comparativas. Chegou-se a um tipo físico da população pré-histórica e histórica brasileira, enquadrando-se no tipo mongol, ou seja, grupos humanos procedentes da Mongólia, mas isso não quer dizer que inexistiram outros tipos. O autor, nesse sentido, limita suas observações praticamente a uma única onda migratória de povos oriundos daquela região da Ásia. C. citado por Ribeiro (1984) e Aquino (2000), quem melhor apontou essas características que distinguem os aspectos culturais dos inúmeros povos do Brasil no pré e pós-contato, devido a vários fatores: 1. não apresentam um modo de vida uniforme, ao contrário, quando do contato existiam grupos vivendo em pleno Paleolítico e outros no Neolítico; mesmo as tribos de uma mesma família linguística se diferenciavam em inúmeros aspectos sócio/culturais e tribos que falavam língua ou dialetos diferentes se aproximavam muito mais no tocante aos usos e costumes, por viverem, segundo Ribeiro (1984,p. 26), em regiões contíguas, criando a noção de área cultural que, segundo a Antropologia, seriam as unidades geográficas de cultura. O conceito de área cultural acaba por dar ênfase a difusão como veículo cultural, sem que essa característica seja única ou superior em importância as outras demais características capazes de traçarem o perfil cultural de um grupo. De certa forma, não está incorreto afirmar que regiões homogêneas, pelo menos ecologicamente falando, abrigaram grupos humanos com características comuns capazes de serem identificadas e utilizadas como parâmetros classificatórios de um perfil cultural do grupo. Quase sempre, os grupos apresentavam certos traços culturais de apresentação que os distinguiam dos demais, mesmo vivendo numa certa área ecológica. Mas não se pode esquecer de que, assim como as classificações linguísticas, as
culturais tropeçam em grandes dificuldades devido, justamente, às variações que se apresentam os grupos humanos. Barral (1971, p. 5) afirma que: Uma classificação é mais sólida quanto mais caracteres ela possa dispor, porém acrescenta simultaneamente que muitos caracteres variáveis obtidos com as únicas disponibilidades de apreciação individual, trariam confusão... Em suma, é necessário ter dados e/ou materiais suficientes para a elaboração de qualquer classificação tipológica ou de grupos culturais. Corremos esse risco ao fazermos uso de tão poucos materiais, indícios arqueológicos para traçar o perfil cultural de um grupo. Nenhuma classificação pode, nesse sentido, ser identificada como definitiva, podendo ser ampliada e/ou alterada à medida que novos dados aparecem. Estêvão Pinto (1935) classifica os indígenas do Nordeste em Tupi (ocupantes do Litoral) e no interior ou Sertões (pelos Cariris e Jês), existindo tribos Cariri no Litoral. Thomaz Pompeu Sobrinho (1935) definiu três áreas culturais distintas no Nordeste do Brasul no pós-contato: 1. o Litoral, com predominância dos Tupis; 2. a região sublitorânea, que em algumas áreas predominava os Tupis e em outras áreas os Tapuias Tarairiús; 3. e os Sertões, era de domínio dos Cariris. Tal classificação é de âmbito geral e não pontual o que deixa brecha para críticas, pois essas áreas territoriais são gigantescas. Para essas classificações faz-se uso da historiografia colonial, especialmente a portuguesa e a holandesa, e de fontes secundárias mais recentes obtidas da liguística e da etnologia. Ao se utilizar tais informações, esses autores correm sérios riscos de caírem no discurso oficial europeu, desprezando a visão e os interesses dos outros. Debret (1834) classifica os indígenas do Brasil em dois grandes grupos: Tupis, do Litoral, os que mantiveram contato imediato com os colonizadores e os Tapuias, os indígenas do interior, povo aguerrido que anteriormente teriam vivido no Litoral. Essa classificação é baseada na preocupação de classificação linguística dos Padres Jesuítas. Van Den Steinen baseia sua classificação na de von Martius (1938). Steinen propôs uma revisão e uma reclassificação dos indígenas do Brasil, em: Tupi, Guarani, Ge (Jê), Carige e Nu- Aruaque. Ehrenreich foi mais além e propôs uma classificação também baseada na proposta de Martius, que transpassasse as fronteiras territoriais do Brasil, englobando a Venezuela, Guianas
e Antilhas, enquadrando os indígenas em três grandes grupos: Tupi-Guarani, Caribe e Nu- Aruaque. Os Jês estariam inseridos dentro das três famílias linguísticas. Para d Orbigny, os indígenas das Américas estariam divididos em três raças : 1. Ando- Peruana; 2. Índio-Pampa; 3. Brasílio-Guarani (MARTIUS, 1938, pp. 15-16). Berta Gleiza Ribeiro em sua obra O índio na história do Brasil (1984), aponta três critérios classificatórias para estudar os indígenas, especialmente aqueles extintos, baseado nos relatos literários, na Arqueologia e os remanescentes destes: 1. O tipo físico do indígena (seus caracteres raciais) - Enquadram-se os primitivos habitantes das Américas na raça mongolóide, tendo a mesma origem de inúmeros povos asiáticos como: japoneses, chineses e outros; 2. O critério linguístico reconhece-se três grandes troncos linguísticos (línguas mães das quais se originaram outras línguas e dialéticas) no Brasil, sendo: a. Tronco Tupi divide-se em sete famílias, sendo o tronco Tupi-Guarani o mais importante, principalmente em termos de quantidade de indivíduos que falavam ou ainda falam a língua no Brasil e adjacências; b. Tronco Macrojê inclui-se a família linguística Jê, aparecendo outras línguas: Kayapó, Timbira e Akuen (Xavante e Xerente), mas quatro famílias menores; c. Tronco Aruak faz parte a família linguística Aruak, sendo esta a que apresenta uma maior diversificação de línguas. A família Arawá também faz parte deste tronco. Existem ainda as línguas pouco estudadas e não enquadradas em nenhum tronco linguístico dos citados anteriormente. São elas: Karib, Tukâno, Pano, Xirianá, Txapakura, Mura, Maku, Nambikwáro e Guaikuru. As línguas consideradas isoladas, de acordo com o linguista Arion Dall Igna Rodrigues (CABRAL e RODRIGUES, 2005), em número de cinco, não existem informações suficientes para que se possa classificá-las e treze que não mais existem indivíduos falantes, sendo que a grande maioria está no Nordeste do Brasil. Esta classificação data do ano de 1972 e fora feita baseada em estudo de remanescentes indígenas. O Critério classificatório baseado nas diferenças culturais não existe uma unidade cultural entre os indígenas do Brasil, o que geralmente acontece é que povos de etnias diferentes, mas que vivem numa região contígua, podem apresentar alguns traços culturais parecidos, como os Cariris e Tarairiús da Paraíba, criando certa unidade geográfica cultural, de acordo com a Antropologia. H. Steward (RIBEIRO, 1984), classifica os povos do continente Americano em quatro
grandes grupos culturais: 1. caçadores e coletores tornados agricultores; 2. aldeias agrícolas da floresta tropical; 3. povos circum-caribe; 4. civilizações dos Andes. Os grupos culturais do Brasil, segundo esse autor, seriam os dois primeiros. Com relação às tribos de coletores-caçadores (agricultores), Ribeiro (1984, p. 26) afirma que estas habitavam a região do cerrado. Entende-se que muitos autores chamam as caatingas de cerrado; os grupos Tapuias Cariris e Tarairiús se enquadram nesta classificação, tais povos praticavam uma agricultura ainda incipiente, mas sem se desprenderem das atividades de caça, coleta e pesca. Afirma Ribeiro (1984) que tais povos apresentavam equipamentos culturais mais simples, como a ausência de cerâmica, tecelagem, redes, canoas etc; ao contrário, estes povos apresentavam características culturais complexas, pois consta-nos que ao menos os Cariris e os Tarairiús dominavam os elementos mais simples da cultura material: cerâmica, construções de canoas, redes etc. Hélio Vianna (1945, p. 57) afirma que a primeira distinção dos indígenas do Brasil advém da observação linguística: havia, portanto, a língua geral (nheengatu) característica dos Tupis e as falantes dos Tapuias, os povos das línguas travadas (nheengaíba). Segundo Rugendas (1959, p 62), três raças de indígenas existiram na América Meridional: na parte mais a Norte, os Caraíbas; ao Sul, as tribos da região polarizada pelo Chile; no Brasil, numerosoas tribos que se assemelham com os mongóis. Data de 1959 a classificação por áreas culturais dos remanescentes indígenas do Brasil do século XX, de Eduardo Galvão, visto por Ribeiro (1984) como uma das mais importantes classificações do Brasil. A classificação de Eduardo Galvão levou em consideração o fator aculturação. Ele divide o Brasil em onze áreas culturais diferentes, com suas respectivas subáreas: 1. Norte-Amazônica; 2. Juruá-purus; 3. Guapé; 4. Tapajós-Madeira; 5. Alto-Xingu; 6. Tocantis-Xingu; 7. Pindaré-Gurupi; 8. Paraguai (chaco); 9. Centro-oeste; 10. Tietê-Uruguai; 11. Nordeste. Como sua classificação é feita em cima de grupos remanescentes, no Nordeste, aparece, no caso da Paraíba, apenas o grupo étnico Potiguara, do tronco-linguístico Tupi- Guarani. Data de 1957 a classificação proposta por Darcy Ribeiro, que tomou por base a situação de contato com a sociedade nacional das tribos que sobreviveram até nossos dias (RIBEIRO, 1984, p. 27). Darcy Ribeiro classifica os indígenas do Brasil em: 1. grupos isolados são aqueles denominados de hostis, que os sertanistas ainda não conseguiram o contato; 2. grupo
em contato intermitente tribos contactadas em áreas isoladas e que, na época da classificação, encontravam-se a salvo das incursões do desbravadores, graças, segundo Darcy Ribeiro, a ação dos órgãos do governo e dos sertanistas; 3. grupos em contato permanente são as tribos que mantêm contato com os colonizadores, mesmo mantendo alguns traços de sua cultura material; 4. grupos integrados são os grupos que já perderam totalmente suas características naturais, mas mantêm alguns laços com suas tradições indígenas. São grupos que dependem totalmente do contato com o branco para sua sobrevivência econômica. Enquadramos, aqui, os remanescentes Potiguaras da Paraíba. Rondon (1953) trabalhou com a hipótese da existência de vários grupos linguísticos existentes no Brasil no pós-contato, principalmente aqueles grupos do final do século XIX e primeiras décadas do século XX (Quadro 1): GRUPO LINGUÍSTICO Jê (GÊ) Caraíba Tupi Alófilo Arauáque Nhambiquara EXEMPLO DE TRIBO Animoré Anauquá Anêtí Umutina Caripuna Nhambiquara Quadro 1 - Grupos linguísticos e tribos, segundo Rondon. Fonte: Rondon (1953, pp. 340-343). Rondon limitou suas atividades de pesquisas nas áreas Centrais e Norte do Brasil. Portanto, as tribos expostas no quadro 1, ligadas aos seus respectivos grupos linguísticos, limitam-se a essas regiões dos Sertões do Brasil. O Marechal Cândido Rondon (1953, p. 30) acreditava serem os indígenas filiados ao grupo Tupi mais adiantado, tecnicamente falando, do que os indígenas pertencentes ao tronco linguístico Gê (Jê), que seriam dos Sertões do Centro/Norte do Brasil, os antepassados dos Nhambiquaras, vistos ainda na época de Rondon, século XX, como hostis. Cândido Rondon (1953, p. 195) dividiu os indígenas do Brasil existentes em sua época em três grupos gerais, a saber: 1º OS SILVÍCOLAS São os indígenas que vivem nas selvas, quer nos campos, quer nas matas;
2º OS ORÍCOLAS Aqueles que habitavam as margens dos rios, navegáveis ou não; 3º OS FLUMINÍCOLAS Aqueles que residem diretamente nas praias e em ilhas nos meios dos rios. Frei Vicente do Salvador (1937) vê os índios pertencentes ao tronco linguístico (Jê) como independentes dos Cariris. Segundo alguns cronistas, teria sido Martius o identificador desse grupo linguístico, que teria tirado a denominação Gê ou Gué de muitas tribos, praticamente restritas ao Brasil. Grupos tribais como os Apinagés, Craós, Acuens de Goyaz, Suyás do Xingú, Cãigãgs, os Coroados do Rio Grande do Sul, os Botocudos do Espírito Santo e Minas, Cayapós, Ibirajaras, Bilreiros ou Caceteiros fariam parte desse imenso tronco linguístico, mas deixando de fora vários grupos Tapuias que serão enquadrados, a posteriores, por etnólogos e historiadores nesse tronco linguístico, como os Cariris e os Tarairiús. Para Frei Vicente do Salvador os grupos linguísticos do Brasil teria sido apurado, até o momento da sua corografia, oito grupos linguísticos: Tupis-Guaranis, Guaycurús, Maipures ou Nu-aruaks, Cariris, Gês, Carahibas, Pano e os Betoyas. Frei Vicente do Salvador vê os Cariris como um grupo étnico adverso dos Gês, com características próprias. Segundo ele, os Cariris seriam: Primeiros habitantes de grande extensão do litoral, onde ainda os Portugueses os encontravam em partes do Maranhão e do Ceará e à esquerda do baixo São Francisco, alhures já repelhidos para o sertão antes da chegada dos europeus. Começavam pelo menos no Paraguaçú e chegaram talvez ao Itapucurú no Maranhão. Parecem de todo extinctos e não ter tido representantes fora do Brasil. Lucien Adam publicou um estudo comparativo da língua, Paris, 1897 (SALVADOR, 1937, p. 10). É interessante perceber que Frei Vicente de Salvador escreveu este relato entre os séculos XVI e XVII e, naquele período, já via os Cariris como um grupo étnico praticamente extinto, sem que, no entanto, aponte os motivos, mas provavelmente seriam os mesmos já relatados por inúmeros cronistas do período: os descimentos, apresamento, limpa do terreno, escravidão e aculturação. Julio Cézar Melatti (1989, p. 33), levando em consideração o critério de classificação através da questão linguística, afirma que vem dos primeiros colonizadores, especialmente dos padres missioneiros, adotando-se os preconceitos dos indígenas Tupis do Litoral contra aqueles grupos internados nos Sertões, denominavam-nos de Tapúyas, ou seja, os grupos humanos que apresentavam uma grande diversidade de línguas. Outra importante forma de classificar os indígenas do Brasil, segundo Melatti, é através do tipo genético. Essa classificação reúne as línguas aparentadas de origem comum e
reunidas numa mesma família. Nesse caminho, o principal trabalho parece ser o de Greenberg. Denise Monteiro (2000, p. 20) afirma que na época do contato, os indígenas do Brasil se dividiam em quatro grandes troncos linguísticos: Tupi, Macro-Jê, Arauaque e um quarto tronco sendo formado pela gama de grupos humanos denominados de indivíduos pertencentes as línguas independentes, não classificadas ou pouco conhecidas e estudadas. Pedro Puntoni (2002, p. 49), afirma que existiu no Brasil quatro grandes grupos linguísticos: Arawaq, Karib, Tupi e Jê. Nesse sentido, Tupi e Tapuia se inserem numa nova e mais dinâmica divisão: Macro-Tupi e Macro-Jê, existindo as outras famílias lingüísticas menores: Mura, Tukano, Pano, etc. Ricardo Pinto de Medeiros (2000) aponta que houveram inúmeras tentativas em classificar os indígenas do Brasil no pós-contato. Basicamente utilizou-se critérios, como: o linguístico, o de reação ao contato, o de grupos ou raças e as mais modernas e utilizadas atualmente a classificação genética das línguas do Brasil, de Aryon Dall Igna Rodrigues, a classificação de Darcy Ribeiro, levando em consideração as semelhanças dos indígenas no póscontato e a classificação por área culturais, de Eduardo Galvão. O autor ainda coloca dos riscos em trabalhar com parâmetros classificatórios, pois ao classificar, define-se o perfil cultural do grupo. Desta feita, trabalharemos com a hipótese que os indígenas Cariris e Tarairiús pertenciam ao tronco-linguístico-cultural Macro-Jê. Ricardo Pinto (2000) aceita que existiu no Brasil quatro grupos linguísticos: Arawak, Karib, Tupi e Jê, além de vários grupos menores, além dos isolados e os desligados de famílias. Alerta o autor que vários grupos podem falar a mesma língua ou dialéticos próximos e apresentarem costumes diferentes. De forma geral, percebe-se, portanto, ter havido em data e local ainda incerto, certo processo de dispersão linguístico em todo o Brasil, pois o próprio grupo Jê seria uma ramificação do Macro-Jê, talvez dispersado a mais ou menos três mil anos atrás, bem como de outros grupos. O enquadramento de grupos indígenas, como os Cariris e Tarairiús no tronco-linguísticocultural Macro-Jê, mas com características e línguas diferentes, talvez esteja ligado a um passado comum, bem como algumas semelhanças culturais existentes entre eles. Acreditamos, enfim, ter havido uma certa homogenização cultural entre vários grupos Tapuias dos Sertões do Nordeste, havendo uma certa influência mútua via contato esporádico e contínuo, desenvolvendo semelhanças, mas se reconhecendo como povos diferentes, mas cada grupo vivendo numa dada área cultural, como bem classifica Elias Borges (1993) ao elaborar seu
famoso cartograma apontado na Figura 1: Figura 1: Cartograma de Elias Borges em que classifica e localiza os grupos indígenas da Paraíba no pós-contato. Fonte: Borges (1993). CONSIDERAÇÕES FINAIS O breve artigo não se propõe a colocar um ponto final na temática, que é complexa, acerca da tentativa de classificar e ao mesmo tempo indicar quantos e quais grupos humanos habitaram o território do Brasil, especialmente no pós-contato. Ao contrário, levantamos dúvidas ao mostrarmos a miscelânea de tentativas de classificar os grupos humanos. Sendo assim, acreditamos que o presente artigo apresenta a serventia de instigar novos pesquisadores em clarear melhor tão complexa problemática e, proporcionar aos futuros estudiosos da temática, melhores subsídios e conhecimentos da imensidade, da grandeza cultural e da pluralidade dos grupos humanos do Brasil, entendendo assim, como se deu seu processo de dispersão pelo território, extinção, aculturação e sobrevivência. REFERÊNCIAS AQUINO, Rubim Santos Leão de. Os primeiros povoados do nosso continente. In: AQUINO, R. S. L. de. et al. Os primeiros brasileiros. Rio de Janeiro: Record, 2000. pp. 33 66.
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