Fair Trade: Um estudo exploratório de suas origens, características e relação entre seus principais agentes



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FAIR TRADE: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO DE SUAS ORIGENS, CARACTERÍSTICAS E RELAÇÃO ENTRE SEUS PRINCIPAIS AGENTES educesar_muz@hotmail.com Pôster-Estrutura, Evolução e Dinâmica dos Sistemas Agroalimentares e Cadeias Agroindustriais EDUARDO CESAR SILVA; LUIZ GONZAGA DE CASTRO JÚNIOR; FABRÍCIO TEIXEIRA ANDRADE; ÍSIS STACANELLI PIRES CHAGAS; THALES FRANCESCHINI CONSENTINE. UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS, LAVRAS - MG - BRASIL. Fair Trade: Um estudo exploratório de suas origens, características e relação entre seus principais agentes Grupo de Pesquisa: Estrutura, Evolução e Dinâmica dos Sistemas Agroalimentares e Cadeias Agroindustriais Resumo A certificação Fair Trade, também conhecida como comércio solidário no Brasil, ganhou uma considerável parcela do mercado desde o seu início na década de 80. As questões éticas, comerciais e sociais que envolvem o Fair Trade têm sido alvo de inúmeras publicações nacionais e internacionais. O sucesso do comércio solidário depende de quatro principais agentes: (1) órgãos de certificação, (2) produtores, (3) grandes companhias internacionais e (4) consumidores. Este artigo discute, por meio de uma revisão de literatura, os fatores que levaram da desregulamentação do mercado ao advento dos cafés comercializados sob o selo do comércio solidário, bem como explora a relação existente entre produtores, grandes empresas do ramo e consumidores, buscando analisar como cada um impacta no segmento de Fair Trade. Palavras-chaves: Fair Trade, certificação, sustentabilidade Abstract Fair Trade Certification, as known as social trade in Brazil, got a considerable share of coffee market since its inception in the 80s. Ethical, commercial and socials issues involving Fair Trade have been subject of uncountable studies, nationally and internationally. Its success relies, mainly, on four agents (1) certification institutions (2) producers (3) international corporations (4) consumers. This article discusses, by a bibliography revision, the facts that brought coffee commercialization under social certification up, since market deregulation, as well as the impact of relation between producers, corporations and consumers to Fair Trade market. 1

Key words: Fair Trade, certification, sustainability 1 INTRODUÇÃO O Brasil configura-se como o maior produtor mundial de café; a safra 2008/2009 é estimada em mais de 45 milhões de sacas (OIC, 2009). A receita cambial obtida com as exportações de café verde em 2008 chegou a mais de US$ 4,1 bilhões (CECAFE, 2009). O café é um importante produto na pauta de exportações brasileiras e fonte de renda para milhares de produtores, sendo a maioria agricultores familiares. O complexo cafeeiro mundial entrou em profunda depressão após a suspensão do Acordo Internacional do Café (AIC) (MORICOCHI & MARTIN, 1993). Com a desregulamentação do mercado, iniciou-se a mobilização de vários agentes para valorizar a qualidade da bebida (SOUZA, 2006). A partir daí o mercado de cafés diferenciados adquiriu importância e passou a ser uma alternativa para o pequeno produtor, uma vez que ele pode amenizar os problemas decorrentes de eventuais quedas no preço do café. Dentre as diferentes formas de diferenciação, a certificação de cafés sustentáveis apresenta forte crescimento em todo o mundo. Entre os seus benefícios destacam-se a agregação de valor, aumento da rentabilidade, respeito ao ecossistema e à biodiversidade (PEREIRA et. al., 2007). Dentre os cafés sustentáveis, aqueles cultivados sob o selo Fair Trade atendem a uma série de normas que visam a permitir manutenção de boas práticas ambientais e sociais aos produtores, além de garantir um preço mínimo e um prêmio. O mercado para café certificado Fair Trade tem crescido de forma elevada em todo o mundo. Em 2000, ocupava apenas 0,2% do mercado, já em 2005 sua participação havia crescido para 2,2% (DORAN, 2008). O Fair Trade e seu uso são apresentados sob as perspectivas de três diferentes elos cadeia produtiva do café: produtores, grandes empresas internacionais (torrefadoras e redes de cafeterias) e consumidores. O presente artigo explora a relação entre a regulamentação do mercado (e sua posterior desregulamentação) com o surgimento do mercado de cafés diferenciados ou especiais. Por meio de uma revisão de literatura, a regulamentação, suas origens e fatores que levaram ao seu fim são apresentados. Em seguida é mostrado como o fim do Acordo Internacional do Café possibilitou a segmentação do mercado em cafés commodity (padrão do mercado) e cafés diferenciados. O artigo é concluído com uma análise das diferentes perspectivas que cada elo da cadeia (produtores, grandes empresas internacionais e consumidores) tem sobre o comércio solidário e apresenta considerações a respeito, bem como sugestão para pesquisas posteriores. 2 METODOLOGIA Este trabalho foi desenvolvido por meio de um estudo exploratório que, conforme Gil (2002), tem como principal objetivo o aprimoramento de idéias e proporciona maior familiaridade com o problema. O estudo foi feito com base em um levantamento bibliográfico da principal literatura nacional e internacional disponível sobre o tema. Os dados e citações dos autores consultados foram organizados e interligados de modo a fornecer um panorama fiel da realidade retratada. 3 DA REGULAMENTAÇÃO AO SEGMENTO DE CAFÉS DIFERENCIADOS 2

3.1 A REGULAMENTAÇÃO DO MERCADO O café foi uma das primeiras commodities do mundo a ter seu mercado regulamentado de alguma forma (PONTE, 2002). Em 1906 teve início a política brasileira para valorização do café, isso ocorreu por meio do Convênio de Taubaté que foi firmado entre os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais para comprar o excesso de produção e formar estoques (SAES, 1995). A este se seguiu o programa de Defesa Permanente do Café (década de 20) e a criação do DNC nos anos 30 com objetivo de reduzir a oferta de café (SAES, 1995). Moricochi & Martin (1994) caracterizam o período de intervenção no mercado interno brasileiro em duas fases. A princípio o objetivo era proteger os preços internos e posteriormente a estratégia passou a ser a de manter os preços de exportação elevados. Paralelamente às políticas nacionais, o governo buscou estabelecer acordos entre as nações produtoras de café, com o objetivo de compartilhar os custos da política de valorização (SAES, 1995). Em 1940 foi assinado o Convênio Internacional do Café, que objetivou estabelecer cotas de exportação para os produtores de café latino americanos em decorrência da interrupção do fluxo para a Europa por causa da Segunda Guerra Mundial (MORICOCHI & MARTIN, 1994). O primeiro acordo internacional do café (AIC) foi assinado em 1962 e tinha como signatários muitos dos países produtores e consumidores. Sob a regulação dos AICs (1962-1989), foi definido um preço alvo para o café e cotas de exportação para cada produtor. Quando o preço do indicador calculado pela Organização Internacional do Café (OIC) se elevava acima do preço estabelecido, as cotas eram aumentadas, do contrário, eram reduzidas (PONTE, 2002). Internamente, o preço do café torrado e moído também foi regulamentado, com o objetivo de conter a alta dos preços no mercado interno (SAES, 1995). 3.2 A DESREGULAMENTAÇÃO E SUAS CONSEQUÊNCIAS Conforme Caldeira (2006), em vários momentos o sucesso dos AICs se deu graças ao Brasil. O país teve grande importância ao aceitar reter sua própria produção para a manutenção das cotas. A partir de 1989 houve uma mudança na posição brasileira com a decisão de não mais aceitar reduzir sua participação, assim, o acordo chegou ao fim. Moricochi & Martin (1994) citam que havia uma pressão por parte dos países importadores, em especial os EUA, para que o Brasil cedesse parte de sua cota para outros países (estes comprometidos com as principais nações importadoras). As políticas nacionais para elevar os preços do produto e os acordos internacionais tiveram grande impacto sobre toda a cadeia produtiva do café. As políticas nacionais permitiram um aumento da receita das exportações com o café (até então, o principal produto de exportação brasileiro). No entanto, houve aspectos negativos. Segundo Saes (1995), havia uma baixa produtividade, a indústria estava defasada e o café brasileiro adquiriu uma imagem negativa. Caldeira (2006) aponta que o Brasil cometeu dois grandes erros em termos de estratégia de marketing durante o período da regulamentação. Em primeiro lugar, o país não criou parcerias com seus compradores e os preços altos, mantidos graças à intervenção, se tornaram atrativos para outros países aumentarem sua produção. O segundo grande erro, conforme o autor, reside no fato do Brasil não diferenciar seu produto dos demais concorrentes. Caso houvesse uma 3

diferenciação, esta poderia proteger o café brasileiro da concorrência direta contra outros produtores. 3.3 UM NOVO MODELO DE PRODUÇÃO Com o fim dos AICs em 1989, a diferenciação do café começou a se intensificar na esfera internacional e também no mercado interno, com a extinção do Instituto Brasileiro do Café (IBC) em 1990 (SOUZA, 2006). Dentro desta nova realidade, a concorrência do segmento foi incrementada e grande parte dos produtores passou a enfrentar dificuldades econômicas que foram refletidas na queda dos lucros (PEREIRA et. al., 2008). Conforme Ponte (2002), com o fim da regulamentação o mercado passou por uma grande redução nos preços internacionais da commodity. O autor menciona que no período entre 1990 e 1993, o indicador real de preço era apenas 42% daquele observado nos últimos quatro anos do AIC (1985-1989). Lindsey (2004) associa a queda dos preços com o grande incremento da produção brasileira durante a década de 90 e a expansão da cafeicultura no Vietnã. Isso gerou um excesso de oferta e, consequentemente, os preços foram forçados para baixo. Com o fim do mercado regulamentado, após um período de meio século de intervenção do Estado, teve início uma mobilização de vários agentes econômicos para valorizar a qualidade da bebida (SOUZA, 2006). Essa busca pela qualidade levou ao surgimento do mercado de cafés especiais e a segmentação, alternativas que os produtores têm para obter melhor renda em sua atividade. Ao ofertar um produto que foge do tipo padrão (commodity), o produtor tem a oportunidade de se beneficiar com a segmentação. 3.4 SEGMENTAÇÃO DE MERCADO Segmentação pode ser definida como a obtenção de produtos diferenciados quanto à composição química, sensorial, forma de preparo, embalagem visando atender diferentes segmentos de mercado (CHALFOUN, 2008, p.228). Na cadeia produtiva do café, segmentar o mercado significa atender a mercados específicos, com isso é possível agregar valor e obter preços diferenciados (PEREIRA et. al., 2004). Conforme os autores, os cafés que atendem a estes mercados específicos são chamados cafés diferenciados ou cafés especiais e englobam aqueles que agregam valor ao produto por: (1) Qualidade da bebida; (2) preocupação socioambiental; (3) modo de preparo ou; (4) processo industrial. Por qualidade da bebida se tem os cafés gourmet. O termo gourmet está ligado às características intrínsecas do grão verde que interferem na qualidade final da bebida como aroma, sabor, acidez e sabor residual (ZYLBERSZTAJN & FARINA, 2001). São cafés que apresentam uma bebida de qualidade superior. Em relação à preocupação socioambiental, se tem tanto os cafés cultivados de forma a causar menor impacto ambiental, como a responsabilidade social na produção e possibilidade de ser comercializado no mercado solidário (ZYLBERSZTAJN & FARINA, 2001). Como exemplos são citados o café orgânico e o café Fair Trade. Quanto ao modo de preparo, existem quatro formas principais: infusão, coado, solúvel e expresso (PEREIRA et. al., 2004). Por fim, na diferenciação por processo industrial podem ser citados os cafés solúveis, os cafés inovadores (cappucino, macaccino, frapuccino) e os cafés funcionais (descafeinados ou adicionados de vitaminas) (PEREIRA et. al., 2004). A partir de todas essas definições, pode-se afirmar que os cafés diferenciados atendem a um segmento do 4

mercado que não tem interesse pelo café padrão, ou commodity. A princípio, a proposta dos cafés diferenciados por qualidade ambiental e social não está em oferecer um produto de qualidade intrínseca superior, mas remunerar produtores que mantenham práticas sustentáveis que preservam o meio ambiente e beneficiam as comunidades locais. Os cafés com selo orgânico ou Fair Trade, por exemplo, não apresentam necessariamente uma qualidade superior da bebida ou sabor característico, mas sim características intangíveis, que neste caso são a preocupação em se produzir um produto livre de produtos químicos e que não agrida o meio ambiente (orgânico) e preocupações sociais (Fair Trade). Neste caso, o consumidor não pode constatar estes atributos do produto pessoalmente, através da sua própria percepção e experiência, por isso são chamados bens de crença (SOUZA et. al., 2000; SOUZA & SAES, 2001). Já os cafés gourmet ou superiores, possuem características que podem ser definidas como bens de experiência. A sua diferenciação tem como base atributos físicos e sensoriais (como a qualidade superior da bebida) que permitem a um consumidor com certo conhecimento distinguir o café padrão do café superior (SOUZA et. al., 2000). Como os cafés ambientais e sociais não podem ter suas características principais auferidas pelo consumidor, se faz necessário algo que ateste suas características. Para tal, existem os órgãos certificadores, que são instituições governamentais ou privadas que podem conceder certificados que atestam que o produto foi produzido em conformidade a proposta do programa adotado (CHALFOUN, 2008). O órgão certificador precisa ter credibilidade, para que o selo da certificação impresso no produto inspire confiança (SOUZA et. al., 2000). Os cafés certificados têm tido atenção crescente nos últimos anos, são produtos de melhor qualidade, favorecem a profissionalização do homem do campo e são mais sustentáveis (SAES & MIRANDA, 2008). 4 FAIR TRADE 4.1 ORIGEM E PRINCÍPIOS DO FAIR TRADE O Conceito de Fair Trade está baseado no fato que práticas no mercado global afetam o subdesenvolvimento e a distribuição injusta de renda entre as nações (LEVI & LINTON, 2003). As origens do Fair Trade estão no consumo ético. O consumo ético teve início na Europa com a emergência de Organizações de Comércio Alternativo (ATOs, na sigla em Inglês), como Ten Thousand Villages (1946), Fair Trade Organisatie (1967) e Global Exchange (1988) (LEVI & LINTON, 2003). Em 1988 foi estabelecida a certificadora Holandesa Max Havelaar (a primeira a certificar Fair Trade ) e o primeiro produto certificado com o selo foi o café produzido pela União das comunidades indígenas da região do Istmo, UCIRI (VanderHoff Boersma, 2008). Conforme Laforga (2005), Max Havelaar era o nome de um romance do século XIX que criticava a forma como os trabalhadores das lavouras de café na Indonésia, então um colônia holandesa, eram tratados. Max Havelaar adotou a estratégia de visar grandes torrefadoras e colocar o café Fair Trade dentro dos supermercados e, com isso, permitir maior acesso aos consumidores (LEVI & LINTON, 2003). Em pouco tempo a iniciativa se expandiu para outros países na Europa e seu rápido crescimento fez com que em 1997 fosse estabelecida a Fair Trade 5

Labellings Organizations Internacional (FLO), uma organização guarda-chuva que coordena o trabalho de 21 certificadoras de produtos Fair Trade (VanderHoff Boersma, 2008). Para que o comércio seja justo, é preciso que alguns princípios sejam seguidos a fim de beneficiar os produtores que adotam o Fair Trade (FLO, 2008): - Assegurar que os produtores recebam um preço mínimo por seus produtos - Fornecer um prêmio adicional que possa ser investido em projetos que promovam o desenvolvimento social, econômico e ambiental. - Disponibilizar pré-financiamento para os produtores que precisem dele - Estimular parcerias de longo prazo entre produtores e torrefadores - Estabelecer critérios claros de que todos os produtos com certificado Fair Trade são socialmente, economicamente e ambientalmente sustentáveis. Ou seja, o comércio solidário, é um sistema de certificação que assegura que o café consumido foi cultivado respeitando padrões ambientais e sociais e comercializado de forma justa, ou seja, é pago um preço que permita a subsistência dos produtores e seus familiares. 4.2 DIFERENÇA ENTRE O MERCADO SOLIDÁRIO E O LIVRE MERCADO Conforme Levi e Linton (2003), existem duas diferenças fundamentais entre o mercado solidário e o livre mercado. A primeira reside no fato que o Fair Trade encoraja os produtores a se organizarem em cooperativas que permitem estabelecer preços que sustentem o seu modo de vida, enquanto o mercado livre os força a vender o produto no menor preço possível. A segunda grande diferença está no fato que o mercado livre não se preocupa com a sustentabilidade econômica dos pequenos produtores, enquanto o Fair Trade considera a sustentabilidade econômica tão importante quanto preço e qualidade. 4.3 DIFERENTES FORMAS DO FAIR TRADE Embora os conceitos e a proposta do comércio solidário sejam bem definidos e reconhecidos, eles não são empregados necessariamente devido à preocupação social e ambiental por parte dos produtores, torrefadoras e redes de cafeterias. Como será mostrado a seguir, o Fair Trade é utilizado de maneiras diferentes pelos agentes da cadeia agroindustrial do café, embora sua ideologia seja uma só. As grandes torrefadoras utilizam-se do selo Fair Trade como ferramenta de marketing, os produtores tem no comércio solidário uma alternativa de renda e produção sustentável e pelo lado dos consumidores, há um desejo de ajudar os produtores nos países pobres. 5 PRODUTORES, GRANDES CORPORAÇÕES E CONSUMIDORES 5.1 AS GRANDES TORREFADORAS E O COMÉRCIO SOLIDÁRIO De acordo com Saes & Miranda (2008), as quatro maiores torrefadoras mundiais vendem entre 0,2 e 2% do total de seus cafés como Fair Trade, o que em números relativos é muito pouco. Mesmo com esse pequeno valor, as empresas supervalorizam sua atuação no segmento de responsabilidade social e ambiental. Essas empresas buscam melhorar a sua imagem tornando-a mais soft e mais fair através de um baixo volume de compras ao preço do mercado justo (LAFORGA, 2005). Faz-se pouco e fala-se muito (SAES & MIRANDA, 2008). 6

Embora isso possa parecer injusto, tem se uma situação complexa, porque, embora façam uso do selo de comércio solidário como forma de marketing, conforme lembram esses autores, a iniciativa necessita do apoio das grandes torrefadoras já que estas possuem meios adequados de promover o produto. A princípio, foi a própria iniciativa da FLO que contribuiu para a formação desse cenário. Desde os seus primórdios o selo Fair Trade apresentava um excedente que não era absorvido pelo mercado e em uma tentativa de solucionar este problema, as iniciativas nacionais vinculadas à FLO buscaram acordos com grandes empresas como a Starbucks (MIRANDA & SAES, 2008). Conforme Reed (2008), o sucesso da iniciativa Fair Trade está ligado à atuação das grandes empresas. Antes, os produtos do comércio solidário eram comercializados em pontos de venda alternativos, com pouco acesso ao grande público. Com a entrada das grandes empresas, os produtos Fair Trade ganharam mais visibilidade e acesso ao grande público o que possibilitou um aumento da demanda e, consequentemente, ganhos a muitos pequenos produtores ao redor do mundo. Com a grande visibilidade adquirida pela certificação de comércio justo nos últimos anos e com o aumento da preocupação com aspectos sociais e ambientais, vender café Fair Trade se tornou em parte uma estratégia de marketing para grandes empresas. O problema nesse caso é que, embora, muitas delas se comprometam a comprar o café Fair Trade, esse volume, comparado com os cafés tradicionais, é muito pequeno. Portanto, não há de fato um comprometimento destas empresas em expandir sua política social. Elas não compram o produto na intenção de ajudar os produtores dos países em desenvolvimento (como seria de se esperar pelo conceito de comércio solidário ). Estas empresas compram um mínimo de café Fair Trade e com isso já podem se dizer socialmente responsáveis. No entanto, a gigante Starbucks,que a princípio se recusava a comprar café Fair Trade, parece ter aderido à causa do comércio solidário. De acordo com seu web site, a empresa pretende comprar 100% de seus cafés em canais de comercialização Fair Trade até 2015. Caso venha a se confirmar, será uma grande oportunidade de crescimento para o comércio justo e pode levar outras empresas a comprarem mais café certificado motivadas pela concorrência. O ideal seria que todas adotassem os princípios éticos do selo por engajamento nas causas sociais, mas a realidade é bem diferente. 5.2 PEQUENOS PRODUTORES E CERTIFICAÇÃO DE CAFÉS SUSTENTÁVEIS As motivações iniciais para a produção e comercialização de cafés sustentáveis são a preocupação ética e filosófica, mas aspectos menos nobres, como o fator econômico, também precisam ser levados em consideração (SOUZA, 2006). Diversos trabalhos apontam as vantagens financeiras da certificação como a principal razão para sua adoção (MOORE, 2004; RENARD, 2005; CONSUMERS INTERNATIONAL, 2005). Isso ocorre porque a cafeicultura é uma atividade comercial e dela provém o sustento de milhares de cafeicultores. Mas mesmo nestes casos, em que os benefícios financeiros prevalecem, as vantagens sociais e ambientais da adoção do selo são obtidas. Por meio da certificação, os pequenos produtores tem uma alternativa para reduzir a instabilidade do mercado de café, aumentar o valor econômico da sua produção e ampliar sua comercialização (PEREIRA et. al., 2006). No entanto, os produtores brasileiros que desejam adotar o selo Fair Trade, encontram uma grande dificuldade que é ter acesso aos compradores do produto e com isso 7

estabelecer uma linha direta com os consumidores preocupados em remunerar quem produz um café socialmente correto (PEREIRA et. al., 2004). Outro problema enfrentado pelos produtores de café participantes do comércio solidário é a dificuldade em vender todo o seu produto como Fair Trade e, dessa forma, receber o ágio e o prêmio pagos. Menos de 20% do café produzido com o selo é vendido como tal e isso se deve a duas razões principais: qualidade e preço (GIOVANNUCCI, 2003). Em parte, isto é explicado pelo fato de uma parcela dos compradores e consumidores estar mais interessada na qualidade tangível do café, do que em aspectos sociais (LEVI & LINTON, 2003). Os autores observaram que nove de cada dez estabelecimentos pesquisados por eles, a qualidade é a principal razão na escolha de servir ou não café Fair Trade. Isso significa que além de cumprir as exigências ambientais e sociais da certificação, os produtores precisam produzir um café de qualidade para ganhar mercado. É sabido que a produção de cafés de qualidade exige uma série de cuidados e investimentos muitas vezes inviáveis para o pequeno produtor. No entanto, uma vez obtida a certificação, os produtores podem investir o prêmio recebido em estruturas de beneficiamento. Foi o que fez Associação dos Pequenos Produtores de Poço Fundo, caso mais notório de sucesso do Fair Trade no Brasil. Com a renda obtida por meio da certificação, a associação foi capaz de construir um armazém e outras instalações para melhorar o processamento do café (BLISKA et. al., 2005). Tal como os cafeicultores de Poço Fundo, outros grupos podem investir o prêmio da certificação em infra-estrutura para produzir cafés de melhor qualidade. 5.3 FAIR TRADE E OS CONSUMIDORES Segundo Reed (2008), é difícil negar que o sucesso do Fair Trade se deva a participação das grandes corporações. Conforme visto anteriormente, as grandes corporações desempenharam um papel importante no sucesso da iniciativa ao disponibilizar produtos certificados em canais de comercialização com maior visibilidade e acesso para grande parte dos consumidores. Mas sem a demanda de produtos sustentáveis por parte dos consumidores, tal iniciativa de nada adiantaria. O crescimento da certificação Fair Trade está correlacionado com o crescimento do interesse dos consumidores pelo consumo consciente, onde o consumidor opta por produtos que acredita serem menos nocivos para si mesmos e para o meio ambiente (RAYNOLDS, 2002). Segundo a autora, os consumidores perderam a credibilidade no mercado convencional após os vários problemas relacionados a doenças e contaminação por alimentos. Pelsmacker et. al., (2005), ao fazer um estudo sobre a preferência dos consumidores de café da Bélgica, dividem os consumidores em: Apreciadores do Fair Trade, Simpatizantes do Fair Trade, Apreciadores da Marca e Apreciadores do Sabor. Conforme os dados levantados neste estudo, os apreciadores do Fair Trade são mais idealistas do que os demais grupos e corresponderam a 10% da amostra. Os simpatizantes são mais éticos do que os apreciadores de marca e sabor, mas demonstram apego a estes atributos. Equivalem a 40% da amostra. Bird e Hughes (1997) também verificaram que os consumidores de cafés sustentáveis são mais éticos que os demais. Em ambas as pesquisas, o preço não foi apontado como fator determinante da escolha. Conforme Fisher (2005), nos EUA, os cafés Fair Trade estão na mesma faixa de preço de outros cafés especiais e produtos da Starbucks. É importante lembrar que, embora o fator preço não seja 8

determinante para os consumidores de cafés especiais, para os consumidores de cafés comuns o mesmo não é válido. Por ter em seus princípios questões relativas à preservação ambiental e bem estar social, a preferência de café Fair Trade por consumidores mais éticos não guarda surpresas. Os consumidores ditos éticos estão mais propensos a consumir produtos cultivados de forma sustentável, por isso as estratégias para expandir o número de consumidores devem ser voltadas para os demais perfis de consumidores. Aumentar a qualidade do café oferecido sob o selo de comércio solidário é uma forma de atrair os apreciadores do sabor, bem como dos canais de distribuição que irão oferecer o produto. Através de campanhas incentivadoras, pode ser possível ganhar a preferência dos consumidores que já apresentam certa inclinação ética ( simpatizantes ). Ao serem atraídos para o consumo de café Fair Trade e constatarem que também se trata de um produto de qualidade, o mercado para estes consumidores possivelmente estará assegurado. A importância em se incrementar a demanda por café comercializado segundo os princípios de justiça social e ambiental reside no fato de que com isso, os consumidores podem usar seu poder de decisão para reduzir os problemas sociais e ambientais do mercado global (TAYLOR et. al., 2005). 6 CONCLUSÃO As mudanças ocorridas no mercado mundial de café no período pós-acordo internacional, associadas com mudanças nas preferências dos consumidores, levaram ao surgimento do segmento de cafés diferenciados. Dentro desse novo cenário, houve espaço para que o café se diferenciasse do padrão commodity. Dentre as diversas formas de produtos diferenciados que surgiram, umas das que mais tem se destacado é a dos cafés diferenciados por preocupação sócio-ambiental. Além de oferecer benefícios aos produtores de café, a certificação Fair Trade também oferece vantagens para as grandes empresas que o comercializam, como uma espécie de marketing social, e atende aos desejos do consumidor disposto a pagar mais por um produto socialmente mais correto. Cada um destes elos da cadeia se beneficia de forma distinta do comércio solidário, nem sempre em acordo com os princípios deste. Os produtores são movidos majoritariamente pelos benefícios econômicos obtidos através da certificação de comércio solidário. Mas ao contrário das grandes empresas, o produtor típico de café Fair Trade enfrenta constantes dificuldades econômicas em de custos de produção maiores do que o valor da saca, volatilidade de preço e dificuldades em comercializar o produto. Os preços obtidos com a comercialização de cafés solidários garantem a manutenção e o desenvolvimento de comunidades por todo o mundo. O prêmio recebido é investido em obras sociais para a comunidade e para melhorar a qualidade do produto. Qualidade esta cada vez mais importante para se comercializar dentro do nicho de cafés Fair Trade. As grandes corporações que comercializam cafés Fair Trade no varejo também são movidas por benefícios financeiros. Ao comercializar uma pequena parcela de seus produtos sob o selo do comércio solidário, estas empresas passam a se utilizar disso como ferramenta de marketing. Diferentemente dos pequenos produtores, elas não tem dificuldade para comercializar seus produtos e muitas vezes possuem filosofias de trabalho que vão contra os princípios do Fair Trade. Devido ao crescimento da oferta de cafés certificados Fair Trade a atuação destes agentes se tornou necessária, já que possibilitou 9

que esses cafés fossem comercializados em milhares de estabelecimentos, alcançando uma faixa maior de consumidores. Do lado consumidor, existem aqueles movidos pelos princípios éticos, eles fazem suas escolhas movidas pelo desejo de consumir um produto sustentável e ajudar os produtores em condições menos favorecidas. Mas estes consumidores não são a maioria e sozinhos não podem sustentar o mercado. Consumidores que simpatizam com a proposta do comércio solidário precisam de um incentivo a mais para adentrarem de fato neste nicho. A qualidade da bebida é assinalada como um fator importante para que o café Fair Trade seja consumido. De modo geral a situação que se tem é de que é mais fácil os produtores ofertarem o que os consumidores desejam e ganhar o mercado do que apenas incentivar o consumo de café Fair Trade unicamente por suas qualidades sociais e ambientais. Embora os princípios de preservação ambiental e social estejam cada vez mais em voga, os consumidores em sua maioria ainda não apreciam tais atributos. Essa discussão mostra que mesmo dentro de um sistema que busca favorecer o pequeno produtor, este ainda é o elo mais fraco da cadeia. Depende de um canal de comercialização (grandes empresas do ramo) e de consumidores dispostos a pagar mais por um produto diferenciado. Ainda assim, o pequeno produtor brasileiro que está inserido neste segmento, encontra mais segurança e benefícios do que ao permanecer no mercado de cafés commodity. No Brasil, os cafeicultores de Poço de Fundo são a principal referência em relação aos benefícios do comércio solidário obtidos. A literatura disponível é deficiente em referências e estudos sobre as demais iniciativas em andamento no país. Sugere-se para pesquisas futuras diagnosticar a situação social, econômica e ambiental destas comunidades para traçar um perfil mais concreto da certificação Fair Trade no Brasil. 7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BIRD, K., HUGHES, D. R. Ethical Consumerism: The Case of Fairly-Traded Coffee. Business Ethics, Volume 6, Number 3, 1997. BLISKA, F. M. M.; PEREIRA, S. P. Impacts of certification on coffee growing areas. In: Consumers International (Org.) From bean to cup: how consumer choice impacts on coffee producers and the environment. Consumers International, London, 2005, Cap. 4, p.31-38. CALDEIRA, L. A Guerra do Café: A competitividade revelada do café arábica do Brasil. Varginha, Editora Alba, 2006. 120 p. CECAFE Conselho dos Exportadores de Café. Exportações Brasileiras de Café Verde e Solúvel. Planilha Eletrônica. Disponível em: < www.cecafe.com.br > Acesso em: 11 mar. 2009 CHALFOUN, S. M. Glossário de Termos Utilizados na Cafeicultura. Lavras: EPAMIG- CTSM, 2008. 305 p. CONSUMERS INTERNATIONAL. From bean to cup: how consumer choice impacts on coffee producers and the environment. Consumers International, London, 2006, 60 p. 10

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