Giovanna F. Silveira Teles Mestranda em Direito Empresarial (FDMC), Especialista em Direito Civil (FDMC), advogada. gsteles25@gmail.



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Transcrição:

O MANDATO JUDICIAL OUTORGADO PELO FALIDO Giovanna F. Silveira Teles Mestranda em Direito Empresarial (FDMC), Especialista em Direito Civil (FDMC), advogada. gsteles25@gmail.com RESUMO O presente artigo busca perquirir se o contrato de mandato judicial outorgado pelo falido pode ser revogado pelo Administrador Judicial. Palavras-chaves: Mandato judicial falido revogação SUMÁRIO 1- Contratos unilaterais e contratos bilaterais. 1.1- Contratos unilaterais. 1-2 Contratos bilaterais. 2- Contrato de mandato. 3- Contrato de mandato judicial. 4- Conclusão. 1- Contratos unilaterais e contratos bilaterais 2- Os contratos se apresentam, geralmente, como bilaterais ou unilaterais. Podem, ainda, serem classificados como plurilaterais. A classificação dos contratos como bilaterais, unilaterais ou plurilaterais se dá em virtude do número de pessoas para as quais se origina obrigação no momento de sua formação. Assim, os contratos, em sua maioria, são bilaterais, pois retratam a vontade de duas partes e criam obrigações recíprocas para ambos os contratantes (compra e venda, locação, transporte, etc), enquanto os contratos unilaterais espelham a vontade de apenas uma parte, e Page1

geram obrigações também para apenas uma das partes (como, por exemplo, testamento e doação sem causa limitadora do exercício). Logo, a bilateralidade e a unilateralidade decorrem do número de emissão de vontade ocorrida no momento da formação do contrato ou negócio jurídico, bem como do número de obrigados. 1.1 Contratos unilaterais As consequências da decretação de falência para os contratos unilaterais deverá ser analisada levando-se em consideração se o falido é o devedor ou credor da obrigação. Assim, nos termos do artigo 118 da Lei 11.101: Art. 118. O administrador judicial, mediante autorização do Comitê, poderá dar cumprimento a contrato unilateral se esse fato reduzir ou evitar o aumento do passivo da massa falida ou for necessário à manutenção e preservação de seus ativos, realizando o pagamento da prestação pela qual está obrigada. Dessa forma, se o falido é credor, esse crédito é transferido para a massa falida, e o contrato não vence antecipadamente, podendo o administrador judicial exigir o cumprimento do contrato. Sendo o falido devedor, o administrador judicial poderá dar cumprimento ao contrato, de acordo com o interesse da massa falida. Cumpre registrar, ainda, que de acordo com o artigo 83, 3º. da Lei de Recuperação de Empresas (Lei 11.101 2005), as cláusulas penais dos contratos unilaterais não incidirão se o descumprimento do contrato se der em virtude da falência. 1.2 Contratos bilaterais Os contratos bilaterais, nos termos do artigo 117 da Lei 11.101 2005, não se extinguem, conforme se verifica: Art. 117. Os contratos bilaterais não se resolvem pela falência e podem ser cumpridos pelo administrador judicial se o cumprimento reduzir ou evitar o aumento do passivo da massa falida ou for necessário à manutenção e preservação de seus ativos, mediante autorização do Comitê. 1 o O contratante pode interpelar o administrador judicial, no prazo de até 90 (noventa) dias, contado da assinatura do termo de sua nomeação, para que, dentro de 10 (dez) dias, declare se cumpre ou não o contrato. 2 o A declaração negativa ou o silêncio do administrador judicial confere ao contraente o direito à indenização, cujo valor, apurado em processo ordinário, constituirá crédito quirografário. Page2

Desta feita, apesar da falência não ser causa de extinção dos contratos bilaterais, ela refletirá na execução dos mesmos. Caberá ao administrador judicial decidir acerca do cumprimento ou não dos contratos, mediante autorização do comitê de credores, se existente. E, uma vez que os contratos bilaterais não se extinguem, se firmados antes da decretação da falência, poderão ser cumpridos ou executados pelo administrador judicial. Quanto aos contratos já executados, salvo se a revogação for benéfica à massa, em casos excepcionais, ou se atos fraudulentos, não sofrerão qualquer influência, ou seja, dar-se-ão por cumpridos. Registre-se, por oportuno, que a legislação de falências anterior (Decreto-Lei 7.661 45) permitia, em seu artigo 39, a prática de atos civis e comerciais pelo falido. A legislação vigente (Lei 11.101 2005) não se manifestou a esse respeito. Porém, em seu artigo 103, retira do falido o direito de administrar seu patrimônio. Não obstante, os contratos bilaterais realizados após a decretação da falência não se resolvem automaticamente, dependendo seu cumprimento da conveniência e das possibilidades da massa falida. E, uma vez que podem ser cumpridos, não podem ser entendidos como contaminados pela nulidade, ocorrendo o mesmo com os contratos firmados no prazo legal. Entretanto, só serão executados se trouxerem benefícios para a massa falida. J. A. Penalva Santos, citado por Denise Borges da Costa, defende que o falido tem capacidade de realizar atos civis e comerciais, e que sobre tais atos a massa terá direito aos lucros e bens adquiridos, importando em responsabilização exclusiva do falido quanto aos prejuízos por ele causados através desses atos pós-falimentares a terceiros. Ele afirma, ainda, que o falido, se, e quando reabilitado, responderá aos seus credores por esses atos praticados pós-falência. Ensina, ainda, Penalva Santos (apud Denise Borges da Costa), que embora os contratos bilaterais não se resolvam pela decretação da falência, se firmados com o contraente in bonis, poderá ocorrer a resolução no caso de inadimplência do contraente falido, sendo necessária que a do tenha siofoi apresentada antes da declaração de falência, e que a inadimplência não seja causada unicamente pela declaração de falência. E, mesmo que se resolva o contrato bilateral, essa resolução não acarreta em condição especial para recebimento de eventuais créditos. Page3

3- Contrato de mandato Mandato é contrato consensual, personalíssimo, não solene e, via de regra, unilateral e gratuito. Pode ser exercido mediante remuneração, que é o caso dos advogados. Possui como traço característico a representação. Poderá ser feito de forma, tácita, verbal ou escrita. Na forma escrita, o contrato é o mandato, e a procuração é o instrumento que o materializa. a)- CONSENSUAL Para a existência de um contrato de mandato é necessário que o mandante dê os poderes, e que o mandatário os aceite. Não há como se constituir um contrato de mandato por imposição. b)- PERSONALÍSSIMO O mandante escolhe o mandatário para realizar, em seu nome, atos que não pode ou não quer exercer. É intuito personae, baseado na confiança, e a fidúcia é elemento essencial. Perdendo a fidúcia, está autorizada sua resolução, tanto pelo mandante quanto pelo mandatário. Prevalece a pessoalidade mesmo nos casos de contratação de escritórios de advogados, pois a confiança está em determinado escritório, independente de quem é o profissional que irá executar a tarefa. A confiança se revela na credibilidade daquele escritório, na segurança do mandante de que o serviço prestado por aquele escritório ou instituição está cercado de profissionalidade, e possui uma supervisão e um trabalho merecedores de confiança. c)- NÃO SOLENE O contrato de mandato não exige nenhuma forma pré-definida, nenhuma solenidade. Poderá ser feito de forma tácita, verbal ou escrita. Especificamente para o contrato de mandato judicial, a forma mais comum é a escrita, porém pode ocorrer de forma verbal (nomeação em audiência e registro em ata) ou tácita (representação pela defensoria pública o assistido informa que não tem condições de advogado, é nomeado um defensor público para ele, independente da feitura de qualquer contrato). Page4

d)- UNILATERAL E GRATUITO Em regra, o contrato é unilateral, pois estabelece obrigações para apenas uma das partes. O mandatário irá agir em nome do mandante, como se este fosse. E, sendo unilateral, prevendo obrigações para apenas uma das partes, será também gratuito, sem necessidade de contraprestação. Entretanto, poderá se dar de forma bilateral e onerosa, como é o caso dos contratos de mandato na esfera jurídica, em sua expressiva maioria. Via de regra, os contratos para prestação de serviços advocatícios prevêem obrigações para ambas as partes, cabendo ao contratante o fornecimento dos elementos necessários para a realização de sua representação, bem como o pagamento dos honorários pactuados; e ao advogado a prestação dos serviços jurídicos para os quais foi contratado. 3- Contrato de mandato judicial Pelo contrato de mandato judicial, uma pessoa física ou jurídica contrata um advogado para defender seus interesses em uma ação judicial. É um contrato bilateral, oneroso ou não, baseado na fidúcia, geralmente escrito, mas que não exige nenhuma forma pré-definida. Pelo contrato de mandato, o advogado se torna o responsável pela defesa dos direitos de seu cliente, o contratante. Havendo a falência, o falido perde o direito de administrar os seus bens, mas não é privado da propriedade dos mesmos. A administração do patrimônio que constitui a massa falida fica a cargo do Administrador Judicial, nomeado pelo juízo, mas a propriedade dos bens continua pertencente ao falido. Possui o falido, mesmo privado da administração, os direitos de: a)- fiscalização da administração da massa; b)- intervenção como assistente nos processos em que houver interesse da massa falida; c)- recorrer das decisões proferidas nos processos em que a massa falida é parte; d)- se necessário, requerer providências conservatórias dos bens arrecadados; e)- manifestar no processo falimentar sobre todos os atos praticados pelas partes; Page5

f)- outorgar mandatos, após a decretação da falência, para exercício de atos não abrangidos pela falência; Os direitos do falido decorrem do fato de que, embora não detenha a administração de seus bens, continua proprietário dos bens arrecadados pela massa falida. Desta feita, cabe a ele zelar pelo seu patrimônio, defendê-lo e fiscalizar a sua conservação. Como bem nos ensina REQUIÃO (1993, p. 266), citado por COSTA (2006, p. 62): A falência, como de resto a dissolução social, não extingue a personalidade jurídica da sociedade. Ademais, o Administrador Judicial é um órgão de execução, não possuindo, via de consequência, o poder de representação dos devedores ou dos credores. Essa representação é feita pelo administrador da empresa (antigo sócio-gerente), o qual continua sendo o representante legal do devedor falido, que mantém a sua personalidade jurídica. Registre-se que a massa falida não possui personalidade jurídica, apenas capacidade processual. A personalidade jurídica do devedor falido mantém-se intacta. O Administrador Judicial age nos interesses da massa falida, porém é um órgão de execução. O artigo 120 da Lei de Falências prevê a revogação dos mandatos para realização de negócios e autoriza a revogação do mandato judicial pelo Administrador Judicial, conforme se infere: Art. 120. O mandato conferido pelo devedor, antes da falência, para a realização de negócios, cessará seus efeitos com a decretação da falência, cabendo ao mandatário prestar contas de sua gestão. 1 o O mandato conferido para representação judicial do devedor continua em vigor até que seja expressamente revogado pelo administrador judicial. 2 o Para o falido, cessa o mandato ou comissão que houver recebido antes da falência, salvo os que versem sobre matéria estranha à atividade empresarial. Não obstante a previsão legal, entendemos que a revogação do mandato judicial conferido pelo devedor, antes da decretação da falência, não pode ser realizada pelo Administrador Judicial, por ser incompatível, inclusive, com diversos artigos do mesmo texto legal. Inicialmente, necessário observar que o contrato de mandato judicial tem caráter personalíssimo, e, assim sendo, somente aquele que realizou o contrato pode decidir pela sua revogação. O Administrador Judicial não representa o falido, não o substitui, apenas executa um serviço, ou seja, administra o patrimônio do falido, que não perde a sua capacidade postulatória ou mesmo a de responder pelos seus atos. Page6

Ademais, entendendo-se que o Administrador Judicial tem poderes para rescindir o contrato firmado entre o falido e seu procurador, necessário que se dê a ele o mesmo poder para constituir um novo advogado para o falido, o que incorreria em um absurdo jurídico. Como já dito anteriormente, a relação entre contratante e contratado é de fidúcia, motivo pelo qual é necessário que o falido seja representado por alguém em quem confia, não podendo essa escolha ser realizada por um terceiro, sem a autorização ou consentimento prévio do falido. Além disso, uma das obrigações do falido é, nos termos do artigo 104, XII, da Lei 11.101 2005, examinar e dar parecer sobre as contas do administrador judicial. Porém, o contato com essas contas se dá através do advogado, que é quem representa o falido nos autos. Assim, admitir a nomeação de advogado para o falido feita pelo Administrador Judicial pode gerar dúvidas na efetiva liberdade do advogado na defesa dos interesses de seu cliente, que na verdade é o falido. Desta forma, o principal motivo pelo qual o advogado do falido deverá ser um profissional por ele escolhido, no qual confia, é ser este a pessoa que irá representá-lo no processo, e praticar os atos necessários, inclusive os de análise das contas, necessitando, para isso, de ausência de qualquer vínculo com o Administrador Judicial. Cabe ainda ao falido intervir nos processos em que a massa falida seja parte ou interessada, interpor os recursos cabíveis, tudo conforme art. 103, único. Assim, poderá o falido interpor recurso ainda que a massa falida não o faça, motivo pelo qual, mais uma vez, se nota que é incompatível a possibilidade de nomeação de advogado pelo Administrador Judicial. Ademais, o contrato advocatício entre o falido e seu procurador não diz respeito aos interesses da massa falida, sendo apenas custeado por ela. Desta forma, o valor dos honorários deverá ser inscrito no quadro de credores, não detendo nenhum privilégio ou preferência simplesmente por ser um contrato advocatício. Caso se entenda que tem caráter alimentar, como defendido pela Ordem dos Advogados, não se trata de privilégio especial ou preferência por se tratar de um contrato advocatício, mas sim de uma privilégio do crédito, independente de quem seja seu titular. 4- Conclusão Conclui-se, portanto, que o contrato de mandato judicial firmado pelo falido não pode ser revogado pelo Administrador Judicial, sob pena de violação aos direitos do falido, Page7

principalmente o de dificultar a fiscalização da administração judicial, que é um dos deveres do falido. Ademais, o contrato de mandato judicial não interfer na execução do objeto da falida, ou mesmo é de interesse da massa falida, cabendo a esta tão somente o pagamento dos honorários contratados, que será realizado juntamente com os demais créditos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMARAL, Diego Martins Silva do. Os efeitos da falência quanto aos contratos do falido. Jurisway. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=1780. Acesso em: 30 jul. 2013. BRASIL. Lei 11.101 2005. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm. Acesso em: 30 jul. 2013. COSTA, Denise Borges da. A denúncia do contrato de mandato do advogado da falida pela massa falida. 2006. 83 f. Dissertação (Mestrado em Direito Empresarial) Faculdade de Direito Milton Campos. Nova Lima, 2006. CAMPINHO, Sérgio. Falência e recuperação de empresa: O novo regime da insolvência empresarial. 5ª.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2010. FREITAS, André Hostalácio. A validade ou não da cláusula expressa de resolução de contrato bilateral em caso de decretação de falência ou do deferimento da recuperação do devedor. 2012. 87 f. Dissertação (Mestrado em Direito Empresarial) Faculdade de Direito Milton Campos. Nova Lima, 2012. NEGRÃO, Ricardo. Aspectos objetivos da lei de recuperação de empresas e de falências: Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. 2ª.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. SARTORI, Hotans Pedro. Dos efeitos retrospectivos da sentença declaratória da falência na Lei nº 11.101/2005. Estudo comparativo com o Decreto-Lei nº 7.661/1945. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 727, 2 jul. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6946>. Acesso em: 17 mar. 2013. Page8