CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO. Eduardo Augusto Rosa de Matos. O Telos na Ética a Nicômaco: virtude e felicidade

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Transcrição:

CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO Eduardo Augusto Rosa de Matos O Telos na Ética a Nicômaco: virtude e felicidade Artigo Interdisciplinar do 1 Semenstre do Curso de Filosofia, sob a Orientação do Prof. Esp. Douglas Rodrigues da Silva. Lorena 2016

O Telos na Ética a Nicômaco: virtude e felicidade Eduardo Augusto Rosa de Matos 1 Resumo: Aristóteles, o grande sistematizador da teoria teleológica, sintetiza seu pensamento sobre a Finalidade das coisas nos dois primeiros livros da Ética a Nicômano. Assim, apresentamos uma revisão das suas ideias fundamentais enfatizando os conceitos de Virtude e Felicidade como princípios do bem comum. Palavras-chave: Virtudes Felicidade Telos Ética a Nicômaco. Sumário: Introdução. 1. Aristóteles: síntese biográfica. 1.1. Períodos do pensamento aristotélico 1.2. Obra: Ética a Nicômaco (visão geral) 2. A virtude na Ética a Nicômaco. 2.1. Tipos de virtudes. 3. Felicidade na Ética a Nicômaco. 3.1. Três modos de vida. 4. Telos : Bem comum. Considerações Finais. Referências. Introdução Todas as coisas têm uma finalidade. Nas ações humanas a finalidade é a felicidade. E o que é a felicidade? Aí há uma divergência, pois uns consideram a felicidade o prazer, outros a honra e a riqueza e alguns o sumo bem. Ao longo desse artigo se fará uma reflexão sobre a teoria teleológica e eudemonista de Aristóteles e alguns conceitos como o da virtude e a felicidade serão apresentados visando o telos, a finalidade última das coisas. Analisando a importância de tal teoria, é preciso olhar para o Aristóteles, quem a desenvolveu nos dois primeiros livros da obra Ética a Nicômano. Esta visão filosófica nos ajudará a compreender melhor nossa vida enquanto indivíduos pertencentes a sociedade humana. 1. Aristóteles: síntese biográfica Aristóteles nasceu em 384/383 a.c., na Estagira 2. Sua família estava ligada à medicina e à realeza da Macedônia. Aos dezoito anos, foi pela primeira vez a Atenas e logo ingressou na escola de vertente matemática cujo mestre é Platão, mesmo tendendose à biologia. Saiu de Atenas após a morte do mestre, casou-se com Pítias que lhe deu um filho, Nicômaco. 1 Aluno do primeiro semestre do curso de Filosofia do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL) Unidade Lorena. 2 Antiga cidade da Macedônia, situada hoje na Grécia, na região de Calcídica, no golfo do rio Estrimão. 2

Em 343 a.c., Aristóteles é convidado por Felipe II, rei da Macedônia, a ser o preceptor de seu filho Alexandre, que em 336 a.c., sobe ao topo, depois do assassinato do pai. Em ocasião da invasão da Macedônia sobre a Grécia, que foi derrotada, Aristóteles voltou para Atenas e por ser amigo do rei, fundou em 335/334 a.c., em Atenas, sua própria escola, próxima ao templo de Apolo Lício, sendo por isso conhecida como Liceu de fundo filosófico e biológico. Com a morte do rei Alexandre, Aristóteles foi hostilizado de Atenas e morreu em 322 a.c. em Calcis 3, na Eubeia. 1.1 Períodos do pensamento aristotélico Aristóteles, como a maioria dos pensadores, passou por etapas na formação do seu pensamento e de suas obras. A primeira etapa foi o período que esteve na escola platônica e que conviveu com o mestre Platão. A segunda foi o período que saiu de Atenas e passou a ser preceptor de Alexandre. E a terceira ocorreu após a fundação da escola aristotélica: Liceu. (Cf. PASSOS JÚNIOR, 2016) É nessa terceira etapa que se encontra a obra Ética a Nicômaco, que o filósofo escreveu em homenagem a seu filho Nicômaco (VELASQUEZ, 2011.), no qual assume um papel de pedagogo, um pai preocupado com a educação de seu filho e, acima de tudo, com a sua felicidade. (ESCÁBIA, 2011). 1.2 Obra: Ética a Nicômaco (visão geral) Aristóteles inicia a Ética a Nicômaco afirmando que assim como as técnicas também a ação humana almeja realizar algum fim. (CASTRO, 2008, p. 27) A obra Ética a Nicômaco é composta por dez livros que se apresenta dividida da seguinte maneira: no livro primeiro trata-se do tema felicidade. No livro II até o livro IX trata-se das virtudes. No livro X completa o tratado da felicidade iniciado no primeiro. (ESCÁBIA, 2011). Assim expõe suas concepções teleológicas e eudaimonista, ou seja, a teoria da finalidade e a doutrina da qual a felicidade é o objetivo da vida. Trazendo a virtude como mediana e suas concepções sobre o hábito e a prudência na ética. (VELASQUEZ, 2011). Desta maneira, para compreendê-lo faz-se necessário alguns 3 Cálcis ou Cálquida é a principal cidade da ilha de Eubeia, na Grécia. 3

conceitos por ele apresentados e alguns princípios importantes para alcançar o bem comum. Comecemos pela virtude. 2. Virtude na Ética a Nicômaco Segundo Aristóteles, o tema da virtude é uma melhor investigação sobre a felicidade e é campo de estudo do verdadeiro político. (ARISTÓTELES, 2001, p. 28.) A virtude a ser investigada é a virtude do homem, pois se busca o bem e a felicidade humanos. Virtude não a do corpo, mas a da alma, porque a felicidade é uma operação da alma. A alma para Aristóteles é dividida, uma irracional e a outra pertencente à razão. Parte da alma irracional parece comum e vegetativa, ligada à nutrição e ao crescimento e não pertence à virtude humana e a outra parte da alma irracional (sensível) participa de algum modo da razão. A parte da alma que tem a razão é a que se inclui na excelência humana, pois o homem é um animal racional e nisso exclusivamente se difere dos demais animais. Conclui-se, então, que a alma tem dupla natureza: uma participa do princípio racional no sentido próprio do termo e em si, ao passo que a outra parte terá a tendência de obedecer-lhe como um filho obedece ao pai. (ARISTÓTELES, 2001, p. 30.) De acordo com a investigação aristotélica, [...] a atividade virtuosa, essa deve necessariamente agir e agir bem. (ARISTÓTELES, 2001, p.21.), a virtude é fruto do esforço e hábito humanos. 2.1 Tipos de virtudes virtudes: A partir da diferença da alma, o autor da Ética a Nicômaco, separa dois tipos de Dizemos, pois, que algumas são [5] intelectuais e outras são morais e, assim, a sabedoria, a inteligência, a prudência são intelectuais, mas a liberalidade e a temperança, são morais. Falando, pois, sobre os [hábitos] morais, não dizemos que alguém é sábio ou inteligente, mas que é manso ou temperante. Todavia, também louvamos o sábio pelo hábito. E os hábitos louváveis dizemos [10] virtudes. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p.164.). Há duas espécies de virtude, a intelectual (dianoética) e a moral (éthos - atos). Uma tem sua origem e crescimento a partir da instrução, ao passo que a virtude moral é 4

adquirida pelo costume, pelo hábito e não gerada em nós por natureza. São as virtudes morais que fixa-se o interesse da investigação aristotélica. Um homem dotado de virtudes morais é o que pode ser chamado de homem virtuoso e de homem bom [...] Qualquer coisa que nos vem, de fato, por natureza, primeiro recebemos suas potências, mas, depois, praticamos as operações delas [...] Adquirimos as virtudes primeiro por praticá-las [...]. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p.174.). A expressão por natureza é entendida aqui como princípio de necessidade. (SILVEIRA, 2000). Assim, O ato de respirar não torna um homem bom e tampouco mau. O ato de respirar é um corportamento natural e, portanto, caracteriza-se como um comportamento necessário. Não é facultado ao homem escolher entre respirar ou deixar de respirar. Ele já nasce com mecanismos naturais que o impelem a fazê-lo e ele nada pode fazer para mudar isso. (SANTOS, 2001, p.1.). São as virtudes práticas, no que diz respeito aos homens, que os tornam justos ou injustos. A principal investigação sobre as virtudes está no âmbito das ações: como se deve praticá-las e como delas se produz o hábito; a saber: deve-se agir de acordo com a reta razão. A investigação aristotélica aprofunda-se a cerca da virtude: [...] são três coisas que ocorrem na alma, as paixões, as potências e os hábitos, algumas dessas certamente será a virtude. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p 202.) As paixões são sentimentos que podem aflorar em quaisquer homens. As potências representam as capacidades que os homens possuem por natureza, inclusive de sentirem as paixões. As paixões e as potências têm cunho natural e não são critérios de juízo entre ruim e bom. Restam os hábitos e são neles que reside a virtude moral. Os hábitos, ou ainda chamado de disposições, representam estados de caráter e definem o modo como o homem utiliza suas potencialidades e se relaciona com suas paixões. A virtude moral pertence, pois ao gênero das disposições do homem. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p. 182.) E esta disposição visa à mediania, pois é na escassez e no excesso que se corrompe a natureza das virtudes. Assim: Todo que sabe evita o excesso e a escassez, busca o meio-termo e o deseja, não, porém, o meio-termo da coisa, mas o que se refere a nós..., pois tanto o excesso como a escassez corrompem o bem, mas o meio-termo salva. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p. 211.). 5

O meio-termo em relação às coisas é um ponto equidistante entre dois extremos e é um e mesmo para todos os homens, porém o meio-termo em relação aos homens é relativo, variável entre dois extremos, sendo diferentes para diferentes homens. Portanto, a virtude é um hábito eletivo que existe no meio-termo [1107a] [1] que nos é determinado pela razão, que certamente será determinado pelo sábio. No entanto, a virtude é um meio-termo entre dois vícios, dos quais um é, pois, conforme o excesso, porém o outro é conforme a escassez. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p. 218.). 3. Felicidade na Ética a Nicômaco Aristóteles faz um apanhado geral do que já foi apresentado: Sendo que, como já foi dito: [1095a] Digamos, portanto, resumindo, que, dado que todo conhecimento [15] eleição desejam algum bem, o que dizemos desejar a política é o bem, que é o mais excelso de todas as boas ações. Sobre seu nome quase todos concordam, pois tanto a maioria quanto os mais instruídos dizem que é a felicidade. De fato, viver bem e agir bem [20] eles estimam ser o mesmo que ser feliz. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p. 47.). A ação do homem é uma operação da alma, segundo a razão e não sem a razão. [...] Cada um [15] agirá bem na medida em que a própria virtude é aperfeiçoada. A boa operação humana se realizará segundo a virtude, se, porém, houver muitas virtudes, realizar-se-á segundo a melhor e mais perfeita. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p. 93.) Há uma divergência no que é felicidade. A maioria pensa ser as coisas mais visíveis e manifestas, como o prazer, a riqueza ou a honra. Outros pensam outras coisas distintas, para o doente a saúde, para o faminto o alimento. Contudo, alguns estimaram que além destes muitos bens, existe outro, bom por si mesmo, e que é causa do ser de todos os bens. [...] O melhor, o mais belo e o mais deleitável será a [25] felicidade. [...] porém, a felicidade exige bem exteriores. Pois é impossível, ou não fácil, praticar boas ações não possuindo o que existe. De fato, muitas ações são realizadas [1099b] [1], como dissemos, pelo auxílio de instrumentos, amigos, riquezas e pelo poder público. Mas se faltar algumas coisas, debilita a felicidade, como a boa estirpe, bons filhos, a beleza. De fato, não é iteiramente feliz quem tem a figura disforme ou mal nascido, ou solitário ou sem filhos. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p. 114.) 6

Aristóteles deixa claro que a felicidade é algo louvável e perfeito. [...] é um princípio, pois fazemos todas as coisas tendo-a em vista, e o primeiro princípio e causa dos bens é, [...] algo louvável e divino. (ARISTÓTELES, 2001, p. 28.) Felicidade é uma certa atividade da alma conforme à virtude. (ARISTÓTELES, 2001, p. 23.) 3.1 Três modos de vida Para o autor estudado, não é irracional ser feliz a partir das coisas perecíveis e de diferentes modos de vida: De fato, o bem [15] e a felicidade não lhes parecem irracional estimar, a partir das coisas que são desta vida. Certamente, para a maioria e para os mais vulgares, é o prazer. Por isso amam a vida prazerosa. Com efeito, três são os tipos de vida tidos como mais excelentes: a que agora foi dita, a política, e a terceira é a contemplativa. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p. 54.) Se para os da vida prazerosa a felicidade está nos prazeres, outros, porém, os mais agraciados e atenuantes, buscam a honra. Pois, talvez, esta seja o fim da vida política. Mas isto parece ser mais supeficial do que se investiga. (Apud TOMÁS DE AQUINO, 2015, p. 55.) No caso da vida política, as pessoas buscam títulos, honras, riquezas, até uma vida virtuosa, porém, só para serem vistas, admiradas, buscando sua felicidade a partir do olhar do outro. O terceiro modo de vida, segundo a investigação aristotélica, é a vida contemplativa, é a que mais se aproxima da real finalidade humana: sua felicidade. Estão, nesse patamar os sábios e os filósofos, que orientados pelo exercício da razão buscam o bem por ser um bem em si mesmo e não por quererem outro bem a partir dele. Com essa diferenciação dos modos de vida, pode-se perceber, novamente, um escala dos bens, da finalidade e da felicidade, poderemos compreender melhor isso no próximo item desse artigo. 4. Telos : Bem comum Toda a arte e toda investigação, bem como toda a ação e toda a escolha, visam a um bem qualquer. [...] o bem é aquilo que todas as coisas tendem. (ARISTÓTELES, 2001, p. 9.) Podemos, a partir dessa afirmação, reconhecer a filosofia teleológica de Aristóteles, ou seja, está orientada por sua finalidade ( telos, em grego significa fim). 7

Na Ética a Nicômaco, a finalidade é identificada como o bem, em outras palavras, dizer que as ações humanas tendem a um fim é o mesmo que dizer que as coisas tendem a um bem. Entre os fins observa-se certa diversidade. O fim da medicina não é o mesmo que o da construção naval ou vice-versa. Em nós seres humanos há algum fim que desejamos por si mesmo e tudo o mais é desejado por causa dele... tal fim deve ser o bem, ou melhor, o sumo bem. (ARISTÓTELES, 2001, p. 9.) Conhecê-lo é o mesmo que acertar o alvo e ocorrerá grande influência sobre a vida do que o conhece. Aristóteles questiona-se: o que é esse bem? De qual ciência ou faculdade esse bem é objeto? Sabe que a finalidade dessa ciência deve necessariamente abranger a finalidade das outras, de maneira que essa finalidade deverá ser o bem humano e parece que esta é a ciência política. (ARISTÓTELES, 2001, p. 10.) Ao qual não visa o conhecimento, mas a ação e seu objetivo é o mais alto de todos os bens: a felicidade. Esse bem é algo próprio de um homem e que dificilmente lhe poderia ser tirado. (ARISTÓTELES, 2001, p. 13.) Podemos identificar o termo bem em dois sentidos: 1) ser bens em si mesmos e 2) em função dos primeiros; ou bens primários e os secundários. Assim, pode-se inferir que de acordo com a teoria teleológica aristotélica, a finalidade humana, é a felicidade, pessoal e coletiva, que é o próprio bem comum estudado pela ciência política. Considerações Finais: Os conceitos apresentados aqui de forma separada visam a investigação aristotélica sobre o fim último das coisas. Na realidade humana, não estão tão dissecados, misturam-se e completam-se. Separar a felicidade, de bem, de virtude e da finalidade é só uma maneira que adotamos para nosso estudo. Todas as ações humanas tendem a um fim, isto é, à realização de um bem específio; mas cada fim particular e cada bem específico estão em relação com um fim último e com um bem supremo, que é a feliciade. (REALE; ANTISERI, 2003, p. 217). O ser humano procura ser feliz, sua felicidade está na escolha certa, no momento certo, na meta certa e da forma certa de vivenciar tal finalidade. A busca de ser feliz, implica o agir bem pessoalmente e coletivamente, segundo à razão, e a finalidade das 8

coisas: o sumo bem. Por isso, a teoria teleológia aristotélica tem muito a oferecer ao homem do século XXI e suas maiores inquietações. Referências ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco. Trad. Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2001. CASTRO, Susana de (Org.). Introdução à Filosofia. Petrópolis: Vozes, 2008. CASTRO, Suzana de. A teoria aristotélica da substância. Rio de Janeiro: Contraponto, 2008. ESCÁBIA, Maria de Lourdes. A Ética a Nicômaco, de Aristóteles. Redefor Unesp, 2011. Disponível em: <http://filosofianomaringoni.blogspot.com.br/2013/03/a-eticanicomaco-de-aristoteles-maria.html>. Acesso em: 21 maio 2016. PASSOS JÚNIOR, Dilson, Aristóteles. Lorena: Centro Unisal, 2016. Digitado. REALE, G.; ANTISERI, D. História da Filosofia: 1 Filosofia Pagã Antiga. Trad. Ivo Storniolo. São Paulo: Paulus, 2003. Disponível em: <https://drive.google.com/file/d/0b8glz-fifkhdukjtlux1a3rea1u/view>. Acesso em: 22 maio 2016. SANTOS, Rui Rossi dos. A Virtude e a Felicidade em Aristóteles. Disponível em: <http://embaixadoresdaprevencao.com.br/gerenciador/uploads/arquivos/arquivo_52.pdf >. Acesso em: 15 abr. 2016. SILVEIRA, Denis. As Virtudes em Aristóteles. Revistas Uri, Frederico Westphalen. v.1, n.1, p. 41-71, 2000. Disponível em: <http://revistas.fw.uri.br/index.php/revistadech/article/viewfile/203/372>. Acesso em: 14 abr. 2016. TOMÁS DE AQUINO. Comentários à Ética a Nicômaco de Aristóteles (I-III): o bem e as virtudes. Trad. de Paulo Faitanain e Bernardo Veiga. Rio de Janeiro: Mutuus, 2015. v. I. VELASQUEZ, Tomlyta Luz. Resenha crítica sobre o livro Ética a Nicômaco. Salvador: Unifacs, 2011. Disponível em: <https://www.academia.edu/4640176/resenha_%c3%89tica_a_nicomaco?aut o=download >. Acesso em: 22 abr. 2016. 9