A Análise efetivação do Direito Social à Saúde no Brasil a partir da Comparação entre o Modelo Federativo Alemão e o Federalismo Sanitário Brasileiro

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Transcrição:

A Análise efetivação do Direito Social à Saúde no Brasil a partir da Comparação entre o Modelo Federativo Alemão e o Federalismo Sanitário Brasileiro Alder Thiago Bastos, Renato Braz Mehhana Khamis Universidade Santa Cecília Mestrado em Direito da Saúde - Dimensões Individuais e Coletivas, Santos-SP, Brasil. Email: thiago@advocaciabastos.adv.br Resumo: Trata-se de um estudo que parte de uma análise comparativa entre os modelos federativos alemão e brasileiro, buscando identificar se o baixo grau de efetivação do direito à saúde no Brasil tem alguma relação com o modelo de federalismo sanitário adotado pela Constituição de 1988. Constatou-se que existe um descompasso entre os federalismos sanitário e fiscal brasileiros, além de um excesso de competências atribuídas constitucionalmente à União, o que dificulta a efetivação do direito fundamental social à saúde no Brasil. Para tanto foi utilizado o método dedutivo em pesquisa amparada no procedimento bibliográfico, pois referenciada em doutrina, legislação e jurisprudência disponíveis em meio impresso e eletrônico. Palavras-chave: Constituição, comparativo, saúde, Brasil e Alemanha Abstract: It is a study that starts from a comparative analysis between the German and Brazilian federal models, trying to identify if the low degree of effectiveness of the right to health in Brazil has some relation with the model of federal federalism adopted by the 1988 Constitution. there is a mismatch between the federal health and fiscal federalisms, in addition to an excess of competences attributed constitutionally to the Union, which makes difficult the realization of the fundamental social right to health in Brazil. For that, the deductive method was used in research based on the bibliographic procedure, as it is referenced in doctrine, legislation and jurisprudence available in print and electronic media. Keywords: Constitution, comparative, health, Brazil and Germany Introdução Em quase trinta anos da Constituição de 1988, o Brasil adotou um federalismo próprio, sui generis, ao mesclar modelos de federalismo que são antagônicos entre sim. No modelo norte-americano (dualista), descentralizam-se as decisões do ente central, dando maior autonomia e liberdade aos Estados-membros na gerencia de seus interesses, caracterizando-se pelo ordenamento constitucional enxuto e conciso. O nosso sistema tributário adota o dualismo. O modelo alemão (cooperativista) é voltado para a centralização de decisões no ente central, dividindo-se a competência com os demais entes, conforme a amplitude do interesse em jogo (p. ex. o interesse local no caso dos municípios). Este modelo caracteriza-se por uma Anais do Encontro Nacional de Pós-Graduação VI ENPG Vol.1 (2017) Página 301

Constituição mais extensa e detalhada, semelhante à realidade brasileira, onde os direitos e as competências são centralizados na Constituição Federal e grande parte das leis são de competência da União. [1] No Brasil, a peculiaridade também está na inclusão do Município como Ente Federativo, participando da construção de políticas públicas no âmbito de sua competência sem qualquer hierarquia formal junto aos demais entes federativos, buscando, em uma complexa repartição de competência, descentralizar, ao menos na teoria, as tomadas de decisões naquela localidade. Nesta linha, percebe-se que há uma carência de estudos relacionados a problemática dos modelos de federalismos esculpidos na Constituição Federal de 1988, onde há priorização da discussão que investiga o sistema político-eleitoral e a própria divisão territorial, não havendo empenhos que resolvam os conflitos suscitantes dos direitos fundamentais e sociais emanados no modelo sui generis de federalismo adotado. [2] Diante disso, a Constituição Federal preocupou-se em descentralizar as medidas que visam a implementação do direito social à saúde, estabelecendo um modelo cooperativista entre os entes federativos, buscando uma atuação conjunta na efetivação de políticas públicas que resguardem os preceitos esculpidos no rol dos direitos fundamentais. A saúde, por seu turno, está classificada como direito social no art. 6 o da Carta Magna, mas sua regulamentação se inicia a partir do art. 196, ao preconizar que a saúde é um direito de todos e dever do Estado. Isto posto, tratando-se de dever comum de todos os entes federativos, e reforçando a ideia de cooperação, o art. 198, inciso I, estabelece ainda a descentralização, com direção única em cada esfera de governo. [3] Desta maneira, como o federalismo sanitário brasileiro inspira-se no modelo adotado pela Constituição Federal alemã, o presente estudo adota como ponto de partida a análise comparativa entre ambos os modelos para, a partir dela, analisar a efetivação do direito social a saúde no Brasil, de modo a identificar se o seu baixo grau guarda alguma relação com o modelo federativo adotado. Objetivo O federalismo sanitário brasileiro, inspirado no modelo alemão, estabeleceu como dever de todos os entes federativos a garantia do direito à saúde, inclusive no que tange à universalidade de acesso e integralidade de atendimento ainda que a Constituição alemã não elenque a saúde como direito social. Anais do Encontro Nacional de Pós-Graduação VI ENPG Vol.1 (2017) Página 302

Porém, a Carta Magna nacional centralizou as principais tomadas de decisões em relação à saúde nas mãos da União e, ao mesmo tempo, descentralizou a sua implementação com base na ideia de que os entes federativos devem contribuir mutuamente e de forma concorrente para defesa desse direito social. Tanto é assim que o Supremo Tribunal Federal e na Repercussão geral n 793 definiu que os entes federativos respondem de forma solidária nas demandas sanitárias, independentemente dos meios internos de compensação financeira que serão necessárias para atender a determinação. [4] Nesse contexto, busca-se aferir se o modelo de federalismo sanitário brasileiro impacta positiva ou negativamente - na efetivação do direito social à saúde no Brasil. Material e métodos Neste trabalho adotou-se o método dedutivo, buscando-se a validação da hipótese de que o federalismo sanitário brasileiro, inspirado no federalismo cooperativo alemão, apresenta problemas na implementação das políticas públicas sanitárias em função do descompasso existente entre o federalismo sanitário e o federalismo fiscal brasileiros, algo que não ocorre na Alemanha. Para tanto foi utilizado o procedimento bibliográfico, por se tratar de pesquisa amparada em doutrina, legislação e jurisprudência publicadas em meio escrito e eletrônico. Resultados Verifica-se pelo resultado que a Constituição brasileira referencia sua base teórica na Lei Fundamental Alemã, principalmente no que tange à proteção dos direitos fundamentais, enfatizando a dignidade humana. Para tanto, optou-se pelo detalhamento dos direitos fundamentais tal como na Alemanha, porém acrescentou-se os direitos sociais, como meio de afirmação daqueles direitos que foram suprimidos no período do regime militar. A ideia do direito social à saúde como direito fundamental não advém do modelo alemão, mas é obrigação de todos os entes federativos, sem hierarquia e de forma solidaria, responderem pela sua implementação, nos termos dos arts. 196 e 198, I da CF. No entanto, criou-se uma centralização excessiva de competências decisórias nas mãos da União, ente mais distante das realidades fáticas locais e regionais, atribuindo-se aos Estados e especialmente aos Municípios atribuições estritamente operacionais, as quais devem ser desenvolvidas sob à direção normativa e financeira da União. Afinal, com pouca disponibilidade financeira em virtude do federalismo fiscal dualista adotado no Brasil os Anais do Encontro Nacional de Pós-Graduação VI ENPG Vol.1 (2017) Página 303

Estados e principalmente os Municípios não gozam da autonomia necessária para implementar políticas de saúde de modo a atender as particularidades regionais e locais. Discussão Os direitos fundamentais no Brasil e na Alemanha ganharam entonação a partir de um ponto em comum, as atrocidades vivenciadas por um atentado às liberdades democráticas. Na Alemanha, a Lei Plenipotenciária (1933) desfez partidos políticos, sindicatos, além de revogar os direitos fundamentais e liberdade de imprensa. No Brasil não foi diferente, os partidos políticos eram controlados pelo governo militar, e havia um rígido controle dos meios de comunicação. [5] Justifica-se, portanto, o fortalecimento das Leis Maiores do Brasil e da Alemanha com base em direitos fundamentais e na dignidade humana, impactadas pela Declaração Universal de Direitos Humanos, haja vista que nas rupturas democráticas há o enfraquecimento da dignidade da pessoa humana e a justiça dos direitos sociais. [6] No entanto, a Constituição brasileira não se baseia no modelo alemão ao acrescentar o direito social da saúde como direito fundamental (arts. 196 e 198, I, CF). A única menção à saúde constante na Lei Fundamental da Alemanha está representada nos serviços obrigatórios na vigência do estado de defesa (art. 12A, 4).[3] [7] Partindo-se desse ponto, verifica-se que a Carta Magna nacional optou por centralizar na União as decisões relativas ao direito social à saúde, estabelecendo um Sistema Único de Saúde, com diretrizes tanto na disponibilização dos princípios de universalidade quanto da integralidade, estabelecendo solidariedade entre os entes federativos, sem qualquer hierarquia. Esta solidariedade, inclusive, foi objeto da Repercussão Geral n o 793, julgada no Plenário do Supremo Tribunal Federal em 05/03/2015. [4] Contudo, tal situação impacta na própria opção adotada pela Constituição ao seguir o federalismo fiscal dualista, pois estabelece uma centralização dos problemas relacionados à saúde na União, o ente federativo mais distante das realidades regionais e locais vivenciadas pelos Estados e Municípios, implicando na supressão de suas respectivas autonomias, tornando estes meros executores das políticas públicas definidas pela União. De se ressaltar que os Municípios acabam sendo mais fragilizados quanto às delimitações estabelecidas na Constituição Federal, pois gozam de orçamentos limitados para implementar as políticas públicas voltadas à saúde na localidade, assim como a solidariedade reafirmada pela Repercussão Geral n o 793 do Supremo impacta nas finanças dos Municípios, Anais do Encontro Nacional de Pós-Graduação VI ENPG Vol.1 (2017) Página 304

que ficam a mercê dos repasses de verbas oriundas dos entes federativos com maior arrecadação. Sob esse ponto, a autonomia também é suprimida, pois dependem de repasses para que possam atender às peculiaridades sanitárias locais, ou mesmo cumprir decisões judiciais que são constantemente proferidas em razão dos princípios da universalidade e da integralidade dos tratamentos médicos lato sensu. Conclusão Consta-se que o federalismo sanitário brasileiro adotado pela Constituição Federal de 1988 e a Lei Fundamental da Alemanha guardam semelhanças quanto ao modelo de federalismo cooperativo. Em que pese inexista qualquer referência do direito social à saúde na Constituição alemã, a brasileira, por seu turno, o faz nos art. 6 o e 196 da CF. Ocorre, porém, que o descompasso existente entre os federalismos sanitário e fiscal brasileiro dificulta a efetivação do direito social à saúde na medida em que Estados e Municípios, que são os entes federativos mais próximos das realidades regional e local, tem pouca interferência na definição das políticas públicas de saúde, tornando-se meros executores das políticas estabelecidas pela União, de qual dependem financeiramente. Referências bibliográficas 1. Rammê, RS. O federalismo em perspectiva comparada: contribuições para uma adequada compreensão do federalismo brasileiro. Revista Eletrônica Direito e Política, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica da UNIVALI, Itajaí, v.10, n.4, 3 o quadrimestre de 2015. Disponível em: www.univali.br/direitoepolitica - ISSN 1980-7791. Acesso em: 10/09/2017 2. Souza C. Federalismo, desenho constitucional e instituições federativas no Brasil pós- 1988. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, v. 24, n. 58, p. 105-121, jun. 2005. 3. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao compilado.htm. Acesso em: 10/09/2017 4. Supremo Tribunal Federal. Tema 793 Repercussão Geral. Recurso Extraordinário n o 855.178-RG/SE. Rel. Min. Luiz Fux. Plenário. Julgado em 05/03/2015 5. Mattos. ALQ. A realidade constitucional da República Federal da Alemanha. Revista do Senado. Brasília a. 43 n. 169 jan./mar. 2006. Disponibilizado em: http://www2. senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/92296/mattos%20ana.pdf?sequence=4. Acesso em 20/09/2017 6. Bonavides. P. A evolução constitucional do Brasil. Revista Estudos Avançados. Vol. 14 n o 40. São Paulo. Sept.Dec. 2000. Disponibilizado em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0103-40142000000300016&script=sci_arttext. Acesso em: 28/09/2017 Anais do Encontro Nacional de Pós-Graduação VI ENPG Vol.1 (2017) Página 305

7. Mendonça. AA. Lei Fundamental da Alemanha. Traduzida para o português. Atual. até jan. 2011. https://www.btg-bestellservice.de/pdf/80208000.pdf. Acesso em 10/09/2017. Anais do Encontro Nacional de Pós-Graduação VI ENPG Vol.1 (2017) Página 306