TROMBOEMBOLISMO PULMONAR PÓS-OPERATÓRIO EM CIRURGIA GERAL POSTOPERATIVE PULMONARY THROMBOEMBOLISM IN GENERAL SURGERY

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Transcrição:

110 TROMBOEMBOLISMO PULMONAR PÓS-OPERATÓRIO EM CIRURGIA GERAL POSTOPERATIVE PULMONARY THROMBOEMBOLISM IN GENERAL SURGERY BRUNO MOMBACH PIFFERO¹; CAUÃ OLIVEIRA ROCHA¹; FELLIPE STAHL MOCELLIN¹; MAURÍCIO AUGUSTO MACHADO¹; GUSTAVO CHATKIN²,³. ¹Acadêmico da Associação de Turma Médica 2017 da Escola de Medicina da PUCRS. ²Médico pneumologista do Hospital São Lucas da PUCRS. ³Professor da Escola de Medicina da PUCRS. RESUMO Objetivos: O objetivo dessa revisão é fornecer subsídios para o diagnóstico, manejo e profilaxia do quadro de tromboembolismo pulmonar (TEP) em pacientes em pós-operatório. Métodos: Foi realizada uma revisão e síntese da literatura disponível, procurando escolher os temas mais relevantes e contemporâneos. Resultados: A clínica de TEP é diversa e o diagnóstico desafiador, sendo prudente o uso de algoritmos específicos que evitam exames desnecessários e permitem o início do tratamento com a brevidade merecida. A escolha da estratégia de profilaxia deve ser feita baseada no risco estratificado pelo escore de Caprini. TEP é uma entidade prevalente e significante nos hospitais de todo o mundo e pacientes no período pós-operatório apresentam um maior risco de desenvolver esta condição. Após a estabilização clínica do paciente, anticoagulação deverá ser iniciada. Caso exista contra-indicação absoluta, existem alternativas terapêuticas a serem aventadas. A duração da anticoagulação é individualizada, durando pelo menos 3 meses. Conclusões: Por ser uma causa prevenível de morte, a profilaxia, identificação e manejo precoce do quadro são de suma importância. Palavras-chave: Tromboembolia; Embolia Pulmonar; Cirurgia Geral; Diagnóstico; Anticoagulantes.

Tromboembolismo pulmonar pós-operatório em cirurgia geral 111 ABSTRACT Aims: The objective of this review is to provide subsidies for the diagnosis, management and prophylaxis of pulmonary embolism (PE) in postoperative patients. Methods: A review and synthesis of the available literature was done by searching for the most relevant and recent themes. Results: The clinical presentation of PE is diverse and the diagnosis is challenging, so the use of specific algorithms to avoid unnecessary tests and to allow the treatment as soon as possible is advisable. The choice of the prophylactic strategy ought to be made based on the risk as stratified by the Caprini Score. After clinical stabilization, anticoagulation must be initiated. In case of absolute contraindication, there are therapeutic alternatives to be explored. The duration of the anticoagulation is individualized, lasting for at least 3 months. PE is a prevalent and relevant entity in hospital settings throughout the world, and postoperative patients are at an increased risk of developing this condition. Conclusions: Being a preventable cause of death, prophylaxis, early identification and treatment of the disease is of utmost importance. Keywords: Thromboembolism; Pulmonary Embolism; General Surgery; Diagnosis; Anticoagulants. INTRODUÇÃO Tromboembolismo venoso (TEV) é uma complicação comum durante a hospitalização. Representa entre 5 e 10% dos óbitos em pacientes hospitalizados, sendo a causa de morte prevenível mais prevalente em internações. Pacientes em pós-operatório constituem um grupo de risco para Trombose Venosa Profunda (TVP) e Tromboembolismo Pulmonar (TEP). Diversos estudos já demonstraram a eficiência e segurança de protocolos de profilaxia para estas condições, mas tais estratégias não são utilizadas em um número substancial de pacientes em pós-operatório. Estudos estimam que até 50% dos pacientes cirúrgicos com risco de TEV não recebem profilaxia adequada no Brasil. Análises pós-morte indicam uma prevalência similar aos EUA de casos de TEV, dos quais cerca de 30% evoluem para TEP. Em pacientes cirúrgicos sem profilaxia adequada, a incidência

112 de TVP pode variar de 10 a 80% dependendo do risco individual e do tipo de cirurgia realizada. A presença de trombo na circulação pulmonar aumenta a resistência vascular, gerando um aumento na pós-carga do ventrículo direito. Aumentos severos ou sustentados na pós-carga podem progredir para falência ventricular. Além da obstrução física, respostas humorais podem mediar vasoespasmo dos vasos não-embolizados, agravando severamente o quadro, principalmente em pacientes com doenças prévias. No período pós-operatório, os pacientes estão em risco elevado tanto pela estase venosa quanto pela hipercoagulabilidade. MÉTODOS Esse estudo constitui-se de uma revisão da literatura especializada, realizada nos meses de maio e junho de 2017, no qual realizou-se uma consulta a artigos científicos selecionados através de busca nos bancos de dados Pubmed e Google Scholar. A busca nos bancos de dados foi realizada utilizando as terminologias cadastradas nos Descritores em Ciências da Saúde criados pela Biblioteca Virtual em Saúde desenvolvido a partir do Medical Subject Headings da U.S. National Library of Medicine. As palavras-chave utilizadas na busca foram pulmonary thromboembolism, post-surgical, epidemiology, diagnosis, treatment, prophylaxis e follow-up. Os critérios de inclusão para os estudos encontrados foram a abrangência, relevância e contemporaneidade dos artigos selecionados. Foram excluídos artigos com mais de 7 anos ou de pouca abrangência. RESULTADOS Diagnóstico Apresentação Clínica A apresentação de TEP pode ser variável e inespecífica tornando o diagnóstico desafiador, logo os algoritmos específicos visam evitar exames diagnósticos desnecessários e iniciar o tratamento com brevidade.

Tromboembolismo pulmonar pós-operatório em cirurgia geral 113 Os sintomas mais comuns são dispnéia (73%), dor pleurítica (66%), tosse (37%) e menos frequentemente hemoptise (13%). Já os sinais que podem ser observados são taquipneia (70%), crepitantes à ausculta pulmonar (51%), dor/edema em membro inferior (44%), taquicardia (30%) e menos frequentemente choque (8%). Devem elevar o nível de suspeição para TEP: pós-operatório; puerpério; trauma recente; descompensação de cardiopatia ou doença pulmonar sem explicação aparente; hipotensão com elevação da pressão venosa central sem outra explicação (ex. Infarto agudo do miocárdio, pneumotórax hipertensivo, tamponamento cardíaco, arritmia). Exames Complementares Exames laboratoriais, em geral, não tem valor diagnóstico em casos de TEP, porém podem alterar o nível de suspeição, confirmar diagnósticos diferenciais e ajudar no prognóstico após um diagnóstico confirmado. Gasometria pode apresentar hipoxemia (74%) e alcalose respiratória associada à hipocapnia (41%). Troponina pode marcar disfunção ventricular direita. Dímero D é resultado da degradação da fibrina, seu valor aumentado detém relação com presença de trombos. Aumenta conforme a idade e pode também estar aumentado em situações como pós-operatório, gestação, puerpério, câncer, infecções e doenças inflamatórias, o que limita seu uso. Tem alto valor preditivo negativo em pacientes de baixa probabilidade clínica. Eletrocardiograma (ECG) e radiografia de tórax apresentam alterações comuns e inespecíficas e têm sua importância em excluir diagnósticos diferenciais. Ecocardiograma pode sugerir TEP evidenciando sinais de hipertensão pulmonar e falência de ventrículo direito. Exames Confirmatórios Os exames confirmatórios incluem a angiotomografia (Angio-TC), a angioressonância e a arteriografia pulmonar por cateter com subtração digital, métodos diretos, que permitem a identificação do trombo propriamente dito. A angiotomografia apresenta alto valor preditivo positivo (96%) e alto valor preditivo negativo (97%) para pacientes com alta e baixa probabi-

114 lidade clínica para TEP, respectivamente. Pacientes com probabilidade intermediária, os valores preditivos negativo e positivo foram de 92%. Além de bons resultados para o diagnóstico de TEP, possibilita ainda a avaliação de diagnósticos diferenciais. A angiorressonância apresenta valores diagnósticos parecidos e pode ser utilizada como alternativa à angio-tc em pacientes alérgicos ao contraste iodado. A arteriografia é considerada padrão ouro para diagnóstico de TEP, apesar de apresentar limitações de sensibilidade e especificidade em estudo de vasos subsegmentares. Seu uso é limitado por ser um método invasivo, ficando então reservado para casos nos quais os exames não- -invasivos são inconclusivos ou o paciente pode se beneficiar de trombectomia por cateter. Algoritmo Diagnóstico É necessária a definição da probabilidade clínica para TEP. Recomendase o uso de escores padronizados e validados como o Escore Canadense de Wells, o qual mais recentemente é dividido em dois níveis: TEP improvável escore 4; TEP provável escore >4. O escore de Wells contém os seguintes critérios com suas respectivas pontuações: Sinais objetivos de TVP, 3.0; Taquicardia (FC > 100 bpm), 1.5; Imobilização por 3 ou mais dias consecutivos ou cirurgia nas últimas 4 semanas, 1.5; TVP ou TEP prévias, 1.5; Hemoptise, 1.0, Neoplasia Maligna (ativa ou término do tratamento < 6 meses), 1.0; e Diagnóstico alternativo menos provável que TEP, 3.0. Para pacientes com escore menor ou igual a 4 devem ser dosados os dímeros D, valores abaixo do ponto de corte de 500 ng/ml afastam com segurança o diagnóstico de TEP e não há necessidade de continuar investigação nesse sentido. Caso o escore obtido seja maior que 4, não cabe a dosagem de dímeros D, pois um resultado negativo não é suficiente para afastar com segurança o diagnóstico de TEP. Em situações em que TEP é comum, como em pós-operatórios e em presença de neoplasia maligna, a especificidade com ponto de corte em 500 ng/ml não é adequada para uso assistencial, visto que nesses contextos o número de falsos positivos pode ser grande.

Tromboembolismo pulmonar pós-operatório em cirurgia geral 115 O exame de escolha para seguimento da investigação costuma ser a angiotomografia. Caso seu resultado seja concordante com a probabilidade clínica previamente definida, confirma-se ou exclui-se o diagnóstico de TEP. Caso haja discordância, deve-se continuar a investigação com uma ecografia de membros inferiores com doppler, mesmo na ausência de sintomas para trombose venosa profunda, pois caso essa esteja presente já possibilita diagnóstico de tromboembolismo venoso e início do tratamento. Em caso de ausência de TVP, o exame indicado a seguir é a arteriografia pulmonar que confirma ou afasta o diagnóstico de TEP com segurança por ser considerada padrão ouro. Já os pacientes clinicamente instáveis, que se apresentam com sinais de hipotensão e hipoxemia importante, há uma maior demanda na agilidade para o diagnóstico. A investigação se dá em conjunto com o manejo inicial que busca estabilizar o quadro. A investigação continua conforme o nível de suspeita clínica estimado. Em caso de suspeita alta é indicado o início de anticoagulação e seguimento de investigação já com angio-tc. Em caso de suspeita baixa ou moderada, a investigação se dá de maneira similar aos pacientes inicialmente estáveis. Tanto ecografia venosa com doppler como o ecocardiograma podem ser auxiliares em pacientes graves e instáveis que não possam ser levados para realizar angiotomografia. Profilaxia A decisão de uso de tromboprofilaxia em pacientes que serão submetidos à cirurgia depende do risco do paciente desenvolver tromboembolismo venoso profundo que, por sua vez, depende do risco estimado baseado nas características do paciente e do tipo de cirurgia a ser realizada. Um dos métodos mais bem aceitos e de fácil utilização para avaliação do risco inerente ao paciente é o escore de Caprini. As recomendações de profilaxia para pacientes submetidos à cirurgia geral são as seguintes: 1. Risco muito baixo para TEV (Caprini 0): deambulação precoce apenas.

116 2. Risco baixo para TEV (Caprini 1-2): profilaxia mecânica, preferencialmente compressão pneumática intermitente. 3. Risco moderado para TEV (Caprini 3-4): a) Sem risco de sangramento maior: Heparina de baixo peso molecular, Heparina não fracionada em baixa dose ou profilaxia mecânica, preferencialmente compressão pneumática intermitente. Há uma leve preferência por Heparina de baixo peso molecular. b) Com risco de sangramento maior: profilaxia mecânica, preferencialmente compressão pneumática intermitente. 4. Risco alto para TEV (Caprini 5): a) Sem risco de sangramento maior: Heparina de baixo peso molecular ou Heparina não fracionada em baixa dose associado à profilaxia mecânica com meias elásticas ou compressão pneumática intermitente. b) Cirurgia oncológica: profilaxia farmacológica de longa duração (4 semanas). c) Com risco de sangramento maior: profilaxia mecânica, preferencialmente compressão pneumática intermitente, até que o risco de sangramento diminua e, então, profilaxia farmacológica. Tratamento A partir da suspeita de tromboembolismo pulmonar, mesmo na ausência de um diagnóstico definitivo, o foco inicial do tratamento deve ser a estabilização clínica desse paciente. Oxigênio pode ser administrado para alcançar valores de saturação maiores ou iguais a 90%. Caso o paciente apresente sinais de falência respiratória e/ou hipoxemia severa, a ventilação mecânica deve ser considerada. O uso de anticoagulantes baseia-se no risco de sangramento e na presença de contra-indicações absolutas ao uso dos mesmos. O risco de sangramento pode ser estimado somando-se os seguintes fatores: idade maior de 75 anos, sangramentos prévios, câncer, falência renal,

Tromboembolismo pulmonar pós-operatório em cirurgia geral 117 falência hepática, trombocitopenia, acidente vascular encefálico prévio, diabetes, anemia, terapia antiplaquetária, mau controle com uso de anticoagulantes, comorbidades com redução da capacidade funcional, cirurgia recente, quedas frequentes e abuso de álcool. Cada fator listado equivale a 1 ponto. Caso o paciente não tenha nenhum desses fatores, seu risco de sangramento é considerado baixo. Se tiver 1 fator o paciente tem moderado risco de sangramento e com 2 ou mais fatores é estratificado como de alto risco. Para pacientes com baixo risco de sangramento, sugere-se o uso de anticoagulação. Pacientes com moderado risco, o uso deve ser individualizado. Alto risco, contra-indicada. Por exemplo: em pacientes com baixo risco de sangramento e com função renal normal, a enoxaparina é utilizada na dose de 1 mg/kg de peso a cada 12 h ou 1,5 mg/kg a cada 24 h, por via subcutânea. Em pacientes com insuficiência renal grave, deve-se usar preferencialmente a Heparina Não-Fracionada (HNF) ao invés da Heparina de Baixo Peso Molecular (HBPM), sendo a dose calculada a partir do peso do paciente (dose de ataque de 80 UI/kg e a dose de manutenção de 18 UI/kg endovenosa, ajustada a cada 6 h de acordo com valor do tempo de tromboplastina parcial ativada medido). Se iniciada, a HNF deve ser usada preferencialmente em regime de infusão contínua EV (menor recorrência de eventos trombóticos e menor chance de sangramentos). Para pacientes que permaneçam instáveis hemodinamicamente a despeito das manobras iniciais e que possuam alta suspeita de TEP, o uso de trombolíticos sistêmicos se torna uma alternativa, sempre atentando para o risco de sangramento associado. Na presença de contra-indicações ao uso de trombolíticos sistêmicos, existe como opção a tromboembolectomia cirúrgica. Nos casos com baixo risco de sangramento e com contra-indicações ao uso de anticoagulantes ou risco alto de sangramento, uma opção a ser considerada é o uso de filtro de veia cava inferior. O início precoce dos anticoagulantes orais, concomitante ao início da heparina, diminui o tempo de internação hospitalar, sendo, portanto, recomendado se o diagnóstico de TEP for confirmado. Atualmente existem diversas opções de anticoagulantes orais. O mais usado e estudado historicamente é a varfarina, sugerindo-se como dose inicial 5-10 mg/dia nos primeiros 3 dias, seguindo-se com o ajuste de acordo com a Razão

118 Normalizada Internacional (RNI) (alvo entre 2 e 3, por pelo menos 24 h, podendo então a heparina ser suspensa). Seguimento A duração do uso de anticoagulantes orais deve ser individualizada, pesando-se o risco-benefício (leia-se risco de sangramento versus o risco de trombose) de cada paciente. Em geral, um tempo mínimo de 3 meses é indicado. Pacientes recebendo heparina ou varfarina devem ser monitorados quanto às provas de coagulação (tempo de tromboplastina parcial ativada variando 1,5 2,5 vezes o limite normal durante o uso de heparina não fracionada e o RNI variando entre 2 3 durante o uso de varfarina). Utilizando-se de anticoagulantes como a heparina de baixo peso molecular, essa monitorização laboratorial não precisa ser realizada. Em relação aos novos anticoagulantes no mercado, muitos estudos têm demonstrado bons e promissores resultados, porém seu uso ainda precisa ser melhor avaliado. CONCLUSÃO TEP é uma entidade clínica relevante que deve ser considerada pela equipe que aborda um paciente em pós-operatório. Algoritmos para a prevenção, diagnóstico e tratamento possuem eficácia e segurança comprovadas, mas ainda não são utilizados tão amplamente quanto seria o recomendado. Uma boa anamnese e um exame físico criterioso são de importância fundamental para o cuidado do paciente, identificando complicações clínicas que forneçam subsídios para a realização de exames complementares. O tratamento consiste de manejo do quadro agudo e, no caso de alguns pacientes, prevenção de recidivas ao longo da vida.

Tromboembolismo pulmonar pós-operatório em cirurgia geral 119 FLUXOGRAMA TEV: Tromboembolismo venoso; HBPM: heparina de baixo peso molecular; HNFBD: heparina não-fracionada em baixa dose. Escolha de profilaxia com base no escore de Caprini.

120 REFERÊNCIAS 1. Konstantinides SV, Torbicki A, Agnelli G, Danchin N, Fitzmaurice D, Galiè N, Gibbs JS, Huisman MV, Humbert M, Kucher N, Lang I, Lankeit M, Lekakis J, Maack C, Mayer E, Meneveau N, Perrier A, Pruszczyk P, Rasmussen LH, Schindler TH, Svitil P, Vonk Noordegraaf A, Zamorano JL, Zompatori M; Task Force for the Diagnosis and Management of Acute Pulmonary Embolism of the European Society of Cardiology (ESC). 2014 ESC guidelines on the diagnosis and management of acute pulmonary embolism. Eur Heart J. 2014 Nov 14;35(43):3033-69, 3069a-3069k. 2. Kakkar AK, Cohen AT, Tapson VF, Bergmann JF, Goldhaber SZ, Deslandes B, Huang W, Anderson FA Jr; ENDORSE Investigators. Venous thromboembolism risk and prophylaxis in the acute care hospital setting (ENDORSE survey): findings in surgical patients. Ann Surg. 2010 Feb;251(2):330-8 3. Fernandes CJ, Alves Júnior JL, Gavilanes F, Prada LF, Morinaga LK, Souza R. New anticoagulants for the treatment of venous thromboembolism. J Bras Pneumol. 2016 Apr;42(2):146-54. 4. Irwin R. Antithrombotic therapy and prevention of thrombosis. 3 th ed.: American College of Chest Physicians; 2012. 5. Lapner S, Kearon C. Diagnosis and management of pulmonary embolism. BMJ. 2013 Feb 20;346:f757. 6. Terra-Filho M, Menna-Barreto SS; Comissão de Circulação Pulmonar da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia SBPT. Recomendações para o manejo da tromboembolia pulmonar. J Bras Pneumol. 2010 Mar;36 Suppl 1:S1-68.