PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY SOLIVAN ARANTES VALENTE



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PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY SOLIVAN ARANTES VALENTE Professor - Engenharia Elétrica - UnicenP/Centro Universitário Positivo solivan@unicenp.edu.br 173 da Vinci da Vinci,, Curitiba, v. 2 v., n. 2, 1, n. p. 1, 155-172, p. 1-208, 2005 173

PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY RESUMO O presente trabalho apresenta um sistema de apoio ao planejamento da manutenção preventiva de uma instalação industrial. O sistema proposto é alimentado com dados sobre diversos fatores que influenciam a determinação da periodicidade das ações de manutenção preventiva sobre uma dada máquina, e fornece uma proposta de eventual correção nesta periodicidade com vistas a equilibrar o binômio: custos de manutenção versus disponibilidade das instalações. Este equilíbrio é buscado com diligência pela indústria em face das constantes exigências de redução de custos operacionais e de aproveitamento do parque instalado, com redução a um mínimo possível do tempo de máquinas paradas devido a panes. Palavras-chave: planejamento de manutenção, manutenção industrial, lógica nebulosa. ABSTRACT This paper presents a maintenance planning support system for an industrial facility. The system receives data related to many factors which affect the decision about preventive maintenance periodicity over a machine and provides a suggestion to adjust this setting, intending to balance between maintenance cost and plant availability. Companies compelled both to reduce operational costs and to make the best use of its machinery diligently search this equilibrium, trying to reduce to a minimum the halted time due to machine failure. Key words: maintenance planning, industrial maintenance, fuzzy logic. 174

SOLIVAN ARANTES VALENTE PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY SOLIVAN ARANTES VALENTE 1 INTRODUÇÃO Há inúmeros fatores que podem levar uma máquina a uma pane, como falhas de construção, utilização incorreta, falhas no seu dimensionamento, condições ambientais desfavoráveis de operação, etc. Assim, é praticamente impossível evitar que um equipamento falhe em algum momento de sua vida útil. Entretanto, é possível minimizar as panes, tanto em número quanto em gravidade, por meio de um bom planejamento de manutenção preventiva. Como manutenção preventiva, no contexto industrial, entende-se todo o conjunto de atividades que se realiza em uma máquina com o intuito de prolongar ao máximo sua vida útil, evitar panes e, assim, reduzir a um mínimo aceitável as paradas de uma determinada instalação fabril. Da mesma forma que é difícil prever uma falha em uma máquina, é igualmente difícil a análise de todas as variáveis em jogo no momento de se determinar a freqüência com que a máquina deve sofrer intervenções de manutenção preventiva. Periodicidades muito curtas têm um alto custo, enquanto atividades feitas com pouca freqüência são ineficazes e, muitas vezes, inócuas. A análise da periodicidade de atividades de manutenção possui variáveis que não podem ser medidas objetivamente, como, por exemplo, o modo como o operador trata a máquina. É natural a noção de que uma máquina operada com zelo precisará de menos intervenções de manutenção preventiva do que outra que seja comandada por um operador relapso. Entretanto, não há como medir objetivamente este comportamento do usuário; se não há como medir, não há como estabelecer uma expressão matemática que relacione este fator à freqüência de intervenções de manutenção. Além disso, mesmo para variáveis que possam ser objetivamente quantificadas e medidas, em geral não há uma relação matemática clara entre as suas diversas combinações e a freqüência de intervenções ideal para o cenário que elas representam. A única ferramenta que existe, ao menos para a grande maioria das empresas, é o bom senso e a experiência da equipe de planejamento de manutenção. Por estes motivos, problemas deste tipo podem ser abordados naturalmente por técnicas de representação do conhecimento (como as heurísticas 1 ), nomeando-se entre elas os sistemas de lógica nebulosa (ou fuzzy). O sistema de apoio proposto neste trabalho armazena num conjunto de regras (chamado de Base de Regras) o conhecimento de pessoas experientes 1 Heurística metodologia, ou algoritmo, usado para resolver problemas por métodos que, embora não rigorosos, geralmente refletem o conhecimento humano e permitem obter uma solução satisfatória (Dicionário Aurélio, Século XXI). 175

PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY em planejamento de manutenção. Isto é feito por meio de expressões lingüísticas que pretendem dotar o sistema de um comportamento semelhante ao de um especialista. O diagrama apresentado na figura 1 ilustra de forma esquemática os fatores que influenciam de forma preponderante a tomada de decisão sobre a freqüência com que as intervenções de manutenção preventiva devem ocorrer. A descrição da cada entrada e da saída é feita na seção 3. Figura 1 Entrada e saídas do sistema de avaliação. (Fonte: autor) Um sistema de apoio como esse tem grande potencial de aplicação na indústria uma vez que, dado o grande volume de máquinas instaladas, pequenas alterações na freqüência com que as atividades de manutenção são realizadas podem significar grande economia de recursos humanos. Em diversas situações podem evitar panes de longa duração que aumentam muito o custo do processo produtivo. 2 CONCEITOS BÁSICOS DE SISTEMAS FUZZY Um sistema baseado em Lógica Fuzzy (SLF), ou em Lógica Nebulosa, é um mapeamento não linear de um vetor de entrada para uma saída escalar. O caso em que a saída também é um vetor pode ser decomposto em um conjunto de sistemas de múltiplas entradas e uma saída (MENDEL, 1995). A figura 2 mostra a representação genérica de um SLF. O sistema mapeia entradas crisp 2 para saídas crisp e apresenta quatro partes: a base de regras, o fuzzificador, a máquina de inferência e o defuzzificador. 2 Seja um conjunto A definido num universo U:. Esta definição caracteriza um conjunto do tipo crisp e significa que nenhum elemento do universo U pode pertencer simultaneamente ao conjunto A e ao seu complemento. Todas as operações de lógica clássica utilizam conjuntos crisp. Em contrapartida, se A fosse um conjunto fuzzy, poderiam existir elementos do universo U que pertencessem simultaneamente a A e ao seu complemento. Denomina-se grau de pertinência (µ A [0,1]) a medida de pertinência de um dado elemento a um conjunto fuzzy. 176

SOLIVAN ARANTES VALENTE Figura 2 Representação de um Sistema de Lógica Fuzzy (SLF). (Fonte: autor) Uma vez que as regras tenham sido estabelecidas, um SLF pode ser visto como um mapeamento,, das entradas, x, para as saídas y = f(x). A base de regras pode ser escrita por especialistas humanos, capazes de determinar de que forma a saída do sistema deve relacionar-se com as entradas, ou pode ser extraída de dados numéricos de forma a espelhar nas regras a relação observada. Em geral, as regras de um SLF apresentam-se como expressões do tipo: Nesta expressão, u 1, u 2 e v são chamadas de variáveis lingüísticas associadas às entradas crisp u 1 e u 2 e à saída v, respectivamente. O termo da regra anterior à implicação lógica então é chamado de premissa da regra, e o termo após de conseqüente da regra. As variáveis lingüísticas podem assumir um número finito de valores lingüísticos, cujas instâncias são denotadas por U 1i, U 2 j e V k. Por exemplo: seja um SLF cujas variáveis de entrada u 1 e u 2 representem a temperatura e a pressão de uma caldeira, e cuja variável de saída, v, seja o ângulo de abertura de uma válvula de escape. Os valores lingüísticos associados a u 1 podem ser, por exemplo, fria, quente e quente demais, e a u 2, baixa, de trabalho e perigosa, enquanto que os valores lingüísticos para a variável de saída poderiam ser fechada, semi-aberta e aberta. Um exemplo de regra deste SLF poderia ser Se u 1 é quente e u 2 é perigosa então v é semi-aberta. O fuzzificador faz o mapeamento das entradas crisp para os conjuntos fuzzy de entrada, atribuindo a cada valor numérico de entrada um grau de pertinência a um (ou mais) destes conjuntos. Os conjuntos fuzzy contínuos são representados por uma função de pertinência convexa, e os discretos por um conjunto de valores de pertinência. No exemplo acima, supondo um universo de discurso para a variável u 1 de 0ºC a 1000ºC, os conjuntos fuzzy, podem ser representados por funções de pertinência como mostra a figura 3. Neste exemplo, um valor de temperatura de entrada de u 1 = 400ºC possui um grau de pertinência ao conjunto fuzzy quente de 0,6 e, simultaneamente, um grau de pertinência de 0,4 ao conjunto fria. Isto significa que uma temperatura de caldeira de 400ºC, neste exemplo, é entendida como mais pertinente ao conjunto fuzzy quente do que ao conjunto fuzzy fria, embora pertença a ambos simultaneamente. (1) 177

PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY Figura 3 Exemplo de repartição do universo de discurso da entrada u 1 por 3 funções de pertinência (Fonte: traduzido de PASSINO e YURKOVICH, 1998) Como cada variável de entrada é associada às demais na premissa de cada regra (equação 1), é necessário estabelecer de que forma os conectores lógicos e (conjunção) e ou (disjunção) devem se comportar quando os operandos não assumem apenas valores lógicos 0 e 1, como na lógica clássica, mas quaisquer valores entre 0 e 1; da mesma forma, a implicação lógica então deve ser definida. As operações de conjunção são realizadas por meio das chamadas Normas-T, dentre as quais a mais popular é a operação de mínimo isto é, a operação lógica e entre dois valores de pertinência resulta no menor valor entre ambos enquanto as operações de disjunção usam as Normas-S, ou Co-normas-T, dentre as quais a mais comum é a operação de máximo, que resulta no maior valor de pertinência dentre os dois operandos. A implicação lógica então é realizada por meio da aplicação de uma das Normas-T entre a premissa e o conseqüente da regra em questão. A máquina de inferência do SLF mapeia conjuntos fuzzy para conjuntos fuzzy, isto é, associa todas as regras que foram ativadas 3 num determinado instante para compor o conjunto fuzzy ao qual pertence a variável de saída neste instante. A agregação das regras recebe o nome de algoritmo fuzzy e consiste na união das regras ativadas com a utilização de uma Norma-S, dual à Norma-T utilizada nas implicações lógicas de cada regra individual. O conjunto fuzzy assim formado pela união das regras ativadas deve, então, dar origem a um valor crisp para a variável de saída. Esta tarefa é realizada pelo defuzzificador, que mapeia o conjunto fuzzy de saída para números crisp por meio de um dos chamados métodos de defuzzificação. Dentre eles, o mais comum é o Método de Centro de Área (COA Center of Area), que atribui à variável de saída a abscissa do centro geométrico do conjunto fuzzy resultante da agregação das regras. Outro método comumente empregado é o Método da Média dos Máximos, em que a variável de saída recebe o valor da abscissa correspondente ao ponto médio dos trechos de maior valor da função de pertinência resultante da união das regras ativadas. 3 Uma regra é dita ativada quando o grau de certeza da sua premissa (resultante da aplicação de uma Norma-T entre os termos que a compõem) for maior que zero. 178

SOLIVAN ARANTES VALENTE Além da forma apresentada na equação 1, há ainda outras maneiras de compor os termos conseqüentes das regras de um SLF, como o modelo de Takagi-Sugeno (PASSINO, 1998). Informações mais detalhadas sobre sistemas de lógica nebulosa podem ser encontradas em KOSKO (1982), BOJADZIEV e BOJADZIEV (1995) e HARRIS et al. (1993), entre outros. 3 ESPECIFICAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA 3.1 Premissas A máquina de inferência do sistema fuzzy escolhido é do tipo Mamdani (MAMDANI e ASSILIAN, 1975), com cinco entradas e uma saída. Como não há dados sobre experiências anteriores, o sistema não tem sua base de regras construída sobre dados históricos, mas sim sobre expressões lingüísticas que representam o conhecimento de uma equipe de planejamento. No caso de se ter um registro histórico de um longo período, é possível utilizar esses dados para realizar a sintonia da base de regras do sistema fuzzy. Entretanto, esta metodologia, aplicada a este problema em particular, tem a desvantagem de transferir para a base de regras o comportamento incerto das análises de periodicidade feitas ao longo da vida de um equipamento pelo método de tentativa e erro. Este problema pode ser minimizado através de uma análise criteriosa dos dados históricos, o que nem sempre é uma tarefa simples de ser realizada. 3.2 Descrição das Variáveis A tabela 1 apresenta o detalhamento das variáveis de entrada e de saída, conforme ilustrado na figura 1. 179

PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY Tabela 1 Detalhamento das variáveis As variáveis de entrada apresentadas são as que representam, em função da experiência do autor, os fatores preponderantes na determinação da freqüência das atividades de manutenção preventiva. Entretanto, esta lista não é exaustiva e outros fatores podem ser igualmente considerados e inseridos como novas variáveis de entrada. Da mesma forma, as faixas de valores adotadas podem ser modificadas, adequando o sistema de análise à realidade de cada equipe de planejamento de manutenção. 3.3 Funções de Pertinência Os suportes 5 das variáveis de entrada e da variável de saída foram divididos entre as funções de pertinência de acordo com os atributos apresentados na tabela 2. 4 O método FMEA tem sua origem no procedimento MIL-P-1629, intitulado Procedures for Performing a Failure Mode, Effects and Criticality Analysis, desenvolvido pelo exército dos EUA em 1949. Este procedimento era usado como uma técnica de avaliação de confiabilidade e dos efeitos de falhas em sistemas e em equipamentos. As falhas eram classificadas de acordo com o seu impacto no sucesso das missões e na segurança do pessoal e dos equipamentos. Esta metodologia de análise militar deu origem ao procedimento SAE J-1739 da Society of Automotive Engineers, amplamente empregado na indústria automotiva norte-americana (por iniciativa da Ford, da GM e da DaimlerChrysler). Na França, o FMEA recebe o nome de AMDEC (Analyse des Modes de Défaillance, de leurs Effets et de leur Criticité) e é adotado pelos grupos Renault e PSA. O índice RPN do FMEA (ou índice C do AMDEC) é utilizado como uma métrica de classificação de riscos potenciais de falhas em equipamentos de uma instalação; é calculado como o produto RPN = S x O x D. O fator S indica a severidade da falha, se ela ocorrer, o fator O indica a probabilidade de ocorrência da falha e o fator D indica a probabilidade da falha ser detectada se vier a ocorrer. O procedimento SAE J-1739 estabelece para os três fatores uma escala de 1 a 10. Entretanto, cada empresa pode definir escalas próprias, atribuindo aos valores de sua escala significados adequados à sua realidade fabril. Este trabalho, a título de exemplo, adota um valor máximo para o índice RPN de 80, com um valor limite crítico de 16; novos valores máximo e crítico podem ser facilmente adaptados ao sistema proposto. (SAE, 2002) 5 Suporte é o nome que se dá ao conjunto dos domínios das funções de pertinência de uma variável. 180

SOLIVAN ARANTES VALENTE Tabela 2 Suportes das variáveis Os atributos são nomes que identificam cada uma das funções de pertinência. Esta forma de identificação facilita a criação da base de regras do sistema fuzzy, uma vez que cada regra aparece como uma sentença lógica escrita em português e não como uma expressão matemática (vide seção 2). As funções de pertinência adotadas são mostradas a seguir, nas figuras de 4 a 9. Os valores entre colchetes indicam as abscissas dos vértices de cada função. Todas as funções variam, em amplitude, entre 0 (falso) e 1 (verdadeiro). As figuras foram obtidas com auxílio da toolbox de Lógica Fuzzy do aplicativo Matlab, da MathWorks. Variável: Freqüência atual Atributos: Muito curta Função de pertinência triangular [1, 1, 4] Curta Função de pertinência triangular [1, 4, 8] Média curta Função de pertinência triangular [4, 8, 12] Média Função de pertinência triangular [8, 12, 26] Média longa Função de pertinência triangular [12, 26, 52] Longa Função de pertinência triangular [26, 52, 104] Muito longa Função de pertinência triangular [52, 104, 104] Figura 4 Funções de pertinência da variável Freqüência atual. (Fonte: autor) Variável: Modo de utilização Atributos: Relapso Função de pertinência triangular [1, 1, 5] Regular Função de pertinência triangular [1, 5, 10] Cuidadoso Função de pertinência triangular [5, 10, 10] 181

PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY Figura 5 Funções de pertinência da variável Modo de utilização. (Fonte: autor) Variável: Criticidade da máquina Atributos: Baixa Função de pertinência triangular [1, 1, 4] Média Função de pertinência trapezoidal [1, 4, 8, 16] Alta Função de pertinência trapezoidal [8, 16, 80, 80] Figura 6 Funções de pertinência da variável Criticidade da máquina. (Fonte: autor) Variável: Desvio da Dp Atributos: Zelo desnecessário Função de pertinência trapezoidal [ 5, 5, 2, 0] Próximo de zero Função de pertinência triangular [ 2, 0, 2] Regular Função de pertinência triangular [0, 2, 5] Ruim Função de pertinência trapezoidal [2, 5, 100, 100] 182

SOLIVAN ARANTES VALENTE Figura 7 Funções de pertinência da variável Desvio da Dp. (Fonte: autor) Variável: Custo de manutenção Atributos: Baixo Função de pertinência trapezoidal [0, 0, 8, 16] Médio Função de pertinência trapezoidal [8, 16, 24, 32] Alto Função de pertinência trapezoidal [24, 32, 50, 50] Figura 8 Funções de pertinência da variável Custo de manutenção. (Fonte: autor) Variável: Freqüência corrigida (saída) Atributos: Muito curta Função de pertinência triangular [1, 1, 4] Curta Função de pertinência triangular [1, 4, 8] Média curta Função de pertinência triangular [4, 8, 12] Média Função de pertinência triangular [8, 12, 26] Média longa Função de pertinência triangular [12, 26, 52] Longa Função de pertinência triangular [26, 52, 104] Muito longa Função de pertinência triangular [52, 104, 104] 183

PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY Figura 9 Funções de pertinência da variável Freqüência corrigida (saída). (Fonte: autor) A palavra muito utilizada na descrição dos atributos das variáveis Freqüência Atual e Freqüência Corrigida não é um modificador 6 lingüístico; ela foi usada por conveniência e por falta de um termo mais apropriado. 3.4 Operadores Lógicos Conforme descrito na seção 2, é necessário definir os operadores para as operações lógicas de associação dos termos das premissas das regras (conjunção e e disjunção ou ), bem como para as operações de implicação nas regras (premissa conseqüente) e de agregação das regras (algoritmo fuzzy). Os operadores adotados neste trabalho são apresentados na tabela 3, definidos em função da máquina de inferência escolhida, do tipo Mamdani. Tabela 3 Operadores lógicos 3.5 Base de Regras A base de regras, conforme já mencionado, é construída sob a forma de expressões lingüísticas que representam o conhecimento de um planejador de manutenção. As regras utilizadas neste trabalho foram construídas com base na experiência do autor e não esgotam todas as possibilidades. De fato, há inúmeras regras que poderiam ser adicionadas em função de dados históricos de manutenção e da experiência da equipe de planejamento. 6 Modificador lingüístico é uma forma de alterar a utilização de um atributo de uma variável, numa regra fuzzy, de modo a dar-lhe mais ou menos intensidade. 184

SOLIVAN ARANTES VALENTE Este trabalho utilizou uma base com 109 regras, das quais algumas podem ser observadas na tabela 4. A coluna Ação indica que comportamento é o recomendado para a combinação dos atributos Modo de Utilização, Criticidade da Máquina, Desvio da Dp e Custo Médio de Manutenção da regra em questão; esta ação é aplicada ao atributo da variável Freqüência Atual para especificar o atributo da variável de saída Freqüência Corrigida. Uma ação do tipo relaxar significa que o atributo da Freqüência Corrigida deve ser aquele referente ao da Freqüência Atual modificado para o correspondente à função de pertinência imediatamente à direita, isto é, que aumenta o tempo entre as intervenções de manutenção preventiva. Uma ação do tipo apertar tem o efeito oposto, enquanto uma ação do tipo manter dá à Freqüência Corrigida o mesmo atributo da Freqüência Atual. Tabela 4 Extrato da base de regras 185

PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY 3.6 Método de Defuzzificação O método de defuzzificação adotado é o de centro de área, por levar em consideração as funções de pertinência de saída como um todo, e não apenas os pontos de maior pertinência (como no método da média dos máximos). 3.7 Implementação Com o objetivo de ter uma ferramenta útil e de fácil utilização, o sistema de lógica fuzzy (SLF) construído foi implementado no formato de uma planilha no software Microsoft Excel. A figura 10 mostra uma pequena porção da tela. O usuário informa os valores das variáveis de entrada para o equipamento que está sob análise (pequena coluna azul central). A planilha calcula automaticamente os valores de pertinência e calcula as implicações de todas as regras. Ao clicar no botão AVALIAR, o Excel executa uma rotina (macro) de defuzzificação e coloca o resultado, ou seja, a freqüência corrigida, no pequeno quadro amarelo. Figura 10 Implementação do SLF via Microsoft Excel. (Fonte: autor) No caso do equipamento sob análise neste exemplo, observamos o seguinte: - a freqüência atual de manutenção preventiva é de 4 semanas; - o operador tem nota 7, isto é, tende a usar a máquina de maneira cuidadosa; - a criticidade da máquina tem RPN=12, isto é, está abaixo do limite crítico padrão (RPN=16); - apresenta um desvio de 1% em sua disponibilidade, ou seja, está 1 ponto percentual acima do que lhe é exigido em termos de desempenho; - o custo médio por hora de manutenção sobre esta máquina é de R$25,00. Com base nestas informações, o sistema sugere que a freqüência de atividades de manutenção preventiva sobre este equipamento seja aumentada de 4 para 6,4 semanas. Se, por exemplo, cada intervenção tomar em média 1h 30 min para ser realizada e existirem 50 máquinas como esta numa dada instalação, haverá uma economia anual (a cada 52 semanas) de: 186

SOLIVAN ARANTES VALENTE A figura 11 mostra, na área preenchida em azul, o conjunto fuzzy resultante da agregação das regras ativadas no exemplo apresentado. O valor da variável de saída (Freqüência Corrigida = 6,4 semanas) é a abcissa do centróide desta área, em conformidade com o método de defuzzificação adotado. A ordenada do centróide também é calculada e aparece na figura 10, logo abaixo do pequeno quadro amarelo. Figura 11 Regras ativadas cálculo da saída. (Fonte: autor) Uma observação importante deve ser feita quanto a uma limitação desta implementação. Para valores de Freqüência Atual muito próximos dos limites (1 e 104 semanas), os resultados obtidos devem ser avaliados com cuidado, uma vez que os valores das demais variáveis de entrada podem tender a fazer a Freqüência Corrigida extrapolar estes limites, o que não é possível. Este problema pode ser contornado com a utilização de intervalos maiores na planilha, ainda que não sejam adotados de fato pela equipe de manutenção. 4 CONCLUSÕES Os sistemas fuzzy possuem a grande vantagem de permitir que o usuário especifique o seu comportamento através de regras lingüísticas, mais palpáveis e mais próximas da forma de raciocínio humano do que as expressões matemáticas convencionais. Além disso, permitem que se construam sistemas, como o apresentado, nas situações em que não existem modelos matemáticos nem formas precisas de calcular uma determinada variável. O sistema fuzzy proposto pode colaborar para uma grande economia nas empresas, no tocante à gestão de seu parque fabril, promovendo a redução de custos com suas atividades de manutenção preventiva. Tendo em vista as variáveis de entrada consideradas, pretende-se atingir esse objetivo numa solução de compromisso entre a preservação do maquinário instalado e o corte de gastos extras devidos a atividades desnecessárias. 187

PLANEJAMENTO DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA EM PLANTAS INDUSTRIAIS COM AUXÍLIO DE LÓGICA FUZZY REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOJADZIEV, G.; BOJADZIEV, M. Advances in fuzzy systems: applications and theory. World scientific, 1995. (Fuzzy sets, fuzzy logic, applications, 5). HARRIS, C.J.; MOORE, C.G.; BROWN, M. Intelligent control: aspects of fuzzy logic and neural nets. Londres: World Scientific, 1993.(World scientific series in robotics and automated systems). KOSKO, B. Neural networks and fuzzy systems: A dynamical systems approach to machine intelligence. Rio de Janeiro: Prentice-Hall, 1982. MAMDANI, E. H.; ASSILIAN, S. An experiment in linguistic synthesis with a fuzzy logic controller. International Journal of Man-Machine Studies, v. 7, n.1, p. 1-13, 1975. MENDEL, J. M. Fuzzy logic systems for engineering: a tutorial. Proceedings of the IEEE, v. 83, n. 3, p. 345-377, 1995. PASSINO, K.M; YURKOVICH, S. Fuzzy Control. California: Addison-Wesley, 1998. SAE. SAE J1739 : potential failure mode and effects analysis in design (Design FMEA) and potential failure mode and effects analysis in manufacturing and assembly processes (Process FMEA) and effects analysis for machinery (Machinery FMEA). SAE Automotive Quality And Process Improvement Committee, 2002. 188