FUNDAMENTOS DA PREVENÇÃO E DO CONTROLE DE PERDAS E AS METODOLOGIAS PARA IDENTIFICAÇÃO DE RISCOS:

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Transcrição:

FUNDAMENTOS DA PREVENÇÃO E DO CONTROLE DE PERDAS E AS METODOLOGIAS PARA IDENTIFICAÇÃO DE RISCOS: Uma breve revisão da literatura Janduhy Camilo Passos* 1.Evolução das ações prevencionistas Por estarem inseridas em um ambiente dinâmico e mutável as organizações podem sofrer perdas associadas ao seu patrimônio, uma vez que o referido ambiente é permeado de riscos. Assim, faz-se necessário à identificação antecipada de todos os fatores que geram ameaças ao patrimônio organizacional, considerando que esta ação permite que sejam adotadas medidas preventivas visando evitar a ocorrência das possíveis perdas. Em termos de evolução, porém, observa-se que parte das ações relativas à prevenção de perdas foi desenvolvida em virtude da grande incidência de infortúnios do trabalho, pois a gravidade e a freqüência das lesões nos trabalhadores, os danos às máquinas e equipamentos, às instalações e ao processo produtivo, demandaram uma série de esforços que, de início, tinham como objetivo prevenir e controlar tais eventos. Na verdade, o que se buscava era manter as empresas dentro de um conceito de segurança, o qual estava relacionado exclusivamente à prevenção e à eliminação dos riscos que poderiam afetar os trabalhadores. Do mesmo modo, todos os estudos e pesquisas realizados giravam em torno das lesões que poderiam ser produzidas através dos acidentes de trabalho. Uma empresa segura, então, seria aquela onde ocorresse o menor número de acidentes e estes eram enfocados segundo o custo que produziam, sem haver a ponderação das diversas perdas patrimoniais que estavam associadas à ocorrência desses acidentes. Carvalho (1984), ao estudar as metodologias propostas para a investigação dos acidentes do trabalho e os riscos que os deflagraram, faz um apanhado histórico e relata a existência de quatro diferentes modelos, sintetizados no quadro a seguir. Tais métodos não são excludentes permitindo que, na prática, eles possam e devam ser utilizados de modo combinado. De acordo com Santos & Rodrigues (1997), essa primeira divisão das metodologias para identificação de riscos é decorrente da escolha do objeto central de análise. Nesse sentido, Denton, apud Santos & Rodrigues (1997), afirma que os métodos cujo enfoque recai sobre a segurança nos locais de trabalho podem estar centrados no trabalho ou nos empregados, embora existam métodos que tentem combinar essas duas propostas. Os métodos centrados nos empregados postulam que um ambiente seguro pode ser criado e mantido pelos mesmos, desde que eles sejam motivados a desempenharem as suas funções com segurança. Para isso, algumas técnicas devem ser usadas, como a supervisão geral e o incentivo à classe trabalhista. O incentivo pode ser obtido através de maior participação nas decisões relativas à segurança; podem ser utilizados também os treinamentos em relações humanas, a associação da segurança com emoções agradáveis ou recompensadoras, a melhoria da comunicação interna etc. Essas ações visam a motivar os empregados a reconhecerem o seu meio ambiente e as suas reações diante deste, com o objetivo de se precaverem e de se conduzirem de forma segura.

QUADRO 1: Métodos de investigação dos acidentes de trabalho MÉTODO CARACTERÍSTICAS COMPORTAMENTAL Utiliza o comportamento humano e suas avaliações giram em torno do comportamento individual ou coletivo, possibilitando vários enfoques, dentre os Quais destacam-se: a susceptibilidade do indivíduo aos acidentes; e a concepção psicodinâmica, para a qual os acidentes podem ser iniciados por razões de comportamento. EPIDEMIOLÓGICO A ênfase recai sobre a procura das causas dos acidentes e, com esse intuito, são percorridos os atos inseguros, as condições inseguras, as falhas humanas etc., colhendo-se dados estatísticos quanto à incidência, horário, local etc. Esse método sugere múltipla causalidade e age primariamente como elemento de seleção. SISTEMAS Para esse modelo o acidente seria causado pela produção anormal do sistema homem-máquina e tem as suas causas individuais estudadas dentro do conjunto do sistema trabalho, cujos fatores se entrelaçam e se auto-regulam. O sistema completo de trabalho seria a execução da operação: indivíduo x material x tarefa x ambiente. INCIDENTES CRÍTICOS FONTE: adaptado de Carvalho, 1984. Estuda os quase-acidentes, ou os incidentes considerados críticos, que poderiam conduzir a um acidente. Assim, os acidentes são investigados através de uma metodologia onde se realizam entrevistas (anônimas) com os indivíduos para a formulação de um relatório a ser processado, analisado e discutido nas Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPA), afim de que sejam tomadas as medidas preventivas necessárias. Em relação aos métodos de abordagem centrados no trabalho, Santos & Rodrigues (1997) dizem que os mesmos têm como ênfase a correção das deficiências nos locais de trabalho através da engenharia. Nesses métodos, é comum o emprego de técnicas como a supervisão severa, incentivos materiais, pecuniários ou a concessão de folgas. Também são usados treinamentos visando a dotarem os trabalhadores dos conhecimentos necessários para o reconhecimento de riscos de acidentes e para a operação correta dos equipamentos. Ainda, são empregados avisos e outras formas de comunicação, mostrando e enfatizando os riscos de acidentes de trabalho e as suas conseqüências. Conforme os autores citados, essa segunda abordagem tem como objetivo definir a forma mais segura para se realizar um trabalho. Logo após, os trabalhadores são treinados de acordo com definições estabelecidas, e um rígido controle é exercido sobre a obediência às normas de segurança. Quanto a métodos que procurem unir as duas vertentes citadas por Denton, encontra-se o MEPHISTO (Metodologia para Estudo e Projetos em Higiene e Segurança do Trabalho). Nessa metodologia, o estudo dos riscos é realizado através do levantamento de dados relativos às condições ambientais e as suas relações com os meios naturais, sociais e técnicos que envolvem o trabalhador e o relacionam com os demais agentes (o empregador e o restante dos funcionários) e com os instrumentos de trabalho. As condições de vida do funcionário também são levantadas por meio de entrevistas que abordam vários aspectos, inclusive a vida familiar. Para Santos (1996), esse método permite tirar conclusões, tanto a respeito de como o trabalho e as condições de vida podem predispor o funcionário a doenças e acidentes no trabalho, como possibilita o diagnóstico dos pontos críticos, em nível de unidade e em nível de seção de trabalho, apontando a ordem de prioridades para o encaminhamento da solução dos problemas encontrados. Isso, levando em conta a possibilidade de implantação de soluções.

A filosofia de que os acidentes também poderiam gerar danos à propriedade (acidentes sem lesões) foi introduzida por Heinrich, a partir de 1931. Nos estudos que realizou, Heinrich conseguiu demonstrar que, para cada acidente com lesão incapacitante, havia 29 acidentes que produziam lesões não incapacitantes (leves) e 300 acidentes sem lesões (De Cicco & Fantazzini, 1985). Durante o período de 1959 a 1966, o engenheiro Frank Bird Jr. empreendeu uma pesquisa na qual analisou mais de 90 mil acidentes ocorridos em uma empresa siderúrgica americana, e atualizou a relação estabelecida por Heinrich, desenvolvendo a proporção 1:100:500. Ou seja, para cada uma lesão incapacitante, existiam 100 lesões não incapacitantes e 500 acidentes com danos à propriedade (De Cicco & Fantazzini, 1985). Os dados obtidos permitiram que Bird desenvolvesse a sua teoria intitulada de Controle de Danos. Um programa de Controle de Danos é aquele que requer a identificação, registro e investigação de todos os acidentes com danos à propriedade, e a determinação do seu custo para a empresa. Além disso, todas essas medidas deverão ser seguidas de ações preventivas (De Cicco & Fantazzini, 1985). Ao se implantar um programa de Controle de Danos, um dos primeiros passos a serem adotados é a revisão das regras convencionais de segurança, as quais estão voltadas apenas para a questão das lesões. Desse modo, as regras devem ser ampliadas com o objetivo de abranger os danos à propriedade, e essas alterações devem envolver desde a alta direção da empresa até o corpo funcional, pois todos deverão saber que regra foi mudada e qual a razão da mudança. Ainda, é importante que qualquer pessoa envolvida no programa compreenda que, para este ser bemsucedido, será necessário um período, devidamente planejado, de comunicação e educação, com o intuito de mostrar a gravidade de não se informar qualquer acidente com dano à propriedade que venha a ocorrer na empresa (De Cicco & Fantazzini, 1985). Segundo Tavares (1996) e De Cicco & Fantazzini (1985), Bird ainda ampliou o seu referencial de estudo analisando acidentes ocorridos em 297 empresas, as quais representavam 21 grupos de indústria diferentes, com um total de 1.750.000 operários que trabalharam mais de 3 bilhões de horas durante o período de exposição. Assim sendo, obteve a seguinte proporção: 1:10:30:600. Para cada acidente com lesão incapacitante, havia 10 acidentes com lesões leves, 30 acidentes com danos à propriedade e 600 acidentes sem lesão ou danos visíveis (quase-acidentes). Estes dados podem ser melhor compreendidos observando-se a figura 1. Prosseguindo o trabalho iniciado por Bird, e partindo do pressuposto de que os acidentes que resultam em danos às instalações, aos equipamentos e aos materiais têm as mesmas causas básicas daqueles que resultam em lesões, John A. Fletcher, em 1970, propôs o estabelecimento de programas de Controle Total de Perdas, cujo objetivo maior é reduzir ou eliminar todos os acidentes que possam interferir ou paralisar um sistema. De acordo com a proposta de Fletcher, o Controle Total de Perdas deve ser concebido de modo que permita a eliminação de todas as fontes que possam interromper um processo produtivo, quer elas resultem de lesão, dano à propriedade, incêndio, explosão, roubo, vandalismo, sabotagem, poluição da água, do ar, do solo, doença ocupacional ou defeito do produto (De Cicco & Fantazzini, 1985). A partir de 1972, surge uma nova abordagem na questão de prevenção de perdas. Essa abordagem, fundamentada nos trabalhos desenvolvidos por Willie Hammer, foi denominada de Engenharia de Segurança de Sistemas e ampliou o escopo da atuação do prevencionismo, pois as empresas passaram a ser visualizadas dentro de um enfoque sistêmico (De Cicco & Fantazzini, 1985).

Segundo Chiavenato (1999, p. 56), um sistema é caracterizado por ser um conjunto integrado de partes, íntima e dinamicamente relacionadas, que desenvolve uma atividade ou função e é destinado a atingir um objetivo específico. Todo sistema integra um sistema maior, chamado supra-sistema, e é formado por sistemas menores ou subsistemas. Esse conceito mostra que as empresas podem ser consideradas como um sistema social aberto, visto que interagem com o ambiente externo. Nessa interação as empresas recebem insumos (inputs) e os transformam em bens e/ou serviços, através das relações intra-organizacionais (ambiente interno), que são ofertados ao mercado consumidor (outputs) e dele recebem informações (feedback) que vão influenciar o comportamento geral do sistema. Lesão incapacitante Lesões graves ou incapacitantes 1 1 1 Lesões leves 29 100 Lesões leves Acid. c/ dano à propriedade 10 30 Acidentes c/ Danos a Quase acidentes propriedade 300 500 600 Heinr FIGURA 1: Comparação dos estudos realizados por Heinrich e Bird FONTE: Tavares, 1996. Bird Essa visão sistêmica das organizações possibilitou que uma outra perspectiva fosse inserida no prevencionismo, fazendo com que o mesmo passasse a contemplar os eventos ou fatos antecessores á concretização dos acidentes, possibilitando que as ações preventivas adotadas pelas empresas não fossem mais apenas baseadas em tentativas e erros ou em avaliações pós-fato das causas que produziram o acidente. Isso permite evitar a formalização dos acidentes e, conseqüentemente, a ocorrência de inúmeros prejuízos ao patrimônio empresarial, uma vez que o mesmo fica resguardado de situações geradoras de efeitos indesejados. Deve-se considerar que os eventos ou fatos antecessores são os quase-acidentes abordados por Bird, e que agora são definidos como incidentes críticos. Trata-se, portanto, de uma situação ou condição com potencial para provocar dano, mas que não o manifesta. A importância do enfoque sobre os incidentes críticos encontra respaldo nos resultados das pesquisas desenvolvidas sobre os mesmos, como a realizada em uma indústria manufatureira de New Jersey. Suas conclusões mostram que os erros e as condições inseguras detectadas nos acidentes sem lesão eram os mesmos que desencadeavam os acidentes com lesões. Também foi apurado que os futuros acidentes com lesões e/ou danos materiais poderiam ser prenunciados analisando-se os quase-acidentes. Deve-se observar, no entanto, que os incidentes críticos poderão ocorrer várias vezes, antes que as variáveis envolvidas configurem as condições que levem ao acidente em termos de danos materiais e/ou lesões (De Cicco & Fantazzini, 1985).

2. Técnicas para identificação de riscos A respeito da identificação de riscos, a Engenharia de Segurança de Sistema condensa várias técnicas que, anteriormente, eram dirigidas ao campo aeroespacial, automotivo e para indústrias de apoio, mas que também se mostraram úteis nas áreas de estudo dos riscos que afetavam as empresas civis, e foram paulatinamente introduzidas ao prevencionismo. Essas técnicas, citadas por Tavares (1996) e De Cicco & Fantazzini (1985), são chamadas genericamente de técnicas de Análise de Riscos 1. A primeira delas é a Série de Riscos, surgida a partir da necessidade de se determinar qual foi o agente diretamente responsável por um evento, e caracterizando-se como uma técnica de identificação que ordena os riscos pela importância ou gravidade destes. Assim, têm-se o risco principal (responsável direto pelo dano), os riscos (ou o risco) iniciais que originam a série, e os riscos contribuintes. Uma vez obtida a série, cada risco é analisado em termos das possíveis inibições que podem ser aplicadas a cada caso. A Análise Preliminar de Riscos (APR), por sua vez, consiste em um estudo, durante a concepção ou desenvolvimento prematuro de um novo sistema, com a finalidade de determinar os riscos que poderão estar presentes em sua fase operacional. Esse procedimento é de suma importância, principalmente nos casos em que o sistema a ser concebido não possui semelhança com outros existentes. Já a Análise de Modos de Falha e Efeitos (AMFE) permite analisar como podem falhar os componentes de um equipamento ou sistema, estimar as taxas de falhas, determinar os efeitos que poderão advir e, conseqüentemente, estabelecer as mudanças necessárias para aumentar a probabilidade de que o sistema ou equipamento realmente funcione de maneira satisfatória. A Técnicas de Incidentes Críticos (TIC), incluída na abordagem de Carvalho (1984) como método, é realizada através de uma amostra aleatória e estratificada de observadores-participantes, que são selecionados dos principais departamentos da empresa em análise, com o objetivo de garantir uma amostra representativa de operações, inseridas nas diferentes categorias de riscos. É operacionalizada através de entrevistas, nas quais o entrevistador interroga os participantes que tenham executado serviços específicos dentro de determinados ambientes, pedindo-lhes para recordar e descrever erros e condições inseguras que tenham cometido ou observado. Assim, os participantes são estimulados a descreverem o maior número possível de incidentes críticos, sem se aterem ao fato de que estes resultaram ou não em danos à propriedade, ou lesões. Após essa etapa, os incidentes descritos são classificados em categorias de riscos, a partir das quais definem-se as áreas problemáticas relativas aos acidentes. Essa identificação permite que sejam delineadas as ações prioritárias para a distribuição dos recursos disponíveis, como também a organização de um programa de prevenção de acidentes. Por último, a Árvore de Análise de Falhas (AAF). Essa é uma técnica de análise que permite uma abordagem lógica e sistemática de um evento muito indesejado. Essa técnica pode fornecer a probabilidade de ocorrência em estudo e gera os chamados conjuntos mínimos catastróficos, que são falhas simultâneas, desencadeadoras de catástrofes. A AAF encontra sua melhor aplicação 1 Análise de risco é o estudo detalhado de um objeto visando identificar perigos e avaliar os riscos associados. O objeto pode ser organização, área, sistema, processo, atividade, intervenção. Cardella (1999, p.106).

diante de situações complexas devido à maneira sistemática na qual os vários fatores podem ser apresentados. Independentemente da forma de abordagem do risco, quer este esteja associado ou não à questão das perdas restritas aos acidentes do trabalho, a literatura ainda aponta outros meios que possibilitam identificá-lo, como as seguintes ações propostas por De Cicco & Fantazzini (1985): 1 Checklist e roteiro: são questionários básicos, repetidamente preenchidos para cada seção da unidade produtiva em estudo. Segundo Tavares (1996, p.50) é ideal como primeira abordagem na análise de riscos de qualquer situação, pois permite que sejam revisados inúmeros riscos. Também, gera um relatório detalhado que serve como material de treinamento e base de revisões futuras. 2 Inspeção de segurança (ou inspeção de riscos): é a procura de riscos comuns já conhecidos de maneira teórica. Esse conhecimento facilita a prevenção de acidentes, pois as possíveis soluções já foram estudadas anteriormente e encontram-se registradas. Para obter êxito, as inspeções devem envolver todo o corpo funcional com o intuito de gerar comprometimento. Também existe a necessidade de se organizar um programa bem definido, onde se estabeleçam, entre outros itens, o que será inspecionado, a freqüência da inspeção, seus responsáveis e as informações que serão verificadas. Em um nível secundário, encontram-se as inspeções de equipamentos, realizadas diariamente pelos funcionários, no início do turno de trabalho. Para isso, deve ser elaborada uma ficha de inspeção fácil, com os pontos a serem observados dispostos em ordem lógica, e o preenchimento deverá ser feito com uma simples marcação ou visto. 3 Fluxogramas: são gráficos que demonstram a seqüência de uma operação ou de um processo e podem ser utilizados para identificar perdas potenciais. Inicialmente, elabora-se um fluxograma maior, genérico, contendo todas as operações da empresa, desde o fornecimento da matéria-prima até a entrega do produto ao consumidor final. Posteriormente, são elaborados fluxogramas detalhados de cada uma das operações definidas no início, que tornam possível a identificação de futuras perdas. A elaboração dos fluxogramas requer o envolvimento funcional para garantir o detalhamento necessário das atividades e assim fornecer maiores condições para se identificarem riscos e perdas potenciais. 4 Investigação de acidentes: constitui-se em uma verificação de dados relativos ao acidente e ao acidentado (comportamento, atividade exercida, tipo de ocupação etc.) com o objetivo de se detectarem as causas ou os fatores que desencadearam o fato. Dentro dessa perspectiva, as investigações proporcionam a identificação de riscos já conhecidos ou não. Outros meios de identificação de riscos também merecem ser considerados, como por exemplo, os citados por Cardella (1999) e observados no quadro a seguir: QUADRO 2: Métodos de identificação de riscos TÉCNICA CARACTERÍSTICAS What If (E se) consiste em detectar perigos utilizando questionamento aberto promovido pela pergunta E se? O objeto da What If pode ser um sistema, processo, equipamento ou evento. Os questionamentos podem ser livres ou sistemáticos. No questionamento livre, o objeto é questionado por meio da pergunta E se...? em relação a qualquer aspecto que se julgar conveniente ou que vier à cabeça no momento. No sistemático, o objeto é focalizado segundo a visão de diversos especialistas. Estudo de consiste em identificar desvios de variáveis de processo em relação a valores Identificação de estabelecidos como normais. O objeto do Hazop são os sistemas e o foco são os Perigos e desvios das variáveis de processo. Sua operacionalização é feita através da aplicação Operabilidade de palavras guias às variáveis do processo. Essas palavras estimulam a criatividade para detectar desvios. São elas: nenhum, reverso, mais, menos, componente a mais, (Hazop) mudança na composição e outra condição operacional. Análise pela Matriz de consiste em observar os elementos do objeto de estudo verificando os perigos que

Interações Análise pela Árvore das Causas (AAC) podem resultar das interações entre esses elementos. Como objeto de análise encontram-se os sistemas, instalações, processos, atividades e intervenções. O foco são as interações entre os elementos do objeto. O conjunto das interações possíveis contém o subconjunto das interações perigosas. é uma variação da Análise por Árvore de Falhas (AAF). A principal diferença entre ambas é que a AAC utiliza fatos (eventos ocorridos) e a AAF, eventos potenciais. Análise Comparativa FONTE: adaptado de Cardella (1999) compara o objeto de estudo com padrões estabelecidos em projeto. Seu objeto são os sistemas, instalações e processos, em qualquer fase do ciclo de vida, e o foco recai sobre os desvios em relação aos padrões. 3. Considerações finais A devida proteção do patrimônio organizacional está condicionada ao conhecimento ou identificação prévia de todos os elementos e fatores que tornam possível o acontecimento de perdas. Sob esse enfoque, é necessário que o profissional encarregado da gestão dos riscos organizacionais utilize os vários recursos disponíveis com o objetivo de evitar a materialização dos riscos e, por extensão, a ocorrência das perdas. Entre os recursos citados está conhecimento das ações prevencionistas cujo fundamento está alicerçado nas várias metodologias que possibilitam a identificação de riscos. No entanto, como afirmam De Cicco & Fantazzini (1985), não existe um método ótimo que permita uma total identificação. Na prática, deve-se utilizar a combinação dos vários métodos existentes, para a abrangência do maior número de informações possíveis sobre os riscos. Assim sendo, é indispensável que o gestor conheça e operacionalize as várias técnicas disponíveis visando a correta aplicação das mesmas no âmbito organizacional. Isto conforme as características possuídas pela empresa e as variáveis que intervém sobre a mesma como: tamanho das instalações físicas, sistema de produção utilizado, bens/ou serviços ofertado ao mercado, número de funcionários, relação com o meio que a cerca (clientes, fornecedores, órgãos governamentais etc.) etc. Assim sendo, entender a existência e a possibilidade de materialização dos riscos que ameaçam as organizações é considerar sempre a possibilidade da ocorrência de perdas. Contudo, esse entendimento não deve levar o gestor ao esquecimento ou a negligência relativa às perdas, pois mesmos que nem todas elas sejam igualmente sérias (no sentido do tamanho do prejuízo sobre o patrimônio organizacional), é necessário que as organizações busquem entender como elas são produzidas ou geradas com o intuito de evitar aquelas cuja repercussão possam acarretar prejuízos maiores ou até mesmo comprometer a sobrevivência da organização.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARDELLA, Benedito. Segurança no trabalho e prevenção de acidentes - uma abordagem holística: segurança integrada à missão organizacional com produtividade, qualidade, preservação ambiental e desenvolvimento das pessoas. São Paulo: Atlas, 1999. CARVALHO, Alberto Mibielli de. Métodos de investigação dos acidentes do trabalho. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional e Segurança. v.12, p.65-68. São Paulo: FUNDACENTRO, jul/set, 1984. CHIAVENATO, Idalberto. Administração nos novos tempos. Rio de Janeiro: Campus, 1999. DE CICCO, Francesco; FANTAZINNI, Mário Luiz. Técnicas modernas de gerência de riscos. São Paulo: IBGR, 1985. TAVARES, José da Cunha. Noções de prevenção e controle de perdas em segurança do trabalho. São Paulo: Ed. Senac, 1996. SANTOS, Cidália de Lourdes de Moura. Avaliação de uma metodologia para identificação de riscos de acidentes para a equipe médica. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba, 1996. (Dissertação, Mestrado em Engenharia de Produção). SANTOS, C.L.M; RODRIGUES, C.L.P. Metodologias para a identificação de riscos: uma avaliação preliminar. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 1997, Gramado. Anais... Porto Alegre: UFRGS, 1997.