As Práticas de Gestão de Pessoas e o Processo de Aprendizagem nas Organizações: um estudo de caso



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Transcrição:

As Práticas de Gestão de Pessoas e o Processo de Aprendizagem nas Organizações: um estudo de caso Autoria: Vania de Fátima Barros Estivalete Resumo O presente artigo tem por objetivo analisar as práticas de gestão de pessoas e a inter-relação com o processo de Aprendizagem Organizacional, identificando os fatores facilitadores e limitadores desse processo. A estratégia metodológica utilizada foi o estudo de caso realizado em uma Cooperativa localizada no interior do Estado do Rio Grande do Sul, destaque em qualidade na região. Os sujeitos da pesquisa são em número de 11, incluindo-se o presidente, a gerência de Recursos Humanos e os gerentes das unidades de negócios que fazem parte do Comitê Gestor da Qualidade. A coleta dos dados foi baseada em fontes documentais, questionários e entrevistas individuais semi-estruturadas. A análise dos dados foi feita qualitativamente à luz do referencial teórico utilizado nesse estudo. Os entrevistados revelaram que as práticas de gestão de pessoas incentivam a aprendizagem organizacional, porém têm consciência da necessidade de um trabalho mais intenso neste sentido e manifestaram não ter clareza quanto à aprendizagem individual e organizacional. É relevante ressaltar que o conceito de aprendizagem organizacional foi confundido com mudança e adaptação, uma vez que todos os entrevistados citaram a implantação da qualidade como uma estratégia de aprendizagem adotada pela organização. 1. Introdução Neste mundo de rápidas transformações, muitas empresas têm buscado meios e ações estratégicas para garantir a sobrevivência no mercado. A preocupação com a qualidade, produtividade e competitividade tem sido, cada vez mais, uma constante na vida das organizações. Essa preocupação exige a predisposição por parte das pessoas e organizações de permanente aprendizado, visando acompanhar esse turbulento cenário de mudanças. Cada vez mais é preciso que haja o reconhecimento da necessidade de profissionais qualificados, preparados para enfrentar a acirrada competitividade e, principalmente, dispostos a aprender a aprender e a oportunizar o aprendizado a outras pessoas que fazem parte da organização. Para isso, salienta-se a grande ênfase que tem sido dada às práticas de gestão de pessoas alinhadas a novos formatos de aprendizagem e desempenho, buscando-se instituir uma cultura de aprendizagem nas organizações. Assim, as práticas de gerenciamento das pessoas que atuam nos mais diversos setores, incluindo-se as cooperativas, são consideradas necessidade imperante, visto ser a forma mais rápida e eficaz para alavancar e conduzir o processo de mudanças e aprendizagem nas organizações. Observa-se, porém que, se de um lado as organizações têm necessidade de buscar a qualidade, diminuir os custos, aumentar a produtividade, etc., como fonte de flexibilidade, agilidade, competitividade e modernidade; do outro têm necessidade de investir em práticas contemporâneas de recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento de pessoas, bem como remunerar estrategicamente, além de qualificar seus recursos humanos, pois esses são considerados a verdadeira fonte de vantagem competitiva, devido à sua capacidade original de combinarem emoção com razão, subjetividade com objetividade quando conhecem situações, quando desempenham tarefas, interagem e decidem (Davel & Vergara, 2001 p.32).

2 Nessa perspectiva e diante dessas preocupações surgem indagações sobre as práticas de gestão de pessoas, a busca contínua da qualidade e o processo de aprendizagem individual e organizacional. Estão as organizações, destaque em qualidade, utilizando práticas de gestão de pessoas que possibilitem criar uma cultura de aprendizagem? Estão as pessoas preparadas para criar o ambiente que possibilite às empresas incorporar o modelo de aprendizagem organizacional? Estão as pessoas dispostas a aprender a aprender e a dar condições para que as demais pessoas aprendam? A utilização das práticas de gestão de pessoas facilitam a aprendizagem organizacional e o compromisso com novas idéias e práticas empresariais? Dessa forma, este estudo visa: investigar e analisar, em uma organização destaque em qualidade, as práticas de gestão de pessoas e a inter-relação com o processo de Aprendizagem Organizacional, identificando os fatores facilitadores e limitadores desse processo. Assim, apresenta-se a seguir a base conceitual que serviu de alicerce para o desenvolvimento dessa pesquisa, os procedimentos metodológicos utilizados, a análise e discussão dos dados e as considerações finais desse estudo. 2. Base Conceitual: Um Recorte Teórico 2.1. Administração de Recursos Humanos (RH) ou Gestão de Pessoas? O gerenciamento de pessoas nas organizações tem sido foco de estudo e discussões de diversos autores. Muito se tem falado sobre as mudanças que vem ocorrendo no que se refere à gestão de pessoas no contexto organizacional, porém observa-se um grande paradoxo. De um lado, destaca-se a ênfase à implementação de novos sistemas de gestão, no qual o ser humano passa a ser o foco principal na administração das organizações. De outro lado, observa-se a grande distância que existe entre o discurso (aquilo que se quer) e a ação (aquilo que realmente se faz), o que exige das organizações novas maneiras de pensar e fazer RH (Ulrich, 1998 p.233). Para esse mesmo autor empresas bem sucedidas serão aquelas capazes de transformar estratégias em ação rapidamente, de gerenciar processos de forma inteligente, de maximizar o compromisso e a colaboração do funcionário e de criar condições para uma mudança consistente. Essas mudanças, por sua vez, impulsionam o questionamento de paradigmas, provocando nas pessoas que ocupam funções gerenciais um estado de abertura e flexibilidade para (re)discutir, (re)ver e (re)criar uma nova forma de pensar e agir em relação à gestão de pessoas. Nesse sentido, apresenta-se a contribuição de Chiavenato (2000, p.13) sobre as tendências mais marcantes relacionadas à gestão de pessoas que podem ser visualizadas no quadro abaixo: Quadro 1 Tendências da ARH 1. Uma nova filosofia de ação: não mais administrar recursos humanos, ou administrar pessoas, mas sim administrar com as pessoas. 2. Enxugamento e downsizing voltado para o core business da área. 3. Metamorfose da área de serviços em área de consultoria interna. 4. Transferência de decisões e ações para a média gerência. 5. Intensa ligação com o negócio da empresa. 6. Ênfase na cultura organizacional participativa e democrática. 7. Utilização de mecanismos de motivação e de realização pessoal. 8. Adequação das práticas às diferenças individuais das pessoas. 9. Completa virada em direção ao cliente interno ou externo. 10. Preocupação com a criação de valor para a empresa ou para o cliente. 11. Contínua preparação da empresa e das pessoas para o futuro. 12. Preocupação com a gestão do conhecimento e com a melhoria do capital intelectual. 13. Visão voltada para o ambiente externo e utilização do benchmarking. Fonte: Chiavenato, Idalberto. Como transformar RH (de um centro de despesa) em um centro de lucro. São Paulo: Makron Books, 2000, p. 20. 2

3 O mundo de hoje, caracterizado pela grande competitividade, certamente exigirá um grande esforço por parte das organizações para fazer com que as mudanças realmente aconteçam. A preocupação com a dimensão humana e com a valorização das pessoas tem sido, cada vez mais, intensificada e tem adquirido relevância estratégica no ambiente empresarial. Dentro desse panorama de transformações, Motta (1998) salienta a importância das pessoas como diferencial competitivo e sintetiza as principais mudanças na forma de gerenciá-las, apresentadas no quadro 2: Quadro 2 Recursos Humanos na Organização do Futuro por Tendências Atuais Fatores Passado Presente Presente Futuro Concepção do recurso humano pessoa talentosa Funcionário Carreira e Progresso crescimento no emprego: perseguir aumento da empregabilidade: criar o próprio alternativas conhecidas futuro. Avaliação Chefias aberta e coletiva Formação e aprender o necessário: a empresa indica autodesenvolvimento (habilidades múltiplas): o Conhecimento funcionário escolhe Remuneração variável: critérios individuais e grupais; variável: incentivos e benefícios adaptados às incentivos financeiros e materiais expectativas individuais Gestão de recursos Centralizada: órgão especializado descentralizada: repartida pelos setores humanos empresariais Cultura da gestão das impessoalidade, exploração, estima e pessoalidade, desenvolvimento e retribuição pessoas benevolência Premissa da lealdade à empresa a si próprio Fonte: Motta, Paulo R. Transformação Organizacional: a teoria e a prática de inovar. Rio de Janeiro: Qualitymark Ed., 1998, p.101 O quadro acima reforça a descentralização da gestão de pessoas e a importância do autodesenvolvimento do funcionário através de contínuo aprendizado. Assim, ressalta-se a contribuição de Ulrich (2000, p.1) ao mencionar a necessidade de criar um novo papel e uma nova pauta para a área que focalizem os resultados e não as atividades tradicionais da área. Thévenet (apud Davel & Vergara 2001) identifica as seguintes mudanças que afetam a gestão de pessoas: Quadro 3 Mudanças que afetam a Gestão de Pessoas 1. Interações entre trabalho e tecnologia. 2. Mudanças nas definições de cargos. 3. Integração de novas categorias de trabalho. 4. Importância crescente da aprendizagem contínua. 5. Controle do trabalho pelos consumidores. 6. Transformação nas funções de liderança e supervisão. 7. Passagem de uma abordagem individual para uma abordagem coletiva de trabalho em equipe. Fonte: elaborado pela pesquisadora com base em Thévenet (apud Davel & Vergara 2001, p. 40) As mudanças, até então apresentadas, retratam o momento que estamos vivendo de intensas trocas de paradigmas, mudando os referenciais que norteiam o gerenciamento de pessoas. Valores, idéias, práticas tradicionais de gestão de pessoas que serviam de referência passam por momentos de readequação ou até desconstrução. Desta forma, cabe a nós 3

4 enxergarmos a área de Recursos Humanos sob uma nova visão, pautada no caráter estratégico coerente com as exigências do mundo contemporâneo. Nessa perspectiva, surgem alguns questionamentos que suscitam reflexões: estão as empresas, realmente, administrando Recursos Humanos ou gerindo pessoas? Em que sentido a área de Recursos Humanos (ARH) tem assumido papel estratégico no contexto das organizações? Como as práticas de gestão de pessoas podem facilitar a aprendizagem individual e organizacional? Assim, passa-se a seguir a explanação sobre a abordagem estratégica da área de Recursos Humanos (ARH) nas organizações. 2.2. RH em Ação: do Operacional ao Estratégico As políticas e práticas de gestão de pessoas estão assumindo um novo papel no contexto das organizações, no sentido de prepará-las para acompanhar a velocidade das mudanças e as exigências do mercado com eficiência e eficácia. Hoje, devido a grande complexidade das organizações, busca-se a integração das práticas de RH à estratégia empresarial, visando adicionar valor à empresa e às pessoas que nela trabalham. O ajustamento dos planos de RH aos planos empresariais passa por três fases distintas que vai da reflexão posterior ou adicional à estratégia, passando pela integração e chegando até um processo isolado de planejamento, conforme apresenta (Ulrich, 1998, p.82) no quadro a seguir: Quadro 4 Abordagens da fusão entre Planejamento Estratégico e Planejamento de RH Reflexão posterior/adicional Integração Isolada O foco se concentra no planejamento empresarial, sendo as práticas de RH consideradas como uma reflexão posterior. As discussões cabem aos gerentes de linha, com envolvimento tangencial de profissionais de RH. O resultado é uma síntese das práticas de RH necessárias para a realização dos planos empresariais. O foco se concentra em uma síntese entre planejamento empresarial e planejamento de RH. Os gerentes de linha e os profissionais de RH trabalham como parceiros para garantir a coerência de um processo integrado de planejamento de RH. O resultado é um plano que destaca as práticas de RH prioritárias para a obtenção de resultados empresariais. O foco se concentra nas práticas de RH e na forma como a função de RH pode adicionar valor à empresa. Os profissionais de RH trabalham no plano e o apresentam aos gerentes de linha. O resultado é um plano para a função de RH, incluindo práticas prioritárias. Fonte: Ulrich, Dave. Os Campeões de Recursos Humanos: inovando para obter os melhores resultados. São Paulo: Futura, 1998, p.82. Como pode-se observar, na fase de reflexão posterior/adicional, as questões de RH recebem pouca atenção tornando-se um complemento ao planejamento empresarial. No processo isolado de planejamento ocorre pouca participação dos gerentes de linha, o que pode comprometer o processo como um todo, haja vista a separação dos planos de RH as estratégias da organização. Um dos grandes desafios, segundo Ulrich (1998, p.83) é tornar as práticas de RH parte integrante do processo de planejamento empresarial. É necessário que os profissionais da área de RH atuem juntamente com os gerentes de linha de modo que as práticas de RH realizem a estratégia empresarial. 4

5 A integração do RH ao planejamento estratégico da empresa deu lugar a uma nova dimensão da área, exigindo que as práticas e atividades até então desenvolvidas avançassem da abordagem operacional para a estratégica como pode ser visualizado no quadro a seguir: Quadro 5 RH: Do Operacional ao Estratégico Práticas RH Do Operacional Ao Estratégico Recrutamento e Seleção Práticas tradicionais como: Estão assumindo novos contornos, análise do curriculum vitae e novos instrumentos, novas entrevista individual. técnicas estão sendo utilizados como: dinâmicas de grupo, Treinamento & Desenvolvimento T&D com foco no cargo; Treinamentos presenciais; entrevistas coletivas, etc. Treinamentos comportamentais; Universidade Corporativa; E-learning Avaliação de Desempenho Utilização de formulários padrão, Avaliação 360 e a valorização da métodos tradicionais de avaliação. pessoa em si. Plano de Carreiras Verticalizada, hierarquizada Em Y, possibilitando maior mobilidade às pessoas. Remuneração Funcional, com base no cargo que a pessoa exerce. Por Habilidades e Competências, com foco na pessoa que ocupa determinado cargo. Benefícios Sociais Padronizados Flexíveis Fonte: Elaborado pela pesquisadora com base em Marras (2000); Chiavenato (2000); Ulrich (2000); Motta (1998); Boog (1999). O quadro apresentado nos mostra que o RH estratégico exige uma mudança de paradigma por parte das organizações, uma postura mais participativa, pró-ativa e comprometida com os objetivos pessoais e organizacionais. A mudança de paradigma requer a assimilação de novos conhecimentos e a incorporação de novas práticas de gestão de pessoas em um ritmo cada vez mais intenso. Essas práticas, por sua vez, afetam a estratégia da organização como um todo, o relacionamento com os clientes interno e externo, o compromisso com a educação e desenvolvimento das pessoas e a maneira como a organização utiliza o conhecimento. Essas tendências, por sua vez, assinalam a importância da aprendizagem individual e organizacional no processo de gerenciamento das pessoas que atuam nos mais diversos tipos de organizações. 2.3. O Processo de Aprendizagem nas Organizações A busca da excelência empresarial tem sido perseguida, incessantemente, pelas organizações e pelos profissionais que nela trabalham e isso não se consegue apenas pelo bom desempenho na execução das atividades, mas através da capacidade de adaptação às mudanças que são impostas e, principalmente, pela busca constante de novas abordagens administrativas, novos sistemas de gestão com foco no ser humano e novos conhecimentos. Reforça-se, desse modo, a importância da aprendizagem nas organizações destacandose a contribuição de Senge (1998) ao salientar que o ser humano vem ao mundo motivado a aprender e experimentar. Infelizmente, a grande maioria das organizações é mais orientada para controlar do que para aprender, recompensando o desempenho das pessoas em função da obediência à padrões estabelecidos e não por seu desejo de aprender. Na concepção de Fleury & Fleury (1997, p.20): O processo de aprendizagem em uma organização não só envolve a elaboração de novos mapas cognitivos, que permitem compreender melhor o que está ocorrendo em seu ambiente externo e interno, como também a definição de novos comportamentos, que comprovam a efetividade do aprendizado. 5

6 Dando continuidade ao seu pensamento, Fleury & Fleury (1997, p. 222) defendem alguns pressupostos que orientariam as empresas e dariam sustentação ao processo de aprendizagem, dentre os quais destaca-se: pensamento sistemático, ação estratégica, integração dos processos de decisão, definição de políticas de RH que sustentem e impulsionem a aprendizagem e, fundamentalmente, o desenvolvimento de uma cultura de aprendizagem. Schein (1996) trabalha nessa linha, enfatizando a construção de uma cultura de aprendizagem nas organizações, sendo essa tanto conseqüência das experiências e aprendizagem quanto base para sua capacidade para o aprendizado contínuo. Para desenvolver essa cultura, os autores enfatizam que as organizações necessitam apoiar-se nas pessoas, uma vez que as mesmas constituem a base do processo. Segundo o pensamento de Boyett & Boyett (1999) o aprendizado do indivíduo é uma condição necessária mas não suficiente para a inteligência organizacional. O fator crucial reside na eficácia com que os indivíduos transferem o que sabem para a organização como um todo. Os autores Caravantes & Pereira (1985, p.6) definem a aprendizagem como o processo de aquisição da capacidade de usar o conhecimento, que ocorre como resultado da prática e da experiência crítica e que produz uma mudança relativamente permanente no comportamento. Esta definição em muito se assemelha com a de Garvin (1993) que destaca que as organizações que aprendem devem estar capacitadas a criar, adquirir e transferir conhecimentos e em modificar seus comportamentos para refletir estes novos conhecimentos e insights. Na percepção de Kolb (1997), a aprendizagem constitui-se num processo onde o conhecimento é criado através da experiência. Esse autor considera o modelo de como as pessoas aprendem denominado de modelo vivencial, como um ciclo quadrifásico, onde a experiência concreta imediata é a base da observação e da reflexão. Para o efetivo aprendizado as pessoas necessitam de quatro tipos diferentes de habilidades: experiência concreta, observação reflexiva, conceituação abstrata e experimentação ativa. Assim, vem à tona outro questionamento: Como as pessoas aprendem e como transferem o que sabem para a organização, a fim de que ela também possa aprender? Face aos questionamentos elucidados, convém ressaltar a concepção de Kim (1998) ao salientar que, nos estágios iniciais de uma organização, a aprendizagem individual se confunde com a organizacional, pelo fato de a empresa ser constituída por um número restrito de pessoas e por possuir uma estrutura pequena. Com o crescimento da empresa esta distinção vai tornando-se mais clara, uma vez que a organização é afetada pelo aprendizado individual de seus membros. Embora possa existir esta confusão entre a aprendizagem individual e organizacional, a aprendizagem organizacional, segundo os autores, é mais do que a simples soma das aprendizagens dos indivíduos. Sweringa & Wierdsma (1995) salientam que a aprendizagem individual é necessária mas não suficiente para o aprendizado coletivo. Vinculada a esta questão, focaliza-se o processo de aprendizagem organizacional, que apesar de ser uma abordagem relativamente recente, já existe diferentes concepções a respeito deste assunto. Destaca-se o estudo de Argyris & Schön (1978) sobre aprendizagem de single loop (ciclo único) e doble loop (ciclo duplo). A aprendizagem de ciclo único refere-se ao como fazer as coisas melhor através da experiência e exerce impacto sobre parte da organização. A segunda foca o porquê das coisas serem feitas, gera efeitos e impactos de longo prazo, refere-se a mudanças mais radicais e tem como objetivo o desenvolvimento de novos paradigmas, envolvendo o questionamento dos valores fundamentais da organização. 6

7 Segundo a visão dos autores Sweringa & Wierdsma (1995), o processo de aprendizagem passa por três ciclos: regras, insights e princípios. As regras referem-se ao que se deve e pode fazer. Os insights ao que se sabe, ao que se compreende e os princípios ao que se é e ao que se deseja ser. Então, a aprendizagem de três ciclos acontece quando ocorre o questionamento e discussão dos princípios essenciais sobre os quais a empresa está alicerçada. Para Senge (1998, p. 37) as organizações que aprendem: São organizações nas quais as pessoas expandem continuamente sua capacidade de criar resultados que realmente desejam, onde se estimulam padrões de pensamentos novos e abrangentes, a aspiração coletiva ganha liberdade e onde as pessoas aprendem continuamente a aprender juntas. As organizações orientadas para a aprendizagem, segundo Morgan (1996), devem seguir quatro diretrizes básicas: flexibilidade, análise e solução de problemas, ação para investigação e a realização de intervenções. Já Bernardes(1999) construiu um modelo de aprendizagem organizacional baseado na contribuição de diversos autores. As dimensões de uma Learning Organization na visão da autora contemplam: democratização das informações, objetivo compartilhado, ambiente que incentive a aprendizagem, visão sistêmica e ação monitorada. Esse modelo, em muito se assemelha ao de Senge (1990), que apresenta como pressupostos básicos para a aprendizagem organizacional a incorporação de cinco disciplinas que as organizações que aprendem devem assimilar. A primeira disciplina é o domínio pessoal que consiste em definir o que é importante para nós e em aprender continuamente a enxergar com mais clareza a realidade do momento. Para Senge (1990 p.138) pessoas com alto nível de domínio pessoal têm um sentido especial de vida, aprendem a identificar e trabalhar com as forças das mudanças ao invés de resistir à elas e vivem num modo contínuo de aprendizagem. Senge (1990, p.162) enfatiza que para desenvolver esta disciplina os dirigentes devem trabalhar incansavelmente para criar na organização um clima em que os princípios do domínio pessoal sejam praticados na vida diária. Sabe-se que muitas vezes estes princípios não são colocados em prática, em função de nossos modelos mentais. Essa disciplina, segundo o autor, modelam nosso modo de agir. São suposições que nos limitam de pensar e agir e nos impedem de colocar em prática as concepções que possuímos. Estas, precisam ser trazidas à tona, possibilitando que novos modelos sejam concebidos. Outro componente vital para a organização de aprendizagem é o objetivo comum. Essa disciplina consiste em desenvolver o comprometimento dos colaboradores com os objetivos organizacionais e, para que isso realmente ocorra, é fundamental que os objetivos individuais sejam compatíveis com os da organização. Senge (1990, p.190) salienta que o objetivo comum é vital para a organização da aprendizagem, porque proporciona o foco e a energia para o aprendizado. A quarta disciplina denomina-se aprendizado em grupo que envolve a criação de um espírito de equipe nos indivíduos, no desenvolvimento da capacidade de trabalhar bem em conjunto e de melhor aproveitar as potencialidades de cada pessoa. O autor reforça que as pessoas que precisam uma das outras para agir, tornam-se unidades chaves de aprendizagem dentro da organização. Por último, tem-se o raciocínio sistêmico que é a disciplina que integra as demais, sendo, portanto considerada a mais importante. Tal disciplina reforça o conceito do efeito sinérgico onde o todo é maior do que a soma das partes. Senge (1990, p.23) enfatiza que o significado básico da organização da aprendizagem: é a organização que está continuamente expandindo sua capacidade de criar o futuro. 7

8 Como se vê, a aprendizagem organizacional é algo complexo que apresenta focos divergentes de estudo, porém no campo das organizações a aprendizagem organizacional é vista como um alavancador da competitividade e inovação (Dodgson, 1993, p.376). Ao refletirmos sobre as diversas concepções que existem sobre aprendizagem organizacional, retoma-se o questionamento anteriormente elucidado. As empresas estão capacitadas a criar, adquirir esta cultura de aprendizagem? A fim de buscar respostas às indagações efetuadas anteriormente, pretende-se investigar a inter-relação existente entre as práticas de gestão de pessoas e o processo de aprendizagem individual e organizacional, enfatizando-se os fatores que podem facilitar e/ou dificultar esse processo. 3. Método e Procedimentos O problema dessa pesquisa procura relacionar dois pontos essenciais: as práticas de gestão de pessoas que, segundo diversos autores, estão assumindo papel estratégico, trazendo implicações ao modo como as pessoas aprendem e como transferem o conhecimento para que a organização também possa aprender, e a percepção sobre os fatores que facilitam ou dificultam o processo de aprendizagem individual e organizacional. Esses pontos serviram de orientação básica para definir a problemática dessa pesquisa que consiste na seguinte questão: de que modo as práticas de gestão de pessoas podem facilitar e/ou dificultar o processo de aprendizagem nas organizações? O método adotado para o desenvolvimento dessa pesquisa de caráter exploratório é o do estudo de caso que, segundo Yin (2001, p.32), investiga um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidos. A organização, objeto desse estudo, foi uma Cooperativa localizada no interior do Estado do Rio Grande do Sul, destaque em qualidade na região. A escolha do local do estudo deve-se ao fato de a mesma ser pioneira no município a participar do Programa Gaúcho de Qualidade e Produtividade (PGQP) e por ser uma das organizações do setor agronegocial a receber o Prêmio Qualidade RS Categoria Troféu Medalha no ano de 2001. Os sujeitos da pesquisa são em número de 11, incluindo-se o presidente, a gerência de Recursos Humanos e os gerentes das unidades de negócios que também fazem parte do Comitê Gestor da Qualidade. A coleta dos dados foi baseada em fontes documentais, questionários e entrevistas. A pesquisa documental foi realizada através de subsídios oferecidos pela cooperativa como: relatório desenvolvido para inscrição Prêmio Qualidade RS, material sobre os produtos que a cooperativa comercializa e folders institucionais. Posteriormente, utilizou-se como instrumento de coleta de dados o questionário sobre as práticas de gestão de pessoas adotadas pela Cooperativa e, por fim, realizaram-se entrevistas individuais semi-estruturadas, que foram gravadas e transcritas com a permissão dos entrevistados, realizadas no local de trabalho dos mesmos. A análise dos dados foi feita qualitativamente à luz do referencial teórico utilizado nesse estudo, tomando-se como material de análise os documentos que foram disponibilizados, as informações constantes dos questionários e as transcrições das entrevistas. 4. Análise e Discussão dos Resultados 4.1. As práticas de gestão de pessoas utilizadas pela organização em estudo e a Aprendizagem A área de Recursos Humanos está assumindo um novo papel no ambiente organizacional, migrando da dimensão tradicional para a dimensão estratégica (Chiavenato, 2000; Marras, 2000; Motta, 1998; Davel & Vergara, 2001; Ulrich, 2000). 8

9 Na organização em estudo, a área responsável pela gestão de pessoas encontra-se num estágio intermediário de desenvolvimento. A presidência, o gestor de Recursos Humanos e os gerentes das unidades de negócio revelaram ter conhecimento das mudanças que vem ocorrendo na área de RH, porém têm consciência de que muitas ações e práticas relacionadas à gestão de pessoas ainda necessitam ser implantadas e incrementadas. As práticas de gestão de pessoas adotadas pela organização investigada, revelam o estágio em que a organização se encontra, como pode-se observar a seguir: Quadro 6 Práticas de Gestão de Pessoas utilizadas pela organização investigada 1. Recrutamento e Seleção A organização dá mais prioridade ao recrutamento interno do que ao externo e utiliza como meio de recrutamento interno indicações das gerências. Os gerentes das unidades de negócios participam do processo seletivo juntamente com os responsáveis pela área de RH. 2. Ambientação e Integração A organização realiza atividades de integração tais como: atividades esportivas, jantares e bailes envolvendo, inclusive, a família do funcionário. 3. Avaliação de Desempenho A organização investigada não possui método formal de avaliação de desempenho. Os colaboradores são avaliados informalmente por suas chefias. 4. Treinamento & Desenvolvimento (T & D) A Cooperativa costuma investir aproximadamente de 1 a 5 horas de treinamento/mês/funcionário. Dentre as práticas existentes, os treinamentos presenciais através de cursos são utilizados em sua totalidade pela organização. Programas de estagiários, treinamentos ao ar livre e treinamentos à distância são utilizados parcialmente. Técnicas mais contemporâneas de T & D como e-learning e educação corporativa não são utilizadas pela empresa. As necessidades de treinamento são feitas através de indicações das gerências, solicitações do próprio funcionário e LNT (Levantamento de Necessidades de Treinamento). Os treinamentos técnico-operacionais são considerados de grande importância pela organização. 5. Sistema de Remuneração Predomina na organização a remuneração do tipo funcional, sendo também utilizada participação nos lucros ou resultados. A Cooperativa não possui Plano de Cargos e Salários, porém possui as definições de responsabilidades de cada colaborador. Fonte: Elaborado pela pesquisadora com base em fontes documentais, questionários e entrevista com a gerência de Recursos Humanos. Pode-se observar que a organização não adota práticas estratégicas de gestão de pessoas, no entanto alguns esforços estão sendo observados. Destacam-se, por exemplo: o pioneirismo na implantação de participação nos resultados, o que beneficia o produtor, sua família e a comunidade em que a Cooperativa está inserida; relacionamento aberto entre direção, associados e colaboradores; complementação salarial através de vale compras; construção de vestiários e aquisição de uniformes; incentivo ao desenvolvimento de seus funcionários através da realização de cursos e palestras; participação dos setores na definição de metas e necessidades de treinamento técnico, operacional, recursos humanos e educacional. Tomando-se por base o esquema conceitual proposto por Ulrich (1998), salienta-se que, na organização investigada, os profissionais de RH elaboram os planos e apresentam-nos aos gerentes de linha, sendo necessário um maior envolvimento dos mesmos para garantir a integração com o planejamento estratégico da empresa. Por isso, a Cooperativa encontra-se ainda na fase isolada necessitando migrar para a fase de integração proposta por Ulrich (1998). Essa migração possibilitaria um avanço do RH tradicional para o RH estratégico, proporcionando não só o alinhamento com as estratégias da organização, como também facilitaria o processo de aprendizagem como um todo. 9

10 Para os entrevistados as práticas de RH são parte essencial do processo de aprendizagem, pois possibilitam o desenvolvimento das pessoas e a utilização de seu potencial criativo, é necessário, entretanto, um trabalho intenso e efetivo bem como uma reestruturação da área no sentido de tornar o RH mais ativo dentro da organização. 4.2.A Aprendizagem na Organização Investigada: Conceituação e Fatores Facilitadores e Limitadores O mundo contemporâneo é permeado por mudanças de toda a ordem, políticas, sociais, econômicas e tecnológicas que têm exercido diversos impactos sobre as organizações, principalmente em termos de sua adaptação ao contexto em que está inserida. O caráter contínuo das mudanças no cenário empresarial intensifica a necessidade da aprendizagem como estratégia de inovação e competitividade, tornando-se relevante um melhor entendimento e sistematização de seu conceito. Na organização investigada, os entrevistados revelaram não ter clareza quanto ao conceito de aprendizagem organizacional, limitando a noção de aprendizagem organizacional aos seguintes aspectos: abertura às mudanças; conhecimento sobre o mercado; incentivo aos funcionários para aprenderem cada vez mais; oportunidades aos colaboradores; desenvolvimento de um trabalho integrado com todos os setores; disposição em buscar o novo e adoção de experiências positivas de outras empresas. Nota-se, portanto, que os entrevistados não consideraram as influências comportamentais sobre o processo de aprendizagem. Stata (1997) enfatiza os aspectos comportamentais ao mencionar que a comunicação deficiente entre pessoas e entre organizações tem significativo impacto sobre o processo de aprendizagem e a melhoria da qualidade. De fato, essas concepções reforçam a complexidade desse tema e a dificuldade em conceituá-lo. É interessante observar que a organização não apresenta uma estratégia de aprendizagem, mas para os entrevistados, a implantação da qualidade e a criação dos grupos de alto desempenho tem possibilitado uma mudança no comportamento das pessoas. Stata (1997, p.387) diz que: A melhoria da qualidade é uma forma de criar estruturas organizacionais temporárias, ou equipes, que ultrapassam horizontalmente as fronteiras organizacionais e aumentam a comunicação e a cooperação. É um meio de levar as pessoas a aprenderem a pensar nos problemas e questões de forma objetiva e quantitativa, em vez de pensarem em termos subjetivos e políticos. É uma forma de separar o punhado de problemas vitais dos muitos problemas triviais e de concentrar os recursos organizacionais em sua resolução. Em suma, a melhoria da qualidade é uma forma de alavancar a aprendizagem organizacional. A fim de tornar mais claro esse conceito perguntou-se aos entrevistados que fatores podem facilitar ou dificultar o processo de aprendizagem organizacional, os quais são apresentados no quadro abaixo: 10

11 Quadro 7 Fatores facilitadores e dificultadores do processo de aprendizagem Entrevistados Fatores Facilitadores da Aprendizagem Fatores Dificultadores da Aprendizagem Presidência Gerência de RH Direção estar aberta às mudanças. Dar condições para as pessoas se desenvolverem. Apontar oportunidades aos colaborares que podem facilitar seu autodesenvolvimento. A pessoa realmente estar disposta a aprender. Abertura à mudanças. Conhecimento do mercado em que a organização atua. Facilidade de acesso às oportunidades Indivíduo não querer aprender. Localização geográfica que acaba limitando o acesso às informações. Modo de pensar da Direção da empresa. Falta de disposição dos gerentes em aprender cada vez mais. Estilo de gestão do gerente. Localização geográfica da empresa. que surgem. Gerentes de área Investimentos em treinamentos buscar o conhecimento. Interesse das pessoas em aprenderem. Incentivo à participação das pessoas nas decisões da empresa. Relacionamento saudável. Rodízio de tarefas dentro da organização. Não ter medo de transferir às informações. Mostrar o como fazer experiência. Transparência de informações. Fonte: Elaborado pela pesquisadora com base nos discursos dos entrevistados. Cultura da empresa. Falta de qualificação e preparo dos funcionários. Não conhecimento da finalidade da empresa. Falta de treinamento. Centralização de poder e informação. Fator humano querer ou não querer aprender, pois o conhecimento está à disposição. Resistências às mudanças. Os relatos apresentados demonstram que tanto os fatores pessoais como os organizacionais podem facilitar ou dificultar a aprendizagem. Observou-se que os entrevistados, dos três níveis (Presidência, gerência de RH e gerentes das unidades de negócios), não mencionaram aspectos referentes à criação de um clima, um ambiente que possibilite que as pessoas aprendam e possam transferir o que sabem para que a organização também possa aprender. Nesse sentido, destaca-se a contribuição de Antonacopoulou (2001, p.263) ao mencionar que: No contexto das organizações em particular, um clima construtivo encorajaria os indivíduos a ter atitudes positivas em relação à aprendizagem e à necessidade de desenvolver a aprendizagem, superar sua própria resistência à mudança, entender suas próprias deficiências como aprendizes e ser mais abertos a experiências e prontos a aprender com elas. Constatou-se, também, que os entrevistados não diferenciaram a aprendizagem individual da organizacional. Kim (1998) reforça que é importante fazer uma distinção entre o indivíduo e a organização para não obscurecer o processo real de aprendizagem, ignorando o papel do indivíduo ou simplificando a aprendizagem organizacional como uma simples extensão da aprendizagem individual. 5. Considerações Finais A realização desse estudo revelou que os entrevistados têm clareza de que a gestão de pessoas nas organizações está passando por um momento de grandes transformações, assumindo realmente um papel estratégico e modificando sua forma de atuação. Prova disso é 11

12 o fato de que, na organização objeto desse estudo, alguns esforços estão sendo feitos no sentido de (re)pensar o RH, de modo a facilitar o desenvolvimento e o crescimento da organização, no entanto ainda há muito a ser feito. Os entrevistados revelaram que as práticas de gestão de pessoas incentivam a aprendizagem organizacional, porém têm consciência da necessidade de um trabalho mais intenso nesse sentido. É relevante ressaltar que o conceito de aprendizagem organizacional foi confundido com mudança e adaptação, uma vez que todos os entrevistados citaram a implantação da qualidade como uma estratégia de aprendizagem adotada pela organização. Entende-se que qualidade e aprendizagem estão inter-relacionadas, porém a aprendizagem vai além, uma vez que deve produzir uma mudança permanente no comportamento das pessoas. Guimarães, Angelim, Spezia, Rocha & Magalhães (apud Cabral 2001) assinalam que aprendizagem, inovação e mudanças organizacionais são constructos interdependentes, os quais podem ser vistos, em algumas circunstâncias, como sinônimos. Para o autor os estudos sobre inovação privilegiam os resultados da organização e os estudos sobre aprendizagem tendem a enfocar processos de gestão. Os gerentes manifestaram não ter clareza quanto à aprendizagem individual e organizacional, uma vez que mencionaram fatores pessoais e organizacionais como facilitadores e dificultadores do processo de aprendizagem nas organizações. Segundo Stata (1997) a aprendizagem organizacional difere da aprendizagem individual em vários aspectos. Para o autor a aprendizagem organizacional ocorre através de percepções, conhecimentos e modelos mentais compartilhados e o aprendizado é construído com base em conhecimentos e experiências passadas, ou seja, com base na memória organizacional. Por fim, destaca-se que é preciso agir, sair do discurso e redimensionar as práticas de gestão de pessoas visando alavancar o processo de aprendizagem nas organizações. A aprendizagem, apesar de ser um tema relevante e essencial para a competitividade das organizações, necessita ser mais difundida no meio empresarial. Não se pode deixar de considerar as questões intrínsecas ao processo de aprendizagem, as individualidades de cada pessoa e a forma como as mesmas aprendem e como transferem o que sabem para que a organização também possa aprender. Espera-se que essa pesquisa contribua no sentido de provocar reflexões que levem ao desenvolvimento de outros estudos que possibilitem um melhor entendimento sobre essa temática, assim como sugere-se que o mesmo seja ampliado, utilizando-se outras fontes de evidências como as opiniões dos colaboradores que atuam nos níveis inferiores da organização. 6. Referências Bibliográficas ANTONACOPOULOU, Elena. Desenvolvendo Gerentes Aprendizes dentro de Organizações de Aprendizagem. In: EASTHERBY-SMITH, M; ARAÚJO, L. & BURGOYNE, J. Aprendizagem Organizacional e Organização de Aprendizagem. São Paulo: Atlas, 2001. ARGYRIS, C. Enfrentando desafios empresariais. Rio de Janeiro: Campus, 1992.. Organizational Learning. Reading, MA. Addison-Wesley, 1978. ARGYRIS C. & SCHON, D. Organizational Learning II: theory, method and practice. Addison-Wesley, USA, 1996. BERNARDES, Maria Elisa B. Learning Organization em empresa brasileira: um estudo de caso. Dissertação de Mestrado. UFMG, 1999. BOOG, Gustavo. Manual de Treinamento & Desenvolvimento. São Paulo: Makron Books, 1999. BOYETT, Joseph H. & BOYETT, Jimmie T. O guia dos gurus: os melhores conceitos e práticas dos negócios. Rio de Janeiro: Campus, 1999. 12

13 CABRAL, Augusto C. de Aquino. Aprendizagem Organizacional no Setor de Telecomunicações do Brasil no Cenário da Privatização das Antigas Estatais. Projeto de Tese. Belo Horizonte: CEPEAD/UFMG, 2000. CARAVANTES, G. & PEREIRA, M.J.L. Aprendizagem organizacional versus estratégia de mudança organizacional planejada: um confronto crítico. Porto Alegre: FAPERGS, 1985. CHIAVENATO, Idalberto. Como transformar RH (de um centro de despesa) em um centro de lucro. São Paulo: Makron Books, 2000, p. 20. DAVEL, Eduardo & VERGARA, Sylvia (Organizadores). Gestão com Pessoas e Subjetividade. São Paulo: Atlas, 2001 DOGDSON, M. Organizational Learning: A Review of Some Literatures. Organizational Studies, 1993. EASTHERBY-SMITH, M & ARAÚJO, L. Organizational Learning: Current Debates and Opportunities IN: EASTHERBY-SMITH, M; ARAÚJO, L. & BURGOYNE, J. Organizational Learning and The Learning Organization. Sage, London, 1999. FLEURY, A. & FLEURY, M.T.L. Aprendizagem e inovação organizacional: as experiências do Japão, Coréia e Brasil. São Paulo: Atlas, 1997. GARVIN, David A. Building a learning organization. Harvard Business Review, 71 (4): 78-84, 1993. GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1991. GUIMARÃES, T., ANGELIM, G., SPEZIA, D., ROCHA, G. & MAGALHÃES. Explorando o Construto Aprendizagem Organizacional no Setor Público. Uma Análise em Órgão do Poder Executivo Federal Brasileiro. In: Encontro Nacional da ANPAD, Anais ANPAD, 2001. KIM, Daniel. O Elo entre a Aprendizagem Individual e a Aprendizagem Organizacional. In: KLEIN, D. A. A gestão estratégica do capital intelectual. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1998. KOLB, David A.. Psicologia organizacional : uma abordagem vivencial. São Paulo: Atlas, 1978. KOLB, David. A gestão e o Processo de Aprendizagem. In: Starkey, Ken. Como as Organizações Aprendem: relatos dos sucessos das grandes empresas. São Paulo: Futura, 1997. p. 321-341. MARRAS, Jean Pierre. Administração de Recursos Humanos: do operacional ao estratégico. São Paulo: Futura, 2000. MILKOVICH, George., MONDREAU, Jonh. Administração de Recursos Humanos. São Paulo: Atlas, 2000. MORGAN, Gareth. Imagens da organização. São Paulo: Atlas, 1996. MOSCOVICCI, Fela. Renascença Organizacional. Rio de Janeiro: José Olympio, 1996. MOTTA, Paulo R. Transformação Organizacional: a teoria e a prática de inovar. Rio de Janeiro: Qualitymark Ed., 1998, p.101 NONAKA, Ikujiro. A empresa criadora de conhecimento. IN: Harvard Business Review. Rio de Janeiro: Campus, 2000. P. 27-49. RUAS, R. A gestão das competências gerenciais e a aprendizagem nas organizações. Documento preliminar, PPGA/UFRGS, POA, Mimeo, 2ª Versão, 32 p., 2001. SCHEIN, Edgar. Culture: The missing concept in organization studies. In: Administrative Science Quartely, n. 41, 1996, p. 229-240. SENGE, Peter. A quinta disciplina: arte, teoria e prática da organização de aprendizagem. São Paulo: Ed. Best Seller, 1990. SENGE, P. A quinta disciplina. 2ed. São Paulo: Best Seller, 1998. STATA, Ray. A Chave da Inovação Gerencial. In: STARKEY, Ken. Como as Organizações Aprendem: Relato do Sucesso das grandes empresas. São Paulo: Futura, 1997. 13

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