PSICOPEDAGOGIA E PENSAMENTO COMPLEXO



Documentos relacionados
OS CONHECIMENTOS DE ACADÊMICOS DE EDUCAÇÃO FÍSICA E SUA IMPLICAÇÃO PARA A PRÁTICA DOCENTE

O olhar do professor das séries iniciais sobre o trabalho com situações problemas em sala de aula

A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR DE PEDAGOGIA DA FESURV - UNIVERSIDADE DE RIO VERDE

LURDINALVA PEDROSA MONTEIRO E DRª. KÁTIA APARECIDA DA SILVA AQUINO. Propor uma abordagem transversal para o ensino de Ciências requer um

PSICOPEDAGOGIA, INTERDISCIPLINARIDADE E TRANSDISCIPLINARIDADE

Aula RELAÇÕES DE DISCIPLINARIDADE. TEMAS TRANSVERSAIS. CONTEXTUALIZAÇÃO NO ENSINO DE MATEMÁTICA

Pedagogia Estácio FAMAP

Gestão da Informação e do Conhecimento

A Interdisciplinaridade como Metodologia de Ensino INTRODUÇÃO

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO E S C O L A D E A R T E S, C I Ê N C I A S E H U M A N I D A D E

TÍTULO: ALUNOS DE MEDICINA CAPACITAM AGENTES COMUNITÁRIOS NO OBAS CATEGORIA: CONCLUÍDO ÁREA: CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E SAÚDE

Duração: 8 meses Carga Horária: 360 horas. Os cursos de Pós-Graduação estão estruturados de acordo com as exigências da Resolução CNE/CES nº 01/2007.

WALDILÉIA DO SOCORRO CARDOSO PEREIRA

Curso de Tecnologia em Gestão de Recursos Humanos

Resumo. Leonel Fonseca Ivo. 17 de novembro de 2009

O PSICÓLOGO (A) E A INSTITUIÇÃO ESCOLAR ¹ RESUMO

Metodologia e Prática de Ensino de Ciências Sociais

PRÁTICA PROFISSIONAL INTEGRADA: Uma estratégia de integração curricular

TRABALHO PEDAGÓGICO NA PERSPECTIVA DE UMA ESCOLA INCLUSIVA. Profa. Maria Antonia Ramos de Azevedo UNESP/Rio Claro.

difusão de idéias AS ESCOLAS TÉCNICAS SE SALVARAM

Estado da Arte: Diálogos entre a Educação Física e a Psicologia

A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA NA EDUCAÇÃO BIOLÓGICA: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

FORMAÇÃO DOCENTE: ASPECTOS PESSOAIS, PROFISSIONAIS E INSTITUCIONAIS

Composição dos PCN 1ª a 4ª

CRIANÇAS NA UNIVERSIDADE: EXPERIÊNCIA DO CURSO DE INGLÊS DO PROJETO MENINAS DA VILA

Os pressupostos básicos para a teoria de Bertalanffy foram os seguintes:

DA UNIVERSIDADE AO TRABALHO DOCENTE OU DO MUNDO FICCIONAL AO REAL: EXPECTATIVAS DE FUTUROS PROFISSIONAIS DOCENTES

II Congresso Nacional de Formação de Professores XII Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores

V Seminário de Metodologia de Ensino de Educação Física da FEUSP Relato de Experiência INSERINDO A EDUCAÇÃO INFANTIL NO CONTEXTO COPA DO MUNDO.

Elvira Cristina de Azevedo Souza Lima' A Utilização do Jogo na Pré-Escola

CURSOS PRECISAM PREPARAR PARA A DOCÊNCIA

CASTILHO, Grazielle (Acadêmica); Curso de graduação da Faculdade de Educação Física da Universidade Federal de Goiás (FEF/UFG).

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO DEPARTAMENTO DE LETRAS

Projeto Pedagógico Institucional PPI FESPSP FUNDAÇÃO ESCOLA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA DE SÃO PAULO PROJETO PEDAGÓGICO INSTITUCIONAL PPI

REFLEXÕES PEDAGÓGICAS SOBRE A DANÇA NO ENSINO MÉDIO

INTEGRAÇÃO DE MÍDIAS E A RECONSTRUÇÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA

Lev Semenovich Vygotsky, nasce em 17 de novembro de 1896, na cidade de Orsha, em Bielarus. Morre em 11 de junho de 1934.

A INCLUSÃO DOS PORTADORES DE NECESSIDADES ESPECIAIS EDUCATIVAS NAS SÉRIES INICIAIS SOB A VISÃO DO PROFESSOR.

UMA PESQUISA SOBRE ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL NO IFC-CÂMPUS CAMBORIÚ

UMA EXPERIÊNCIA EM ALFABETIZAÇÃO POR MEIO DO PIBID

O uso de Objetos de Aprendizagem como recurso de apoio às dificuldades na alfabetização

PROFESSOR FORMADOR, MESTRE MODELO? ANDRÉ, Marli Eliza Dalmazo Afonso de PUC-SP PASSOS, Laurizete Ferragut UNESP GT-20: Psicologia da Educação

Como mediador o educador da primeira infância tem nas suas ações o motivador de sua conduta, para tanto ele deve:

CONSULTORIA DE DESENVOLVIMENTO ORGANIZACIONAL

RESENHA. Desenvolvimento Sustentável: dimensões e desafios

O PAPEL DA CONTAÇÃO DE HISTÓRIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

CLUBE DE PROGRAMAÇÃO NAS ESCOLAS: NOVAS ERSPECTIVAS PARA O ENSINO DA COMPUTAÇÃO. IF Farroupilha Campus Santo Augusto; joaowinck@hotmail.

Fundamentação Teórica

RELAÇÕES INTERDISCIPLINARES ENTRE EDUCAÇÃO E SUSTENTABILIDADE

O Que São os Serviços de Psicologia e Orientação (SPO)?

GUIA DE IMPLEMENTAÇÃO DO CURRICULO ANO 2 - APROFUNDAMENTO

Por uma pedagogia da juventude

Pesquisa com Professores de Escolas e com Alunos da Graduação em Matemática

O ORIENTADOR FRENTE À INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIENCIA NA ESCOLA REGULAR DE ENSINO

A Educação Bilíngüe. » Objetivo do modelo bilíngüe, segundo Skliar:

ROTEIRO PARA ELABORAÇÃO DE PROJETOS

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE CIÊNCIAS SÓCIO-ECONÔMICAS E HUMANAS DE ANÁPOLIS

EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA E AS NOVAS ORIENTAÇÕES PARA O ENSINO MÉDIO

componente de avaliação de desempenho para sistemas de informação em recursos humanos do SUS

FORMAÇÃO PEDAGÓGICA DE DOCENTES NO ENSINO SUPERIOR

FACULDADES INTEGRADAS SIMONSEN INTERVENÇÃO EDUCATIVA INSTITUCIONAL PROJETO PSICOPEDAGÓGICO

O PAPEL DO SERVIÇO SOCIAL EM UMA EQUIPE INTERDISCIPLINAR Edmarcia Fidelis ROCHA 1 Simone Tavares GIMENEZ 2

Dados do Ensino Médio

Módulo 14 Treinamento e Desenvolvimento de Pessoas Treinamento é investimento

Uma Pedagogia Multidisciplinar, Interdisciplinar ou Transdisciplinar para o Ensino/Aprendizagem da Física

difusão de idéias Atenção ao olhar crítico dos professores

A DANÇA E O DEFICIENTE INTELECTUAL (D.I): UMA PRÁTICA PEDAGÓGICA À INCLUSÃO

A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO COMO PRINCÍPIO EDUCATIVO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

DISPOSITIVOS MÓVEIS NA ESCOLA: POSSIBILIDADES NA SALA DE AULA

OS CONHECIMENTOS MATEMÁTICOS NO ENSINO SUPERIOR: OUTRAS POSSIBILIDADES PARA A PRÁTICA DO PROFESSOR

de Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia

AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: domínio e/ou desenvolvimento? Cipriano Carlos Luckesi 1

TÍTULO: A CRIANÇA E A TECNOLOGIA: PENSANDO E REPENSANDO SOBRE A FORMAÇÃO PSIQUICA NO CONTEXTO TECNOLÓGICO ATUAL

VESTIBULAR: Uma escolha profissional que interliga a família e a escola

ALGUNS ASPECTOS QUE INTERFEREM NA PRÁXIS DOS PROFESSORES DO ENSINO DA ARTE

PROJETO MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA

Se você acredita que as escolas são o único e provável destino dos profissionais formados em Pedagogia, então, está na hora de abrir os olhos

PROJETO MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA

ESTRATÉGIAS DE ENSINO NA EDUCAÇÃO INFANTIL E FORMAÇÃO DE PROFESSORES. Profa. Me. Michele Costa

educação ambiental: estamos caminhando... EDUCAÇÃO AMBIENTAL: ESTAMOS CAMINHANDO...

Orientações para informação das turmas do Programa Mais Educação/Ensino Médio Inovador

Psicopedagogia Institucional

EMENTAS DAS DISCIPLINAS

AS NOVAS DIRETRIZES PARA O ENSINO MÉDIO E SUA RELAÇÃO COM O CURRÍCULO E COM O ENEM

REALIZAÇÃO DE TRABALHOS INTERDISCIPLINARES GRUPOS DE LEITURA SUPERVISIONADA (GRULES)

Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, Pós-graduação à distância e Mercado de Trabalho Sandra Rodrigues

Curso Sustentabilidade e Saúde Humana:

PROBLEMATIZANDO ATIVIDADES EXPERIMENTAIS NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES/AS

NÚCLEO DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA E ENSINO DE FÍSICA E AS NOVAS TECNOLOGIAS NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

ESCOLA ESTADUAL ERNESTO SOLON BORGES PREVENÇÃO E QUALIDADE DE VIDA - ALCOOLISMO

Ana Paula de Souza João Paulo Gonzaga Kelly Cristina Miquelino Jugeick Educação Matemática

ESCOLA, LEITURA E A INTERPRETAÇÃO TEXTUAL- PIBID: LETRAS - PORTUGUÊS

PNL? o que é. Dossie. Veronica Ahrens Diretora de T&D, Trainer e Coach da SBPNL Inspirar pessoas a criarem um mundo melhor. veronica@pnl.com.

A IMPORTÂNCIA DAS DISCIPLINAS DE MATEMÁTICA E FÍSICA NO ENEM: PERCEPÇÃO DOS ALUNOS DO CURSO PRÉ- UNIVERSITÁRIO DA UFPB LITORAL NORTE

Mudança gera transformação? Mudar equivale a transformar?

EDUCAÇÃO INCLUSIVA: ALUNO COM DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA NO ENSINO REGULAR

QUALIFICAÇÃO DA ÁREA DE ENSINO E EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE: FORMAÇÃO PEDAGÓGICA PARA PROFISSIONAIS DE SERVIÇOS DE SAÚDE

EXPLORANDO ALGUMAS IDEIAS CENTRAIS DO PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS ENSINO FUNDAMENTAL. Giovani Cammarota

LEV VIGOTSKY 1. VIDA E OBRA

Rompendo os muros escolares: ética, cidadania e comunidade 1

Transcrição:

PSICOPEDAGOGIA E PENSAMENTO COMPLEXO Eliana Branco Malanga, Universidade de Santo Amaro ebmalanga@hotamail.com Maria Luiza Puglisi Munhoz, Universidade de Santo Amaro marilumunhoz@uol.com.br Resumo: O pensamento complexo é uma nova abordagem da pesquisa cientifica. Ele se apoia na transdisciplinaridade e busca estudar os fenômenos humanos em toda a sua complexidade, sem os limites impostos pelas disciplinas. A Psicopedagogia sendo em si mesma interdisciplinar configura-se como um campo privilegiado para a prática do pensamento complexo. A abordagem sistêmica ou pensamento sistêmico das interações humanas é um instrumento metodológico adequado para o pensamento complexo, porque se apoia em novos paradigmas, que consistem em considerar o contexto e as complexidades inerentes aos processos psicossociais que influem nas condutas humanas, e desenvolveu uma teoria que procura dar conta das relações, ao invés das partes isoladas, valorizando todos os elementos dessa relação de forma igualitária. Palavras-chave: psicopedagogia, pensamento complexo, metodologia científica, pensamento sistêmico INTRODUÇÃO Esta pesquisa foi realizada em duas etapas. Na primeira, teórica, procurou-se compreender em que medida a Psicopedagogia, por ser um estudo interdisciplinar ou transdisciplinar (variando do conceito de um autor para outro, havendo quem a considere apenas multidisciplinar), configura-se como um campo privilegiado para a prática do pensamento complexo. As autores deste trabalho entendem a Psicopedagogia como uma atividade e um campo de conhecimento interdisciplinar, e que tende a se tornar transdisciplinar, na medida em que as fronteiras entre as disciplinas ficam cada vez mais diluídas ao se formular uma teoria própria deste campo do conhecimento. Entendemos pensamento complexo como uma nova abordagem da pesquisa cientifica, que se integra com a transdisciplinaridade e que busca estudar os fenômenos humanos em toda a sua complexidade, sem os limites impostos pelas disciplinas. Partimos da hipótese de que, se o objeto de estudo da Psicopedagogia é o desenvolvimento do pensamento autônomo do ser humano, numa visão integradora, o Pensamento Complexo contribui para a pesquisa em Psicopedagogia porque contextualiza e leva em conta a complexidade do ser humano. A segunda fase consiste em uma pesquisa de campo, utilizando a observação direta intensiva mediante a aplicação de questionário, distribuídos para psicopedagogos em atividade no Brasil de hoje, através de grupos de discussão e sites especializados na Internet. As perguntas visavam averiguar as representações sociais dos psicopedagogos e estudantes de psicopedagogia em fase de conclusão do curso (que, no Brasil é, normalmentem uma pós-graduação lato sensu), sobre a sua atividade, em especial, verificar se têm noção da complexidade, entendida como um novo paradigma do pensamento científico e ainda se percebem a relação entre o pensamento complexo e a Psicopedagogia. O objetivo geral desta pesquisa foi identificar a contribuição do pensamento complexo e da transdisciplinaridade à Psicopedagogia, tanto no campo teórico conceitual, como no campo prático e o objetivo específico foi verificar o que os psicopedagogos conhecem sobre pensamento complexo e suas possibilidades de contribuição para a Psicopedagogia. Os objetivos específicos foram verificar: como os psicopedagogos e os estudantes prestes a se formar em Psicopedagogia conceituam sua atividade profissional; se eles têm contato com o conceito

de Conhecimento Complexo; se percebem a Psicopedagogia como uma atividade transdisciplinar, ou, no mínimo interdisciplinar. PSICOPEDAGOGIA, INTERDISCIPLINARIDADE E TRANSDISCIPLINARIDADE A Psicopedagogia é um campo novo do conhecimento científico. Como tal é fértil em possibilidades criativas, oferecendo uma liberdade de inovação, que nem sempre é fácil em outras áreas científicas mais estratificadas. Configurando-se como um estudo interdisciplinar, a Psicopedagogia, por princípio, ultrapassa os estreitos limites da disciplina. Assim sendo, aproxima-se mais da visão integradora do pensamento complexo. Embora alguns autores considerem que a Psicopedagogia é um campo de estudo transdisciplinar, este entendimento não se sustenta se utilizarmos os conceito do CIRET sobre interdisciplinaridade e transdisciplinaridade. Enquanto esta é mais uma forma de abordagem na integração sem barreiras disciplinares de especialistas de várias áreas, a interdisciplinaridade tem como uma de suas possibilidades a criação de um novo campo de conhecimento a partir da superposição de outras disciplinas. Não se trata de uma somatória, mas de um pensamento novo que surge. A Psicopedagogia pretende estudar uma área específica da atividade humana, que é a aprendizagem humana, a construção do conhecimento, ou ainda, a autoria do pensamento. Entretanto, a compreensão desta atividade humana ultrapassa os limites de uma disciplina específica, pois engloba os aspectos físicos e biológicos, cognitivos, afetivos, sociais e relacionais e ainda a capacidade de simbolização através das linguagens. A Psicopedagogia recorre, portanto, a diversas disciplinas científicas, tais como a Biologia, a Psicologia, a Pedagogia, a Lingüística (e a Semiótica) e as Ciências Sociais, construindo assim seu campo próprio de conhecimento. Este último aspecto é extremamente relevante: a Psicopedagogia não apenas se utiliza dos conhecimentos de outras disciplinas, mas, a partir deles cria conhecimentos novos. Assim, ela se configura como interdisciplinar e não como apenas pluri ou multidisciplinar. PENSAMENTO SISTÊMICO E O APRENDIZADO NO CONTEXTO DO PENSAMENTO COMPLEXO Propor o pensamento sistêmico no entendimento das questões do aprendizado é possibilitar uma visão mais ampla entre o ensinar e o aprender na compreensão do quando, onde e como acontece. Consiste em reconsiderar as relações de causa e efeito das dificuldades que se apresentam, ao focalizar as formas de comunicação e de interação que se estabelecem. Seria possibilitar aos alunos, crianças, adolescentes ou adultos, assimilarem os conhecimentos que vão adquirindo em seus contextos culturais, reunindo-os, religando-os em novas bases de saber. Com esse pensamento estamos nos apoiando em um de seus princípios básicos da psicologia cognitiva, ao defender que um saber só é pertinente se for capaz de ser situado num contexto. Definitivamente, situar os saberes em um contexto torna-se um grande desafio para o ensino no despertar do 3º milênio, especialmente porque nos deparamos com uma disputa de saberes compartimentados, que se isolam uns dos outros. A proposta seria tentar articulá-los, com o objetivo de estabelecer uma comunicação solidária entre eles, ao romper com os reinados dos técnicos especialistas, definidos como experts do assunto, que tratam os conhecimentos específicos como saberes isolados, numa constante competição. Nos momentos atuais da mundialização, os problemas que emergem são transversais, multifatoriais e multidimensionais. Somente poderemos chegar a uma compreensão mais pertinente desses problemas, na busca de soluções se ampliarmos nossa visão. Essa tentativa não se detém em somente justapor os conhecimentos, sem organizá-los, produzindo idéias gerais, mas ocas, como

exemplo as idéias sobre o mundo, sobre o amor, sobre a felicidade, sem conceituação clara do que estamos expressando. São idéias não refletidas ou meditadas, por não se deterem a um conhecimento que religue as partes ao todo e, evidentemente, o todo às partes. Isso porque ao procurarmos entender o todo, estaremos compreendendo as partes que o compõem. Não somente uma simples somatória das partes, mas sim, a articulação dessas partes, com suas características, peculiaridades e próprias necessidades, que se tornará um todo único, com uma dinâmica específica. O olhar sistêmico intui e enfatiza que todos os aspectos dos diferentes saberes devem ter um mesmo valor, possibilitando a criação de um equilíbrio dinâmico entre as partes articuladas. Estaria assim atingindo a homeostase do sistema: mantém o equilíbrio do todo, atendendo as necessidades das partes. Tudo isso requer uma reforma de pensamento que vem se processando a partir da emergência das ciências com a utilização do método científico que procura sistematizar e organizar os dados, valorizando os aspectos específicos de cada fenômeno, passíveis de objetivação e manipulação, tendo como finalidade o controle das variáveis, para a obtenção de resultados comprováveis, a fim de se criar conhecimentos fidedignos. O caminho das mudanças se processa ao agrupar as ciências que se consideravam polidisciplinares (ou pluridisciplinares, ou ainda multidisciplinares), sem conhecimento umas das outras para promover um reagrupamento intitulado de Ciências da Terra que se trata de um domínio que se propõe a conhecer a terra como um sistema complexo. Entre elas podemos citar a ecologia que parte do estudo dos ecossistemas e toma a biosfera como objeto que é, sem dúvida, uma ciência polidisciplinar, porque o ecologista não retém os conhecimentos da zoologia, do saber botânico, da geologia e outros, mas somente se ocupa das articulações e regulações desses conhecimentos, apelando para os especialistas. Além desse exemplo, não nos esqueçamos de ciências como a História que se complexificaram no transcorrer dos últimos cinqüenta anos. Na busca de um pensamento organizador do todo e suas partes estaremos desenvolvendo uma compreensão contextual e complexa que respeita a inseparabilidade e as inter-retroações entre qualquer fenômeno e seu contexto e deste com os contextos nos quais está inserido. Como exemplo, ao querer compreender como se processa a construção do conhecimento de determinadas crianças ou adolescentes, procuramos conhecer os contextos familiares, escolares e sociais percorridos por eles. Para tanto devemos ampliar nosso olhar na direção do pensamento complexo, que não somente contextualiza os fenômenos ocorrentes, mas considera as relações, inter-relações, implicações mútuas em suas multidimensões, respeitando as diversidades e a unidade ao mesmo tempo. Para que isso ocorra há necessidade de uma mudança de pensamento, que já está em andamento. Ao afirmar isto apoio-me nos processo históricos a partir dos primórdios do século XX, com o surgimento das ciências denominadas polidisciplinares, focalizando os elementos de cada fenômeno em suas especificidades, na busca de compreensão em profundidade de seus aspectos. Em conseqüência das exigências do método científico, tendo como objetivo principal a eliminação de dados não experimentáveis e manipuláveis, a fim de se tornarem objetivos e portanto científicos. Como exemplo, a medicina ao especificar cada parte de nosso corpo cria disciplinas de especialidades estanques, dificultando uma avaliação global. Para tanto começa a emergir a necessidade de visões holistas para dar conta dos sintomas humanos, entre elas o que conhecemos como as abordagens homeopáticas, ou antroposóficas, novas aquisições que ampliam a compreensão dos fenômenos próprios das doenças orgânicas, que não se detêm no conhecimento das disciplinas isoladas, mas sim na possibilidade de religação desses saberes, ao promover troca de informações entre cada uma delas, dando-lhes vitalidade e fecundidade. A ecologia, também como uma ciência polidisciplinar, em vista de o ecologista não ter conhecimentos de zoologia, biologia, botânica ou geologia, mas poderá criar conceitos mais amplos se religar as diferentes informações obtidas com os especialistas. Neste mesmo caminho, vejo o desenvolvimento da educação, de maneira geral, e a psicopedagogia, de forma específica, estendendo-se para outros domínios científicos. A revolução biológica dos anos cinqüenta é um dos dados históricos que nos permite afirmar

que as mudanças vêm ocorrendo, especificamente, com as sobreposições, as articulações e as transferências entre conceitos da Física, da Química e da Biologia, criando novos paradigmas nessas religações. E será a partir dos conceitos da Física, baseando-se na teoria geral dos sistemas de Ludwing von Bertalanffy (1968) que a Biologia transportou para a compreensão das relações imanentes aos sistemas vivos, considerando o ser em sua integração com o meio-ambiente, num processo constate de retro-alimentação. Primeiro passo para o entendimento do ser em seu contexto e em sua complexidade. Apoiados nesses novos paradigmas, que consistem em considerar o contexto e as complexidades inerentes aos processos psicossociais influenciadores das condutas humanas, é que se desenvolveu uma teoria que procura dar conta das relações, ao invés das entidades isoladas, valorizando todos os elementos dessa relação de forma igualitária. Sendo, então, definido como pensamento sistêmico das interações humanas (Munhoz,2002). A PESQUISA DE CAMPO Para esta pesquisa, aplicamos um questionário com cinco perguntas abertas a 22 pessoas entre estudantes concluintes da especialização em nível de pós-graduação lato sensu em Psicopedagogia e profissionais da área. Estes, num total de apenas cinco, foram contatados via Internet, através de um grupo de discussão de psicopedagogia. Os estudantes pertencem a duas instituições privadas da capital do Estado de São Paulo. TABELA 1 Qualificação da Amostra Idade Sexo Até 35 anos De 36 a 50 anos 50 a 65 anos Não informou idade Feminino 7 9 4 2 Masculino - 1-1 A predominância de 90,9 % de mulheres dentre as entrevistadas não surpreende, já que existe uma acentuada maioria de pessoas do sexo feminino no ensino brasileiro hoje. O que merece uma especial atenção é que há profissionais de todas as faixas etárias buscando melhor compreender o processo de aprendizagem. TABELA 2 Formação profissional (graduação) dos pesquisados CARREIRA NÚMERO DE FORMADOS % EM RELAÇÃO DO NÚMERO DE RESPONDENTES Pedagogia 10 45,45 Psicologia 5 22,73 Artes 4 18,18

Letras 3 13,64 Ciências Sociais 1 4,55 Física 1 4,55 Não respondeu 3 13,64 Total 26 100,00 Observação: Há mais profissões que entrevistados porque alguns cursaram mais de uma faculdade. Com relação a já ter lido ou ouvido falar de pensamento complexo, igual número de entrevistados, oito, respondeu que sim e que não. Mas, a estes últimos devem ser somados os que responderam que não sabem ou não se lembram. Assim sendo, de fato, apenas 36,36% dos pesquisados sabem o que é pensamento complexo, Quanto à relação entre Interdisciplinaridade e Psicopedagogia ou Transdisciplinaridade e Psicopedagogia, identificamos três grupos de respostas: - Os que identificam a Interdisciplinaridade e a Transdisciplinaridade do ponto de vista da construção teórica, que permite a compreensão da Psicopedagogia como área do inter ou transdisciplinar do conhecimento científico. - Os que abordam a questão do ponto de vista prático, falando da integração do ser ou do sujeito. - Os que não sabem ou têm um entendimento errado da questão. Nesse grupo temos respostas em branco ou que não têm relação com o assunto proposto. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os psicopedagogos, em sua maioria, ainda não têm um conhecimento claro sobre a relação entre os conceitos de Interdisciplinaridade, Transdisciplinaridade, Pensamento Complexo e Psicopedagogia. Esta carência se mostra mais acentuada no nível teórico, pois, quando discorrem sobre a questão da prática psicopedagógica, vêem a interdisciplinaridade como um elemento integrador para lidar com os sujeitos aprendentes.

Referencias Bibliográficas BATESON, G. Pasos Hacia uma ecologia de lamente: uma aproximación a la compreensión del hombre. Buenos Aires: Editorial Planeta, 1991.. Mente e natureza: a unidade necessária. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1985. BERTALANFFY, L. General systems theory. Nova York: Braziller, 1968. CAPRA, F. O ponto de mutação, a ciência, a sociedade e a cultura emergente. São Paulo: Cultrix, 1988. ECO, Umberto. Abertura, informação, comunicação. In:. Obra aberta. 8. ed. São Paulo: Perspectiva, 1991. MALANGA, Eliana Branco. A metodologia com episteme e a pesquisa em Psicopedagogia.. In: ANDRADE, Márcia Siqueira de; GOTUZO, Alessandra Gotuzo Seabra (orgs.). A produção do conhecimento: métodos e técnicas de pesquisa em psicopedagogia. São Paulo: Memnon, 2002, p. 66-78. MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Lisboa: Instituto Piaget, 2002. (Epistemologia e Sociedade). MORIN, E. Introdução. In:. A religação dos saberes, o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002, pp.489-492. (Oitava Jornada Temática, Paris, França, 1988, idealizada e dirigida por Edgar Morin). MORIN, E et. al. Os sete saberes e outros ensaios. São Paulo: Cortez, 2002. MUNHOZ, Maria Luiza Puglisi. Bases teóricas da visão sistêmica. In: ANDRADE, Márcia Siqueira de; GOTUZO, Alessandra Gotuzo Seabra (orgs.). A Produção do Conhecimento: Métodos e Técnicas de Pesquisa em Psicopedagogia. São Paulo: Memnon, 2002, pp. 63-65.. A psicopedagogia como veículo para a construção do sujeito. Cadernos de Psicopedagogia. São Paulo. v.1, n.1, julho-dezembro, 2001, p. SHRÖDINGER, Erwin. O Que é a Vida?O aspecto físico da célula viva. São Paulo: Editora da UNESP / Cambridge, 1997.