UMA EXPERIÊNCIA NO ENSINO DE GRAMÁTICA NA ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA DE VEREDINHA - EFAV
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- Juliana Viveiros Monteiro
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1 UMA EXPERIÊNCIA NO ENSINO DE GRAMÁTICA NA ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA DE VEREDINHA - EFAV Neltinha Oliveira dos Santos 1 1 Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, neltinhaoliveira@gmail.com Resumo: Percebe-se que o ensino da gramática, na maioria das escolas, aborda a concepção normativa em que predomina-se a análise gramatical desvinculada das práticas sociais de uso da língua. Com base nas discussões sobre o ensino de gramática apresentadas por Antunes (2014), Possenti (1996) e Perini (2010) a experiência realizada na EFAV rompeu com as práticas vigentes. Palavras-chave: ensino, gramática, letramento e EFAV. 1. Introdução: A Escola Família Agrícola de Veredinha EFAV, integra um projeto de luta por uma Educação do Campo contextualizada e de qualidade, que, a cada dia, vem se expandindo no Brasil. Os princípios orientadores da escola, regidos pelos seus documentos oficias, são a Pedagogia da Alternância, a Associação Local, o Desenvolvimento do Meio e a Formação Integral. A EFAV tem ainda como proposta curricular a formação em prol da Agroecologia. Dentro disso, percebe-se que o Projeto Político Pedagógica da EFAV contempla uma visão diferenciada para o ensino-aprendizagem. Propor a gramática de forma contextualizada e problematizar o ensino da língua e da linguagem em sala de aula, traduz-se em duas questões fundamentais: contribuir com uma formação educacional de qualidade quanto ao ensino da Língua Portuguesa e garantir o que rege os documentos oficiais da escola teoria e prática. Antunes (2014, p.97) discute que a dificuldade em reconhecer a gramática como apenas UM dos componentes de objeto de estudo do texto atribui à gramática um poder que ela não tem, qual seja, o poder de ser suficiente para o bom e prestigiado exercício da linguagem. Nessa perspectiva, a experiência concretizada na EFAV possibilitou a exploração de outros componentes presentes no texto, verificando, também, que as dificuldades no exercício da escrita estão atreladas, predominantemente, às percepções de mundo e da própria realidade do estudante. Corroborando, assim, com a crítica à gramática normativa explicitada por Antunes (2014, p.97) [...] grande parte das pessoas ainda pensa que basta estudar gramática para saber 1
2 falar, ler e escrever com pleno sucesso. O objetivo dessa experiência desenvolvida em sala de aula é contribuir para a mudança no ensino da Língua Portuguesa, retirando da centralidade, a gramática normativa, principalmente, nas escolas do campo que atendem um público específico e têm uma trajetória marcante de desprestígio linguístico no Brasil. 2. Dos Fatos Debater sobre a língua e a linguagem no espaço da Educação do Campo ainda é inovador. Predomina-se, na grande maioria das escolas, a adesão do ensino normativo da língua, embasado, teoricamente, no pretexto do exercício da escrita, o que na prática é incoerente. O tradicionalismo educacional, vigente, é um fator de embasamento que sustenta essas práticas nas escolas. Um dos propósitos da Educação do Campo e que foi defendido por Paulo Freire (1987), em sua obra intitulada por Pedagogia do Oprimido, é a liberdade. Partindo, então, da compreensão do poder da língua e da linguagem, as críticas desse autor impactam diretamente no ensino da gramática e chama atenção para a urgência de romper com as estruturas do tradicionalismo, que vem mantendo as relações sociais, opressores-oprimidos : Este é o trágico dilema dos oprimidos, que a sua pedagogia tem de enfrentar. A libertação, por isto, é um parto. E um parto doloroso. O homem que nasce deste parto é um homem novo que só é viável na e pela superação da contradição opressores-oprimidos, que é a libertação de todos. (FREIRE, 1987, p.35). O que é validado também, por Perini (2010), ou seja, a urgência de se ter novas noções gramaticais que explicitem a língua realmente utilizada pelos falantes do Português Brasileiro: Apresentar a ideia, revolucionária para alguns, de que fazer gramática é estudar os fatos da língua, e não construir um código de proibições para dirigir o comportamento linguístico das pessoas. Esta tarefa é, de longe, a mais difícil de programar muitas pessoas parecem resistir a isso com obstinação fanática. Mas é a mais importante, e se não for vencida as outras vão cair no vazio. (PERINI, 2010, p.40). De um modo geral, observa-se uma grande desmotivação da maioria dos estudantes quando se trata de ações como, por exemplo, escrever, ler, falar em público e participar de debates. Questiona-se, então, em que ocasião ou em que momento problematizar e envolver os estudantes com essas demandas? Essas atitudes perpassam o ensino na sala de aula? 2
3 Nesse sentido, Possenti (1996) aponta outras preocupações relacionadas ao ensino da língua padrão e que de certa forma denuncia o caráter de urgência quanto às mudanças nas estratégias pedagógicas de ensino-aprendizagem. Ele discute a natureza político-cultural, a respeito da língua padrão: [...] é uma violência, ou uma injustiça, impor a um grupo social os valores de outro grupo. Ela valeria tanto para guiar as relações entre brancos e índios quanto para guiar as relações entre para simplificar um pouco pobres e ricos, privilegiados e "descamisados". Dado que a chamada língua padrão é de fato o dialeto dos grupos sociais mais favorecidos, tornar seu ensino obrigatório para os grupos sociais menos favorecidos, como se fosse o único dialeto válido, seria uma violência cultural. Isso porque, juntamente com as formas linguísticas [...], também seriam impostos os valores culturais ligados às formas ditas cultas de falar e escrever, o que implicaria em destruir ou diminuir valores populares. (POSSENTI, 1996, p.12). Em suma, as questões que foram levantadas não simbolizam a intenção de excluir o ensino da gramática é um direito do/a estudante. Revela, portanto, um conjunto de impasses provocados, cotidianamente, nas aulas de Língua Portuguesa. Dentro disso, defende-se, que são fatores instigadores, no sentido de provocar os/as professores/as da área da linguagem, isto é, a pesquisar e a identificar as dificuldades reais presentes na sala de aula e, assim, dar novos sentidos e contribuições concretas para a vida dos/as estudantes, bem como, para o ensino da Língua Portuguesa. Ressalta-se que esses motivos supracitados geraram diversos debates na EFAV, exclusivamente, na turma do 3º ano do Ensino Médio. Essa movimentação dialógica, possibilidades de leituras e produções escritas foi determinante, inclusive, para as convicções dos/as estudantes quanto à relevância da língua e da linguagem para o empoderamento político-participativo. Salienta-se que não foi uma experiência robusta com aplicação de métodos complexos e quase inatingíveis, partiu-se do pressuposto da leitura, da conversa, do levantamento de hipóteses e, posteriormente, a escrita o que já é rotineiro nas aulas de Língua Portuguesa. Inicialmente, a turma leu e debateu o capítulo Comportamentos e Atitudes do livro, Sociolinguística uma introdução crítica do autor, Louis-Jean Calvet e o texto Urupês do autor, Monteiro Lobato. Essa base teórica proporcionou uma grande diversidade de posicionamentos, como: o desprestígio social das variações linguísticas, a não neutralidade da língua, as atitudes linguísticas do que me aproxima e do que me afasta, os espaços sociais e 3
4 as condições linguísticas interligadas e, por fim, a identidade camponesa. Foi possível analisar que essas discussões foram inovadoras para a turma e produziram mudanças positivas quanto à autoestima, o reconhecimento e a valorização da própria variação linguística e, acima de tudo, o interesse em exercitar a leitura e a escrita. Deparou-se com depoimentos, como: vou tirar pelo ao menos 15 minutos para ler todos os dias, eu preciso ler e escrever mais, o exercício da leitura e da escrita não deveria iniciar aqui, agora, mas, para mim, está iniciando hoje. Essas declarações estimularam o projeto Arte e Leitura em Toda Parte, na EFAV, criando a Oca Literária espaço estratégico de vivenciar a leitura. Os diálogos sobre língua e linguagem desencadearam nas temáticas: identidade camponesa e a relação campo e cidade. Delimitando, posteriormente, na questão: As possibilidades e os limites de permanecer no campo. Por conseguinte, estudou-se em sala de aula textos afins, leituras de entrevistas com jovens do campo e vídeos com experiências da sucessão rural. Todo o material explorado foi debatido por diferentes grupos, sendo que cada grupo manuseou textos de conteúdos diferentes. Presenciou-se que a temática suscitou pontes com a realidade vivenciada nas próprias comunidades, somando-se a outros conhecimentos e de diferentes áreas. Dentro disso, cada estudante produziu um texto do gênero dissertativo-argumentativo e os encaminhamentos desse processo estão atrelados, predominantemente, à organização das ideias no plano da escrita e à adequação em respeito à estrutura introdução, desenvolvimento e conclusão, ou seja, a centralidade das dificuldades na produção textual, de fato, não está na gramática. Os desdobramentos gramaticais diagnosticados foram: concordância verbal, concordância nominal, dúvidas quanto ao uso da crase, o uso de termos onde ou aonde, se não ou senão, traz ou trás e a terminação dos verbos na 3ª pessoa do plural (presente do indicativo) e na 3ª pessoa do plural (futuro do presente do indicativo). Situações que foram estudadas e analisadas por meio das hipóteses dos/as estudantes, gerando, inclusive, debates sobre a gramática normativa. 4
5 Conclusão Por fim, analisa-se que essa experiência do Ensino da Gramática na EFAV aponta para novos caminhos, em defesa da contextualização do ensino em sala de aula, contextualização, aqui, proposta, no sentido freiriano a vida e o mundo. Se temos uma sociedade em constante transformação, se temos uma língua em funcionamento, não existe justificativa para a estagnação dos conteúdos em sala de aula. Destaca-se também a Pedagogia da Alternância e os diálogos entre a teoria e a realidade, que legitimam as possibilidades de rupturas com o tradicionalismo linguístico. Soma-se também os diferentes instrumentos pedagógicos existentes na EFAV que demandam práticas de leitura e escrita. Referências ANTUNES, Irandé. Gramática contextualiza: limpando o pó das ideias simples. São Paulo: Parábola Editorial, FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, PERINI, M. A. Gramática do português brasileiro. São Paulo: Parábola Editorial, POSSENTI, S. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas, SP: Mercado de Letras, p
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