RECONSTRUINDO IDENTIDADES: INTERFACES ENTRE A HISTÓRIA, CULTURA E MEMÓRIA DA COMUNIDADE QUILOMBOLA DO CAMPO D ANGOLA- PB
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- Luiz Eduardo Paixão Ferretti
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1 RECONSTRUINDO IDENTIDADES: INTERFACES ENTRE A HISTÓRIA, CULTURA E MEMÓRIA DA COMUNIDADE QUILOMBOLA DO CAMPO D ANGOLA- PB Michelle Santino Fialho; Anacleto Lira de Oliveira Universidade Estadual da Paraíba- michelle-fialho@hotmail.com Universidade Estadual da Paraíba- carpefabula@gmail.com Este trabalho aborda estudos referentes às comunidades remanescentes de quilombos, especificamente, a comunidade quilombola do Campo D Angola, localizada no distrito de São José da Mata- PB. Um dos objetivos dessa pesquisa é garantir o reconhecimento da comunidade enquanto remanescente, dando-lhes uma relevante visibilidade. Debater-se-á questões acerca da memória cultural e o reconhecimento constituído através de diversos processos, partindo do pressuposto da elaboração de um imaginário identitário submerso no perfil cultural quilombola. Através de uma revisão bibliográfica e de uma pesquisa de campo, traçada desde o início dos nossos trabalhos realizados ao decorrer desses dois anos, objetivamos a realização de um trabalho que viesse entender as implicações culturais retratadas e preservadas no cerne das comunidades negras remanescentes de quilombo, considerando a necessidade da construção coletiva da sua história. PALAVRAS- CHAVES: Cultura, Quilombo, Identidade. INTRODUÇÃO É bem verdade que, nos últimos anos a nossa historiografia da escravidão vem lançando novos olhares para o fenômeno da quilombagem. A associação da memória cultural aos estudos historiográficos assinala uma imensurável ampliação do cenário étnico enquanto campo privilegiado a análises epistemológicas, possibilitando à historiografia contemporânea projetar perspectivas étnicas em uma categoria histórica. Reafirmam-se hábitos peculiares provenientes de identidades culturais e costumes, absolutamente, construídos no cerne das práticas cotidianas, estabelecendo assim, novas ações de sociabilidade. Esse situar dentro das diversas formas de sociabilidade ativa constitui padrões de permanência e mudanças articuladas aos hábitos das comunidades. Esse processo
2 oferece subsídios relevantes à medida que se concentram em um processo contínuo que configura diversas formas e influências/relações de modos singulares. Daí percebe-se a presença de inevitáveis valores simbólicos imersos na construção da vida cotidiana a partir do universo quilombola, que possibilitam uma circularidade cultural irreversível no sentido de experiências que regem as representações sociais. A consciência e o reconhecimento de uma indiscutível bagagem cultural quilombola que emana das práticas de convívio retratam e afirmam uma extrema valorização. A proposta de desenvolver esta pesquisa apoiou-se no interesse em estabelecer um diálogo com a comunidade moradora do Campo d Angola, considerando a necessidade da construção coletiva da história do local. É certo que a questão de projetos educacionais inseridos nas comunidades quilombolas, expressa uma realidade, indiscutivelmente, limitada ao padrão de sociabilidade vigente. No entanto, com o decorrer do tempo, mudanças significativas no contexto étnico cultural emergiram, a fim de promoverem uma relevante transformação nos indivíduos integrantes da comunidade, enquanto sujeitos aptos a uma conscientização educacional. Tendo em vista o desconhecimento da origem dos descendentes afro-brasileiros que povoaram inicialmente o lugar, a exemplo dos remanescentes de quilombos já identificados em outras comunidades paraibanas, buscamos contribuir imensamente para o registro dessas histórias de vida, proporcionando um redimensionamento de concepções pautadas nas relações sócio-educativas. Desse modo através das primeiras pesquisas, alavancamos mais um passo na ampliação dos estudos da história e cultura das populações negras no estado da Paraíba, sobretudo no que se refere aos remanescentes quilombolas, uma vez que era evidente a necessidade de produções acadêmicas sobre essa temática. O interesse pelos estudos étnicos tornou-se significativos ao longo dos anos 90, quando pesquisadores dedicados ao estudo de comunidades rurais negras, principalmente no Nordeste passam a ganhar visibilidade política e acadêmica. Embora esse fenômeno tenha consolidado um imensurável avanço nas discussões concernentes às questões da construção cultural e um aprofundamento direcionado à investigação histórica e social das comunidades quilombolas, poucas reflexões foram
3 elaboradas do processo em si, no âmbito intelectual. Tal investigação nos interessou, uma vez que se configurou a alto-definição dos remanescentes quilombolas enquanto portadores e personagens de uma história própria e de uma considerável diversidade de significantes culturais e de múltiplos saberes, incutidos em um processo que, possibilitou então, o norteamento do desenvolvimento da comunidade. Assim, partindo do pressuposto de que as identidades são móveis e historicamente construídas, estabelecemos a pretensão, através das pesquisas, em dar mais um passo na ampliação dos estudos da história e cultura das populações negras no estado da Paraíba, ampliando a compreensão sócio-cultural, sobretudo no que se refere aos remanescentes quilombolas. METODOLOGIA Após levantamento e catalogação das fontes, a metodologia que desenvolvemos neste projeto constituiu-se a princípio, do uso da história oral. Por meio das entrevistas com os moradores mais antigos e descendentes de famílias de escravos, da pesquisa analítica documental e fotográfica, identificação de elementos, símbolos e estruturas, bem como da análise de alguns textos teóricos que reafirmaram e comprovaram a existência da identidade quilombola, haja vista a imensurável presença cotidiana de atividades afro-descendentes incutidas na localidade. Estabelecendo uma análise das culturas tradicionais da comunidade como, por exemplo, grupos de danças, de música, capoeira, dentre outros, objetivamos perceber nelas significantes que nos levem a identificar aspectos de uma cultura afrobrasileira. Reconhecendo, então, práticas e saberes locais imbuídos de um considerável vínculo entre passado e presente, sob a ótica de aspectos materiais e imateriais, levamos nossos questionamentos para o âmbito do desenvolvimento cultural, representando sua plena importância enquanto um remanescente de quilombo. A partir da apreensão do pluralismo cultural presente no cenário e na concretização dos laços sociais, apontamos para o aspecto da identidade cultural peculiar como condição necessária para seu reconhecimento cultural, rompendo definitivamente com visões abstratas que asseguram entendimentos equivocados
4 em relação às comunidades remanescentes. Desta forma, ao pesquisar e analisar os aspectos inerentes a comunidade quilombola Campo d Angola, especificamente, referencias culturais e simbólicos, efetivamos reflexões em consonância com os nossos objetivos propostos, sob o alicerce de valores praticados através de um processo de troca de informações e conhecimento firmados em um contato direto com a população. RESULTADOS Os resultados obtidos ao final do nosso projeto se mostraram em um patamar de imensa satisfação, tendo em vista o reconhecimento da comunidade do Campo d Angola por parte da instituição de ensino e do envolvimento e empenho dos alunos participantes. Neste segundo ano de pesquisa conseguimos atrair a participação da população local, incutindo nela o sentido de pertencimento e de transformação social. Há, de fato, uma mudança anunciada. Evidencia-se a imensurável contribuição e o reconhecimento da identidade quilombola, uma vez que o despertar do interesse pela sua cultura, mostra-se de suma relevância para a reafirmação da convivência social, seja âmbito escolar, familiar ou em outros espaços de inserção social e participação cidadã. A partir da realização das pesquisas, consolidamos possibilidades e oferecemos caminhos para a comunidade acessar a sua memória, ressaltando-os como sujeitos do conhecimento e produtores de sua realidade, uma vez que esta se mantém viva e atuante. A (re) significação da história da comunidade do Campo d Angola, enquanto remanescente quilombola beneficiou diretamente os moradores (juventude e idosos) residentes na comunidade e, indiretamente, moradores de regiões vizinhas, o distrito de São José da Mata e a cidade de Campina Grande. Nossos estudos mostraram que as comunidades de quilombo, especificamente o Campo d Angola, se constituíram a partir de uma grande diversidade de processos direcionados à construção de uma trajetória histórica própria, de uma existência coletiva e uma autoconsciência identitária.
5 DISCUSSÃO Nos últimos anos, a concepção sobre as comunidades remanescentes de quilombos e a forma de como se pensar suas condições sócio culturais tem mudado lentamente e significativamente. Nosso interesse ao colocar em prática esse projeto de pesquisa na comunidade de Campo d Angola, encontra-se fundamentado no cerne de trocas de saberes incontornáveis, uma vez que, a partir de então, torna-se evidente o estabelecimento de rupturas lacunares. Essa pesquisa abrigou operações aptas a fornecerem importantes pistas sobre a diversidade cultural da mesma. Destacamos ainda a importância de identificarmos as práticas culturais e configurar a ideia de persistência da cultura africana nos quilombos. Nesse caso perguntaríamos em que medida os quilombos são ou buscam ser, reproduções do modo de vida africano, ou em que medida constituem criações originais e propriamente. Tendo em vista a necessidade de registro da história de vida da comunidade tornou-se importante os relatos dos moradores, para que através da memória coletiva estes possam contribuir de maneira significativa para a construção da identidade quilombola. Falando a respeito da identidade étnica e caminhando na mesma linha de raciocínio de Stuart Hall (2006), que diz que ela vai se reconstruindo e (re) configurando ao longo do processo histórico. Não se pode entendê-la como algo definido plenamente desde o inicio da história de um povo (p. 20). Neste caso, as comunidades quilombolas enquanto espaços de convivialidade tornamse um local onde as práticas cotidianas se ajustam constituindo, por fim, redes de integração entre os indivíduos. Assim partido do pressuposto de que as identidades são móveis e historicamente construídas, foram discutidas ao transcorrer dos estudos, as fragmentações de classe e étnica, resultando em transformações que de alguma forma mudam as identidades pessoais. CONCLUSÕES A partir de nossa pesquisa e ao estabelecer uma parceria entre os moradores da
6 comunidade e a Universidade Estadual da Paraíba, identificamos a importância do resgate da memória, que até então é silenciada pelos registros oficiais, além da persistência da cultura africana nos quilombos. Tendo em vista a necessidade de registro da história de vida da comunidade tornou-se muito importante os relatos dos moradores, para que através da memória coletiva houvesse uma contribuição de maneira significativa na construção da identidade quilombola, bem como na afirmação de um espaço de visibilidade. Os resultados da pesquisa evidenciaram uma forte valorização da alto-estima dos moradores da comunidade, principalmente, dos jovens que na sua maioria estavam destituídos das atividades lúdicas, artísticas e profissionais, visto que estes demonstraram um inegável interesse e curiosidade sobre a história da comunidade. Desenvolvemos táticas para promoção da igualdade social e ética, incitando a inclusão social das crianças e jovens no cerne da organização grupal e despertando entre eles o interesse pela história sua realidade local. Levando em consideração tais fatos, tomamos por base a narração da história de vida dos diversos sujeitos individuais e coletivos, para que, assim, adquirissem a consciência de protagonistas de sua própria história. Reafirmou-se, portanto, um considerável avanço nas discussões referentes às questões e étnico-raciais incutidas no anseio da preservação histórica e na intenção, com este trabalho, em melhor conhecer a já mencionada comunidade, onde as manifestações culturais apresentam forte vínculo com o passado, partindo do reconhecimento e valorização da cultura local, além da riqueza artística e cultural incutida na espacialidade quilombola. Concluímos que o conhecimento da ideia incutida na (re) significação das comunidades quilombolas encontra-se, veementemente, direcionada a um processo de alto reconhecimento na tentativa de dar voz aos agrupamentos, objetivando uma transformação integral, com base nas dinâmicas socioculturais estabelecidas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARRUTI, J. M. A. (1995). Morte e vida no Nordeste indígena: a emergência étnica como fenômeno regional. Estudos Históricos. FVG, vol. 8, n.15, p. 66
7 CERTEAU, M. A invenção do cotidiano 1. Artes de fazer. Tradução de Efhraim Ferreira Alves. 16. Ed. Petrópolis, RJ: VOZES, A invenção do cotidiano: morar, cozinhar. 2. ed. Petrópolis: Vozes, GEERTZ, C. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: LTC, GUIMARÃES, A. Preconceito racial: modos, temas e tempos. São Paulo: Cortez, (Preconceitos; v.6) GUINZBURG, C. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. São Paulo: Companhia das letras, Olhos de Madeira: nove reflexões sobre a distância. São Paulo: Companhia das Letras, HALL, S. Da diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte/Brasília: Editora UFMG/UNESCO, P. 20 Livro do Município de Campina Grande. Movimento Brasileiro de Alfabetização Mobral. MUNANGA, K / Origem e histórico do quilombo na África. Revista de Antropologia da USP, n. 28. São Paulo: USP. REIS, J. J.; GOMES, F. dos S. Liberdade por um fio: História dos quilombos no Brasil. São Paulo, Companhia das Letras, SANTOS, J. L. dos. O que é Cultura. São Paulo: Brasiliense, 2006.
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