SEGUNDA TURMA RECURSAL JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS SEÇÃO JUDICIÁRIA DO PARANÁ
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- Maria Aveiro Dias
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1 Autos nº: Relatora: Juíza Federal Ana Carine Busato Daros Recorrente: União Federal Recorrido: Salim Gonçalves da Mata Origem: Vara do JEF Cível de Curitiba - SJPR V O T O Cuida-se de recurso interposto contra sentença que julgou procedente o pedido, para declarar a inexigibilidade da contribuição ao Fundo de Saúde do Exército - FUSEX em patamares superiores à alíquota de 3% sobre o soldo dos militares da ativa, respeitada a prescrição decenal. A União recorreu, alegando que a contribuição não possui natureza tributária, bem como que sua cobrança é legítima. Merece reforma o julgado, apenas para alterar o prazo prescricional, que modifico de ofício para o prazo de 05 anos. Prescrição A contribuição ao FUSEX subsume-se no conceito de tributo previsto no art. 3º do Código Tributário Nacional, de modo que não se pode negar a sua natureza tributária e, portanto, a sua sujeição ao princípio da legalidade. Com relação à natureza do ato do lançamento, o Superior Tribunal de Justiça em julgamento do recurso repetitivo pacificou o entendimento de que se trata de lançamento de ofício e, portanto, a prescrição é qüinqüenal. Transcrevo a ementa da decisão, porquanto esclarecedora: - 1 -
2 TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRIBUIÇÃO AO FUSEX. TRIBUTO SUJEITO AO LANÇAMENTO DE OFÍCIO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. 1. O Fundo de Saúde do Exército (FUSEX) é custeado pelos próprios militares que gozam, juntamente com seus dependentes, de assistência médico-hospitalar, cuja contribuição é cobrada compuriamente dos servidores. A contribuição de custeio, por inserir-se no conceito de tributo previsto no art. 3º, do CTN, ostenta natureza jurídica tributária, sujeitando-se ao princípio da legalidade. (Precedentes: REsp /PR, DJ ; REsp /PR, DJ ; REsp /SC, DJ ; REsp /PR, DJ ). 2. Consoante doutrina abalizada definindo o critério diferenciador das modalidades de lançamento, in verbis: "Ao estudar as modalidades de lançamento (...), a doutrina antecedente ou a superveniente ao Código Tributário Nacional as classificam adotando como critério de classificação o maior ou menor concurso dos obrigados na atividade do lançamento, ou seja, o grau de colaboração entre Fisco e sujeito passivo. O critério tricotômico consagrado no Código Tributário Nacional decorreria do grau de colaboração do sujeito passivo na preparação do lançamento. No lançamento direto ou de ofício (CTN, art. 149) não haveria participação do sujeito passivo. No lançamento por declaração ou misto (CTN, art. 147) ocorreria uma colaboração entre Fisco e sujeito passivo. No lançamento por homologação (CTN, art. 150) maior seria a intensidade da colaboração, vale dizer, da participação do sujeito passivo, porquanto o Fisco se limitaria a homologar os atos por ele praticados." (José Souto - 2 -
3 Maior Borges, in Lançamento Tributário, Editora Malheiros, 2ª edição, p. 325/326) "A fonte inspiradora da tricotomia reside no índice de colaboração do administrado, com vistas à celebração do ato. Na primeira hipótese (lançamento de ofício), a participação seria inexistente, uma vez que todas as providências preparatórias são feitas nos cancelos da Administração. Na segunda (lançamento por declaração), colaboram ambas as partes, visando os resultados finais do lançamento. Na última (lançamento por homologação), quase todo o trabalho é cometido pelo súdito, limitando-se o fisco a homologar os atos por ele praticados." (Paulo de Barros Carvalho, in Curso de Direito Tributário, Ed. saraiva, 20ª edição, p. 460) 3. A contribuição social ao FUSEX configura tributo sujeito ao lançamento de ofício, que se processa mediante o desconto em folha do servidor militar pelo órgão pagador, o qual é mero retentor do tributo, não havendo qualquer participação do sujeito passivo da relação jurídicotributária na constituição do crédito fiscal. (Precedentes: AgRg no AgRg no REsp /PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/02/2010, DJe 24/02/2010; EDcl no AgRg no Ag /RS, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/11/2009, DJe 27/11/2009; AgRg no AgRg no REsp /RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/10/2009, DJe 21/10/2009; REsp /PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/02/2009, DJe 11/03/2009) 4. Destarte, o prazo prescricional a ser aplicado às ações de repetição de indébito relativas à contribuição ao FUSEX, que consubstancia tributo sujeito ao lançamento de ofício, é o qüinqüenal, nos termos do art. 168, I, do CTN
4 5. In casu, as parcelas pleiteadas referem-se a recolhimentos indevidos efetuados de 30/9/1991 a 29/03/2001, tendo sido a ação ajuizada em 04/06/2007, por isso que ressoa inequívoca a ocorrência da prescrição. 6. Recurso especial desprovido. (REsp /RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/04/2010, DJe 26/04/2010) Tendo em vista a natureza eminentemente tributária da referida contribuição social, verifica-se que essa se processa mediante o desconto em folha do servidor militar pelo órgão pagador, o qual é mero retentor do tributo. Por isso que a contribuição social em tela é tributo sujeito ao lançamento de ofício, uma vez que o sujeito passivo não participa da constituição do crédito tributário. Assim, com base no artigo 219, 5º, do Código de Processo Civil, reconheço a prescrição das parcelas anteriores ao qüinqüênio que antecedeu o ajuizamento da ação. Portanto, reconheço de ofício a prescrição qüinqüenal. Mérito A contribuição destinada ao fundo de assistência médicohospitalar dos militares vinha sendo exigida em virtude da Lei n /72, nos seguintes termos: Art. 81. Os recursos para a assistência médico-hospitalar aos dependentes dos militares provirão de verbas consignadas no Orçamento da União e de contribuições estabelecidas na forma do disposto no parágrafo 1º. 1º Poderá ser estabelecida a contribuição de até 3% (três por cento) do soldo do militar, para constituição de um Fundo de - 4 -
5 Saúde de cada Força Armada, regulamentado pelo respectivo Ministro. A lei consignou, expressamente, os elementos essenciais da obrigação então instituída, quais sejam: o sujeito passivo, a base de cálculo e a alíquota máxima permitida, ou seja, atendeu-se ao princípio da legalidade. A delegação administrativa contida na norma transcrita estava restrita à regulamentação do fundo então criado, e não da contribuição propriamente, pois os aspectos materiais já estavam delineados na lei. Seguiu-se a Lei n , de 9 de dezembro de 1980 (Estatuto dos Militares) que manteve o direito dos militares e dependentes à assistência médico-hospitalar própria, sem, no entanto, fazer referência à contribuição devida, de modo que permaneceu vigente a norma da Lei n /72. As leis referidas foram, então, regulamentadas pelo Decreto n , de 2 de abril de 1986, que estabeleceu a alíquota máxima de 3% (três por cento) para os militares da ativa e na inatividade, e de 1,5% (um e meio por cento) para as pensionistas da categoria. A contribuição então exigida encontrava amparo no inciso I do art. 21 da Constituição, com a redação da Emenda Constitucional n. 1/69, que atribuía competência residual à União para a instituição de contribuições de interesse de categorias profissionais. Subsumia-se, igualmente, no conceito de tributo previsto no art. 3º do Código Tributário Nacional, de modo que não se pode negar, desde aquela época, a sua natureza tributária e, portanto, a sua sujeição ao princípio da legalidade. A contribuição ao Fundo de Saúde das Forças Armadas estabelecida nas Leis ns /72 e 6.880/80, bem como o Decreto n /86 que as regulamentou, foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, sendo de se observar que este último foi acolhido pelo - 5 -
6 novo ordenamento constitucional como lei ordinária, porquanto com ele compatível, na medida em que consistindo em contribuição de interesse de categoria profissional, da competência exclusiva da União, passou a encontrar amparo no art. 149, caput, da nova Carta. Com o advento da Lei n , de 30 de setembro de 1991, não obstante revogada a Lei n /72, permaneceu a previsão da contribuição para o FUSEX, como desconto obrigatório discriminado no seu art. 75, II, de modo que impende concluir pela continuidade da contribuição segundo as alíquotas inicialmente fixadas no Decreto n /86, pois este permaneceu em vigência, com status de lei ordinária. Isso significa dizer que são ilegais as posteriores majorações de alíquota, uma vez que se fizeram mediante a alteração do artigo 14 daquele decreto por atos administrativos a ele supervenientes (Decretos nºs 906, de 30 de agosto de 1993, 1.961, de 19 de julho de 1996 e 3.557, 23 de janeiro de 2007), quando a modificação somente poderia ser perpetrada por lei ordinária ou medida provisória com força de lei. A situação só foi regularizada com a edição da Medida Provisória nº 2.131, de , publicada no D.O.U. de (atual MP , de ), que determinou, em seu art. 25, a incidência da exação com a alíquota máxima de 3,5% (art. 25). Contudo, a citada medida provisória alterou a alíquota anteriormente vigente e versou de forma expressa sobre a base de cálculo da contribuição cobrada apenas dos militares inativos e pensionistas. Não há qualquer menção aos militares da ativa, em evidente lapso, visto que o art. 15, II da própria MP impõe a obrigatoriedade da contribuição também aos ativos
7 É de se ressaltar a impossibilidade de estender os efeitos do art. 25 da referida MP aos militares da ativa, pois fazê-lo seria empregar a analogia na forma vedada pelo art. 108 do CTN, isto é, quando resultar na exigência de tributo não previsto em lei. Neste sentido, esclarecedora é a lição de Leandro Paulsen, que disserta: Na analogia, há integração da legislação tributária mediante aplicação da lei a situação de fato nela não prevista, embora semelhante àquela a qual a lei se refere expressamente... (in: Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 6 ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado: ESMAFE, p. 869). Em última análise, a aplicação do art. 25 da MP /01 afronta o próprio princípio da reserva legal tributária, esculpido no art. 150, I, da CF: Art Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; Desse modo, a cobrança da exação é válida até o percentual de 3,5% somente sobre os proventos da inatividade, pois para esta hipótese existe definição legal da base de cálculo, da alíquota e do sujeito passivo. Quanto aos militares da ativa, permanece vigente o Decreto n /86, no que tange à alíquota de 3% sobre o soldo, prevista no art. 14, inciso I, em sua redação original. Esta última observação se faz necessária, pois, como já dito, a Constituição Federal de 1988 albergou, em relação ao sistema tributário, o princípio da reserva legal tributária (art. 150, I). Deste princípio decorre a proibição de delegação ao Poder Executivo de regulamentar qualquer dos aspectos essenciais do tributo hipótese de incidência, base de cálculo e alíquota. Portanto, todos os decretos que - 7 -
8 alteraram a alíquota original de 3% prevista no art. 14 jamais poderiam fazê-lo. Ademais, mesmo com o,advento da Lei n /91, os requisitos necessários para caracterização e individualização da contribuição em estudo continuam explicitadas no Decreto n /86 não foi revogado pela Lei n /91, e como já dito, foi recepcionado pela CF. Assim, a contribuição para a assistência médico-hospitalar dos militares da ativa denominada como FUSEX é devida até o limite de 3% sobre o soldo (e não sobre a totalidade da remuneração), nos termos da redação original do art. 14, I do Decreto n /86 ( Art. 14. As contribuições mensais, para a constituição e manutenção dos fundos de saúde de cada Força Armada, corresponderão: I - a 3% (três por cento) do valor do soldo, para os militares da ativa e na inatividade ). Qualquer contribuição acima deste limite é passível de restituição, desde que não atingida pela prescrição. Frise-se que é totalmente irrelevante se a imposição se deu de forma a fracionar a contribuição em diversas rubricas de desconto, desde que não seja ultrapassado o limite de 3% sobre o soldo. Isto porque a cobrança de tais rubricas não tem respaldo legal, pois são fundadas em espécies legislativas de hierarquia inferior à lei, quais sejam, as Portarias Ministeriais n. 859/97 e n. 117/01. Não obstante, tendo em vista que a assistência à saúde visa a custear despesas médicas e hospitalares tanto dos militares quanto de seus dependentes, e considerando que o Decreto nº /86 autoriza a exação até o limite de 3%, o procedimento previsto nas portarias mencionadas pode ser compatibilizado com os ditames do Decreto n /86, desde que a soma das rubricas não ultrapasse a alíquota fixada em lei
9 Assim, tendo em vista que a pretensão de repetição de indébito se restringe às contribuições vertidas ao FUSEX que excederem os limites legais, tenho que a soma dos descontos efetivados sob estas rubricas não poderá exceder os 3% para o militar da ativa. Entretanto, o valor a ser restituído no caso concreto deve ficar adstrito aos limites do pedido, e desde que haja efetiva comprovação de recolhimento. No que tange à correção monetária, por se tratar de verba de natureza tributária, deverá incidir a taxa SELIC (art. 39, 4º da Lei nº 9.250/95), até data da requisição de pagamento. Ressalto que não deverão incidir juros de mora, haja vista que a Lei 9.250/95, ao introduzir inovação em relação ao disposto no art. 161, 1º do CTN, já os contempla na taxa mista da SELIC, sob pena de bis in idem. Considerando a sucumbência, condeno a União a arcar com os honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vencidas a partir da sentença. Do exposto voto por RECONHECER DE OFÍCIO A PRESCRIÇÃO QUINQUENAL E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA UNIÃO. Curitiba, 28 de setembro de 2010 ANA CARINE BUSATO DAROS JUÍZA FEDERAL RELATORA - 9 -
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