PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de São Paulo, em que é apelante/apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, são apelados/apelantes ELCIO GONCALVES DO NASCIMENTO e RENATO DE SOUZA GALINDO. ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao apelo defensivo e deram provimento ao recurso ministerial para condenar Elcio Gonçalves do Nascimento, nos termos do v. acórdão. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GUILHERME DE SOUZA NUCCI (Presidente), LEME GARCIA E OSNI PEREIRA. São Paulo, 23 de fevereiro de Guilherme de Souza Nucci RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Apelação nº Comarca: São Paulo Apelantes: Elcio Gonçalves do Nascimento, Renato de Souza Galindo e Ministério Público Advogado: Danielle Cristina Uemura VOTO Nº Apelação. Roubo majorado pelo concurso de agentes. Concurso formal de infrações. Subtração de bens pertencentes a três vítimas, abordadas no interior de veículo, sob a mira de duas armas de fogo. Acusados que, após a subtração, evadiram-se em outro veículo ocupado por dois indivíduos. Réus detidos na posse dos bens e reconhecidos por todas as vítimas. Autoria e materialidade comprovadas. Apelo ministerial pelo reconhecimento da causa de aumento referente ao emprego de arma de fogo. A caracterização da majorante prescinde de comprovação da potencialidade lesiva da arma de fogo. Outros elementos de prova que suprem a apreensão. Dinâmica dos fatos que se amolda ao concurso formal de crimes. Penas fixadas corretamente. Réu Elcio possuidor de maus antecedentes. Ambos os acusados reincidentes específicos. Negado provimento ao apelo defensivo, provendo-se o recurso ministerial. A MM. Juíza a quo, Dra. Fátima Vilas Boas Cruz, da 17ª Vara Criminal da Comarca Central da Capital, em sentença datada de 24/07/2014 (fl. 206), julgou parcialmente procedente a acusação, para condenar Elcio Gonçalves do Nascimento e Renato de Souza Galindo como incursos no artigo Apelação nº

3 157, 2º, inciso II, por três vezes, na forma do artigo 70, ambos do Código Penal, às penas de, respectivamente, 8 anos, 5 meses e 18 dias de reclusão e 48 dias-multa (Elcio), e 7 anos, 3 meses e 3 dias de reclusão e 42 dias-multa (Renato), ambos em regime inicial fechado. Insurge-se o órgão ministerial, em face da r. sentença, pleiteando o reconhecimento da causa de aumento referente ao emprego de arma de fogo, afastada pela magistrada sentenciante diante da ausência de comprovação da potencialidade lesiva do instrumento, uma vez que não apreendida. Irresignada, a defesa recorreu, pretendendo sejam os réus absolvidos, com fulcro na insuficiência de provas. Alternativamente, requer a redução das bases em relação ao réu Elcio e a compensação entre menoridade e reincidência quanto ao acusado Renato. Por fim, pleiteia o reconhecimento de crime único. Contrarrazoado os recursos; a Procuradoria Geral de Justiça, em seu parecer, opinou pelo improvimento do apelo defensivo, provendo-se o recurso ministerial. É o relatório. Segundo consta da exordial acusatória, na data de 16 de março de 2014, em horário incerto, os denunciados, agindo em concurso de agentes e mediante emprego de arma de fogo, subtraíram, em proveito comum, uma carteira e o aparelho celular da vítima Lucas, uma carteira, Apelação nº

4 relógio e uma garrafa de tequila de propriedade da vítima Júlio César e, por fim, uma carteira e uma aliança pertencentes à vítima Giovanni. A vítima Lucas, ouvida em sede judicial, declarou estar juntamente com as vítimas Júlio e Giovanni, no interior de veículo, quando foi abordada pelos acusados, estando ambos armados com revólveres. Na posse dos bens subtraídos, os réus evadiram-se em um carro de cor branca, marca GM, modelo Corsa, com outros dois indivíduos no seu interior. Os réus foram presos cerca de duas horas depois, reconhecendo-os na delegacia e em juízo. Apenas os seus documentos foram recuperados. A vítima Julio corroborou tais declarações, acrescentando que um dos réus apontou a arma de fogo na direção de seu rosto. Reconheceu ambos os acusados e conseguiu recuperar o seu relógio e uma garrafa de tequila. O ofendido Giovani ratificou as informações oferecidas pelas outras vítimas, reconhecendo os acusados como os agentes do fato e acrescentou que outros dois indivíduos os aguardavam no veículo de cor branco, marca GM, modelo Corsa. Recuperou a aliança e a carteira. O policial Cleber, inquirido em sede judicial, narrou ter recebido a notícia do roubo via rádio, tendo os agentes se evadido em um veículo antigo, modelo Corsa, de cor branca. Após breve patrulhamento, logrou encontrar o veículo estacionado, com o capô aberto e quatro indivíduos em seu interior. Em revista, o depoente localizou uma CNH, um relógio, Apelação nº

5 uma aliança e uma garrafa de tequila. Conduzidos à delegacia, foram reconhecidos pelas vítimas, as quais identificaram os bens subtraídos. As armas de fogo não foram localizadas. No mesmo sentido, as declarações do policial Ricardo de Souza. Interrogados, os recorrentes negaram os fatos. Alegaram ter parado o veículo na frente da residência de Renato para colocar água no compartimento, quando foram abordados e injustamente acusados. Disseram que os policiais jogaram os objetos subtraídos no interior do veículo. A autoria e a materialidade restaram devidamente comprovadas pelas provas orais produzidas em sede de contraditório, notoriamente por terem sido flagrados, instantes após a prática criminosa, na posse dos bens subtraídos e foram reconhecidos pelas três vítimas. Razão assiste à pretensão acusatória quanto ao reconhecimento da causa de aumento, posto que inequívoco o emprego de armas de fogo, comprovada a partir das declarações uníssonas prestadas pelas vítimas, as quais, nas duas oportunidades em que foram ouvidas, asseguraram a existência de dois revólveres. O argumento referente à impossibilidade de aferição da potencialidade lesiva da arma de fogo cede à constatação de seu natural caráter de intimidação e de perigo próprio, prescindindo de laudo para tanto. Aliás, não se trata de circunstância que deixa vestígio material. O nosso entendimento está respaldado Apelação nº

6 pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, cuja decisão, em sede de habeas corpus, foi proferida pelo Pleno da Corte, a seguir: Ementa: Roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo Apreensão e perícia para a comprovação de seu potencial ofensivo Desnecessidade Circunstância que pode ser evidenciada por outros meios de prova Ordem denegada. (STF, HC 69099/RS. Min. Rel. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, d.j ) Em crimes dessa monta e, considerando o temor social quanto às possíveis interferências, a palavra da vítima, na prática, é o único elemento de prova, não podendo ser desprezada pelo julgador, pois, caso contrário, a impunidade prevaleceria. Por fim, os acusados em um único contexto fático mediante uma só ação, subtraíram bens de três vítimas, tendo as suas condutas se amoldado à previsão constante no artigo 70, do Código Penal, resultando, assim, na impossibilidade de reconhecimento de crime único. Destarte, os réus devem ser condenados como incursos no artigo 157, 2º, incisos I e II, por três vezes, na forma do artigo 70, ambos do Código Penal. Na primeira fase, as bases do acusado Renato foram fixadas em 4 anos de reclusão e 10 dias-multa, em atenção ao artigo 59, do Código Penal. Apelação nº

7 As penas-base do réu Élcio foram corretamente determinadas em 4 anos e 8 meses de reclusão e 11 dias-multa, porquanto, conforme extrai-se do apenso de antecedentes, há duas condenações anteriores pelos crime de furto (transito em julgado em 04/09/2006) e de roubo (transito em julgado em 03/01/2011) a justificar o gravame. Na segunda fase, verificam-se presentes duas circunstâncias legais, quais sejam as atenuantes da menoridade relativa e as agravantes da reincidência específica, conduzindo o juízo a quo a agravar as penas à fração de um sexto. Na existência de reincidência específica, a compensação integral não deve proceder, tendo em vista a necessidade de maior rigorismo quanto à conduta de um sujeito que, malgrado tenha a seu favor a atenuante da menoridade relativa, novamente reiterou em semelhante ação criminosa. Assim, as penas de Renato são mantidas em 6 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão e 14 dias-multa, e as reprimendas de Élcio em 7 anos, 3 meses e 3 dias de reclusão e 16 dias-multa. Na terceira fase, presente duas causas de aumento e, considerando a existência de, ao menos, quatro indivíduos na empreitada criminosa, em poder de duas armas de fogo, as reprimendas devem ser exasperadas à razão de dois quintos, um pouco acima do mínimo permitido, suficiente à reprovação e ao respeito à individualização da pena, resultando em 8 anos, 8 meses e 16 dias de reclusão e 19 dias-multa para Apelação nº

8 Renato, e 10 anos, 1 mês e 28 dias de reclusão e 22 dias-multa para Elcio. Reconhecido o concurso formal de infrações, mantém-se o aumento à fração de um sexto, tornandose as penas definitivas em 10 anos, 1 mês e 28 dias de reclusão e 22 dias-multa em relação ao réu Renato, e 11 anos, 10 meses e 7 dias de reclusão e 25 dias-multa quanto ao corréu Elcio. O 3º, do artigo 33, do Código Penal, permite ao julgador valorar as circunstâncias judiciais como norte para se determinar o regime. Sendo assim, o quantum de pena, aliado às circunstâncias do crime e os antecedentes dos acusados, autorizam a fixação de regime mais gravoso, o qual deve ser mantido o fechado. Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao apelo defensivo, provendo-se o recurso ministerial, para condenar Elcio Gonçalves do Nascimento às penas de 11 anos, 10 meses e 7 dias de reclusão e 25 diasmulta e Renato de Souza Galindo às penas de 10 anos, 1 mês e 28 dias de reclusão e 22 dias-multa, ambos em regime inicial fechado, como incursos no artigo 157, 2º, incisos I e II, por três vezes, na forma do artigo 70, do Código Penal. GUILHERME DE SOUZA NUCCI Relator Apelação nº