ROYO, Jesús (1997): Unha 1 lingua é un mercado. Vigo: Edicións Xerais de Galicia. 147 páginas. Álvaro Iriarte Sanromán Universidade do Minho
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1 ROYO, Jesús (1997): Unha 1 lingua é un mercado. Vigo: Edicións Xerais de Galicia. 147 páginas. Álvaro Iriarte Sanromán Universidade do Minho Há muito que me espanta a pouca política linguística que se faz para o português e, ao mesmo tempo, o discurso mitificador, mistificador, sacralizador, com que se preenche esta falta, o discurso sobre a sagrada língua portuguesa. Justamente porque também entendo que uma língua não é uma medalha comemorativa, mas uma moeda de curso legal (Royo, 1997: 139) decidi resumir aqui este pequeno livro, tradução galega do catalão Una llengua és un mercat. Para tal, não sigo as habituais normas de apresentação de recensões. Faço, antes, uma paráfrase do texto, indicando, na coluna da esquerda, a página ou páginas comentadas. 1. A substituição linguística 9-10 Começa o autor por perguntar-se o que é que faz crescer uma língua. A teoria da língua materna defende que as línguas se transmitem por via biológica, de pais para filhos. Mas as grandes línguas são grandes porque não são línguas maternas. São línguas segundas, línguas aprendidas. 41. As línguas com futuro são as que se aprendem, não as que se herdam. 10. Há argumentos de tipo imperialista que tentam explicar o crescimento das línguas, como o argumento da superioridade de um povo, de uma raça, de uma religião; ou argumentos pseudo-linguísticos, baseados em preconceitos como o da perfeição intrínseca da língua: há línguas superiores, mais perfeitas, mais coerentes, mais precisas, etc. As línguas imperfeitas cedem ao entrarem em contacto com as línguas superiores. 21. As línguas crescem num processo de substituição. Passa-se de uma situação original monolingue a um estado final monolingue por um estado bilingue provisório. 1 É pena, especialmente para o galego, que ainda hoje se tenha que alertar para o facto de o livro não tratar de unhas, pezunhos, garras ou qualquer outro órgão córneo de pessoa ou animal.
2 22. Só as políticas linguísticas (de qualquer tipo) é que podem alterar este processo. 21. A situação de diglossia é uma situação provisória. Não existe, do ponto de vista sociolinguístico, estados de bilinguismo harmónico. A retórica do bilinguismo é um mito. O único bilinguismo possível é o de duas línguas em espaços perfeitamente delimitados. Dentro desse espaço, as comunicações são monolingues. Ex.: A Bélgica é um pais trilingue. 23. É frequente, neste processo de substituição, começarmos a utilizar valores identificativos das línguas, que se colocam por cima da sua funcionalidade. Começa o discurso sacralizador, mitificador, mistificador, do amor à língua. 23. Quando se formula a necessidade de conservar a língua, quer dizer que esta já não se vê como algo natural. 2. Função identificativa e função comunicativa da língua 40. A retórica da língua como signo de identidade dos povos tem conteúdos basicamente conservadores: natureza, patriotismo, origens, raízes, terra, 41. As línguas marca de identidade não são línguas normais. As línguas realmente vigentes são línguas úteis, com potência comunicativa. Em determinada altura, o inglês, o espanhol, o português, o francês, aumentam o número de falantes, não por serem signos de identidade mas por um puro e duro processo de substituição linguística. 41. A substituição linguística não é feita de maneira gratuita, por opção, e cada vez menos, felizmente, acontece por imposição directa. A substituição é o resultado de uma valoração que o novo falante faz: aprendo/uso esta língua porque me é necessária, porque me é útil. Nem místicas, nem mistérios: A utilidade de a falar é superior ao esforço de a aprender. Quanto mais útil, mais fácil será considerada a aprendizagem (em Espanha, parece ser mais fácil para um árabe aprender castelhano do que para um castelhano aprender catalão). 42. O gaélico, na Irlanda, era uma língua signo de identidade, que após a independência já não fez falta: adoptaram o inglês como língua de comunicação, como língua útil.
3 42. A retórica da língua como signo de identidade pode ser um elemento dissuasivo para a aquisição da língua: Se és português, fala português pode querer dizer também se não o és, não faz falta que o aprendas. 3. Uma língua é um mercado 51. O mercado é o lugar de ponderação dos valores: o lugar onde a sociedade expressa e fixa as suas necessidades, onde compara estas necessidades com o custo que implica a sua satisfação, e onde se decide por uma coisa ou por outra (compro ou não compro). 51. O mercado é a actividade significativa por excelência. 62. A língua é a praça do mercado, o território onde se realizam as trocas. A língua é a ferramenta de comunicação. Dominar a língua é dominar o mercado. A língua veicula poder: A língua sempre foi companheira do império (Nebrija). Quem possui a língua, controla o mercado. 64. A patologia da linguagem descreve casos de desestruturação por falta de linguagem: uma linguagem mal estruturada comporta uma deficiente relação com as coisas. 65. A perda de uma língua seria uma catástrofe colectiva: a desestruturação de todas as pessoas de uma comunidade (a extrapolação é consciente por parte do autor, pois língua não é a mesma coisa que linguagem). 66. A mudança de língua é sempre traumática. Tem sempre custos em termos de mercado. 66. Mas o dilema é que temos que optar. Ora completamos o processo de substituição em direcção à nova língua (o inglês, por exemplo), ora fazemos com que a língua nativa (?) (o português, por exemplo) recupere o mercado. 73. O mercado está aí (o mercado das novas tecnologias, por exemplo). E devemos ocupá-lo (em inglês, em português,...), ou serão outros a ocupá-lo. 67. Os movimentos de libertação das ex-colónias sabiam isto muito bem quando decidiram adoptar o português como língua oficial. Os custos de outra solução seriam talvez superiores ao seu valor, aos seus benefícios A compensação será o acesso ao novo mercado (novas oportunidades sociais, culturais, nível de vida, etc.).
4 66. Sem discursos mitificadores ou sacralizadores, porque todas as soluções poderão ser legítimas, para bem dos catalães, dos portugueses, dos galegos, dos cabo-verdianos, Os discursos mitificadores da língua, que entendem a mesma apenas como signo de identidade e não como veículo de comunicação só servem para preparar uma bela campa à língua em questão. 4. A diversidade linguística. 25. Por que não se debate a sério a questão da diversidade linguística? Talvez porque há fortes interesses, e talvez pouco defensíveis, por parte de algumas línguas A herança linguística diversa não coincide com as necessidades de unicidade do mercado global. 25. Em princípio, a diversidade linguística é um obstáculo para a necessária homogeneização do mercado. 29. A globalização impõe a unicidade a todos os níveis: científico, económico, político, militar, linguístico, 92. A existência de várias zonas linguísticas comporta a existência de mercados parciais e em concorrência. 29. Os discursos sobre a biodiversidade ensinaram-nos que a consideração dos problemas de diversas perspectivas aumenta a probabilidade de adequação da resposta. 30. A diversidade é garantia de durabilidade e de estabilidade do sistema, pelo facto de não destruir recursos (neste caso, recursos culturais). É a diversidade de perspectivas que pode proporcionar soluções decisivas em situações de crise. 28. É saudável ecológico para a civilização manter a diversidade linguística. Cada língua tem um tipo de relação com a realidade: é arriscado confiar em que a humanidade, contando apenas com uma única língua, possa sair de todas as contradições que se lhe possam apresentar A língua é um depósito de toda uma série de opções históricas, uma atitude de percepção e de conformação do meio. Uma ferramenta para pesquisar a realidade. Ao usar várias ferramentas de pesquisa (Google, Yahoo, Altavista,...) temos mais probabilidades de encontrar mais e melhor informação. A língua é um valor que pertence à esfera do conhecimento,
5 difícil de quantificar. Como também é difícil de quantificar o teorema de Pitágoras. Quanto vale o teorema de Pitágoras? 30. O problema é: das 3 mil línguas que existem, aproximadamente, quantas poderão no futuro fazer parte dessa diversidade linguística? 30. Algumas características que poderão fazer uma língua habilitar-se a desaparecer: - línguas pouco unificadas internamente; - línguas com baixa consideração social pelos próprios falantes; - línguas sem correspondência com um poder político; - línguas sem correspondência com um poder económico; - línguas com um número insuficiente de falantes; Uma planificação linguística democrática deve contemplar estes dois aspectos: - a vigência da língua no mercado interior, e - a sua convertibilidade perfeita e total no mercado exterior. 5. Conclusão: O autor, Jesús Royo, não quis apresentar-se como defensor de qualquer tipo de substituição linguística. O autor defende, antes, a criação de verdadeiras condições que permitam às pessoas fruírem não apenas dos seus direitos civis, políticos, como também dos seus direitos económicos, sociais, culturais e linguísticos (cf. Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, de 16 de Dezembro de 1966 (artigo 27.º), e o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, da mesma data). Contesta também a inacção e uma retórica da língua como simples marca de identidade. Esses são os primeiros passos para enterrar de vez qualquer língua.
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