tf) - PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA PARAIBA GABINETE DO DES. MÁRCIO MURILO DA CUNHA RAMOS

Transcrição

1 tf) - PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA PARAIBA GABINETE DO DES. MÁRCIO MURILO DA CUNHA RAMOS AGRAVO DE INSTRUMENTO N /001 8" Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital. RELATOR: Dr. Onaldo Rocha de Queiroga, juiz convocado para substituir o Des. Márcio Murilo da Cunha Ramos. AGRAVANTE: O Município de João Pessoa, representado por seu prefeito. ADVOGADO: Neuzelito Cavalcanti Sobral AGRAVADA: Fabiana Cavalcanti dos Santos DEFENSORA: Rizalva A de Oliveira Sousa AGRAVO DE INSTRUMENTO FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA DIREITO À SAÚDE GARANTIA CONSTITUCIONAL DE TODOS INOCORRÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA INDEPENDÊNCIA DOS PODERES NÃO INCIDÊNCIA DA RESERVA DO POSSÍVEL ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE REQUISITOS QUE CARACTERIZEM A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA INSUBSISTÊNCIA HIPOSSUFICIÊNCIA E VEROSSIMILHANÇA DEMONSTRADAS POSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DO MEDICAMENTO POR GENÉRICO EQUIVALENTE APLICABILIDADE DO ART. 557, 1 - A, DO CPC PROVIMENTO PARCIAL. O fornecimento de tratamento às pessoas hipossuficientes é dever da Fazenda Pública, mesmo que não constante rol de medicamentos fornecidos pelo Município através do SUS. pois a assistência à saúde e a proteção à vida são garantias constitucionais. Não há ofensa à independência dos Poderes da República quando o Judiciário se manifesta acerca de ato ilegal, imoral e ineficiente do Executivo. A teoria da reserva do possível e as possíveis restrições orçamentárias não justificam a omissão da Administração Pública em fornecer medicamentos necessários à subsistência do indivíduo. Demonstrada a insuficiência econômica da requerente para arcar com os custos de tratamento de saúde, ela faz jus à gratuidade da droga que lhe é necessária. Havendo a possibilidade de substituição do medicamento requerido por outro genérico, impõe-se o provimento parcial do agravo, desde que possua o mesmo princípio ativo e produza o mesmo efeito da medicação requerida.

2 Vistos, etc. 4 Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo Município de João Pessoa em desfavor de Fabiana Cavalcanti dos Santos, pugnando pela reforma da decisão interlocutória que, proferida pelo Juízo de Direito da 8 Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital, deferiu a tutela de urgência para obrigar a edilidade a fornecer, de forma imediata, o medicamento THYROGEN à paciente. sob pena de multa diária no valor de R$ (mil reais). Inconformado, sustenta a edilidade, em síntese, que deve ser aplicado o princípio da legalidade a fim de observar os regulamentados da norma local para atender a devida previsão orçamentária; que é necessário um parecer médico acerca da impossibilidade de utilização dos medicamentos fornecidos pelo SUS, bem como ser possível a substituição do medicamento por outro menos oneroso; que não há respaldo legal que permita ao Judiciário obrigar o Executivo de cumprir determinada exigência, pelo que deve ser respeitado o princípio da separação dos poderes e da reserva do possível; e que inexiste elementos caracterizadores para a concessão da tutela antecipada. Por fim, requer a concessão do efeito suspensivo. O recurso veio instruído com documentos às fls. 18/56. É o relatório. Decido. A hipótese dos autos gravita em torno do fornecimento de medicamentos indispensáveis à vida da agravada, matéria amplamente debatida nos pretórios de superposição. Invoco, pois, a densa construção jurisprudencial que se ergueu em torno do tema, a franquear-me o uso do art. 557 do Código de Processo Civil. 1. DAS NORMAS QUE DISCIPLINAM O FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE: Alega o recorrente que o fornecimento de medicamentos está regulamentado pela norma local, que, por sua vez, deve atender a previsão orçamentária. Assegurando a intangibilidade do direito fundamental à vida e à saúde, o STJ tem repudiado todas as tentativas de infirmá-lo. Vale dizer, toda a argumentação jurídica perde fôlego aqui, diante da envergadura constitucional dessa prerrogativa, de modo que a falta de previsão orçamentária suplicada pela Edilidade, revela-se descabida em virtude da essencialidade do bem jurídico tutelado e afastado pela incidência da legalidade estrita, soando-me completamente despropositada. Nesse sentido, o E. Superior Tribunal de Justiça vaticinou: "FAZENDA PÚBLICA - FORNECEvIENTO DE MEDICAMENTOS - BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS - CABIMENTO - ART. 461, 5. DO CPC - PRECEDENTES. 1. A hipótese dos autos cuida da possibilidade de bloqueio de verbas públicas do Estado do Rio Grande do Sul, pelo não-cumprimento da obrigação de fornecer medicamentos à portadora de doença grave, como meio coercitivo para impor o cumprimento de medida antecipatória ou de sentença definitiva da obrigação de fazer ou de entregar coisa. (arts. 461 e 461-A do CPC). 2. A negativa de fornecimento de um medicamento de uso imprescindível, cuja ausência gera risco à vida ou grave risco à saúde, é ato que, per si, viola a Constituição Federal, pois a vida e a saúde são

3 bens jurídicos constitucionalmente tutelados em primeiro plano. 3. Por isso, a decisão que determina o fornecimento de medicamento não está sujeita ao mérito administrativo, ou seja, conveniência e oportunidade de execução de gastos públicos, mas de verdadeira observância da legalidade. (...)" (STJ/REsp /RS, Rel. Min. Humberto Martins, 2a T.. j. em DJ p De fato, o agravante busca frustrar o exercício de uma prerrogativa tão lídima quanto vital com a tão-só oposição de entraves meramente formais à consecução do fim último do direito fundamental à saúde e à vida, medida absolutamente despropositada. Assim, não há que se falar em afronta ao princípio da legalidade que determina que a norma local regulamente os limites orçamentários da administração pública quando se tratar de direito indispensável à vida e assegurado pela Constituição, como no presente caso. 2. DA SUBSTITUIÇÃO DO MEDICAMENTO E DA NECESSIDADE DE PARECER MÉDICO: Na realidade, vislumbro que o Município se recusa em fornecer o medicamento solicitado pela autora. No entanto, deseja, aquele, disponibilizar medicamento de custo menos elevado para o Erário. Entendo, pois, ser totalmente admissivel que a edilidade possa fornecer a medicação menos onerosa, mas com a mesma eficácia, àquela que necessita do medicamento, desde que esteja devidamente autorizado pelos órgãos de fiscalização competentes e que detenha o mesmo princípio ativo, produza o mesmo efeito e que não haja prejuízo à saúde da autora. Não obstante, entendo que o medicamento deve ser fornecido à necessitada no prazo informado pelo médico, qual seja, 02 dias. Ademais, na hipótese da quantidade estabelecida no receituário não ser suficiente, ou seja, no caso de a solicitante ainda estar precisando do medicamento, esta deverá, tão somente, apresentar à Edilidade fornecedora uma nova receita médica com tal posologia, desde que estritamente recomendado pelo médico. Neste caso, prescinde-se, pois, de impetração de nova ação ordinária ou mandado de segurança para garantir a percepção do medicamento prescrito. Quanto à necessidade de parecer médico informando sobre a excepcionalidade do fármaco, entendo que só não seria possível a substituição do medicamento por genérico caso a paciente comprovasse que o medicamento requerido fosse o único capaz de produzir resultado à paciente. Não sendo este o caso dos autos, é possível a sua substituição por genérico. 3. DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E DA RESERVA DO POSSÍVEL: De outra banda, também não está a amparar a pretensão recursal ao argumento de que o decisum monocrático fere a independência dos poderes, sendo ingerência ilegal do Judiciário no Poder Executivo. A Carta Magna, em seu art. 37. cobra dos Administradores

4 Públicos um comportamento legal, ético, moral e eficiente, perfilado com o interesse público e dentro dos parâmetros legais, assim dispondo referido dispositivo legal: "Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados. do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e, também, ao seguinte:" No caso vertente, a omissão da Edilidade em relação ao fornecimento do medicamento denominado THYROGEN à paciente portadora de Carcino da tireóide com metastática constitui-se em um ato ilegal, imoral e ineficiente. Nesse sentido, é o entendimento sufragado pelo colendo ST3, o que se deflui do precedente jurisprudencial adiante colacionado: "É lícito ao Poder Judiciário examinar o ato administrativo, sob o aspecto da moralidade e do desvio do poder. Como princípio inscrito no art. 37. a Constituição Federal cobra da Administração, além de uma conduta legal, um comportamento ético" (la T., REsp. n Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, "DJU" , p ). Acrescente-se que o pronunciamento do ilustre Min. MARCO AURÉLIO DE MELLO, componente do Excelso Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Mandado de Segurança n /RJ, de sua Relatoria, bem define a questão em comento, possibilitando a manifestação judicial sobre o mérito do ato administrativo, segundo o qual: "O Poder Judiciário, quando intervém para assegurar as franquias constitucionais e para garantir a integridade e a supremacia da Constituição, desempenha, de maneira plenamente legítima, as atribuições que lhe conferiu a própria Constituição. O regular exercício da função jurisdicional, por isso mesmo, desde que pactuado pelo respeito à Constituição, não transgride o princípio da separação dos poderes. O sistema constitucional brasileiro, ao consagrar o princípio da limitação de poderes. teve por objetivo instituir modelo destinado a impedir a formação de instâncias hegemônicas de poder no âmbito do Estado. em ordem a neutralizar, no plano político-jurídico, a possibilidade de dominação institucional de qualquer dos poderes da República sobre os demais órgãos da soberania nacional" ("DJU" ). grifo meu. Assim, não há que se falar em ofensa à independência dos poderes, sendo perfeitamente possível decisão judicial sobre a questão ora posta. No que se refere à afronta ao princípio da reserva do possível suplicado pela Edilidade, enfatizo, mais uma vez, que não pode, o referido princípio, ser colocado como anteparo à concretização do direito à saúde (arts. 6 e 196, da Constituição), já que este se cuida de bem jurídico fundamental, devendo o Poder Público zelar por sua integridade, concretizando assim o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1. inciso III, da Constituição), este núcleo fundamental do Estado emocrático de Direito. Tribunal de Justiça: Nesse sentido, tem-se o recentíssimo arresto do E. Superior "ADMINISTRATIVO CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS POSSIBILIDADE EM CASOS EXCEPCIONAIS DIREITO À SAÚDE FORNECLMENTO DE MEDICAMENTOS

5 MANIFESTA NECESSIDADE OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICO AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES NÃO OPONIBILEDADE DA RESERVA DO POSSÍVEL AO MÍNIMO EXISTENCIAL. (...) 2. Tratando-se de direito fundamental, incluso no conceito de mínimo existencial, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário estabeleça a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal. (...) Agravo regimental improvido." (AeRg no REsp RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/06/2010. DJe 21/06/2010) grifo nosso. 4. DOS ELEMENTOS CARACTERIZADORES DA TUTELA ANTECIPADA: Analisando os autos, verifico que restou demonstrado, através dos documentos de fls. 27/29, que a recorrida é portadora de Carcinoma papilifero metastático, necessitando do uso da medicação denominada THYROGEN. Ademais, convenço-me da hipossuficiência econômica da agravada para o custeio do tratamento, pois a mesma juntou declaração de nobreza (fl. 37), cuja presunção de veracidade não restou desconstituída. Assim, estando comprovada a verossimilhança do direito da agravada, não há que se falar em inexistência de elementos caracterizadores da concessão da tutela antecipada uma vez que a não concessão da tutela poderá causar prejuízos irreparáveis à saúde ou, até mesmo, à vida da agravada. Além disso, a ouvida da parte contrária poderá comprometer seriamente a efetividade da própria tutela urgente. Diante do exposto, DOU PROVIMENTO PARCIAL ao presente agravo, permitindo, unicamente, a substituição do medicamento THYROGEN por outro genérico, se houver, desde que este esteja devidamente autorizado pelos órgãos de fiscalização competentes, que detenha o mesmo principio ativo e produza o mesmo efeito daquele, nos termos do 1"-A, do art. 557, do CPC. P. I. João Pessoa, 15 de março de cr-e Dr. Onaldó Rocha de Queiroga Juiz convocado/relator

6 inosnuejj '01,1nar2r- S1 opunn.ton p211GpJ000