TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo

Transcrição

1 Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº , da Comarca de Osasco, em que são apelantes/apelados DEIVID MAIKON RIBEIRO PEDROSO e CARLOS DA SILVA, é apelado/apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento aos recursos defensivos e deram provimento ao recurso ministerial, nos termos que constarãom do acórdão. Expeça-se, oportunamente, mandado de prisão. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores EUVALDO CHAIB (Presidente) e LUIS SOARES DE MELLO., 13 de maio de IVANA DAVID RELATOR Assinatura Eletrônica

2 APELAÇÃO nº APTES/APDOS: DEIVID MAIKON RIBEIRO PEDROSO E CARLOS DA SILVA APELADO/APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO COMARCA: OSASCO VOTO Nº 3954 EMENTA: TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE ENTORPECENTES IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO REDUTOR DA PENA EM FACE DA QUANTIDADE DA DROGA APREENDIDA, QUE RESTA AFASTADA PARA O CORRÉU BENEFICIADO CORRÉU QUE POSSUI DIVERSAS CONDENAÇÕES POSSÍVEL A CONSIDERAÇÃO DE UMA DELAS PARA A CONFIGURAÇÃO DA REINCIDÊNCIA E DAS OUTRAS COMO MAUS ANTECEDENTES INOCORRÊNCIA DO BIS IN IDEM SUBSTITUIÇÃO DA REPRIMENDA POR PENA RESTRITIVA DE DIREITOS INSUFICIENTE PARA REPRESSÃO E PREVENÇÃO DO DELITO GRAVIDADE DO CRIME QUE IMPÕE A FIXAÇÃO DE REGIME FECHADO ENTENDIMENTO DELAÇÃO PREMIADA INEXISTÊNCIA CONFISSÃO QUE DEVE FAVORECER A ELUCIDAÇÃO DO CRIME PERDIMENTO EM FAVOR DA UNIÃO DE VEÍCULO INSTRUMENTO DO CRIME DECRETADO RECURSO DEFENSIVO NÃO PROVIDO E MINISTERIAL PROVIDO. Vistos. Pela r. sentença de fls. 319/325, prolatada pela MM. Juíza Danielle Martins Cardoso, cujo relatório ora se adota, restaram condenados como incursos no art. 33, caput, da Lei n /06 c.c art. 29 do CP, DEIVID MAIKON RIBEIRO PEDROSO às penas de 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 166 (cento e sessenta e seis) dias-multa, à razão de 1/30 do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, substituída por restritivas de direitos e CARLOS DA SILVA às penas de 05 (cinco) APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12

3 anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime semiaberto, e de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, à razão de 1/30 do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos. Público. Inconformados, apelaram os réus e o Ministério O representante ministerial almeja, em relação a Deivid, seja afastada a redução da pena aplicada ou, o menos, reduzido o patamar de redução para o mínimo, em 1/6, bem como afastar a substituição da pena por restritiva de direitos operada. No tocante a Carlos, pretende o aumento da pena base em face de o réu ostentar duas condenações anteriores, bem como a perda do veículo nos termos do art. 63 da Le n /06. Requer ainda seja fixado o regime inicial fechado para o cumprimento da pena para ambos os réus. A defesa, por sua vez, pretende a redução da pena conforme o art. 41 da Lei n /06 para Deivid e, em relação a Carlos, seja a pena aplicada no mínimo legal uma vez que o magistrado o considerou tecnicamente primário, bem como a aplicação do redutor de pena em seu patamar máximo e a substituição da reprimenda corporal por restritiva de direitos. Processados os recursos e contrarrazões ofertadas, a Douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso defensivo e provimento do apelo ministerial. Os autos vieram conclusos a esta Relatoria em 30 APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12

4 de janeiro de É o Relatório. Deivid Pedroso e Carlos da Silva foram acusados porque, segundo a denúncia, agindo em concurso e unidade de propósitos, traziam consigo e transportavam, no interior do veículo Fiat Palio, placas CTA-6822, para fins de comércio, dois tijolos de maconha, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Consoante consta da acusação, a polícia civil recebera denúncia anônima, por telefone, dando a informação de que um individuo de alcunha Carlão estaria praticando o tráfico de drogas juntamente com um indivíduo de prenome Deivid (com descrição física de ambos), próximo ao campo de futebol. O denunciante disse ainda que utilizavam um fiat Palio, descrevendo o veículo em detalhes e, dispondo de tais informações, os policiais foram ao local indicado, realizaram as diligências, avistaram o veículo que foi seguido pelos policiais. Na abordagem, Carlos tentou fugir mas foi deito e Deivid foi detido junto ao veículo. No interior do veículo foram encontradas as drogas apreendidas. Restaram perfeitamente demonstradas a materialidade e autoria e as condenações foram bem decretadas e estão fundamentadas em prova firme e suficiente, contra as quais a defesa sequer se insurge. APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12

5 Passa-se então à análise dos recursos. No tocante ao réu Deivid e o afastamento da redução da pena e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos aplicadas, sorte socorre ao Ministério Público. Com efeito, art. 33, 4º, da Lei n /06, em apreço, faculta ao Magistrado sua concessão, que está livre ainda para estabelecê-lo no patamar que entender adequado, diante da análise do caso concreto, respeitando-se o princípio da individualização da pena. A lei busca punir com maior rigor quem se dedica ao tráfico e com menos rigor quem se envolve com o comércio de drogas de maneira eventual. In casu, embora o apelante seja tecnicamente primário e não possua maus antecedentes, a redução operada apresentase totalmente incompatível com a quantidade da substância entorpecente apreendida, dois tijolos de maconha (1.850,0 gr peso bruto, fls. 17/18), que demonstra o seu alto grau de envolvimento com a criminalidade, o que afasta os requisitos subjetivos necessários para o reconhecimento e aplicação da benesse e por isso deve ser afastada. Também merece acolhida o pedido relacionado ao afastamento da substituição da pena da pena corporal por restritivas de direitos. Muito embora o Plenário do STF tenha reconhecido APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12

6 incidentalmente a inconstitucionalidade da expressão vedada a conversão em penas restritivas de direitos, contida no 4º, do art. 33, da Lei n /06 (HC n /RS, Rel. Min. Ayres Britto, j ) e o Senado Federal tenha suspendido, no dia , a executividade da referida expressão (Resolução nº 5/2012), o apelante, de fato, não preenche os requisitos subjetivos que permitiriam tal conversão. A substituição da reprimenda corporal por restritiva de direitos é medida excepcional, de natureza alternativa, empregada nos delitos de menor gravidade e atendidas as exigências contidas nos incisos do art. 44 do CP. Ainda que o crime tenha sido cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa e não seja o réu reincidente em crime doloso, em se tratando do crime de tráfico, entende-se que, considerados a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias, a mencionada conversão apresenta-se inadequada e insuficiente ao fim da sanção penal. Trata-se de crime de natureza grave, de reprovabilidade acentuada e cujas circunstâncias (lucro fácil em detrimento da saúde de outrem) e consequências (desestabilização familiar e social), impedem a substituição, sob o risco de a retribuição estatal ao ilícito tornar-se inócua. No mesmo sentido é o entendimento desta Veneranda 4ª Câmara de Direito Criminal: APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12

7 TRÁFICO DE ENTORPECENTES RECURSO MINISTERIAL OBJETIVANDO A IMPOSIÇÃO DE REGIME PRISIONAL MAIS GRAVOSO E AFASTAMENTO DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL NOS TERMOS DO ART. 44 DO CP POSSIBILIDADE. Diante da extrema gravidade do delito, equiparado a hediondo pela lei, de rigor a fixação do regime fechado, independente do montante da privativa de liberdade estabelecida. Inviável, também, a substituição da pena carcerária por restritiva de direitos, pelo fato de tal medida gerar incentivo à reiteração da nefasta prática do tráfico, causando à sociedade a sensação de impunidade e banalização de um crime tão execrável. RECURSO PROVIDO. (Apelação Criminal nº , Rel. Willian Campos, j. 25/06/2013) Referente ao réu Carlos da Silva, merece acolhida a irresignação ministerial e a pena base deve ser reformada. É perfeitamente admissível que seja estabelecida a pena-base acima do mínimo, decorrente da análise conjunta das circunstâncias previstas no art. 59 do CP. Aqui, a pena base deve ser majorada em 1/6 pelos antecedentes, mantida, na segunda fase, a agravante da reincidência reconhecida. Ressalte-se que exasperação da pena dá-se pelo fato de ter restado evidenciado, pelas certidões constantes dos autos, a existência de mais de uma condenação em relação a Carlos da Silva (fls. 16 e seguintes apenso de antecedentes) sendo perfeitamente possível a consideração de uma delas para a configuração da reincidência e das outras como maus antecedentes. APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12

8 Nesse sentido o recente entendimento do C. STJ: havendo mais de uma condenação transitada em julgado em desfavor do condenado não há óbice para que uma seja considerada como maus antecedentes, enquanto a outra seja valorada como agravante da reincidência. O que não se admite, sob pena de 'bis in idem', é a valoração de um mesmo fato em momentos diversos da aplicação da pena, o que não se evidencia na hipótese. Precedentes desta Corte (HC /SP, Rel. Min. MARILZA MAYNARD, DJ de 01/02/2013). Assim, não há falar-se na ocorrência do bis in idem, impondo-se o aumento da pena base à razão de 1/6, resultando na reprimenda de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses, e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa que, aumentada em 1/6 pela reincidência reconhecida em primeiro grau, torna-se definitiva em 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias, e 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa. In fine, em respeito aos ditames do art. 63, da Lei /06, o qual prevê o perdimento em favor da União do produto, bem ou valor apreendido em razão do tráfico de drogas, decreta-se o perdimento em favor da União do veículo Fiat/Palio, placas CTA-6822, no qual a droga apreendida estava sendo transportada, oficiando-se à Delegacia de Polícia, ao SENAD e ao DETRAN, para as providencias necessárias. Isto porque restou manifestamente comprovado que tal veículo era o instrumento utilizado pelos acusados no exercício da traficância. APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12

9 acolhe-se a súplica ministerial. No tocante ao regime prisional, da mesma forma, O regime inicial para cumprimento da reprimenda privativa de liberdade, para ambos os réus, deve ser o fechado. Não se desconhece a decisão do Tribunal Pleno do E. STF (HC /ES, Rel. Min. Dias Toffoli, j ) que declarou a inconstitucionalidade do art. 2º, 1º, da Lei de Crimes Hediondos, o qual prevê o cumprimento da pena em regime inicialmente fechado aos condenados por crimes hediondos e equiparados. incidentalmente, sem efeito erga omnes. Importa consignar que tal decisão deu-se Ademais, entende esta c. Câmara pela aplicabilidade da referida norma, o que obriga à fixação do regime inicial mais severo, como se retira do teor de recente acórdão da lavra do Eminente Des. Edison Brandão: Por fim, mantenho o regime inicial fechado para início do desconto da corporal, sendo o único compatível com o delito, dada a determinação legal em se tratando de crime hediondo (art. 2º, 1º, da Lei nº 8.072/90). Cumpre observar que o ilícito do qual ora se trata, equiparado a hediondo, tem como principal engrenagem motora a dependência química e psíquica, principalmente por parte de jovens de diferentes classes sociais, o que acaba por resultar no aumento da APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12

10 criminalidade pelo cometimento de crimes mais graves em prol do sustento de tal vício. Daí o reconhecimento da alta periculosidade da conduta, de forma que o cumprimento de pena privativa de liberdade em regime fechado permitirá aos réus uma maior recuperação, bem como a importante reflexão quanto ao impacto social e a gravidade de sua conduta. (TJSP AP , Rel. Edison Brandão, j. 02/07/2013) Por esta razão, mesmo que a quantidade da pena imposta permita que seja estabelecido regime inicial mais benéfico, sempre dependerá, em última análise, do exame da culpabilidade da agente, de seus antecedentes, de sua conduta social, de sua personalidade, bem como dos motivos, das circunstâncias e das consequências do crime, além do comportamento da vítima. Dessa, forma, diante da análise do caso concreto, consoante os termos dos arts. 59 e 33 do CP, levando-se em consideração a conduta e as gravíssimas consequências causadas à sociedade pelo crime de tráfico de entorpecentes, impõe-se a adoção do regime mais gravoso. Assim, a modalidade menos severa para o cumprimento da pena mostra-se insuficiente e inadequada à repressão do delito, mantendo-se o regime inicial fechado para o cumprimento da reprimenda. Quanto ao apelo de Deivid, pretendendo ver APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12

11 reconhecida a minorante prevista no art. 41 da Lei n /06, este não procede. Não há que se falar em delação premiada porquanto o êxito da investigação policial deu-se em virtude de denuncia anônima, informando todos os detalhes necessários para a localização e detenção e apreensão dos réus e da droga. Assim qualquer declaração prestada por Deivid quedou sem relevância. Além disso, não é verdadeira a afirmação de que Deivid teria confessado o crime, pois permaneceu silente perante a autoridade policial (fls. 11/12) e em juízo alegou que o entorpecente apreendido destinava-se ao seu consumo pessoal (fls. 306). Com relação a Carlos, o pretendido afastamento da reincidência reconhecida pelo juízo a quo resta prejudicado em decorrência do exposto quando da análise do recurso ministerial. A aplicação do redutor do art. 33, 4º, da Lei n /06 apresenta-se impossível em face dos mesmos fundamentos que motivaram o afastamento da redução por esta Relatoria em relação ao apelante Deivid, acima mencionada. Também sem cabimento a súplica defensiva de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Além de entendimento adotado no sentido de ser a medida insuficiente quando se trata da prevenção, repressão ou reeducação do condenado APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12

12 no crime de tráfico ilícito de entorpecentes, cujas circunstâncias e consequências são de natureza extremamente grave, no caso em apreço, referido benefício é incompatível com o quantum de pena aplicado e a reincidência, nos termos do art. 44 do CP. Ante o exposto, nega-se provimento aos recursos defensivos e dá-se provimento ao recurso ministerial para afastar a aplicação da redução prevista no art. 33, 4º, da Lei n /06 em relação a Deivid e para fixar a pena base acima do mínimo legal à razão de 1/6 no tocante a Carlos da Silva, tornando a pena do réu DEIVID MAIKON RIBEIRO PEDROSO definitiva em 05 (cinco) anos de reclusão e ao pagamento de 500 (quinhentos) dias multa, à razão de 1/30 do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, e do réu CARLOS DA SILVA definitiva em 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e ao pagamento de 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa, à razão de 1/30 do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, a serem cumpridas em regime inicial fechado, afastada a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito para Deivid. Expeça-se, oportunamente, mandado de prisão. Ivana David Relatora APELAÇÃO Nº OSASCO VOTO Nº /12