Década de 20 - o Samba e o Choro
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- Agustina Nobre Castilhos
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1 Década de 20 - o Samba e o Choro A música brasileira sempre foi de uma riqueza imensa em diversidade, formas e conteúdos. De norte a sul, podemos perceber que estilos musicais variados surgem a cada momento e vão se complementando de uma forma global, quase que democrática. Desde o século XIX, essa diversificação ficou mais acentuada, misturando tanto as características musicais herdadas dos índios e dos negros quanto as dos europeus. A diversificação dos gêneros musicais presentes no Brasil possui, ao mesmo tempo, aspectos positivos, como uma variedade significativa de danças, expressões artísticas, musicais, cenográficas, dentre outras. Essa diversidade pode ocasionar alguns problemas como a banalização da cultura em nosso país, perda de identidade, maior facilidade de entrada de culturas estrangeiras em nosso território, muitas vezes, prevalescendo a estrangeira e desaparecendo a nossa cultura legítima. Porém alguns gêneros musicais se transformaram em representações legítimas de nossa cultura, como é o caso do Samba, do Choro, do Maxixe e de vários outros. O Samba Muitos pensam que o Samba é um gênero musical criado no Rio de Janeiro. Acontece que esse ritmo que contagia milhões de brasileiros e também estrangeiros tem sua origem no nordeste brasileiro e forte influência africana na sua formação. Tudo começou em Angola, onde existe um ritmo conhecido como Semba. Provavelmente foi dele que surgiu, com adaptações, o Samba no Brasil. Os escravos, que em seus momentos de descanso praticavam nos terreiros das senzalas seus rituais, crenças e danças, foram aos poucos misturando diversos elementos vindos da África bem como os adquiridos por aqui. Em roda, eles transmitiam sua cultura em forma de batuques e danças. É incrível percebermos como a influência africana está em quase todas as manifestações culturais brasileiras. Esse ritmo dançante foi nomeado Samba de Roda e é considerado expressão pura desse gênero no Brasil. Surge a partir de elementos afro-brasileiros. É um misto de dança, música e batuque, transmitido de geração a geração por ensinamentos orais. Na Bahia, ainda hoje, podemos encontrar grupos que praticam o Samba de Roda. 38
2 Somente após a migração dos escravos para a nova capital, o Rio de Janeiro, em 1763, é que o Samba começou a se transformar, gradativamente, no que é hoje. A alquimia de se misturarem os costumes dos negros baianos com os novos ares da nova capital, seus hábitos, instrumentos e novas danças, foi a centelha criadora da nova forma de se dançar e cantar o Samba. Esses foram os principais motivos de o Samba Carioca ser tão diferente do Samba de Roda baiano e, ao mesmo tempo, podemos perceber raízes tão comuns nesses dois sambas. Após a libertação dos escravos, muitos deles se deslocaram até o centro do Rio, no bairro da Lapa. Surge, a partir desse momento, o Samba que a maioria de nossa população e grande parte dos estrangeiros conhece o Samba Carioca. Na Lapa, os escravos libertos formaram as casas de samba, mais conhecidas como casas das tias, onde havia festas em que se tocavam sambas. Uma das casas mais conhecidas era a da tia Ciata. Você sabia? Samba de Roda baiano Acompanhado por atabaques, ganzá, reco-reco, viola e violão, o solista entoa cantigas, seguido em coro pelo grupo a dançar. Ligado ao culto de orixás e caboclos, à capoeira e às comidas à base de dendê, o Samba de Roda teve início por volta de É uma forma de preservação da cultura dos negros africanos escravizados no Brasil. A influência portuguesa, além da língua falada e cantada, fica por conta da introdução da viola e do pandeiro. Tradição milenar no Recôncavo Baiano, essa manifestação concorre, inclusive, ao título de Obra Prima do Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade. Presente no trabalho de renomados compositores baianos Dorival Caymmi, João Gilberto, Caetano Veloso -, esse misto de música, dança, poesia e festa se revela de duas formas características: o samba chula e o samba corrido. A chula, uma forma de poesia, é declamada pelo solista, enquanto o grupo escuta atento, só se rendendo aos encantos da dança após o término do pronunciamento, quando um participante por vez adentra o meio da roda ao som da batucada regida por palmas. Já no corrido, o samba toma conta da roda ao mesmo tempo em que dois solistas e o coral se alternam no canto. Também conhecida como Umbigada porque cada participante, ao sair da roda, convida um novo para a dança, dando-lhe uma umbigada -, a manifestação típica do Recôncavo tem destaque nas cidades de Cipó, Candeias e Cachoeira durante os festejos juninos e da Boa Morte. Em São Félix, Muritiba, Conceição do Almeida e Santo Amaro, o samba de roda é destaque na festa de Nossa Senhora da Purificação. São Francisco do Conde, Feira de Santana, Itacaré e, novamente, Conceição do Almeida celebram o samba de raiz na festa de Dois de Julho. (Fonte: Períodos musicais brasileiros 39
3 O Choro O Choro é um gênero musical brasileiro com fortes influências europeias. Ele surgiu no fim do século XIX. Um dos principais instrumentistas e idealizadores desse gênero foi Joaquim Callado, flautista que tocava na Quinta da Boa Vista, residência de Dom Pedro II, no Rio de Janeiro, onde aconteciam festas com muita música. Os músicos brasileiros, ao tocarem a música vinda da Europa, executavam a obra de maneira mais sentimental, mais chorada. Deriva-se daí a origem do termo. Esse é o conceito utilizado por José Ramos Tinhorão quando escreve em seu livro Pequena História da Música Popular: O termo choro deriva da sensação de melancolia como eram tocadas as músicas européias. A safra de grandes músicos brasileiros ligados ao choro é incontável. Alguns compositores se destacaram. Podemos considerar Pixinguinha como a figura mais expressiva no cenário musical do início do século XX. A composição de Pixinguinha que se destaca é a famosa obra Carinhoso, escrita em 1917, em duas partes, o que, para a época, era algo Joaquim Callado estranho aos compositores. Pixinguinha a escreveu, inicialmente, apenas instrumental para, muito tempo depois, em1936, ganhar de Braguinha sua letra inesquecível. Carinhoso Pixinguinha Meu coração, não sei por quê Bate feliz quando te vê E os meus olhos ficam sorrindo E pelas ruas vão te seguindo Mas mesmo assim foges de mim Ah, se tu soubesses Como sou tão carinhoso E o muito, muito que te quero E como é sincero o meu amor Eu sei que tu não fugirias mais de mim Vem, vem, vem, vem Vem sentir o calor dos lábios meus À procura dos teus Vem matar essa paixão Que me devora o coração E só assim então serei feliz Bem feliz 40
4 Décadas de 30 e 40 ritmos e estilos A Era do Rádio A partir da década de 30, populariza-se no Brasil um novo modo de se escutar as músicas e as notícias: o rádio. Getúlio Vargas utilizou-se do rádio como uma ferramenta de divulgação em massa das notícias produzidas pelo seu governo, transformando-o, assim, em seu principal veículo de comunicação, lhe dando o acolhimento popular. Podemos considerar esse momento como sendo o início da Era de ouro do rádio, principalmente, no que se refere à divulgação musical brasileira e ao entretenimento de modo geral. Algumas rádios, como a Rádio Nacional, a Record e a Tupi foram as responsáveis pelo lançamento de muitos cantores e cantoras como, por exemplo, Orlando Silva o cantor das multidões, Carlos Galhardo o cantor que dispensa adjetivos, Ary Barroso, Dalva de Oliveira, Aracy de Almeida, dentre outros. Necessário se faz lembrar que, durante o período da Era de ouro do rádio, e mesmo um tempo depois, no próprio rádio, as pessoas cantavam de maneira operística e a programação da rádio era divulgada. A instrumentação que existia nos auditórios era muito bem elaborada e composta de verdadeiras orquestras, muitas vezes, inspiradas nas Big Bands americanas. Até agora, concentramos-nos, basicamente, em ritmos que tiveram o seu auge na região sudeste. Aqueles que tiveram forte influência europeia para se desenvolver, ou a mistura de vários ritmos (como é o caso do Samba Carioca). Aracy de Almeida Ary Barroso Orlando Silva Períodos musicais brasileiros 41
5 Na região Nordeste, extremamente rica em ritmos, desenvolveu-se um que até hoje é muito apreciado por muitos brasileiros: o Baião. O Baião Esse é um dos ritmos mais conhecidos do nordeste brasileiro. Foi eternizado na voz e na sanfona do Rei do Baião, Luiz Gonzaga, que com seu jeito tímido de ser e grande carisma, cantou para os brasileiros as dores e os amores do povo nordestino. O termo surgiu, segundo José Ramos Tinhorão, grande estudioso da música brasileira, provavelmente de uma forma especial de os violeiros, que por lá chegaram com o nome de baiano, da zona rural do Nordeste, tocarem lundus. De baiano a baião, foi um pulo de vários acordes e notas. Estátua de Luiz Gonzaga Wikimedia: Foto Patrick (GFDL) Foi pela voz de Luiz Gonzaga que o Sul, como era conhecido o lugar para onde os nordestinos emigravam, ficou conhecendo os problemas do povo sofrido do nordeste. Cantou a asa branca, o assum preto, o mandacaru, entre outros temas. Podemos também sentir a dor desse povo, ouvindo a música A Triste Partida, que tem a letra de Patativa do Assaré, grande poeta nordestino. Zabumba, sanfona e triângulo, instrumentos típicos do Baião 42
6 A triste partida Patativa do Assará e Luiz Gonzaga Setembro passou Outubro e novembro Já estamos em dezembro Meu Deus, que é de nós, Assim fala o pobre Do seco Nordeste Com medo da peste Da fome feroz A treze do mês Ele fez experiência Perdeu sua crença Nas pedras de sal, Mas noutra esperança Com gosto se agarra Pensando na barra Do alegre Natal Rompeu-se o Natal Porém barra não veio O sol bem vermelho Nasceu muito além Na copa da mata Buzina a cigarra Ninguém vê a barra Pois barra não tem Sem chuva na terra Descamba janeiro, Depois fevereiro E o mesmo verão Então o nortista Pensando consigo Diz: isso é castigo não chove mais não Apela pra março Que é o mês preferido Do santo querido Senhor São José Mas nada de chuva Tá tudo sem jeito Lhe foge do peito O resto da fé Agora pensando Ele segue outra trilha Chamando a família Começa a dizer Eu vendo meu burro Meu jegue e o cavalo Nós vamos a São Paulo Viver ou morrer Nós vamos a São Paulo Que a coisa está feia Por terras alheias Nós vamos vagar Se o nosso destino Não for tão mesquinho Pro mesmo cantinho Nós torna a voltar E vende seu burro Jumento e o cavalo Até mesmo o galo Venderam também Pois logo aparece Feliz fazendeiro Por pouco dinheiro Lhe compra o que tem Em um caminhão Ele joga a família Chegou o triste dia Já vai viajar A seca terrível Que tudo devora Ai,lhe bota pra fora Da terra natal O carro já corre No topo da serra Olhando pra terra Seu berço, seu lar Aquele nortista Partido de pena De longe acena Adeus meu lugar No dia seguinte Já tudo enfadado E o carro embalado Veloz a correr Tão triste, coitado Falando saudoso Com seu filho choroso Exclama a dizer De pena e saudade Papai sei que morro Meu pobre cachorro Quem dá de comer? Já outro pergunta Mãezinha, e meu gato? Com fome, sem trato Mimi vai morrer E a linda pequena Tremendo de medo Mamãe, meus brinquedo Meu pé de flor? Meu pé de roseira Coitado, ele seca Períodos musicais brasileiros 43
7 E minha boneca Também lá ficou E assim vão deixando Com choro e gemido Do berço querido Céu lindo e azul O pai, pesaroso Nos filhos pensando E o carro rodando Na estrada do Sul Chegaram em São Paulo Sem cobre quebrado E o pobre acanhado Procura um patrão Só ver cara estranha De estranha gente Tudo é diferente Do caro torrão Trabalha dois ano, Três ano e mais ano E sempre nos planos De um dia voltar Mas nunca ele pode Só vive devendo E assim vai sofrendo É sofrer sem parar Se alguma notícia Das banda do norte Tem ele por sorte O gosto de ouvir Lhe bate no peito Saudade de mói E as água nos olhos Começa a cair Do mundo afastado Ali vive preso Sofrendo desprezo Devendo ao patrão O tempo rolando Vai dia e vem dia E aquela família Não volta mais não Distante da terra Tão seca mas boa Exposto à garoa A lama e o baú Faz pena o nortista Tão forte, tão bravo Viver como escravo No Norte e no Sul Setembro passou Outubro e novembro Já estamos em dezembro Meu Deus, que é de nós, Assim fala o pobre Do seco Nordeste Com medo da peste Da fome feroz A treze do mês Ele fez experiência Perdeu sua crença Nas pedras de sal, Mas noutra esperança Com gosto se agarra Pensando na barra Do alegre Natal Rompeu-se o Natal Porém barra não veio O sol bem vermelho Nasceu muito além Na copa da mata Buzina a cigarra Ninguém vê a barra Pois barra não tem Sem chuva na terra Descamba janeiro, Depois fevereiro E o mesmo verão Então o nortista Pensando consigo Diz: isso é castigo não chove mais não Apela pra março Que é o mês preferido Do santo querido Senhor São José Mas nada de chuva Tá tudo sem jeito Lhe foge do peito O resto da fé Agora pensando Ele segue outra trilha Chamando a família Começa a dizer 44
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