CASA UBATUBA II O MIRANTE PRAIANO 1. Implantação. Local: Ubatuba - SP Ano: Escritório SPBR Autoras: Paula Hallal e Ana Elísia da Costa

Transcrição

1 CASA UBATUBA II Local: Ubatuba - SP Ano: Escritório SPBR Autoras: Paula Hallal e Ana Elísia da Costa O MIRANTE PRAIANO 1 Construída como uma casa de fim de semana, a Casa Ubatuba II ( ) localiza-se na cidade de mesmo nome, no litoral paulista. O projeto foi feito desenvolvido pelo escritório SPBR, fundado em 2003 e dirigido pelo arquiteto Angelo Bucci que divide-se entre a atuação profissional e a vida acadêmica. Apesar do escritório informar no seu site que a casa teria sido concluída em 2014, não foi encontrado material sobre a obra finalizada, o que limitou parcialmente a sua análise. Implantação A residência se localiza em um terreno de 887,50m², com acentuada declividade no sentido frente-fundos e duplo acesso - à rua (frente) e à praia (fundos). Explorando a longitudinalidade deste terreno e com 350,4m², a casa não se prende aos seus limites laterais. Em corte, ela segue a mesma lógica, acompanhando o desnível do terreno sem tocá-lo. De acordo com o escritório, a casa está espalhada ao longo do caminho entre a rua e a praia. (Figura 1) Figura 1: Casa Ubatuba II ( ): a) implantação; b) corte. SPBR Fonte: na base: da autora) O acesso à residência levou ao extremo a tentativa de torná-lo imperceptível desde a rua, sem nenhuma alteração marcante no entorno. Neste sentido, o escritório optou por criar um platô no nível da rua, tratado como um prolongamento da calçada, estando toda a casa implantada abaixo dele. (Figura 2) 1 Trabalho desenvolvido para a disciplina "Casa Moderna e Contemporânea", ministrada pelas professoras Ana Elísia da Costa e Celia Gonsales, junto ao Programa de Pós-Gaduação em Arquitetura e Urbanismo (PROGRAU), da Universidade Federal de Pelotas, em abril de 2016.

2 Figura 2: Casa Ubatuba II ( ): maquete, evidenciando o acesso à casa. Fonte: Por estar a fachada oeste protegida visualmente pelo talude e pelas fachadas laterais estarem fechadas por empenas laterais, a casa volta-se toda para os fundos, onde ocorre o acesso à praia e as melhores visuais. Desenha-se assim um mirante praiano. Aspectos formais A forma da casa é obtida por três prismas independentes entre si e desconectados dos limites do terreno e do solo, sendo estes tratados aqui como Prisma 1, 2 e 3. O Prisma 1 abriga a casa do caseiro; o Prisma 2, com 10x10m e 6m de altura, concentra todas as funções principais da casa; e o Prisma 3 destina-se à piscina. A conexão externa entre eles é feita por uma sutil rede de circulação uma plataforma esbelta entre os Prismas 1 e 2; e uma rede de escadas externas que não possui expressão formal e não compromete a ideia de independência entre as partes do conjunto. Abaixo dos pilotis do Prisma 2, está a casa de máquinas, a única parte da casa que tem contato com o solo e que fica semi-enterrada, para ser minimamente perceptível e não perder a intenção de soltura dos blocos em relação ao terreno. (Figura 3) Figura 3: Casa Ubatuba II ( ) arranjo volumétrico: a) implantação; b) corte. SPBR. Fonte: na base: da autora) No tratamento das fachadas do Prisma 2, a leveza dos planos envidraçados das fachadas transversais contrastam visualmente com o peso das fachadas longitudinais que, apesar dos pequenos recortes, sugerem configurar empenas cegas. Esse arranjo ainda sugere uma expressão ambígua entre volumétrica e planar, como evidencia a extensão horizontal e vertical das empenas cegas além dos limites do possível volume original. (Figura 4)

3 Figura 4: Casa Ubatuba II ( ) maquete que evidencia o tratamento das faces no prisma principal. SPBR Fonte: Independentes, cada prisma possui um sistema estrutural próprio, sistemas estes que não puderam ser analisados profundamente por falta de dados. O Prisma 1 apoia-se num porticado centralizado na extensão longitudinal do volume dois pilares conectados pelas vigas das lajes de piso e cobertura -, configurando generosos balanços longitudinais ao volume. Aparentemente, este sistema é similar ao adotado no Prisma 3. Quatro colunas internalizadas no Prisma 2 configuram os apoios de sua laje inferior. Por outro lado, duas vigas transversais e invertidas, apoiadas nas empenas laterais que funcionam como grandes vigas, sustentam sua laje de cobertura, sendo estas vigas também responsáveis pelo atirantantamento da laje do piso intermediário, solução essa comum entre as obras do SPBR. (Figura 5) Figura 5: Casa Ubatuba II ( ) corte longitudinal, evidenciando os elementos estruturais. SPBR Fonte: Aspectos funcionais A casa possui duas formas de circulação que a conectam à rua, na parte superior do lote, à praia, na parte inferior. Na primeira opção (em roxo), de caráter mais social, é transposto o abrigo de carros e o terraço para, alcançar uma escada lateral que leva ao primeiro piso inferior, onde se encontra uma espécie de hall e o setor íntimo. Do hall, se tem acesso à escada interna até o segundo piso inferior, onde se encontram a área de estar e serviço e se pode seguir pelo caminho externo lateral até a área de

4 lazer no terceiro piso inferior. Na segunda opção (em laranja), é possível caminhar direto por um passeio que acompanha o terreno pela lateral da casa. Esse percurso também dá acesso independente aos diferentes níveis. (Figura 6) Figura 6: Casa Ubatuba II ( ) plantas baixas; esquema das circulações. SPBR Fonte: HALLAL, Paula (2016). As circulações então acabam configurando um "envoltório" na parte superior e na fachada sul do volume (amarelo), dando suporte aos ambientes que, por sua vez, são setorizados em níveis. No pavimento superior, em vermelho, se localizam as três suítes voltadas para a visual leste. Neste pavimento, banheiros e armários configuram uma faixa entre a circulação e os dormitórios, de forma a liberar totalmente a orientação com a melhor visual para os quartos. No pavimento intermediário, observa-se o setor de serviços (verde), voltado para a face oeste do volume, e o setor social (azul), voltado para leste e para as melhores visuais. No pavimento inferior, existe apenas uma área social, com espaço gourmet e piscina, totalmente aberta ao entorno. (Figura 7)

5 Figura 7: Casa Ubatuba II ( ) zoneamento esquemático. SPBR Fonte: HALLAL, Paula (2016) Espacialidade Ao acessar a residência, a falta de qualquer construção no nível da rua gera amplitude visual e, consequentemente, forças multidirecionais, uma vez que o caminho é apenas sugerido por marcação no piso Ao seguir o caminho pela cobertura, essa sensação é acentuada, supondo que os lotes lindeiros possuam construções no nível da rua e que ao fundo a vista para o mar não seja bloqueada. (Figura 8) Figura 8: Espacialidade no terraço da Casa Ubatuba II ( ). SPBR Fonte: na base: da autora) Transposto o terraço e a escada lateral, o ingresso no hall no pavimento inferior proporciona uma compressão espacial que é abrandada pela grande esquadria que ladeia a escada, visualizando-se a construção secundária do caseiro e o talude, um jardim interno e semivertical. Além disso, a diversificação das opções de caminho faz com que o trajeto passe a se tornar multidirecional. (Figura 9) Figura 9: Espacialidade da circulação íntima da Casa Ubatuba II ( ). SPBR

6 Ao entrar nas suítes, os halls de acesso aos banheiros geram uma área de compressão espacial, que novamente dilatada ao se ingressar nos dormitórios. A grande esquadria no fundo do dormitório se estabelece como ponto focal e, ao mesmo, gera uma tensão unidirecional horizontal. (Figura 10) Figura 10: Espacialidade dos quartos da Casa Ubatuba II ( ): a) hall de entrada; b) quarto. SPBR Ao descer a escada interna, o usuário acessa a área de serviço e lazer localizada no pavimento intermediário. A cozinha é separada da área de estar apenas por um balcão baixo, dilatando o espaço. Este ambiente também possui uma grande esquadria ao fundo que direciona as visuais, porém a amplitude do espaço faz com que diminua a tensão em uma única direção (figura 11) Figura 11: Espacialidade do estar da Casa Ubatuba II ( ). SPBR

7 No pavimento inferior, o espaço do pilotis promove uma dilatação horizontal do espaço, estabelecendo múltiplos pontos focais. A amplitude visual alcançada é suavemente fechada pelo talude a oeste. (Figura 12) Figura 12: Espacialidade do pavimento inferior da Casa Ubatuba II ( ) Considerações Finais A Casa Ubatuba II deve ser entendida na sua impostação como uma casa praiana, uma casa mirante que privilegia a construção de uma promenade em constante contato visual com o mar, em detrimento de arranjos que esboçam uma eficiente rede circulatória. Trata-se de uma resposta adequada aos condicionantes topográficos e às visuais e que, ao mesmo tempo, mescla estratégias recorrentes na produção do escritório SPBR, como: a) mimetização da casa na paisagem, também observada na Ubatuba (2006) e Casa de Fim de semana em São Paulo (2011); b) estrutura trabalhada como parte inerente da expressão formal do edifício, com a vigas invertidas nas coberturas que atirantam as lajes de pisos de pavimentos inferiores, também ilustrado pelas casas Ribeirão Preto (2000), Carapicuíba (2003), Ubatuba (2006); c) tratamento formal ambíguo, entre o volumétrico e o planar, observável também nas casas Santa Tereza (2004) e East Hampton (2007).