Palavras-Chave: Movimento de Natal; Regime Militar; Movimento Social.
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1 A IGREJA SUBVERSIVA: A DITADURA MILITAR E O MOVIMENTO DE NATAL NA DÉCADA DE Autor (a): Artur Farkatt Tabosa de Melo (UFRN) arturfarkatt@gmail.com Co-autor (a): Jessica Freire Dalcin (UFRN) jessi.ica@hotmail.com O presente trabalho tem em vista analisar o que levou a marcação da Igreja como um espaço de subversão pelos defensores da ordem e a paralisação do Movimento de Natal, na década de 1960, especificamente no período posterior à deflagração do golpe militar de Ao consultarmos a bibliografia existente acerca do Movimento, deparamo-nos com o seguinte problema: porque este sofreu uma paralisação, mesmo tendo obtido êxitos consideráveis no campo social e moral. A deflagração no Brasil do regime militar desdobrou na perseguição e repressão ao que ameaçasse a situação política do momento. Assim, fomos levados a inferir e buscar constatar se essas ocorrências tinham relação. Palavras-Chave: Movimento de Natal; Regime Militar; Movimento Social.
2 No início da década de 1940, época da 2ª Guerra Mundial, Natal era habitada por 60 mil pessoas. No final de 1941, 20 mil soldados americanos desembarcaram no Rio Grande do Norte. Isso significava um aumento significativo da população, e que trouxe suas consequências no campo social, econômico e cultural. O termo desorganização social explica o que viria acontecer: a instalação das bases militares, a chegada de técnicos e tropas americanas propiciaria o desequilíbrio da organização social da área, ocasionando elevação do custo de vida, proliferação das casas de tolerância, crise habitacional, mudança de comportamento com a introdução de novos costumes que abalam a estrutura tradicional. A grande procura de mão de obra para a construção e instalação do campo de Parnamirim e da Base Naval termina por ocasionar uma imigração rural em larga escala (CAMARGO, 1968). Diante dessa situação, os sacerdotes Eugênio Sales e Nivaldo Monte pensam um jeito de reorganizar a sociedade em Natal. O conjunto de ações sociais realizadas pela Igreja na época recebeu o nome de Movimento de Natal. O alcance e a extensão dessas ações foram se ampliando, na medida em que as atividades práticas se mostraram bem sucedidas e se institucionalizaram. O Movimento de Natal envolve as atuações do Serviço de Assistência Rural (SAR), Movimento de Educação de Base (MEB), Serviço de Assistência Urbana (SAUR), Serviço de Assistência ao Menor (SAM), entre outros. No Brasil, o período incluído entre o final da década de 1950 e o início da década de 1960 foi marcado por um aumento significativo da mobilização de setores anteriormente marginalizados pela população. Sindicatos rurais e ligas camponesas formaram-se em regiões agrícolas; trabalhadores urbanos organizaram-se no interior da estrutura sindical; organizações estudantis, setores progressistas da Igreja Católica, políticos nacionalistas, entre outros grupos lutavam por mudanças sociais. Essas reformas, as chamadas reformas de base, foram preconizadas pelo Presidente da República João Goulart, que governou buscando o apoio dos trabalhadores, criando um clima político que permitia um desenvolvimento de formas da organização mais profundas e efetivas. Porém, com a deflagração do golpe militar, que implantou a ditadura no país ( ), todos os que lutavam por transformações sociais foram afastados pelos órgãos da repressão. Iniciou-se um processo de repressão política, caracterizado por um discurso anticomunista que enquadrava qualquer manifestação dessa espécie sob a
3 designação de subversiva, comunista, atentatória à ordem, ameaça à democracia, entre outras. O novo regime se destinava a ser transitório, mas se tornou uma ditadura plena com a promulgação do Ato Institucional Nº 5 em A ditadura deu início a um processo de repressão aos movimentos sociais e manifestações de oposição. A Igreja Católica no início da década de 1960 foi um dos espaços escolhidos para a mobilização e reunião dos movimentos sociais sindical, popular, alfabetização rural e urbana -, os leigos estavam presentes nesta atuação e, junto a eles, os religiosos. Após o golpe militar, esses movimentos foram vistos como laboratórios de ideias comunistas, sendo perseguidos, os seus participantes, pelo regime militar. Muitas lideranças católicas eram igualmente acusadas de comunistas, ou de pactuarem com eles. Diversos membros da Igreja passaram a ser perseguidos e serem alvos da repressão policial. Como desdobramento do que acontecia por todo país com essa nova situação, no Rio Grande do Norte verificou-se também um processo de repressão política direcionado à vários setores da sociedade - entre eles as atuações da Igreja. Ao consultar a bibliografia existente acerca do Movimento de Natal, nos deparamos com o seguinte questionamento: porque o Movimento de Natal teve uma paralisação, mesmo tendo obtido êxitos consideráveis no campo social e moral e repercussão a nível internacional. Como já foi dito, a deflagração no Brasil do regime militar desdobrou na perseguição e repressão a tudo o que ameaçasse a situação política no momento. O Movimento de Natal se propunha a elevar o homem não apenas socialmente, mas também moralmente. Não era apenas a alfabetização (no caso do MEB), mas também a conscientização política e a consciência de classe (FERRARI, 1967), conhecer a legislação trabalhista e fazer valer seus direitos, o que constituía uma prática subversiva para o regime. Eder Sader, em seu livro Quando novos personagens entraram em cena: experiências e lutas dos trabalhadores da grande São Paulo ( ), apresenta como um novo sujeito é produzido pelos movimentos sociais, um sujeito coletivo, diferente do individualista e racional; mostra o cotidiano popular, novos lugares para o exercício da política: Que são as migalhas das pequenas vitórias das pequenas lutas? São as experiências que os excluídos adquirem de sua presença no campo social e
4 político, de interesses e vontades, de direitos e práticas que vão formando uma história, pois seu conjunto lhes dá dignidade de um acontecimento histórico. 1 Seguindo a noção de movimento social de Sader, o movimento vai tecendo uma ligação entre o mundo cotidiano e o mundo da política 2. Os movimentos sociais não substituem os partidos nem podem cancelar as formas de representação política. Mas estes já não cobrem todo o espaço da política e perdem sua substância na medida em que não dão conta dessa nova realidade. 3 Uma obra encontrada sobre o Movimento de Natal, o livro Igreja e Desenvolvimento - O Movimento de Natal de autoria de Alceu Ferrari, o autor explica que, no início da década de 1960, o Movimento (incluídos os sindicatos rurais, estimulados e apoiados pelo SAR) e a classe político patronal rural estavam em conflito, pois, o primeiro, através de um processo educativo, visava atingir as relações de trabalho, assim como as relações de fidelidades políticas a partir do combate ao curral eleitoral, ao cabresto, à venda de voto livre e consciente, sendo isso para muitos um verdadeiro deus nos acuda, principalmente no que tangia aos sistemas de fidelidades políticas e relações de trabalho. Dessa forma, a classe político patronal rural, identificando-se com os propósitos anticomunistas e antissubversivos do golpe de 31 de março de 1964, ou sob pretexto de servir aos ideais deste, se mobilizou no sentido de erradicar toda e qualquer fonte de subversão da ordem estabelecida. Por subversão entendia-se tudo que, de alguma maneira, comprometia a sobrevivência dos sistemas tradicionais, de relações político-administrativas e de trabalho, no meio rural. O resultado foi uma paralisação do Movimento de Natal, de tudo que dizia respeito à luta pela mudança de estruturas, os sindicatos rurais, a conscientização, a politização. Alguns meses mais tarde, na tentativa de uma lenta recuperação, suas bases apresentavam um desfalque de quase metade de seus associados e vários sindicatos não mais podiam constar no mapa. O MEB continuou com ensino radiofônico, conservando da politização e conscientização apenas os aspectos não relacionados com a luta pela mudança de classes. O mesmo se diz do setor Ensino médio, da Emissora e d A Ordem; o SAR instaurou uma política de salvar o que pode. Mesmo com o preço de 1 SADER, Eder. Quando novos personagens entraram em cena: experiências e lutas dos trabalhadores da grande São Paulo Ed. São Paulo: Paz e Terra, p Ibid, p Ibid, p. 313.
5 uma pausa na luta pela mudança de estruturas, importava, antes de tudo, assegurar uma sobrevivência do conjunto e de cada uma de suas partes. Pensamos que, o Movimento de Natal, através de uma ação cognitiva que visava atingir relações de trabalho e política, procurando, a partir daí, despertar uma consciência de classe, estimulando e criando condições para a organização da classe trabalhadora rural em sindicatos, também através do combate ao curral eleitoral e ao cabresto, atingiu e entrou em conflito, dessa forma,com a classe político patronal rural, chefes políticos e cabos eleitoreiros, pois viam ameaçados seus domínios eleitorais, afinal, o adulto analfabeto era motivado a alfabetizar-se para progredir, para ler e conhecer a legislação trabalhista e fazer valer seus direitos. A Igreja Católica no Rio Grande do Norte, que já vinha sendo um dos espaços escolhidos para a mobilização e reunião dos movimentos sociais sindical, popular, alfabetização, rural e urbana, foi logo perseguida por essa classe político patronal rural, esta sob pretexto de servir os ideais da Revolução de 1964.
6 REFERÊNCIAS CAMARGO, Procópio. Movimento de Natal. Bruxelas: Centre de Documentation sur L'Action dês Eglises dans Le Monde, COUTO, Adolpho João de Paula. Revolução de 1964: a versão e o fato. Porto Alegre. Gente do livro, FERRARI, Alceu Ravanello. Igreja e Desenvolvimento O Movimento de Natal. Natal: Fundação José Augusto, LEÃO, Ilza A. Leão de (org), etall. Igreja e Política no RN: Momentos de uma trajetória. Natal: co-edição Comunicação; Sebo Vermelho, SADER, Eder. Quando novos personagens entraram em cena: experiências e lutas dos trabalhadores da grande São Paulo Ed. São Paulo: Paz e Terra, 2001.
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