Superior Tribunal de Justiça

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1 RECURSO ESPECIAL Nº MG (2010/ ) RELATOR RECORRENTE RECORRIDO ADVOGADO : MINISTRO GILSON DIPP : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS : CARLOS ROBERTO BARREIRO : SEBASTIÃO ASTÉZIO DE OLIVEIRA EMENTA CRIMINAL. RESP. EX-PREFEITO. CONDENAÇÃO NOS TERMOS DO ART. 89, DA LEI N.º 8.666/93. ABSOLVIÇÃO EM GRAU DE RECURSO, POR AUSÊNCIA DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. CRIME DE MERA CONDUTA. INEXIGÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO OU COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. O tipo penal previsto no art. 89 da Lei n.º 8.666/93 cuida de crime de mera conduta e sua caracterização independe da existência de dolo específico ou efetiva lesão ao erário, sendo suficiente a dispensa irregular de licitação ou a não observação das formalidades legais, nos exatos termos do enunciado. Precedentes. II. Recurso conhecido e provido, nos termos do voto do relator. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça. "A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e lhe deu provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP) votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 09 de novembro de 2010(Data do Julgamento) MINISTRO GILSON DIPP Relator Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 22/11/2010 Página 1 de 7

2 RECURSO ESPECIAL Nº MG (2010/ ) RELATÓRIO EXMO. SR. MINISTRO GILSON DIPP (Relator): Trata-se de Recurso Especial interposto pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, com fulcro no artigo 105, inciso III, alíneas a e c da Constituição Federal, contra acórdão proferido pela 3.ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Consta dos autos que contra o recorrido, à época Prefeito do Município de São João da Mata, foi oferecida denúncia dando-o como incurso no art. 1.º, inc. XIV do Decreto-Lei n.º 201/67 e nos arts. 89 e 90, ambos da Lei n.º 8.666/93. Sobreveio sentença que o condenou à pena de 03 (três) anos de detenção, em regime aberto, além de 10 (dez) dias-multa, como incurso no art. 89 da Lei n.º 8.666/93. Nos termos do art. 44 do Código Penal, a pena de detenção foi substituída por prestação pecuniária equivalente a 10 (dez) salários mínimos. Contra a sentença, a defesa interpôs recurso de apelação, no qual pretendeu a absolvição do ora recorrido, argumentando a ausência de dolo na conduta. Alternativamente, pretendeu a redução do valor do dia-multa e da prestação pecuniária. O recurso foi provido, nos termos da seguinte ementa (fl e-stj): ART. 89 DA LEI 8.666/93 EX-PREFEITO AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DOLO ABSOLVIÇÃO DECRETADA. Ante a inexistência de dolo, e não demonstrado, de forma clara a indiscutível, qualquer prejuízo ao erário municipal decorrente da conduta imputada ao acusado, impõe-se a sua absolvição. Contra tal acórdão, o Ministério Público estadual opôs embargos de declaração, os quais foram rejeitados (fl e-stj): EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ART. 619 DO CPP VÍCIO INEXISTENTE REEXAME DA CAUSA REDISCUSSÃO DO MÉRITO INVIABILIDADE EMBARGOS REJEITADOS. Em razões, o recorrente alega contrariedade ao art. 18, inc. I, do Código Penal e ao art. 89, caput, da Lei n.º 8.666/93, além de divergência jurisprudencial quanto ao tema. Não foram apresentadas contrarrazões (fl e-stj). Admitido o recurso (fls. 1177/1178 e-stj), a Subprocuradoria-Geral da Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 22/11/2010 Página 2 de 7

3 República opinou pelo seu provimento (fls. 1199/1202 e-stj). É o relatório. Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 22/11/2010 Página 3 de 7

4 RECURSO ESPECIAL Nº MG (2010/ ) VOTO EXMO. SR. MINISTRO GILSON DIPP (Relator): Trata-se de Recurso Especial interposto pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, com fulcro no artigo 105, inciso III, alíneas a e c da Constituição Federal, contra acórdão proferido pela 3.ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, o qual deu provimento ao recurso de apelação da defesa para absolver o réu da prática do delito descrito no art. 89 da Lei n.º 8.666/93. Em razões, o recorrente alega contrariedade ao art. 18, inc. I, do Código Penal e ao art. 89, caput, da Lei n.º 8.666/93, além de divergência jurisprudencial quanto ao tema. Tempestiva a irresignação, prequestionada a matéria e demonstrado o dissídio, conheço do recurso. O Tribunal a quo, ao prover o recurso de apelação, assim considerou (fls. 1135/1136 e-stj): (...) Narra a denúncia que em janeiro de 2001 o denunciado, sem qualquer justificativa plausível ou procedimento de dispensa de licitação, contratou o fornecimento de combustível para a frota municipal através do 'Posto Nicoelho', de propriedade de seu cunhado Jadir Franco. É verdade que a materialidade do delito encontra-se comprovada pelos documentos carreados aos autos. Também não há dúvida de que o réu autorizou aquisição de combustível no referido posto, pois ele confessou isso. Por outro lado, o Órgão Ministerial não se desincumbiu do ônus de provas que o acusado agiu com dolo, sendo certo que exigir que o acusado comprove que seu ato foi legítimo seria inversão do ônus probandi, o que não é admissível no ordenamento vigente. Ainda que da conduta atribuída ao réu se possa auferir algum tipo de descaso na gestão da coisa pública, não se mostram aptas a evidenciar a vontade livre e consciente do mesmo de contratar os serviços do referido posto com o objetivo de perpetrar qualquer ilícito a fim de obter proveito próprio ou alheio a partir da conduta praticada. (...) A meu ver, o fato de existir um contrato anterior entre o Município e o Posto Monjolo Ltda não configura o ilícito do art. 89 da Lei n.º 8.666/93, mesmo porque o acusado justificou que precedeu daquela forma em busca de evitar prejuízos ao Município, o que se comprova com a propositura de uma ação cautelar visando à rescisão do aludido contrato, ainda que tal ação tenha sido julgada improcedente (vide docs. de f. 686/695). Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 22/11/2010 Página 4 de 7

5 Portanto, inexistindo evidências seguras de favorecimento, entendo configurada mera irregularidade administrativa e não um ilícito de natureza penal. Assim, ante a inexistência de dolo, e não demonstrado, de forma clara e indiscutível, qualquer prejuízo ao erário municipal decorrente da conduta imputada ao acusado, impõe-se seja ele absolvido. O acórdão recorrido, de fato, encontra-se em confronto com o entendimento reiteradamente firmado por esta Corte, no sentido de que o tipo penal previsto no art. 89 da Lei n.º 8.666/93 cuida de crime de mera conduta. Assim sendo, a concretização do tipo independe da existência de dolo específico ou efetiva lesão ao erário, sendo suficiente a dispensa irregular de licitação ou a não observação das formalidades legais, nos exatos termos do enunciado. A respeito, trago à colação os seguintes precedentes: HABEAS CORPUS. PENAL. ART. 89, CAPUT, DA LEI N.º 8.666/93. TESE DE ATIPICIDADE DA CONDUTA. DOLO ESPECÍFICO. PREJUÍZO AO ERÁRIO. INEXIGÊNCIA. SENTENÇA CONDENATÓRIA, CONFIRMADA EM SEDE DE APELAÇÃO. RECONHECIMENTO DA INOCÊNCIA. NECESSIDADE DE EXAME APROFUNDADO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. ORDEM DENEGADA. 1. O crime previsto no art. 89 da Lei n.º 8.666/93 é crime de mera conduta, onde não se exige dolo específico de fraudar o erário ou efetivo prejuízo à administração pública, bastando para sua configuração que o agente dispense licitação fora das hipóteses previstas em lei ou deixe de observar as formalidades pertinentes à dispensa. Precedentes. 2. Ademais, absolver o Paciente reconhecendo a atipicidade da conduta por falta de dolo ultrapassa os limites do writ, pois depende, inexoravelmente, de amplo procedimento probatório e reflexivo, para que se possa concluir, com certeza, acerca da prática da infração delitiva. 3. Ordem denegada. (HC /PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 01/06/2010, DJe 28/06/2010) PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CONTRATAÇÃO SEM LICITAÇÃO. EMPRESA PROMOTORA DE EVENTOS. ART. 89, CAPUT, DA LEI Nº 8.666/93. DOLO ESPECÍFICO. PREJUÍZO AO ERÁRIO. INEXIGÊNCIA. AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1. É entendimento pacífico desta Corte que o trancamento da ação penal, pela via do habeas corpus, é medida de exceção, só admissível se emerge dos autos, de forma inequívoca, a ausência de indícios de autoria e prova da materialidade, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade. Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 22/11/2010 Página 5 de 7

6 2. Havendo indícios de que cabia ao agente público realizar licitação para a contratação de empresa promotora de eventos, afigura-se prematuro o trancamento da ação penal, ante a impossibilidade de revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos na estreita via do habeas corpus. 3. O tipo previsto no art. 89 da Lei nº 8.666/93 é delito de mera conduta, não exige dolo específico, mas apenas o genérico, representado, portanto, pela vontade de contratar sem licitação, quando a lei expressamente prevê a realização do certame. Independe, assim, de qualquer resultado naturalístico, como por exemplo, prejuízo ao erário. 4. Ordem denegada. (HC /PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 21/10/2008, DJe 10/11/2008) Com estas considerações, entendo que o recurso deve ser provido, para determinar-se o restabelecimento da sentença de primeiro grau de jurisdição Diante do exposto, conheço do recurso, dando-lhe provimento, nos termos acima expostos. É como voto. Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 22/11/2010 Página 6 de 7

7 CERTIDÃO DE JULGAMENTO QUINTA TURMA Número Registro: 2010/ REsp / MG MATÉRIA CRIMINAL Números Origem: PAUTA: 09/11/2010 JULGADO: 09/11/2010 Relator Exmo. Sr. Ministro GILSON DIPP Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro JORGE MUSSI Subprocurador-Geral da República Exmo. Sr. Dr. FRANCISCO XAVIER PINHEIRO FILHO Secretário Bel. LAURO ROCHA REIS RECORRENTE RECORRIDO ADVOGADO AUTUAÇÃO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS : CARLOS ROBERTO BARREIRO : SEBASTIÃO ASTÉZIO DE OLIVEIRA ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Previstos na Legislação Extravagante - Crimes de Responsabilidade CERTIDÃO Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: "A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e lhe deu provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator." Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP) votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília, 09 de novembro de 2010 LAURO ROCHA REIS Secretário Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 22/11/2010 Página 7 de 7