A Televisão em Portugal - História, paradigma actual e casos específicos

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1 Universidade de Vigo PROGRATELE 13 A Televisão em Portugal - História, paradigma actual e casos específicos análise à cadeia de televisão da região autónoma portuguesa com reflexões sobre o papel da televisão autonómica/regional. POR DIOGO LIMA (Erasmus, ) 2013/2014

2 ! A TV Regional no país Em Portugal o espectro dedicado à televisão regional é escasso. No cabo (ou seja, através de subscrição paga) há o Porto Canal (empresa privada com programação dedicada aos habitantes da segunda maior cidade do país; e a Localvisão TV - canal com uma hora de emissão dedicada a diferentes regiões nacionais que aposta na cobertura da actualidade e vida nos municípios. Apesar de na primeira se encontrar um certo nível de fidelização junto do seu target (dados do Instituto de Pesquisa de Opinião de Mercado indicam que 5,7% dos telespectadores dos cinco distritos do Norte a vêm diariamente), nenhuma das duas agrega em si focos de audiência de dimensões consideráveis. O modelo de gestão da Rádio e Televisão de Portugal, por seu lado, nunca passou pela criação de canais dedicados a certas regiões ou municípios. Enquanto país de pequena dimensão, nunca existiu uma diferenciação cultural ou política na população que propiciasse tão fortemente os factores que levam à formação de cadeias de televisão autonómicas ou regionais (como, em Espanha, é o caso das regionais). Além dos principais dois canais generalistas e dos diversos temáticos que oferece por cabo, a emissora de serviço público é obrigada por lei a manter dois canais que emitem nas regiões autónomas - a RTP/Açores e a RTP/Madeira. Fundadas na década de setenta, dedicam o seu espaço em grelha a uma mistura de programação de carácter generalista vinda dos canais nacionais com várias horas de produção feita em cada arquipélago. Este trabalho dedicar-se-á, portanto, à análise da situação actual, identidade e características da grelha de programação da RTP/Açores como ponto de partida para traçar uma perspectiva geral sobre um modelo de televisão peculiar que numa época de globalização é cada vez mais posto em causa.

3 O Atlântico e a Televisão: Introdução à história da RTP/A Os Açores são um arquipélago a 1600km do continente europeu habitado por aproximadamente 247 mil pessoas que se dividem por nove ilhas, sendo São Miguel a que acolhe o maior número (aproximadamente 140 mil pessoas). Situada no Atlântico Norte, trata-se de uma região ultraperiférica incluída na União Europeia dotada de um estatuto que lhe concede um governo e uma assembleia legislativa desde Tem como principais sectores de sustento a agricultura, pecuária, turismo e indústrias de transformação alimentar, tendo estes últimos sido desenvolvidos a partir dessa altura. Devido à distância entre o arquipélago e território continental e à elevada verba que implicaria a instalação dos meios necessários para a difusão de um canal televisivo nos Açores, esta foi a última zona do país a ter acesso ao pequeno ecrã, sucedendo-se tal em 1975 com a criação da RTP/A. Esta surgiu pouco após a Revolução dos Cravos, altura em que se vão pouco a pouco estabelecendo os parâmetros em que se exerceria a autonomia da região. A emissora apresentou-se pela primeira vez no dia 10 de agosto desse ano, com base na ilha de S.Miguel. Ainda que funcionando num horário reduzido em comparação com a homónima nacional - três horas diárias, seis ao fim-de-semana e fecho de emissão para pausa dos trabalhadores na segunda-feira - a sua grelha assentava nos espaços informativos, pouca produção regional (a aposta na ficção só apareceria nos anos 80) e num vasto leque de conteúdos nacionais (destaque para a tele-escola, aulas dedicadas a jovens de locais mais recônditos do país de modo a que fizessem a escolaridade básica) e internacionais. A caixinha mágica representava, naquele tempo, uma espécie de amostra do que melhor se fazia lá fora na altura, reflectindo uma programação característica do período paleotelevisivo (sendo informar, formar e entreter as palavras de ordem da grelha). Considera-se que o canal exerceu um papel vital na altura ao informar os cidadãos sobre o estado das coisas. Nos anos vindouros, contribuiu regularmente para a criação e manutenção de uma identidade comum através da exibição de conteúdos produzidos nas diferentes ilhas, aproximando assim uma série de indivíduos que não tinha a possibilidade de se deslocar entre elas e só a partir daí teve oportunidade de as conhecer com maior profundidade. Produções da RTP/A como Xailes Negros, Crónica de Gente Esquecida (séries de ficção), Atlântida ou Contacto levaram uma imagem diferente da região ao resto de Portugal e à enorme comunidade açoriana de espalhada através da antena internacional da Rádio e Televisão de Portugal.

4 Dos anos 80 até ao presente A evolução da cadeia passou pela extensão do horário de emissão (primeiramente das 9h da manhã às 2h da noite, mais tarde a 24h completas), melhoramento de infrastruturas e abertura de centros de produção em duas outras ilhas na década de 80. Só em 1988 o sinal da RTP Açores se difundiu por completo ao atingir finalmente as duas ilhas mais a ocidente, Flores e Corvo. Revela-se na década de 90 que os açorianos são a população do país que mais televisão vê, com uma média de audiência a rondar os 98,6%. O sexo feminino é aquele que mais lhe assiste mas a percentagem de telespectadores homens não lhe fica muito atrás (apresentando eles 89,1% em comparação com os 91% delas), um dado que revela a enraízada presença do meio de comunicação no arquipélago. É sabido que um pouco por toda a Europa os canais generalistas de serviço público perdem terreno com a chegada dos privados - a RTP/Açores sofre esse rombo com a chegada do cabo à região, perdendo gradualmente o monopólio das audiências e a fidelização dos espectadores para as emissoras nacionais e internacionais. Em 2005, a ZON (operadora portuguesa de televisão por cabo) estabelece um protocolo com as regiões autónomas que providencia aos seus cidadãos acesso gratuito aos canais generalistas em sinal aberto, garantindo finalmente a sua cobertura televisiva para todo o país. Estes dois acontecimentos não implicam a perda do propósito do canal na sua totalidade - havendo ainda locais onde esta era a oferta televisiva existente devido ao sinal de antena fraco ou à inexistência de infrastruturas - mas a sua relevância enquanto televisão de proximidade vai-se tornando cada vez mais complicada ao longo de anos de má gestão e grelhas repletas de retransmissão de conteúdos dos canais nacionais da empresa. A televisão pública sofre algumas reviravoltas no país com a chegada da crise de O governo de Pedro Passos Coelho revela um plano de reestruturação da RTP, que se vê em mãos com uma dívida de aproximadamente 768 milhões de euros. A antena açoriana sofre com estas mudanças, sendo obrigada a reduzir a produção regional a uma janela horária entre as e as como forma de cortar custos. Face a esta mudança de paradigma, suscitou-se a discussão pública sobre um meio de comunicação entre muitos que já o vinham considerando obsoleto e aqueles que defendem a televisão regional como um meio de manutenção da identidade cultural e de informação a uma região que dificilmente veria essas necessidades supridas apenas pela antena nacional.

5 A IDENTIDADE DA RTP AÇORES: TRAÇOS GERAIS Convém talvez mencionar que, ao longo da sua história, o canal sempre teve graves problemas de falta de meios tecnológicos modernizados, tendo que trabalhar as suas equipas de produção de conteúdos próprios em estúdios e escritórios degradados. Isto traduz-se num trabalho por vezes efectuado de forma amadora ou pobre tal como muitas produções do canal o foram. Apesar desses contratempos e como previamente mencionado, a RTP Açores procurou ao longo da sua existência servir as necessidades de uma população descentralizada onde, um pouco como no caso galego, predominam os espectadores de maior idade com um grande número de trabalhadores em áreas rurais e poucas qualificações. A sua grelha sempre teve, portanto, um maior enfoque na informação de proximidade, no desporto, cultura e tradições locais como forma de fidelizar audiências. Os programas mais importantes da história do canal sempre procuraram ir ao encontro dos açorianos de várias ilhas, como é o caso do Telejornal (boletim informativo nocturno, programa de maior audiência no arquipélago), Atlântida (talk-show realizado em cooperação com a RTP/Madeira sobre os costumes das diferentes ilhas portuguesas) ou Açores VIP (magazine de reportagens sobre distintos eventos socioculturais). A nível de estratégias de programação, a RTP/A joga tanto com tentativas de fidelização horizontal como vertical dentro das suas possibilidades. Mantêm-se os formatos típicos da estação à mesma hora todos os dias (Estação de Serviço, programa em conjunto com a rádio pública Antena 1, às 17; Telejornal às 20 e às 23, reposição para quem chega tarde a casa), mas a estação procura também ter programas de exibição semanal em dias em que o que procura é a fidelização vertical (caso dos dois últimos programas mencionados no parágrafo anterior, que constituem pratos fortes no fim-desemana). Esses programas têm apresentadores que são largamente reconhecidos pelos ilhéus. Caras mais antigas como as de Vasco Pernes, Sidónio Bettencourt, Pedro Bicudo (ex-jornalista da CNN) ou a mais recente Solange Vieira são personalidades que ganharam o seu lugar naquilo a que se pode considerar o espaço público da região e, através da RTP Internacional, fazem também chegar as suas caras a milhares de emigrantes açorianos espalhados pelo mundo (há o dizer popular de que existem mais ilhéus no estrangeiro que a viver lá).

6 Universidad de Vigo Apesar de durante algum tempo a RTP/A ter sofrido com a pobre qualidade dos seus grafismos, a universalização do design de promos, cortinas e identificativos feita pela empresa-mãe ajudou a modernizar a imagem da estação. A sua imagem (fig.1) é dominada pelos tons claros com o azul enquanto cor principal da palete. O logótipo da estação, de cor verde (como é possível ver na capa deste trabalho), aparece depois. Sempre foram as cores principais da marca Açores da RTP pela sua associação ao ambiente rural rodeado de mar em que as ilhas se encontram. fig.1 - cortina autopromocional da RTP/A.

7 caso RTP/A Conclusão: reflexões sobre a televisão generalista regional com base no É certo que reestruturação da RTP Açores teve um grande impacto no funcionamento geral do canal. A estação passou a ter que programar o seu dia todo com programação nacional e só começa as emissões a partir dos seus estúdios a partir da hora estipulada pelo Governo nacional. Tal reflectiu-se num clima de insegurança entre os trabalhadores e voltou a acender o debate sobre a verdadeira importância de um canal de serviço público para uma região autónoma. Lisboa não excluiu a decisão de fechar o canal açoriano da RTP, pretendendo cortar custos em todos os lados. Alguns acusam a emissora de desleixo na sua programação, passando grande parte do seu primetime com retransmissões de concertos. Trabalhadores e ex-trabalhadores defendem-se na falta de meios e condições, alegando que é essencial uma aposta do estado no canal e não o seu abandono. Ao longo da minha estadia na Galiza tive a oportunidade de olhar este tipo de televisão de uma forma diferente. Apesar da diferença de dimensões, entende-se que é possível fazer-se serviço público com produção de qualidade, construíndo um canal que preserva a língua, a cultura e a tradição de um povo apostando constantemente em novos conteúdos. A abordagem do estado português à questão não facilita o futuro da RTP/A. A tutela dos Assuntos Parlamentares, responsável pelo caso, arrasta-se em decisões por tomar e lutas contra os trabalhadores. As regiões autónomas, empobrecidas com a crise, procuram encontrar uma solução para um problema que se arrasta há anos e que agora se começa a tornar sério - a sustentabilidade de um canal de televisão para uma região tão pequena. É certo que o canal foi um instrumento que aproximou gerações de açorianos e de emigrantes, mas nos tempos que correm parece ser um fardo nas contas do estado e, socialmente, uma distração ultrapassada pela livre oferta televisiva e pela internet. Num tom de opinião pessoal, a RTP Açores precisa de voltar a olhar para dentro, relembrar os objectivos do serviço que presta à comunidade e trabalhar de forma inteligente, importando conceitos de estratégia, fidelização e programação televisiva tão comuns no estrangeiro. Modernizando as infrastruturas e formas de distribuição (porque Portugal Continental, ainda que contribua com os seus impostos para as ilhas, não tem a possibilidade de ver os seus canais), adoptando uma postura consciente dos tempos que correm. Resta é saber se se consegue renovar face a uma pressão tão grande dos seus governantes.

8 ! BIBLIOGRAFIA! Uma parte importante do trabalho não seria possível sem investigação directa junto a testemunhos pessoais de pessoas que viveram os tempos da RTP/Açores (destaque essencial para Tiago Ribeiro, trabalhador nos quadros da RTP/A e uma das principais vozes da estação homónima). Além de observação directa e de consulta a opiniões sobre o assunto, recorreu-se à consulta das seguintes fontes para fins de contextualização e dados mais específicos: TEVES, Victor Hugo. (n.d.). RTP 50 Anos de História. RTP. Retrieved September 18, 2013, from seed2.rtp.pt/50anos/50anos/livro/ [visto em 23 de novembro de 2013]. Expresso (2013). Privatização na RTP complica redução do passivo da empresa. [ONLINE] Available at: [visto em 25 de novembro de 2013]. Público (2013). Maioria dos açorianos contra concentração da programação regional da RTP Açores. [ONLINE] Disponível em: [visto em 28 de novembro de 2013]. YouTube (2013). Maioria dos açorianos contra concentração da programação regional da RTP Açores. [ONLINE] Disponível em: [visto em 29 de novembro de 2013]. SALVADOR, Jorge (2013). RTP Açores vive ainda tecnologicamente nos tempos analógicos. [ONLINE] Disponível em: [visto em 23 de novembro de 2013]. SALVADOR, Jorge (2013). RTP Açores tem de aumentar as audiências senão não há televisão para ninguém. [ONLINE] Disponível em: [visto em 23 de novembro de 2013].

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